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Para Lefebvre (2008, p. 82), em qualquer que seja o tempo histórico, há três características marcantes em uma cidade, ou seja, enquanto objeto espacial que ocupa um espaço bem distinto do urbano, onde as relações entre o urbano e o rural dependem das relações de produção, isto é, do modo com que se organizam os processos de produção material do homem; enquanto mediação entre uma ordem próxima e outra ordem distante, sendo que o campo próximo é o campo à sua volta dominado e organizado por ela e a ordem distante é o conjunto da sociedade; lugar onde o espaço é organizado e instituído segundo

exigências éticas, estéticas e ideológicas do momento histórico em que são implantadas, sendo assim uma obra no sentido de uma obra de arte.

Cosgrove (2003, p. 103) destaca que a produção de símbolos que se definem através de códigos onde “tais códigos incluem não apenas a linguagem em seu sentido formal, mas também o gesto, o vestuário, a conduta pessoal e social, a música, a pintura, a dança, o ritual, a cerimônia e as construções”, demonstra que o espaço urbano é culturalmente construído pelo homem em sociedade e essa construção evidencia-se através da produção simbólica de tais códigos.

Tendo em vista que o modo de vida urbano acontece inevitavelmente em espaços públicos e que este constitui um estilo de vida que contempla paisagens, arquitetura, modos de circulação humana, que juntos formam uma maneira do homem urbano construir e atuar no mundo. Toda a atividade humana é “ao mesmo tempo, material e simbólica, produção e comunicação” (COSGROVE, 2003, p. 103).

Para Lefebvre (1999, p. 77-81), o espaço urbano é espaço construído e apresenta os níveis e dimensões desse espaço, que estendem do nível global, onde se exerce o poder do Estado, o nível considerado intermediário, onde ocorre o urbano e o nível privado ou do habitar.

O Estado exerce seu poder enquanto vontade e representação no nível global. Isso se dá através de estratégias políticas de que detem o poder, facilitando a intervenção dos especialistas urbanistas e como forma de representatividade, “os homens de Estado têm uma concepção política ideologicamente justificada do espaço” tendo “capacidade de ação, podendo modificar a distribuição dos recursos, dos rendimentos, do valor criado pelo trabalho produtivo”. (LEFEBVRE, 1999, p. 78).

Esse nível global é onde ocorrem as relações mais essenciais e gerais com o mercado de capitais e a política de planificação do espaço, portanto, é mais abstrato. Porém, as práticas projetadas e desenvolvidas interferem diretamente no “prático-sensível e no imediato”, desenvolvendo projetos urbanísticos, projetando edificações e/ou monumentos (LEFEBVRE, 1999, p. 78).

O nível intermediário, de acordo com o pensamento de Lefebvre, localiza-se entre o nível global, onde há a construção de estratégias programadas para a estruturação do espaço, e o nível privado, isto é, o espaço do habitar. O nível intermediário, para ele, está diretamente

relacionado ao espaço urbano, porque ali encontra-se as estruturas para o comércio, os transportes e outros serviços urbanos.

No espaço privado situam-se os imóveis “domínio edificado”, edifícios residenciais, casas, acampamentos e favelas. Para Lefebvre (1999, p. 81), o nível do habitar “deteriorou-se fortemente na prática”, pois na sociedade urbana o homem vive em espaços homogeneizados “obrigando o vivido a encerrar-se em caixas, gaiolas, ou “máquinas de habitar”.

Para o autor, reencontrar o habitar e seu sentido, para exprimi-los, é preciso utilizar conceitos e categorias capazes de ir além do vivido do habitante, em direção ao não conhecido e ao desconhecido da cotidianidade”. (LEFEBVRE, 1999, p. 81).

Desse modo o habitar será compreendido nas relações cotidianas do espaço urbano, seja “do templo e dos palácios à choupana do lenhador, à cabana do pastor” assim como as “realidades urbanas, com suas diferenças e relações secretas e/ou evidentes” (LEFEBVRE, 1999, p. 81), revelam as singularidades deste espaço culturalmente construído e constantemente modificado.

A construção simbólica do espaço urbano propõe-se na dimensão cultural e na representação social em que os símbolos constituídos a partir dos bens patrimoniais históricos que se encontram concentrados ou dispersos no espaço público das pequenas, médias ou grandes cidades, se configuram e relevam a teia de relações sociais que afloram destes espaços.

As cidades, para Santos (1993, p. 61), têm “um grande papel na criação dos fermentos que conduzem a ampliar o grau de consciência”, pois é um espaço onde a vida em sociedade é facilitado devido às possibilidades que se apresentam nos diversos campos, sejam eles o da troca, da cultura ou da economia. Na cidade, no ambiente urbano essas possibilidades tornam- se mais prementes. Santos (1993, p. 61) ainda ressalta que as cidades são “espaço de revelação”, em que para a maioria dos indivíduos é um espaço que “ ao primeiro contato é impalpável, não se deixando entender apenas com o que apreendemos em suas enormes quantidades, nada mais que uma fração do todo”.

Tendo em vista que a cidade é o espaço onde se concentram “a população, mas também os instrumentos de produção, o capital, as necessidades, as fruições, logo, tudo o que faz com que uma sociedade seja uma sociedade onde a existência urbana confunde-se com a existência política [...] se a cidade concentra o que faz uma sociedade, reparte-o de maneira relativamente razoável entre organizações e instituições. (LEFEBVRE, 1972, p. 50).

A compreensão consciente e crítica desses processos de produção, possibilita perceber o espaço urbano e suas produções simbólicas e o que ele tem a revelar. “A cidade é palco constante no qual se movimentam as categorias econômicas, o salário e o capital, o sobreproduto e a mais-valia, desempenhando as suas cenas e os seus dramas” (LEFEBVRE, 1972, p. 117).

Neste espaço há inserção do homem de forma particularizada e singular, onde ele produz e consome bens materiais e culturais. Este também é o espaço onde se dão as relações de conflito e integração humanas. A cidade, transformada dentro de um movimento histórico, é produzida dentro de aspectos que a envolvem em dilemas permeados por aspectos demográficos, ambientais e funcionais. O espaço urbano é dinâmico, a vida o envolve em suas diversas nuances trazendo ao seu cotidiano os elementos que constituem a história humana em suas apropriações, suas interrelações políticas e sociais.

Estas revelam a simbologia de suas construções que são ao mesmo tempo concretas e abstratas, envoltas em aspectos culturais que marcam sua historicidade, trazendo à tona modos de ser, viver e organizar-se. Essas construções traduzem a dinâmica vital do espaço urbano, que a partir dessas marcas pode ser melhor compreendido, planejado e provavelmente transformado.

A discussão teórica travada ganha sentido na medida em que o tema do desenvolvimento e sustentabilidade se inscreve nas dimensões e nas dinâmicas do que denominamos espaço. Especificamente, como as pesssoas que fazem uso do espaço constroem suas subjetividades e subjetivações, sem perder de horizonte o contexto contemporâneo em que vivem. É dentro deste campo de ideias que este trabalho pensa o desenvolvimento local, o que discutiremos no próximo capítulo.

Capítulo 3

Desenvolvimento local e suas (im)possibilidades

Neste capítulo, guardadas as devidas proporcionalidades vale a reflexão a respeito das possibilidades de se efetivar o desenvolvimento local frente aos apelos massificadores, por sinal muito eficientes, em seu propósito de convencer que não há outros caminhos possíveis e que pensar em desenvolvimento local, de forma endógena, seria algo próximo do impossível.

Para se buscar uma melhor compreensão desses aspectos propõe-se uma análise a respeito de desenvolvimento local e sua articulação com o poder, também as relações humanas frente ao desenvolvimento urbano, o embate entre desenvolvimento e crescimento econômico. Para isso, faz-se necessária a conceituação de desenvolvimento e sustentabilidade.

Aqui também os elementos contextuais estão presentes com a intenção de localizar e compreender as concepções políticas pertinentes ao lugar, de modo a facilitar a interlocução com os temas desenvolvimento e sustentabilidade, tendo em vista, o município pequeno e a sua relação com os aspectos locais de poder.