4.2 Técnicas de Caracterização
4.2.3 Espectroscopia Mössbauer
A Espectroscopia Mössbauer tem sido intensivamente empregada no estudo de ferritas e em outros tipos de materiais. Isto se deve a varias razões que a elege como uma importante técnica de caracterização [72].
O comportamento magnético macroscópico de um material com magnetização permanente é o resultado de uma complexa interação entre a estrutura cristalina e sua es- trutura magnética local, a qual pode ser investigada pela Espectroscopia Mössbauer. Dados importantes podem ser obtidos a partir da determinação dos parâmetros hiperfinos como o campo magnético (Bhf), o desdobramento quadripolar (DQ) e o deslocamento isomérico (δ).
A técnica envolve emissão e absorção ressonante de raios gama pelos núcleos de diversos elementos da tabela periódica, sendo, portanto uma espectroscopia nuclear, o mesmo princípio usado na Ressonância Magnética Nuclear. A Espectroscopia Mössbauer é uma poderosa ferramenta para o estudo estrutural, químico e magnético do material.
Essencialmente, o processo ressonante consiste na emissão de radiação γ por um núcleo excitado e na absorção dessa radiação por outro núcleo idêntico, sem perda de energia pelo recuo dos núcleos (figura 4.15). Se o emissor ou o absorvedor estiverem incorporados em
Figura 4.15: Emissão de energia γ por um núcleo no estado excitado, seguido pela absorção por um núcleo idêntico, originalmente no estado fundamental.
uma mesma matriz deve-se compensar eventuais diferenças de energias ou desdobramentos das linhas, devido às interações quadripolares ou magnéticas dos núcleos, colocando então o emissor em movimento oscilatório longitudinal para que a radiação γ seja emitida com um intervalo de energia modulado através do efeito Doppler.
A partir de um espectro Mössbauer pode-se obter os seguintes parâmetros: • Fator-f e o Deslocamento Doppler: parâmetros relacionados com a dinâmica de vi- bração do reticulado cristalino;
• Deslocamento Isomérico (δ): parâmetro relacionado com o estado de oxidação ou valência de ferro que compõe a amostra;
• Desdobramento Quadripolar (DQ): parâmetro relacionado com o potencial eletros- tático local dos átomos;
• Campo Hiperfino (Bhf): parâmetro relacionado com os momentos magnéticos dos
átomos envolvidos na ressonância.
Figura 4.16: Esquema de um arranjo experimental típico.
O esquema de funcionamento do espectrômetro Mössbauer é bastante simples. Consideremos que a amostra seja um material sólido e que os átomos que compõem a rede do cristal esteja em vibração (fônons), uma fonte radioativa é fixada na ponta de um eixo ligado a um transdutor que executa um movimento oscilatório longitudinal (figura 4.16). O fóton γ que é emitido pela fonte sofre uma modulação de energia por efeito doppler dado
por: E(v) = E0 1 ± v c
, v ≪ c (em primeira ordem) (4.14)
onde v é a velocidade instantânea da fonte e c é a velocidade da luz. Quando esse fóton atinge a amostra contendo o elemento com núcleo idêntico ao emissor, ela pode ser absorvida ou não, dependendo das condições da ressonância. Quando o fóton não é absorvido, o fóton atravessa a amostra e atinge o detector. Quando ela é absorvida, o fóton é reemitido não necessariamente na direção do detector. Assim quando há ressonância, a taxa de contagem de fótons lida pelo detector é sensivelmente menor do que o observado quando a amostra não absorve os fótons. Essa geometria do espectrômetro é conhecida como geometria de transmissão e é o mais utilizado na obtenção dos espectros.
Para a fonte emissora pode-se usar uma amostra contendo núcleos com grande probabilidade de decair, mesmo que seja por algum outro processo diferente do decaimento γ, em que o estado excitado emitirá um fóton γ ao decair de estado. Como exemplo, vemos na figura 4.17 um diagrama de decaimento nuclear que resulta em57F e.
Figura 4.17: Esquema do decaimento do57
Coem57
F eindicando a meia vida e a diferença de energia para cada estado.
A amostra absorvedora deve ter, além do núcleo em questão no estado funda- mental, pequena espessura para que a quantidade de radiação transmitida seja significativa. Essa espessura deve ser escolhida considerando-se a seção de choque (σ), a fração de emissões livres de recuo e a concentração do núcleo emissor e absorvedor na amostra.
Se tomarmos o espectro Mössbauer de F e com fonte emissora57F e, podemos ter
espectros com única linha de ressonância (singleto), duas linhas (dubleto), seis linhas (sexteto magnético, com ou sem uma pequena interação quadripolar), ou, muito mais raramente, oito linhas (caso de interações magnética e quadripolar de intensidades comparáveis).
única (figura 4.18).
Figura 4.18: Espectro de linha única.
Suponhamos que o desdobramento quadripolar seja diferente de zero para uma amostra não magnética (Bhf = 0). No caso de uma fonte emissora57F e, o nível fundamental
(spin I = 1
2) não é afetado, enquanto o primeiro nível excitado (spin I = 3
2) se desdobra em
dois níveis, mostrando um espectro com desdobramento quadripolar (figura 4.19).
Figura 4.19: Espectro hiperfino quadripolar.
Uma amostra com presença do campo magnético Bhf > 0 e com desdobramento
quadripolar nulo, os níveis de57F e da fonte emissora se desdobram, como mostra o espectro
da figura 4.20a para uma amostra de F e puro. Cada subnível é associado a um valor de número quântico magnético M. As seis transições permitidas pela regra de seleção quântica são indicadas na figura 4.20b.
A figura 4.21 mostra alguns espectros Mössbauer com fonte emissora 57F e para
Figura 4.20: a) Espectro hiperfino magnético de F e puro. b) Desdobramento de níveis devido ao efeito Zeeman nuclear para o estado fundamental e o primeiro estado excitado do57F e.
Figura 4.21: Espectro hiperfino magnético: a) α − F e2O3 em temperatura ambiente [74]. b) F e3O4 em
temperatura ambiente [74].
O espectrômetro utilizado para as medidas Mössbauer encontra-se na UERN de Mossoró sob a responsabilidade do Prof. Dr. Marco Antonio Morales da UFERSA de Mossoró-RN.
Resultado e Discussão
“Se, a princípio, a ideia não é absurda, então não há esperança para ela.”
Albert Einstein
5.1
Caracterização por Difração de Raio-X
Com o objetivo de se obter a ferrita de cálcio (Ca2F e2O5), submetemos os ma-
teriais precursores (CaCO3 + F e2O3) a diferentes tempos de moagem, com subsequente
tratamento térmico. E analisados via difratometria de raios X.
As figuras 5.1a e 5.1b mostram os difratogramas de raios X para as amostras submetidas a moagem em função do tempo (10h, 30h, 60h e 80h) e seguidamente calcinadas a temperatura de 900◦C por 2h.
Os difratogramas da figura 5.1a revelam que a moagem por si só não é suficiente para formar o composto Ca2F e2O5, tendo em vista que a presença dos precursores continua
evidente nos difratogramas. Na figura 5.1b observa-se as amostras submetidas a tratamento térmico. Há formação da ferrita de cálcio para todas as amostras calcinadas. É impor- tante observar que para a amostra cujos materiais precursores foram somente misturados
Figura 5.1: a) Difratogramas de raios X das amostras moídas em 10h, 30h, 60h e 80h. b) Tratadas termicamente a 900◦C por 2h.
as amostras foram tratadas termicamente a temperaturas de 900oC e submetidas ao mesmo
processo de moagem (10h), variando somente a tempo de calcinação (2h, 3h e 5h). A ferrita (Ca2F e2O5) é formada em todos os casos sem nenhuma presença de impureza, não havendo
nenhuma variação significativa do tamanho final do grão. O mesmo resultado não é alcançado quando mantemos o tempo de calcinação constante, variando somente a temperatura de calcinação, figura 5.2b. Não há formação da ferrita para a amostra tratada a 500oC e sim
a presença dos materiais precursores (CaCO3 + F e2O3). Para temperaturas superiores
a 500oC obtemos a formação da ferrita de cálcio sem contaminação, na qual, a medida
que aumentamos o valor da temperatura de calcinação o tamanho final do grão aumentava significativamente, ou seja, para uma calcinação de 700oC temos o tamanho de 35,4nm e a
1100oC temos o grão no tamanha de 42,1nm, um aumento de de 16% no tamanho do grão.
Temos na figura 5.3a os difratogramas das amostras moídas por 10h em atmosfera de álcool metílico em proporções diferentes (0, 5ml; 1, 0ml; 2, 0ml). Na figura 5.3b observa-se os difratogramas das amostras referidas tratadas a 900◦C.
Os difratogramas da figura 5.3a mostram que não houve formação da ferrita de cálcio. Na figura 5.3b a ferrita de cálcio é obtida sem nenhuma impureza para qualquer quantidade de álcool metílico usado, sendo que, o grão final tem seu tamanho reduzido significativamente a medida que aumentamos a quantidade de álcool durante o processo de moagem.