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Espiritismo e Espiritualismo

No documento Portal Luz Espírita (páginas 37-39)

V. — Em primeiro lugar, pergunto qual a necessidade da criação de novos

termos: espírita e espiritismo, para substituir: espiritualista e espiritualismo, que são da língua comum e já compreendidos por todos nós? Já ouvi alguém classificar tais

termos de barbarismos15.

A. K. — Desde muito a palavra espiritualista já tem uma acepção bem

determinada; acepção essa que nos é dada pela Academia: Espiritualista, aquele ou aquela pessoa cuja doutrina é oposta ao materialismo.

Todas as religiões são necessariamente fundadas sobre o espiritualismo. Aquele que crê que em nós existe outra coisa, além da matéria, é espiritualista, o que não implica a crença nos Espíritos e nas suas manifestações. Como poderá distinguir este daquele que tem esta crença? Somos obrigados a nos servir de uma

perífrase16 e dizer: É um espiritualista que crê ou não crê nos Espíritos.

Para as novas coisas são necessários termos novos, quando se quer evitar equívocos. Se eu tivesse dado à minha "Revista Espírita" a qualificação de espiritualista, não lhe teria especificado o objeto, porque, sem desmentir-lhe o título, bem poderia nada dizer nela sobre os Espíritos, e até combatê-los.

Já há algum tempo, li num jornal, um artigo sobre uma obra filosófica em que se dizia tê-la o autor escrito do ponto de vista espiritualista; ora, os partidários dos Espíritos ficariam singularmente desapontados se, confiantes nessa indicação, acreditassem encontrar alguma concordância entre o que ela ensina e as ideias por eles admitidas.

Se adotei os termos espírita, espiritismo, é porque eles exprimem, sem equívoco, as ideias relativas aos Espíritos. Todo espírita é necessariamente espiritualista, mas nem todos os espiritualistas são espíritas.

Ainda que os Espíritos fossem uma quimera17, havia utilidade em adotar

termos especiais para designar o que a eles se refere; porque as falsas ideias — como as verdadeiras — devem ser expressas por termos próprios.

Além disso, essas palavras não são mais bárbaras que as outras que as ciências, as artes e a indústria diariamente estão criando; com certeza, elas não o são mais do que aquela que Gall imaginou para a sua nomenclatura das faculdades, como: Secretividade, alimentividade, afecionividade, etc.

Há pessoas que, por motivo de contradição, criticam tudo que não provém delas, tomando ares de oposicionistas; aqueles que assim provocam tão pequeninas manobras, só revelam o acanhamento de suas ideias. Agarrar-se a tais bagatelas é demonstrar falta de boas razões.

As palavras espiritualismo e espiritualista são inglesas, e têm sido

15 Barbarismo: uso de formas vocabulares contrárias à norma culta da língua, seja do ponto de vista ortoépico (por exemplo, "peneu" no lugar de "pneu"; "rubrica" no de "rubrica"), ortográfico (por exemplo, "excessão" por "exceção"), gramatical (por exemplo, a construção "quando eu ver" por "quando eu vir"; ela está "meia triste" por "meio triste"; "menas palavras" por "menos palavras"), ou semântico (exemplo, o uso da locução "ir de encontro a" ['chocar-se com'] no lugar de "ir ao encontro de" ['estar conforme'] — conforme Dicionário Houaiss — N. E.

16 Perífrase: frase ou recurso verbal excessivo, que exprime aquilo que poderia ser expresso por menor número de palavras — N. E. 17 Quimera: fantasia, ilusão, utopia — N. D.

empregadas nos Estados Unidos desde que começaram a surgir as manifestações dos Espíritos; no começo e por algum tempo, também delas se serviram na França; logo, porém, que apareceram os termos espírita, espiritismo, compreendeu-se a sua utilidade, e foram imediatamente aceitos pelo público.

Hoje, seu uso está tão generalizado que os próprios adversários, aqueles que no princípio os classificavam de barbarismos, não empregam outros. Os sermões e as pastorais que fulminam o Espiritismo e os espíritas viriam produzir enorme confusão, se fossem dirigidos ao espiritualismo e aos espiritualistas.

Bárbaros ou não, esses termos estão hoje incluídos na língua usual e em todas as línguas da Europa; são os únicos empregados em todas as publicações, favoráveis ou contrárias, feitas em todos os países. Eles ocupam o ponto de convergência da coluna da nomenclatura da nova ciência; para exprimir os fenômenos especiais dessa ciência, tínhamos necessidade de termos especiais; o Espiritismo hoje possui a sua nomenclatura, tal como a Química.

As palavras espiritualismo e espiritualista, aplicadas às manifestações dos Espíritos, não são hoje mais empregadas senão pelos adeptos da escola americana.

Dissidências

V. — Essa diversidade na crença do a que chamais uma ciência parece-me

que é a sua condenação. Se ela se baseasse em fatos concretos, não deveria ser a mesma na América e na Europa?

A. K. — A isso responderei, primeiramente, que tal divergência só existe na

forma, sem afetar a essência; realmente, ela apenas se limita ao modo de encarar alguns pontos da doutrina, e não constitui um antagonismo radical nos princípios, como afirmam os nossos adversários, sem ter estudado a questão.

Diga-me, porém, qual a ciência que, em seu começo, não teve dissidências, até que seus princípios ficassem claramente estabelecidos? Não encontramos as mesmas dissidências nas ciências melhormente constituídas? Estarão os sábios de perfeito acordo sobre todos os pontos? Cada qual não tem seus sistemas particulares? As sessões das Academias apresentam sempre o quadro de perfeito e cordial entendimento? Em Medicina não há a Escola de Paris e a Escola de Montpellier? Cada descoberta, em qualquer ciência, não tem produzido cismas entre os que querem adiantar-se e os que desejam estacionar?

Referindo-nos ao Espiritismo, não será natural que, ao surgirem os primeiros fenômenos — quando eram ignoradas as leis que os regem —, cada pessoa tivesse uma teria e houvesse encarado os fatos de um modo particular? Onde estão hoje essas teorias primitivas? Caíram todos ante uma observação mais completa.

Bastaram apenas alguns anos para que ficasse estabelecida a unidade grandiosa que hoje prevalece na Doutrina, e que prende a imensa maioria dos adeptos, com exceção de algumas individualidades que, nesta como em todas as coisas, se apegam às ideias primitivas e morrem com elas. Qual a ciência, qual a doutrina filosófica ou religiosa que oferece um exemplo igual?

O Espiritismo apresentou a centésima parte das cisões que, durante tantos séculos, dilaceraram a Igreja e que ainda hoje a dividem?

Espiritismo; isso não indica uma falta de argumentos sérios? Se eles tivessem tais argumentos, não deixariam de fazê-los valer.

Qual o recurso de se utilizam? Zombarias, negações, calúnias, porém, nunca de um só argumento peremptório; e a prova de ainda lhe não terem achado um ponto vulnerável, é que nada pôde deter-lhe a marcha crescente e que, apenas com dez anos de vida, ele já conta tal número de adeptos como ainda nenhuma seita contou depois de um século de existência. É fato verificado e reconhecido por seus próprios adversários.

Para aniquilá-lo, não era bastante dizer: isto não é real, isto é um absurdo; seria necessário demonstrar categoricamente que os fenômenos não se produzem, não podem produzir-se; e é o que ninguém ainda fez.

No documento Portal Luz Espírita (páginas 37-39)