• Nenhum resultado encontrado

O Problema de Cauchy para Equa¸c˜ oes Quasilineares Bidimensionais

No documento Equações Diferenciais Parciais I/II (páginas 43-50)

1.3 Equa¸c˜oes de Primeira Ordem Linear com Coeficientes Vari´aveis e o M´etodo das Caracter´ısticas

2.1.3 O Problema de Cauchy para Equa¸c˜ oes Quasilineares Bidimensionais

Relembrando as defini¸c˜oes da se¸c˜ao anterior, consideraremos uma equa¸c˜ao quasilinear de primeira ordem na forma

a(x, y, u)ux+ b(x, y, u)uy= c(x, y, u) em Ω⊂ R2, (2.12)

onde Ω ´e um aberto e a, b, c∈ C1(Ω× R), com a e b nunca se anulando simultaneamente. Uma superf´ıcie

Σ ⊂ Ω × R ´e chamada uma superf´ıcie integral para esta equa¸c˜ao, se para todo ponto (x, y, z) ∈ Σ, o vetor (a(x, y, z), b(x, y, z), c(x, y, z)) ´e tangente a Σ; se Σ puder ser escrita como o gr´afico de uma fun¸c˜ao z = u(x, y), (x, y)∈ Ω, isto ´e equivalente a dizer que a(x, y, u)ux+ b(x, y, u)uy= c(x, y, u) em Ω, isto ´e, que

u ´e uma solu¸c˜ao para a equa¸c˜ao quasilinear, e dizemos que Σ ´e uma superf´ıcie solu¸c˜ao. As curvas que satisfazem o sistema de equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias n˜ao-lineares

   x′(t) = a(x(t), y(t), z(t)) y′(t) = b(x(t), y(t), z(t)) z′(t) = c(x(t), y(t), z(t))

s˜ao chamadas as curvas caracter´ısticas associadas `a equa¸c˜ao quasilinear (2.12). O sistema de equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias que a define ´e chamado o sistema de equa¸c˜oes caracter´ısticas ou, simplesmente, sistema caracter´ıstico.

Proposi¸c˜ao 2.5. Se uma superf´ıcie Σ⊂ R3 ´e a uni˜ao de curvas caracter´ısticas para a equa¸c˜ao quasilinear

(2.12), ent˜ao ela ´e uma superf´ıcie integral para ela. Reciprocamente, toda superf´ıcie integral z = u(x, y) ´e a uni˜ao de curvas caracter´ısticas.

Prova. A primeira afirma¸c˜ao ´e ´obvia, j´a que por todo ponto p de Σ passa uma curva caracter´ıstica Γ contida na superf´ıcie e o vetor tangente `a uma curva caracter´ıstica por defini¸c˜ao tem a dire¸c˜ao do vetor caracter´ıstico (a, b, c): como o vetor tangente a Γ em p pertence ao plano tangente TpΣ, porque Γ⊂ Σ, conclu´ımos que em

todo ponto da superf´ıcie o vetor caracter´ıstico est´a contido no plano tangente `a superf´ıcie naquele ponto. Para provar a rec´ıproca, seja Σ uma superf´ıcie integral que ´e o gr´afico de uma fun¸c˜ao z = u(x, y), (x, y)∈ Ω. Dado um ponto (x0, y0, z0) = (x0, y0, u(x0, y0))∈ Σ, seja Γ a curva caracter´ıstica que passa por

este ponto. Mostraremos que Γ⊂ Σ.

De fato, seja γ : t7→ (x(t), y(t), z(t)) uma parametriza¸c˜ao de Γ satisfazendo    x′(t) = a(x(t), y(t), z(t)) y′(t) = b(x(t), y(t), z(t)) z′(t) = c(x(t), y(t), z(t))

e (x(0), y(0), z(0)) = (x0, y0, z0); como o vetor tangente `a curva caracter´ıstica Γ em (x0, y0, z0) n˜ao ´e paralelo

ao eixo u, esta parametriza¸c˜ao faz sentido. Defina

w(t) = z(t)− u(x(t), y(t)). (2.13)

Provaremos que w≡ 0, isto ´e, z(t) = u(x(t), y(t)) para todo t e portanto Γ ⊂ Σ. De fato, temos w(0) = z(0)− u(x(0), y(0)) = z0− u(x0, y0) = 0

e

w′(t) = z′(t)− ux(x(t), y(t))x′(t)− uy(x(t), y(t))y′(t)

= c(x(t), y(t), z(t))− a(x(t), y(t), z(t))ux(x(t), y(t))− b(x(t), y(t), z(t))uy(x(t), y(t))

= c(x(t), y(t), w(t) + u(x(t), y(t)))

− a(x(t), y(t), w(t) + u(x(t), y(t)))ux(x(t), y(t))− b(x(t), y(t), w(t) + u(x(t), y(t)))uy(x(t), y(t)).

Portanto, w ´e a solu¸c˜ao ´unica do problema de valor inicial 

 

w′(t) = c(x(t), y(t), w(t) + u(x(t), y(t)))

− a(x(t), y(t), w(t) + u(x(t), y(t)))ux(x(t), y(t))

− b(x(t), y(t), w(t) + u(x(t), y(t)))uy(x(t), y(t)),

w(0) = 0.

Por outro lado, a solu¸c˜ao identicamente nula tamb´em ´e uma solu¸c˜ao para este problema, porque u ´e uma solu¸c˜ao para a equa¸c˜ao quasilinear. Por unicidade de solu¸c˜ao para uma equa¸c˜ao diferencial ordin´aria, segue que w≡ 0. 

Corol´ario 2.6. Se duas superf´ıcies solu¸c˜ao tˆem um ponto em comum, ent˜ao elas se interceptam ao longo de toda a curva caracter´ıstica que passa por este ponto. Reciprocamente, se duas superf´ıcies integrais interceptam-se transversalmente ao longo de uma curva, ent˜ao esta curva ´e uma curva caracter´ıstica. Prova. A primeira afirma¸c˜ao ´e uma conseq¨uˆencia direta da Proposi¸c˜ao 2.5. Para provar a segunda afirma¸c˜ao, sejam Σ1, Σ2 duas superf´ıcies integrais que se interceptam transversalmente ao longo de uma curva Γ. Dado

um ponto qualquer p ∈ Γ, considere os planos tangentes TpΣ1, TpΣ2. Como a intersec¸c˜ao das superf´ıcies

integrais ´e transversal, por defini¸c˜ao os planos TpΣ1e TpΣ2tamb´em interceptam-se transversalmente, isto ´e,

ao longo de uma ´unica dire¸c˜ao comum, a qual obviamente ´e a dire¸c˜ao tangente `a curva Γ em p. Esta dire¸c˜ao ´e dada pelo vetor (a, b, c), j´a que ambos os planos contˆem este vetor, por defini¸c˜ao de superf´ıcie integral. Segue que a tangente `a curva Γ em p est´a na dire¸c˜ao do vetor (a, b, c), logo Γ ´e uma curva caracter´ıstica.  A Proposi¸c˜ao 2.5 pode ser vista como descrevendo a solu¸c˜ao geral para a equa¸c˜ao quasilinear: a solu¸c˜ao geral ´e o conjunto de superf´ıcies solu¸c˜ao, as quais por sua vez s˜ao uni˜oes de curvas caracter´ısticas. Uma solu¸c˜ao particular u(x, y) pode ser obtida atrav´es da especifica¸c˜ao de uma superf´ıcie solu¸c˜ao. A especifica¸c˜ao de uma superf´ıcie integral em geral pode ser feita atrav´es de uma curva inicial eΓ no espa¸co xyz que seja capaz de gerar uma tal superf´ıcie. Uma condi¸c˜ao necess´aria ´e que a curva eΓ seja transversal `as curvas caracter´ısticas: as curvas caracter´ısticas que passam pelos pontos de eΓ geram uma superf´ıcie integral. Se parametrizarmos eΓ por

e

γ(s) = (α(s), β(s), f (s)),

ent˜ao especificar a superf´ıcie solu¸c˜ao que passa por eΓ ´e equivalente a encontrar a solu¸c˜ao u(x, y) para a equa¸c˜ao quasilinear que satisfa¸ca a condi¸c˜ao

f (s) = u(α(s), β(s))

sobre a curva inicial Γ parametrizada por γ(s) = (α(s), β(s)). ´E necess´ario, pois, saber que condi¸c˜oes a curva inicial Γ deve satisfazer para que a curva eΓ gere uma superf´ıcie integral que seja o gr´afico de uma fun¸c˜ao

z = u(x, y), para que possamos estabelecer a existˆencia de uma solu¸c˜ao (pelo menos local) para o problema de Cauchy assim definido. Segue do pr´oximo teorema que a ´unica condi¸c˜ao exigida ´e que a curva inicial Γ intercepte transversalmente as proje¸c˜oes das curvas caracter´ısticas em Ω. A grande diferen¸ca com rela¸c˜ao ao caso linear ´e que no caso quasilinear as proje¸c˜oes caracter´ısticas n˜ao s˜ao independentes da condi¸c˜ao inicial: enquanto que no caso linear as proje¸c˜oes caracter´ısticas s˜ao exclusivamente associadas `a equa¸c˜ao, e n˜ao se alteram quando a condi¸c˜ao inicial do problema muda, no caso quasilinear a sua defini¸c˜ao depende tamb´em da condi¸c˜ao f sobre a curva inicial Γ. Isso se deve ao fato de que no caso quasilinear o vetor tangente `as proje¸c˜oes caracter´ısticas no ponto de interse¸c˜ao com a curva inicial ´e o vetor (a(α(s), β(s), f (s)), b(α(s), β(s), f (s))). Teorema 2.7. (Existˆencia e Unicidade Locais para o Problema de Cauchy Quasilinear) Sejam Ω⊂ R2 um

aberto e Γ⊂ Ω uma curva de classe C1. Seja γ(s) = (α(s), β(s)) uma parametriza¸c˜ao de Γ de classe

C1, definida em um intervalo aberto I

⊂ R. Suponha que a, b, c ∈ C1(Ω

× R), f ∈ C1(I), com a e b n˜ao se anulando simultaneamente em nenhum ponto x∈ Ω e satisfazendo

det  α′(s) a(α(s), β(s), f (s)) β′(s) b(α(s), β(s), f (s))  6= 0 para todo s ∈ I. (2.14)

Ent˜ao, o problema de Cauchy quasilinear 

a(x, y, u)ux+ b(x, y, u)uy= c(x, y, u) se (x, y)∈ Ω,

u(α(s), β(s)) = f (s) se s∈ I, (2.15)

possui uma ´unica solu¸c˜ao de classe C1 em uma vizinhan¸ca de Γ.

Prova. Seja (x(s, t), y(s, t), u(s, t)) a solu¸c˜ao local, definida em uma vizinhan¸ca V0, do sistema de equa¸c˜oes

caracter´ısticas               ∂x

∂t(s, t) = a(x(s, t), y(s, t), u(s, t)) ∂y

∂t(s, t) = b(x(s, t), y(s, t), u(s, t)) ∂u

∂t(s, t) = c(x(s, t), y(s, t), u(s, t)) sujeito `a condi¸c˜ao inicial

  x(s, 0) = α(s) y(s, 0) = β(s) u(s, 0) = f (s) .

A hip´otese do determinante significa geometricamente que a curva inicial intercepta as proje¸c˜oes das curvas caracter´ısticas em Ω transversalmente; analiticamente, atrav´es do Teorema da Fun¸c˜ao Impl´ıcita, ela permite encontrar localmente s, t em fun¸c˜ao de x, y (ou seja, nesta vizinhan¸ca da curva Γ, a superf´ıcie escreve-se como o gr´afico de uma fun¸c˜ao de x, y). De fato, para cada s temos

∂(x, y) ∂(s, t)(s, 0) = det     ∂x ∂s(s, 0) ∂x ∂t(s, 0) ∂y ∂s(s, 0) ∂y ∂t(s, 0)     = det  α′(s) a(α(s), β(s), f (s)) β′(s) b(α(s), β(s), f (s))  6= 0, logo, pelo Teorema da Fun¸c˜ao Impl´ıcita, em uma vizinhan¸ca V ⊂ V0 de Γ podemos resolver



x = x(s, t) y = y(s, t) para s e t em termos de x e y, obtendo 

s = s(x, y) t = t(x, y) ,

com

s(α(s), β(s)) = s e t(α(s), β(s)) = 0. Conseq¨uentemente, podemos definir u como uma fun¸c˜ao de x e y:

u = u(x, y) = u(s(x, y), t(x, y)).

Vamos verificar que a fun¸c˜ao u assim definida satisfaz o problema de Cauchy. A condi¸c˜ao inicial ´e satisfeita porque

u(α(s), β(s)) = u(s, 0) = f (s).

Que u satisfaz a equa¸c˜ao quasilinear pode ser visto atrav´es da regra da cadeia: como ux= ussx+ uttx,

uy= ussy+ utty,

segue que

aux+ buy= (asx+ bsy)us+ (atx+ bty)ut.

Mas, novamente pela regra da cadeia,

asx+ bsy= sxxt+ syyt= st= 0,

pois s, t s˜ao vari´aveis independentes, e

atx+ bty= txxt+ tyyt= tt= 1.

Portanto,

aux+ buy= ut= c.

A unicidade da solu¸c˜ao segue da teoria de unicidade para solu¸c˜oes de equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias. Se u(x, y) ´e uma solu¸c˜ao qualquer para o problema de Cauchy na vizinhan¸ca V encontrada acima, n´os constru´ımos uma curva (x(t), y(t))⊂ V como sendo a solu¸c˜ao do sistema de equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias



x′(t) = a(x(t), y(t), u(x(t), y(t))

y′(t) = b(x(t), y(t), u(x(t), y(t))

sujeito `a condi¸c˜ao inicial (x(0), y(0)) = (x0, y0), onde (x0, y0) ´e um ponto qualquer do dom´ınio da superf´ıcie

solu¸c˜ao. Defina agora

u(t) = u(x(t), y(t)). Ent˜ao u(t) satisfaz

u′(t) = uxxt+ uyyt= aux+ buy= c(x(t), y(t), u(x(t), y(t))),

de modo que a curva (x(t), y(t), u(t)) satisfaz o sistema de equa¸c˜oes caracter´ısticas e passa por um ponto (x0, y0, u0) na superf´ıcie. Pelo teorema de unicidade para equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias, esta curva ´e ´unica.



A seguir, vamos ilustrar o teorema anterior considerando alguns exemplos de problemas de valor inicial para equa¸c˜oes quasilineares que surgem em situa¸c˜oes f´ısicas.

Exemplo 2.8. Primeiro vamos analisar o problema de valor inicial para a equa¸c˜ao cinem´atica da onda 

ut+ c(u)ux= 0 se x∈ R e t > 0,

onde c e f s˜ao fun¸c˜oes de classe C1. O sistema caracter´ıstico ´e    x′= c(u) t′= 1 u′= 0 ,

com condi¸c˜ao inicial parametrizada por    x(s, 0) = s t(s, 0) = 0 u(s, 0) = f (s) . Como ∂(x, y) ∂(s, t)(s, 0) = det  1 u(s, 0) 0 1  6= 0,

sabemos que existe uma solu¸c˜ao local em uma vizinhan¸ca do eixo x. Integrando cada equa¸c˜ao do sistema caracter´ıstico e levando em conta as condi¸c˜oes iniciais, obtemos as curvas caracter´ısticas

x = c(u)t + s, t = t,

u = f (s).

Observe que, dado um ponto inicial (x0, 0) no eixo x, a curva caracter´ıstica emanando deste ponto

´e uma reta, com inclina¸c˜ao vari´avel c(u(x0)) = c(f (x0)) dependendo do ponto x0: ´e a reta x =

c(f (x0))t + x0. Portanto, apesar do problema ser n˜ao-linear, vemos que suas curvas caracter´ısticas

s˜ao retas. Al´em disso, como u′ = 0, segue que u ´e constante ao longo destas retas caracter´ısticas

(conseq¨uˆencia da equa¸c˜ao ser homogˆenea), logo o valor de u nos pontos (x0, 0) ´e transmitido ao longo das

retas caracter´ısticas com velocidade vari´avel igual a c(f (x0)). A solu¸c˜ao ´e, portanto, u(x, t) = c(f (x0))

se x = c(f (x0))t + x0.

Queremos investigar a existˆencia de uma solu¸c˜ao global, definida para todo t > 0. Resolvendo s, t implicitamente em fun¸c˜ao de x, t, segue que

u(x, t) = f (x− c(u)t). (2.16)

Obviamente esta ´e uma equa¸c˜ao impl´ıcita que ainda n˜ao ´e a solu¸c˜ao u. Sabemos que existe uma solu¸c˜ao local em uma vizinhan¸ca do eixo x, mas para que exista uma solu¸c˜ao global u ´e necess´ario poder escrever a vari´avel s explicitamente em fun¸c˜ao de x, t. Para isso, ´e necess´ario que as retas caracter´ısticas n˜ao se interceptem: cada ponto (s, t) deve corresponder a um ´unico ponto (x, t), o que n˜ao acontece no ponto de interse¸c˜ao de duas retas caracter´ısticas, quando diferentes valores de s d˜ao origem a um mesmo ponto (x, t). O teorema de existˆencia e unicidade local garante que isso n˜ao ocorre durante um certo tempo (ou seja, pr´oximo a vizinhan¸ca do eixo x), mas n˜ao pode garantir que isso eventualmente n˜ao acontecer´a, para algum valor de t. Para que as retas caracter´ısticas nunca se interceptem, a fun¸c˜ao c◦ f precisa ser n˜ao-decrescente, ou seja, ambas as fun¸c˜oes c e f devem ser n˜ao-decrescentes. Quando isso ocorre, existe uma solu¸c˜ao global para o problema de valor inicial. 

Exemplo 2.9. Vamos considerar agora o seguinte problema espec´ıfico de valor inicial para a equa¸c˜ao de

Burgers:   ut+ uux= 0 se x∈ R e t > 0, u(x, 0) = f (x) =  0 se x 6 0, e−1/x se x > 0.

Neste caso temos c(u) = u e f ´e uma fun¸c˜ao de classe C∞. Ambas s˜ao fun¸c˜oes n˜ao-decrescentes. As

se x 6 0 e as retas caracter´ısticas s˜ao retas verticais; se x > 0, ent˜ao c = e−1/x e as caracter´ısticas

come¸cam a inclinar-se para a direita, tendendo `a velocidade 1 quando x → ∞, descrevendo uma situa¸c˜ao em que as retas caracter´ısticas tendem a se espalhar (esboce o diagrama caracter´ıstico). A regi˜ao onde as caracter´ısticas se espalham ´e chamada uma onda de rarefa¸c˜ao. A solu¸c˜ao do problema ´e dada implicitamente por

u(x, t) =  0 se x 6 0, e−1/s onde x − s = te−1/s, se x > 0. 

Terminamos esta se¸c˜ao dando uma solu¸c˜ao mais completa para o problema de Cauchy quasilinear, con- siderando tamb´em o caso em que a curva inicial ´e uma proje¸c˜ao caracter´ıstica.

Teorema 2.10. (Solu¸c˜ao do Problema de Cauchy Quasilinear) Seja Ω ⊂ R2 um aberto. Suponha que

a, b, c∈ C1(Ω

× R), f ∈ C1(I) e que a, b n˜ao se anulam simultaneamente em nenhum ponto (x, y)

∈ Ω. Considere o problema de Cauchy quasilinear



a(x, y, u)ux+ b(x, y, u)uy= c(x, y, u) se (x, y)∈ Ω,

u(α(s), β(s)) = f (s) se s∈ I, (2.17)

onde γ(s) = (α(s), β(s)) ´e a parametriza¸c˜ao de uma curva Γ ⊂ Ω de classe C1. Defina a curva

e

Γ(s) = (α(s), β(s), f (s)). Valem as seguintes possibilidades:

(i) Se Γ ´e transversal `as proje¸c˜oes caracter´ısticas do problema de Cauchy, ent˜ao (2.17) tem uma ´

unica solu¸c˜ao de classe C1na vizinhan¸ca de Γ; a superf´ıcie solu¸c˜ao ´e gerada por eΓ e pelas curvas caracter´ısticas que interceptam eΓ transversalmente.

(ii) Se Γ ´e uma proje¸c˜ao caracter´ıstica e eΓ ´e uma curva caracter´ıstica da equa¸c˜ao quasilinear, ent˜ao (2.17) tem infinitas solu¸c˜oes.

(iii) Se Γ ´e uma proje¸c˜ao caracter´ıstica e eΓ n˜ao ´e uma curva caracter´ıstica da equa¸c˜ao quasilinear, ent˜ao (2.17) n˜ao tem solu¸c˜ao.

Prova. A parte (i) ´e essencialmente o Teorema 2.7. Para provar a parte (ii), considere uma curva plana qualquer ∆ que intercepta a curva Γ em um ponto γ(s0) = (α(s0), β(s0)) e que ´e transversal `as proje¸c˜oes

caracter´ısticas. Seja δ(s) = (ϕ(s), ψ(s)) uma parametriza¸c˜ao de ∆ com δ(s0) = γ(s0), e seja g uma fun¸c˜ao de

classe C1 tal que g(0) = f (s

0). Como ∆ ´e transversal `as proje¸c˜oes caracter´ısticas, pela parte (i) o problema

de Cauchy 

a(x, y, u)ux+ b(x, y, u)uy= c(x, y, u) se (x, y)∈ Ω,

u(ϕ(s), ψ(s)) = g(s) se s∈ I,

tem uma ´unica solu¸c˜ao u na vizinhan¸ca de ∆. Al´em disso, a superf´ıcie solu¸c˜ao cont´em a curva e∆(t) = (δ(t), g(t)) e todas as curvas caracter´ısticas que interceptam e∆. Em particular, a superf´ıcie solu¸c˜ao cont´em e

Γ, e portanto a solu¸c˜ao u tamb´em ´e solu¸c˜ao do problema de Cauchy com condi¸c˜ao inicial f em Γ. Como existe uma infinidade de escolhas poss´ıveis para δ(t) e g(t), o problema tem uma infinidade de solu¸c˜oes.

A demonstra¸c˜ao de (iii) segue por contradi¸c˜ao. Suponha por absurdo que o problema de Cauchy tenha solu¸c˜ao neste caso. Derivando a condi¸c˜ao inicial, obtemos

α′(s)u

x(α(s), β(s), f (s)) + β′(s)uy(α(s), β(s), f (s)) = f′(s).

Por outro lado, a equa¸c˜ao quasilinear no ponto (α(s), β(s), f (s)) fica

Comparando as equa¸c˜oes e usando o fato que os vetores emR2

(α′(s), β(s)) e (a(α(s), β(s), f (s)), b(α(s), β(s), f (s)))

s˜ao iguais, pois Γ ´e uma proje¸c˜ao caracter´ıstica, conclu´ımos que os vetores emR3

(α′(s), β′(s), f′(s)) e (a(α(s), β(s), f (s)), b(α(s), β(s), f (s)), c(α(s), β(s), f (s))) tamb´em s˜ao iguais, contradizendo o fato de que eΓ n˜ao ´e caracter´ıstica. 

Observe que o Teorema 2.10 trata apenas dos casos extremos. Para uma an´alise de alguns casos intermedi´arios (por exemplo, quando a curva inicial ´e tangente a uma proje¸c˜ao caracter´ıstica em apenas um ponto), veja [I´orio].

2.1.4

Exerc´ıcios

Exerc´ıcio 2.2. Nos ´ıtens a seguir, resolva o problema de Cauchy para as equa¸c˜oes quasilineares, esbo¸cando as proje¸c˜oes das caracter´ısticas.

(a)  ut+ uux=−ku2 se x∈ R e t > 0, u(x, 0) = 1 se x∈ R. (b)  ut+ cux= xu se x∈ R e t > 0, u(x, 0) = f (x) se x∈ R. (c)  ut− xtux= x se x∈ R e t > 0, u(x, 0) = f (x) se x∈ R. (d)  ut+ ux= u2 se x∈ R e t > 0, u(x, 0) = f (x) se x∈ R.

Exerc´ıcio 2.3. Considere o problema de valor inicial 

ut+ uux=−ku se x∈ R e t > 0,

u(x, 0) = f (x) se x∈ R,

onde k ´e uma constante positiva. Determine uma condi¸c˜ao em f para que uma solu¸c˜ao exista para todo x∈ R e t > 0, e determine uma solu¸c˜ao em forma impl´ıcita.

Exerc´ıcio 2.4. Enuncie e demonstre o Teorema 2.1 no caso geral n-dimensional. Exerc´ıcio 2.5. Demonstre o Teorema 2.2 no caso geral n-dimensional.

Exerc´ıcio 2.6. ([John], p´ag. 18) Seja u uma solu¸c˜ao de classe C1 da equa¸c˜ao linear

a(x, y)ux+ b(x, y)uy=−u em D,

onde D ´e o disco unit´ario do plano. Suponha que a(x, y)x + b(x, y)y > 0 na fronteira de D. Prove que u ´e a fun¸c˜ao identicamente nula. (Sugest˜ao: Mostre que maxDu 6 0 e minDu > 0, usando as

No documento Equações Diferenciais Parciais I/II (páginas 43-50)

Documentos relacionados