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ESPECTROSCOPIA DE TEMPO DE VIDA DE ANIQUILAÇÃO DE POSITRÕES (PALS)

ENVELHECIMENTO FÍSICO: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3 ESPECTROSCOPIA DE TEMPO DE VIDA DE ANIQUILAÇÃO DE POSITRÕES (PALS)

Da revisão bibliográfica realizada parece evidente que a existência de volume livre é responsável pelo movimento das cadeias poliméricas. Por isso, é vital conhecer o volume dos poros ou cavidades que condicionam a evolução dos processos físicos e mecânicos no interior do epóxido. Este volume livre pode ser determinado através de várias técnicas experimentais, onde se destacam a dilatometria, medições da variação da densidade, espectroscopia de fluorescência e a espectroscopia de tempo de vida por aniquilação de positrões (PALS - Positron Annihilation Lifetime Spectroscopy). É relevante notar que a última técnica é a única que permite a observação direta de espaços vazios na resina de epóxido a nível molecular (Wang, et al., 2003).

Durante as últimas décadas, a espectroscopia de tempo de vida de aniquilação de positrões tornou-se uma ferramenta fundamental no estudo das propriedades nanoscópicas de polímeros, sólidos e líquidos moleculares. Jean (1993) estabeleceu uma correlação direta entre a fração de volume livre e o tamanho da cavidade do espaço vazio, indicando que o tamanho destas cavidades pode ser um fator de controlo da correlação do volume específico com a temperatura.

O conceito de antimatéria tem vindo a ser empregue no estuda da matéria. A partícula de antimatéria mais simples e mais acessível é o positrão (antipartícula do eletrão). Esta partícula, quando interage com um eletrão, pode aniquilar-se, libertando energia. Entre os modos possíveis de aniquilação do par positrão - eletrão destacam-se a aniquilação sem emissão de radiação, com emissão de um raio gama, com emissão de dois raios gama e com emissão de três raios gama (Luís, 2010). A aniquilação pode dar-se, também, no interior do material e a massa do par (m) é totalmente convertida em fotões de alta energia. A energia total destes fotões é determinada pela equação de Einstein:

10

2

mc

E. (2.1)

É comum utilizarem-se positrões para estudar os materiais, uma vez que a física da aniquilação é bem conhecida e permite extrair informações específicas sobre o local onde esta ocorre (Gidley, et al., 2006). O positrão pode aniquilar a partir de três estados: (i) livre, (com eletrões de valência do material alvo); (ii) capturado (com eletrões ligados do material alvo); (iii) átomo de positrónio (Ps) - estado ligado de um positrão com um eletrão. Este último estado só pode formar-se no vácuo ou em espaços vazios de materiais porosos.

Há dois estados fundamentais de Ps: (i) o estado singleto (S = 0) - o positrão e o eletrão

têm momento magnético intrínseco (spin) antiparalelo, sendo denominado para-positrónio (p-

Ps) e (ii) estado tripleto (S =1) - o positrão e o eletrão têm spins paralelos, designado orto- positrónio (o-Ps). A conservação do momento angular obriga que a aniquilação do estado

singleto emita um número par de fotões gama, enquanto o estado tripleto origina a emissão de um número ímpar de fotões. Contudo, estatisticamente, só a aniquilação com emissão de dois

ou três fotões merece relevo. Para o p-Ps o tempo médio de vida no vácuo é de 0,125 ns e para

o o-Ps é na ordem dos 142 ns. No entanto, no interior de um material a probabilidade do orto- positrónio colidir com um eletrão é muito elevada e, inevitavelmente, o positrão aniquila com ele. Este processo é conhecido como pick-off e, dependendo da densidade do material poroso, o tempo de vida do orto-positrónio é tipicamente de 1 a 5 ns (Naia, 2004).

A sensibilidade do tempo de vida do o-Ps à dimensão do espaço livre e da sua distribuição, permitiu o desenvolvimento de uma técnica de avaliação de volumes livres em líquidos e materiais porosos, nomeadamente para polímeros. Na matéria densa, que permita no entanto a sua formação, o tempo de vida do o-Ps é baixo. Nos polímeros o Ps tende a localizar- se nos elementos de volume livre e o seu tempo de vida pode relacionar-se com a concentração, distribuição e tamanho destes elementos de volume livre (figura 2.2) (Budd, et al., 2005).

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Figura 2.2 – Representação esquemática da formação do átomo de positrónio em polímeros (Adaptado de Shaikh, 2010).

Todas as técnicas de espectroscopia de aniquilação de positrões (PAS - Positron Annihilation Spectroscopy) são baseadas na deteção dos raios gama de aniquilação tanto do positrão como do eletrão, no entanto diferem na maneira de detetar estes raios e, principalmente na forma que os utiliza para obter informação. Contrariamente às técnicas PAS, que se focam na energia da aniquilação, a PALS é efetuada no domínio do tempo. Os positrões são implementados no interior do material e mede-se o tempo que decorre entre a implantação

(assinalada por um fotão correlacionado com a emissão da fonte + ou um sinal de controlo do

acelerador de implantação) e a deteção de qualquer raio gama resultante da aniquilação. Um espectro de tempos de vida PALS é um histograma de vida de todos os eventos de aniquilação dos positrões que foram implantados. Este contém sempre, pelo menos, dois componentes: um tempo de vida inferior a 0,5 ns (que corresponde à aniquilação rápida de positrões que não formam Ps) e um outro tempo de vida de 1 a 5 ns (correspondente à aniquilação do orto-positrónio no vácuo). Os espectros de tempos de vida típicos obtidos através da PALS em polímeros revelam três componentes: (i) uma curta, de 125 a 200 ps, associada ao

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dos positrões livres, 𝜏2; e (iii) uma mais longa, de 1 a 5 ns, associada ao orto-positrónio,

𝜏3(Gidley, et al. , 2006). Este último tempo de vida está diretamente relacionado com o

tamanho real da cavidade livre, que pode ser avaliado através da seguinte equação:

, 2 sin 2 1 1 2 1 1 ns R R R R R R Ps o                         (2.2) onde      R R0 R 1,656 .

A equação 2.2 é obtida admitindo que a cavidade é uma esfera de raio R e a função de onda do átomo o-Ps tem uma espessura de penetração nas paredes da cavidade, que é modelada

pela barreira potencial retangular infinita, definida por ∆𝑅 (figura 2.3). É de notar que a

formação do positrónio só ocorre quando o diâmetro da cavidade é superior a 0,22 nm

(Nakanishi, et al., 1987). Conhecendo o raio da cavidade, e admitindo-a esférica, é possível determinar o volume do espaço livre (Algers & Maurer, 2003):

3 4 ) ( 3 3 R V    . (2.3)

Figura 2.3 - Representação esquemática da expansão da cavidade (esférica) de volume livre. Ilustração dos parâmetros necessários à equação 2.2.

0,22nm

Volume do polímero Nuvem eletrónica

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Por outro lado, a intensidade da componente 𝜏3 permite, ainda, avaliar a densidade dos espaços

livres e, por conseguinte, estimar a fração do volume livre:

3 3)

( I CV

fV   , (2.4)

onde C é uma constante de proporcionalidade avaliada em 1,5, se o volume for avaliado em

nm3 e a intensidade em percentagem. Estes modelos foram comprovados a partir de medições

de pressão-volume-temperatura e de difusão de gás em vários polímeros (Scmidt & Maurer, 2000).

As técnicas PAS, e em particular a PALS, oferecem muitas características atraentes quando utilizadas como uma ferramenta para a caracterização dos poros. Assim, a técnica é considerada ideal para medir o comprimento de interligação dos poros em materiais microeletrónicos, procurar heterogeneidades ou danos na estrutura de poros, avaliar a dependência com a profundidade e explorar a porosidade escondida sob camadas densas ou barreiras de difusão (Gidley, et al., 2006). É ainda útil para estudar as propriedades mecânicas e o volume livre em materiais cerâmicos. Por exemplo, o aquecimento do cimento ósseo Palacos

®R causa uma redução apreciável no volume livre e o tempo de vida do o-Ps diminui de 2,04

para 1,91 ns. Esta mudança no volume livre, devida à eliminação de um monómero residual durante o aquecimento da amostra, comprovou-se que ocorria perto dos 60 °C usando as medidas PALS (Algers & Maurer, 2003).

A aplicação da PALS em polímeros também permitiu resultados muito interessantes. A medição dos tempos de vida de aniquilação em vários polímeros permitiu estabelecer um modelo simples para relacionar a variação característica do tempo de vida do o-Ps em função da temperatura. Para temperaturas baixas, o tempo de vida do o-Ps aumenta lentamente com a temperatura; e acima da temperatura de transição vítrea (Tg,) o aumento do tempo de vida é mais rápido. Todavia para temperaturas ainda mais elevadas, Tk (knee temperatures), podem ocorrer mudanças, e o tempo de vida do o-Ps volta a estabilizar. Esta temperatura, Tk, pode ser definida como a temperatura à qual o tempo de relaxação segmentar se torna da mesma ordem de grandeza do tempo de vida do o-Ps, de modo que a mudança do comportamento do tempo de vida não se deve a uma transição molecular, ou a uma súbita alteração das propriedades intrínsecas do polímero, mas sim, a uma perturbação local na estrutura, provocada pelo próprio átomo Ps. Como já se referiu, o átomo localiza-se dentro da cavidade, mas a perturbação estabelecida provoca a expansão desse volume livre até que um estado de equilíbrio seja

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estabelecido. Para temperaturas entre Tg e Tk, uma cavidade ocupada pelo positrónio não tem a capacidade de expandir para um estado de equilíbrio, uma vez que os tempos de relaxação das moléculas do polímero são muito mais longos que o tempo de vida do o-Ps (Winberg, et al., 2012).

Apesar da definição do conceito de volume livre ser ainda alvo de debate, a verdade é que é fundamental para explicar os aspetos de mobilidade da cadeia polimérica e da permeabilidade nos polímeros. Efetivamente, os materiais poliméricos no estado vítreo dispõem de uma elevada quantidade de volume livre interligados e, apresentam várias semelhanças com materiais microporosos. Por isso, aplicou-se PALS para o estudo de polímeros de microporosidade intrínseca (PIMs) através da análise do volume livre e da sua distribuição no material. Estes estudos mostraram a capacidade de adaptar a estrutura molecular de um polímero, de modo a manipular a quantidade e a distribuição de volume livre. Os materiais assim moldados permitem combinar as características de um polímero convencional e de um sólido microporoso (Budd, et al., 2005).

A técnica de espectroscopia de tempo de vida de aniquilação de positrões é extremamente sensível a transições de fase bem como à presença de defeitos e outras não homogeneidades. Essa especificidade permitiu estudar o efeito dos grupos laterais no comportamento de resinas epóxidas curadas, ou estudar o envelhecimento físico e a deformação elástica em materiais vítreos (Liu, et al., 2003).

A PALS permite revelar o volume livre à escala atómica e molecular, motivo pelo qual foi empregue num trabalho anterior (Luís, 2010) para compreender o mecanismo associado com o processo de absorção de humidade, na mesma resina de epóxido que foi usada na presente dissertação. Nesse trabalho, caracterizou-se a fração de volume livre com a exposição do material a teores de humidade controlada e a temperatura constante (Luís, 2010). Observou-

se que a componente 𝜏3 (tempo de vida do o-Ps) pode ser associada ao tamanho das cavidades

no epóxido e que a intensidade 𝐼3 corresponde à concentração desses nano poros. Desta forma

o produto 𝐼3⋅ 𝜏3 destas duas componentes é um excelente parâmetro para caracterizar a variação

da fração de volume livre nos epóxidos (Luis, et al., 2012).

A revisão bibliográfica da aplicação de PALS ao estudo do envelhecimento físico

mostrou que a componente de vida 𝜏3 pode aumentar no período inicial, mas depois diminui,

enquanto que 𝐼3 diminui ao longo de todo o processo. Por exemplo, o estudo do envelhecimento

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fraca com o envelhecimento. Este mesmo comportamento foi demostrado para o poliestireno, policarbonato e um epóxido (Kobayashi, et al., 1989).

Através da análise de quatro resinas epóxidas novolac, envelhecidas 30 C abaixo da

temperatura de transição vítrea, a espectroscopia de tempo de vida de aniquilação de positrões

permitiu concluir que a aniquilação da componente com tempo de vida mais longo, 𝜏3, é menos

evidente na resina epóxida EP do que nas restantes (EPA,EPB,EPP), durante o envelhecimento físico (Liu, et al., 2003).

O efeito do envelhecimento físico e do agente de cura no volume livre foi estudado por outros grupos, para uma série de resinas epóxidas curadas separadamente com uma resina novolac e resinas novolac esterificadas (EP, EPB,EPA,EPP). Descobriu-se que a intensidade do orto-positrónio diminui com o aumento do tempo de envelhecimento. Isto significa que a diminuição do volume livre resulta da recuperação estrutural de ordem local devido ao rearranjo

segmentar da cadeia polimérica(Wang, et al., 2003).

Para compreender a microestrutura e o papel do volume livre nas propriedades mecânicas de compostos baseados em resinas de epóxido, Altaweel, et al. (2009) também recorreu à espectroscopia de tempo de vida de aniquilação de positrões. Esses trabalhos mostraram que as propriedades mecânicas (a resistência à tração e o módulo de elasticidade) apresentam uma elevada dependência com o volume livre. Também foi possível concluir que, em qualquer processo que haja uma redução do volume livre, é verificável um aumento da resistência à tração e uma alteração semelhante no módulo de elasticidade (Altaweel, et al., 2009)

Em copolímeros de estireno envelhecidos contendo um hidrogénio de ligação como comonómero, verificou-se através da PALS, que quer o tempo de vida quer a intensidade do o- Ps diminuem com o tempo de envelhecimento. Esta redução no tamanho do volume livre pode indicar a presença de ligações de hidrogénio nestes copolímeros, que atuam efetivamente como ligações cruzadas. Curiosamente, para um copolímero foi evidenciado um tempo de vida maior, explicado pela fraca interação molecular das ligações de hidrogénio. A evidência experimental sugere que os efeitos de volume livre são menos importantes que os efeitos como a rigidez intrínseca da cadeia, a extensão e o tipo de ligações de hidrogénio, bem como a aleatoriedade da distribuição dos comonómeros nas cadeias poliméricas (McGonigle, et al., 2005).

De toda a bibliografia estudada foi possível verificar que entre todas as técnicas usadas para o estudo do envelhecimento físico de polímeros, a espectroscopia de tempo de vida de

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aniquilação de positrões é a mais requisitada, devido à sua capacidade para sondar diretamente o tamanho do volume livre e permitir quantificar a sua distribuição.

2.4

CARACTERIZAÇÃO

DO

ENVELHECIMENTO

FÍSICO:

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