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Espa¸cos de H¨ older

No documento Equações Diferenciais Parciais I/II (páginas 174-179)

A continuidade de H¨older ´e uma medida quantitativa de continuidade que ´e especialmente apropriada para o estudo de equa¸c˜oes diferenciais parciais. De um certo modo, ela tamb´em pode ser vista como um conceito de diferenciabilidade fracional. Isso sugere uma amplia¸c˜ao dos espa¸cos Ck(Ω) de fun¸c˜oes diferenci´aveis.

Lembre-se que se Ω⊂ Rn ´e um aberto, ent˜ao Ck(Ω) denota o espa¸co vetorial das fun¸c˜oes cujas derivadas

parciais at´e a ordem k (inclusive) s˜ao todas cont´ınuas: Ck(Ω) =

{f : Ω → R : Dγf ´e cont´ınua em Ω para todo

|γ| 6 k} . (9.17)

Freq¨uentemente denotamos o espa¸co das fun¸c˜oes cont´ınuas C0(Ω) simplesmente por C(Ω), e definimos

C∞(Ω) = T k∈N

Defini¸c˜ao. Seja Ω ⊂ Rn aberto. Os espa¸cos de H¨older Ck,α(Ω) s˜ao definidos como os subespa¸cos de

Ck(Ω) consistindo das fun¸c˜oes cujas derivadas parciais at´e a ordem k (inclusive) s˜ao todas cont´ınuas

de H¨older com expoente α em Ω:

Ck,α(Ω) =f ∈ Ck(Ω) : Dγf

∈ Cα(Ω) para todo

|γ| 6 k . (9.18)

Permitindo α = 0, podemos incluir os espa¸cos Ck(Ω) entre os espa¸cos de H¨older: Ck(Ω) = Ck,0(Ω).

Dado um espa¸co vetorial E, lembre-se que uma norma em E ´e uma fun¸c˜aok·k : E → [0, ∞) que satisfaz as seguintes propriedades:

(i) (Desigualdade Triangular)kv + wk 6 kvk + kwk para todos v, w ∈ E; (ii) kαvk = |α| kvk para todo v ∈ E e para todo α ∈ R;

(iii) kvk = 0 se e somente se v = 0.

Uma fun¸c˜ao [·] : E → [0, ∞) que satisfaz apenas as duas primeiras propriedades ´e chamada uma seminorma. Por exemplo, [f ]Cα(Ω) ´e uma seminorma em Cα(Ω): ´e f´acil ver que as duas primeiras propriedades de uma

norma s˜ao satisfeitas, mas a terceira propriedade n˜ao ´e satisfeita pois [f ]Cα(Ω)= 0 para toda fun¸c˜ao constante

f . Um espa¸co vetorial dotado de uma norma ´e chamado um espa¸co normado.

Como Ω ´e aberto, fun¸c˜oes em Ck(Ω) (e suas derivadas) n˜ao precisam ser limitadas em Ω. Portanto n˜ao

podemos adotar a norma do sup para transformar Ck(Ω) em um espa¸co normado. Ao inv´es, lembrando que

uma fun¸c˜ao limitada e uniformemente cont´ınua em Ω tem uma ´unica extens˜ao cont´ınua limitada para Ω, consideraremos o espa¸co

Ck(Ω) =f ∈ Ck(Ω) : Dγf ´e limitada e uniformemente cont´ınua em Ω para todo

|γ| 6 k . (9.19) (Observe que Ck(Rn)6= Ck(Rn).) Transformamos este espa¸co vetorial em um espa¸co normado definindo a

norma kfkCk(Ω)= max |γ|6kkD γf kL∞(Ω). (9.20) Similarmente, definimos Ck,α(Ω) =f ∈ Ck(Ω) : Dγf ∈ Cα(Ω) para todo |γ| 6 k (9.21)

e transformamos Ck,α(Ω) em um espa¸co normado definindo

kfkCk,α(Ω)=kfkCk(Ω)+ max

|γ|6k[D γf ]

(Ω). (9.22)

Novamente, identificamos Ck(Ω) = Ck,0(Ω). Lembrando que um espa¸co de Banach ´e um espa¸co normado

em que toda seq¨uˆencia de Cauchy ´e convergente, temos o seguinte resultado: Teorema 9.5. Seja Ω⊂ Rn aberto. Ent˜ao Ck,α(Ω) ´e um espa¸co de Banach.

A demonstra¸c˜ao deste resultado fica como exerc´ıcio (Exerc´ıcio 9.2). Agora, observamos que se 0 < α < β 6 1 valem as seguintes inclus˜oes:

Ck,β(Ω)$ Ck,α(Ω)$ Ck(Ω).

Tamb´em ´e claro que

Ck,1(Ω)6⊂ Ck+1(Ω).

Em geral tamb´em temos Ck+1(Ω) 6⊂ Ck,1(Ω), a n˜ao ser quando o dom´ınio ´e convexo, quando podemos

aplicar o teorema do valor m´edio (veja o teorema a seguir e o Exerc´ıcio 9.4). Podemos caracterizar melhor topologicamente as inclus˜oes lembrando os conceitos de imers˜ao cont´ınua e imers˜ao compacta:

Defini¸c˜ao. Seja E um subespa¸co vetorial normado de um espa¸co normado F (ou seja, a norma em E n˜ao precisa necessariamente ser a norma induzida de F ). Dizemos que a inclus˜ao E ⊂ F ´e uma imers˜ao (cont´ınua) se a aplica¸c˜ao inclus˜ao I : E → F definida por Ix = x for cont´ınua. Denotamos este fato por

E ֒→ F.

Se, al´em disso, a aplica¸c˜ao inclus˜ao for compacta, dizemos que a imers˜ao E ֒→ F ´e compacta. Como a aplica¸c˜ao inclus˜ao ´e linear, o fato de existir uma imers˜ao E ֒→ F ´e equivalente `a existˆencia de uma constante C tal que

kxkF 6CkxkE para todo v∈ E. (9.23)

Em particular, se (xn) ´e uma seq¨uˆencia de Cauchy em E, ent˜ao (xn) tamb´em ´e uma seq¨uˆencia de Cauchy em

F ; logo, se xn→ x em E, ent˜ao xn→ x em F tamb´em. ´E claro que se E tem a norma induzida de F , ent˜ao

a inclus˜ao E⊂ F ´e uma imers˜ao, com C = 1. Quando existe uma imers˜ao E ֒→ F , dizer que ela ´e compacta ´e equivalente a dizer que seq¨uˆencias limitadas de E possuem subseq¨uˆencias convergentes em F (isto ´e, na topologia de F ). A compacidade das imers˜oes de espa¸cos de H¨older definidos em dom´ınios limitados ´e uma conseq¨uˆencia direta do Teorema de Ascoli-Arzel´a, como o pr´oximo teorema mostra:

Teorema 9.6. Seja Ω ⊂ Rn aberto. Ent˜ao, para todo k e para todos 0 < α < β 6 1 valem as seguintes imers˜oes:

Ck+1(Ω) ֒

→ Ck(Ω), (9.24)

Ck,α(Ω) ֒→ Ck(Ω), (9.25)

Ck,β(Ω) ֒→ Ck,α(Ω). (9.26)

Se Ω ´e limitado, ent˜ao as duas ´ultimas imers˜oes s˜ao compactas e se Ω ´e convexo e limitado, todas as trˆes imers˜oes s˜ao compactas.

Se Ω ´e convexo, valem duas imers˜oes adicionais

Ck+1(Ω) ֒→ Ck,1(Ω), (9.27)

Ck+1(Ω) ֒→ Ck,α(Ω), (9.28)

sendo que a ´ultima ´e compacta se Ω for tamb´em limitado.

Prova. Primeiro vamos estabelecer a existˆencia das cinco imers˜oes. A existˆencia das imers˜oes (9.24) e (9.25) segue das desigualdades ´obvias

kfkCk(Ω)6kfkCk+1(Ω),

kfkCk(Ω)6kfkCk,α(Ω).

Para estabelecer (9.26), observamos que se 0 < α 6 β, ent˜ao

|x − y|α>|x − y|β se 0 <|x − y| 6 1, e

|x − y|α>1 se |x − y| > 1. Logo, para todo|γ| 6 k temos

sup x,y∈Ω 0<|x−y|61 |Dγf (x)− Dγf (y)| |x − y|α 6x,y∈Ωsup |Dγf (x)− Dγf (y)| |x − y|β = [D γf ](Ω)

e sup x,y∈Ω |x−y|>1 |Dγf (x) − Dγf (y) | |x − y|α 62 supΩ |D γf | = 2 kDγf kC0(Ω), donde kfkCk,α(Ω)63kfkCk,β(Ω).

Para estabelecer a existˆencia de (9.27) e (9.28), suponha agora que Ω ´e convexo. Seja f ∈ Ck+1(Ω). Dados

x, y∈ Ω e |γ| 6 k, pelo Teorema do Valor M´edio existe um ponto z ∈ Ω no segmento de reta que liga x e y tal que

Dγf (x)− Dγf (y) =∇Dγf (z)· (x − y). Portanto,

|Dγf (x)− Dγf (y)| 6 kfkCk+1(Ω)|x − y|

para todos x, y∈ Ω e para todo |γ| 6 k , o que implica f ∈ Ck,1(Ω) e

kfkCk,1(Ω)6kfkCk+1(Ω).

A imers˜ao (9.28) segue das imers˜oes (9.26) e (9.27).

Vamos agora estabelecer a compacidade das imers˜oes. De agora em diante assuma que Ω ´e limitado. Mostremos primeiramente que (9.25) ´e compacta no caso k = 0. Se (fj) ´e uma seq¨uˆencia limitada de

fun¸c˜oes em C0,α(Ω) = Cα(Ω), ent˜ao existe M > 0 tal que

kfjkCα(Ω)6M para todo j. Mas ent˜ao

|fj(x)| 6 M para todo x ∈ Ω e para todo j,

o que implica que a seq¨uˆencia (fj) ´e uniformemente limitada, e

|fj(x)− fj(y)| 6 M |x − y|α para todos x, y∈ Ω e para todo j,

o que implica que a seq¨uˆencia (fj) ´e uniformemente eq¨uicont´ınua. Pelo Teorema de Ascoli-Arzel´a, (fj) possui

uma subseq¨uˆencia convergente em C0(Ω). Isso prova a compacidade de (9.25) no caso k = 0.

No caso geral, se (fj) ´e uma seq¨uˆencia limitada de fun¸c˜oes em Ck,α(Ω), ent˜ao em particular (fj) ´e

uma seq¨uˆencia limitada de fun¸c˜oes em C0,α(Ω) e portanto possui uma subseq¨uˆencia convergente em C0(Ω),

como acabamos de ver, que continuaremos denotando por (fj). Assim, existe f∈ C0(Ω) tal que fj→ f em

C0(Ω). Mas (D1f

j) tamb´em ´e limitada em C0,α(Ω), logo existe uma subseq¨uˆencia de (fj) , que continuaremos

denotando por (fj), tal que D1fj→ f1em C0(Ω), para alguma f1∈ C0(Ω). Como a convergˆencia em C0(Ω)

corresponde `a convergˆencia uniforme em Ω, conclu´ımos que f1= D1f . Continuando este processo de extrair

subseq¨uˆencias, conclu´ımos que Dγf

j → Dγf em C0(Ω) para todo |γ| 6 k. Isso significa que fj → f em

Ck(Ω), o que estabelece a compacidade de (9.25).

A compacidade de (9.26) segue da compacidade de (9.25). Basta apenas observar o seguinte: se (fj) ´e

uma seq¨uˆencia limitada de fun¸c˜oes em Ck,β(Ω), digamoskf

jkCk,β(Ω)6M , ent˜ao podemos escrever

|Dγf j(x)− Dγfj(y)| |x − y|α = |Dγf j(x)− Dγfj(y)| |x − y|β !α β |Dγf j(x)− Dγfj(y)|1− α β 6Mα/β|Dγfj(x)− Dγfj(y)|1− α β , ou seja, [Dγfj]Cα(Ω)62 1−α βMα/βkDγf jk 1−α β C0(Ω).

Por (9.25), (fj) possui uma subseq¨uˆencia convergente em Ck(Ω). A desigualdade que acabamos de obter im-

plica, ent˜ao, que cada uma das derivadas parciais desta mesma subseq¨uˆencia converge em C0,α(Ω). Portanto,

Finalmente, se Ω ´e convexo ´e limitado, a compacidade de (9.24) e (9.28) segue respectivamente de compor a imers˜ao cont´ınua (9.27) com as imers˜oes compactas (9.25) e (9.26) para o caso α = 1, respectivamente:

Ck+1(Ω) ֒→ Ck,1(Ω)compacta֒ Ck(Ω), Ck+1(Ω) ֒→ Ck,1(Ω)compacta֒

→ Ck,α(Ω). 

Agora observamos que o produto de duas fun¸c˜oes cont´ınuas de H¨older limitadas ainda ´e uma fun¸c˜ao cont´ınua de H¨older (limitada). Portanto, os espa¸cos de H¨older Ck,α(Ω) s˜ao ´algebras.

Proposi¸c˜ao 9.7. Seja Ω⊂ Rn aberto. Se f, g

∈ Cα(Ω), ent˜ao f g ∈ Cα(Ω) e [f g]Cα(Ω)6kfkC0(Ω)[g]Cα(Ω)+kgkC0(Ω)[f ]Cα(Ω). Prova. Temos |f(x)g(x) − f(y)g(y)| |x − y|α =

|f(x)g(x) − f(x)g(y) + f(x)g(y) − f(y)g(y)| |x − y|α 6|f(x)||g(x) − g(y)| |x − y|α +|g(y)| |f(x) − f(y)| |x − y|α . 

Uma das mais importantes propriedades dos espa¸cos de H¨older ´e a desigualdade de interpola¸c˜ao, que torna poss´ıvel estudar somente o termo mais importante ao derivar uma estimativa a priori, simplificando assim a demonstra¸c˜ao. Usamos o argumento de compacidade cl´assico para a demonstra¸c˜ao deste tipo de desigualdade. No que se segue, consideraremos as seminormas

[f ]Ck(Ω)= X |γ|=k kDγf kL∞(Ω), (9.29) [f ]Ck,α(Ω)= X |γ|=k [Dγf ]Cα(Ω). (9.30)

A norma introduzida anteriormente para os espa¸cos Ck,α(Ω) ´e equivalente `a norma

kfkCk,α(Ω)=

k

X

j=0

[f ]Cj(Ω)+ [f ]Ck,α(Ω) (9.31)

(veja o Exerc´ıcio 9.5). Em vista disso, usaremos em cada situa¸c˜ao a norma que for mais conveniente. Teorema 9.8. (Desigualdade de Interpola¸c˜ao) Seja Ω⊂ Rn um aberto limitado. Se 0 6 α 6 1, ent˜ao para

todo ε > 0 vale

[u]C1(Ω)6ε [u]C2,α(Ω)+ CεkukC0(Ω), (9.32)

[u]C2(Ω)6ε [u]C2,α(Ω)+ CεkukC0(Ω), (9.33)

para todo u ∈ C2,α(Ω), com a constante C

ε = C (ε, n, α, Ω). Al´em disso, se Ω ´e convexo, valem tamb´em

[u]Cα(Ω)6ε [u]C2,α(Ω)+ CεkukC0(Ω), (9.34)

Prova. Provaremos primeiro (9.33). Se (9.33) n˜ao ´e v´alida, ent˜ao para todo m∈ N existe um∈ C2,α(Ω) tal

que

[um]C2(Ω)> ε [um]C2,α(Ω)+ mkumkC0(Ω).

Usando a homogeneidade da desigualdade (isto ´e, se (9.33) ´e v´alida para uma fun¸c˜ao v, ela cont´ınua v´alida para qualquer m´ultiplo escalar λv de v), podemos assumir sem perda de generalidade que

kumkC2(Ω)= 1 (9.36)

para todo m, pois se isso n˜ao ocorrer podemos substituir umpor vm= um/kumkC2(Ω). Como [um]C2(Ω)6

kumkC2(Ω), segue que ε [um]C2,α(Ω)+ mkumkC0(Ω)< 1, donde [um]C2,α(Ω)< 1 ε (9.37) e kumkC0(Ω)< 1 m. (9.38)

De (9.36) e (9.37) conclu´ımos, via a norma equivalente introduzida acima, que a seq¨uˆencia (um) ´e limitada

em C2,α(Ω). Segue ent˜ao da compacidade da imers˜ao C2,α(Ω) ֒→ C2(Ω) que existe uma subseq¨uˆencia u mj  de (um) tal que umj → u em C 2(Ω); em particular, kuk C2(Ω) = lim umj

C2(Ω) = 1. Por outro lado, de

(9.38) conclu´ımos que um→ 0 uniformemente em C0(Ω). Isso implica que u = 0, uma contradi¸c˜ao.

A demonstra¸c˜ao das outras trˆes desigualdades ´e an´aloga, uma vez que observamos que [um]C1(Ω)6kumkC2(Ω),

por defini¸c˜ao, e que, se Ω ´e convexo, existe uma constante C = C (n, α, Ω) tal que [um]Cα()6CkumkC2() ,

[um]C1,α()6CkumkC2() .

Estas duas ´ultimas desigualdades decorrem da continuidade da imers˜ao C2(Ω) ֒

→ C1,α(Ω):

kukC1,α() = kukC1() + [u]Cα() + [Du]Cα()6CkukC2() .



Uma vers˜ao da desigualdade de interpola¸c˜ao para espa¸cos de H¨older de qualquer ordem ´e apresentada no Exerc´ıcio 9.9. Para os nossos prop´ositos de estudar equa¸c˜oes el´ıpticas de segunda ordem, a desigualdade de interpola¸c˜ao do Teorema 9.8 ser´a suficiente.

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