Capítulo IV: Análise da Experiência Leonardo Da Vinci 48
1. Estágio Leonardo Da Vinci 49
“No principio é tudo um pouco estranho, um pouco assustador e sentimos um ansiedade intermitente, mas no fim (...) o susto inicial acaba por passar e ficamos a conhecer-‐nos melhor e até ficamos orgulhosos de ter saído da nossa zona de conforto e de termos sido bem sucedidos” [Lilian]
Os estágios Leonardo Da Vinci são de relativa curta duração, não ultrapassando os 4 meses. A maioria dos estagiários refere que embora curto o período, permite atingir os objetivos descritos no plano de estágio e, de uma forma geral, sentir-‐se integrada no ambiente e rotinas de trabalho.
Visto caber ao (ex) aluno escolher sua a empresa ou instituição no estrangeiro, podemos dizer que as atividades desempenhadas estiveram relacionadas com a sua formação académica e com os seus interesses profissionais. Os estágios foram feitos em diferentes contextos: museu, hospital pediátrico, jardim de infância, escola primária, canal de TV, empresa de design gráfico entre outros.
A grande maioria dos testemunhos levantados indica que novos métodos e técnicas de trabalho e importantes competências para o futuro profissional foram adquiridas nesta experiência. Não podemos concluir que para todos isto se deve apenas ao facto de estarem a realizar o estágio no estrangeiro. No entanto, o exemplo do estágio da Carina, numa escola na Alemanha, tendo já trabalhado em escolas em Portugal, pode confirmar importantes diferenças no modo de lecionar. Os alunos (até ao equivalente 6º ano português) não estavam dispostos do mesmo modo, os professores serviam mais de apoio, enquanto os alunos formavam grupos em que pesquisavam as matérias dadas pelo professor na aula anterior. No final de cada semana, os estudantes apresentavam aquilo que tinham aprendido, fazendo assim uma reflexão sobre o que tinham assimilado: “O facto de o sistema ser diferente, de não terem o sistema frontal de sala de aula, de terem mais um sistema de grupo de interação, em que eram mais autónomos no ensino e aprendizagem era muito positivo (...) o professor era sempre o último recurso para resolver os problemas” [Carina]. Outro caso de ganho de competências devido a oportunidade de trabalhar num país diferente, foi o de um outro estagiário que esteve num canal
de televisão em Espanha. A nível profissional conheceu novos métodos de trabalho e proporcionou a oportunidade de colaborar num canal de TV por cabo e on-‐line que, segundo ela, funciona em moldes completamente diferentes de qualquer canal em Portugal.
Outro dado relevante é o da integração do estagiário na instituição de acolhimento. Visto estarem num ambiente diferente, com uma língua estrangeira, era de esperar alguma dificuldade na adaptação. No entanto, todos os inquiridos, sem exceção, referiram que se sentiram integrados e valorizados durante o seu estágio. A nosso ver, esta conclusão pode ser explicada em parte pela sua capacidade de realizar as atividades propostas. Esta ideia foi repetida e sublinhada pela maioria dos estagiários e muitos referiram ser um dos pontos mais positivos da experiência: “Os ganhos relacionam-‐se, principalmente, com o facto de ter tido uma experiência concreta de trabalho num museu, que é uma área onde eu gostaria de trabalhar. Por outro lado, ter tido a percepção de ter capacidade de o fazer, caso tenha essa oportunidade” [Mafalda]. A avaliação positiva feita por todas as entidades de acolhimento confirma esse bom desempenho dos estagiários.
Melhorar a capacidade de falar numa língua estrangeira acaba por ser algo inevitável para quem vai trabalhar num país estrangeiro. Todos os inquiridos sem exceção confirmam esta ideia. No entanto, para alguns essa mais-‐valia não se verificou necessariamente na língua autóctone mas sim no inglês, língua escolhida para comunicar no local de trabalho. O relativo curto espaço de tempo do estágio não foi suficiente para aprender os idiomas mais distintos do português como o alemão, holandês ou Checo.
Um sentimento repetido por quase todos os estagiários foi o do aumento da confiança para encarar o futuro, independentemente do país escolhido para continuar a sua vida profissional. Para muitos dos estagiários esta foi até a primeira experiência de trabalho após a formação universitária, o que, só por si, pode levantar inúmeras incertezas e receios. Se aliarmos a isto o facto de estarem num país diferente, a trabalhar numa língua distinta, longe da família e dos amigos, então este estágio representa um verdadeiro desafio. Assim, ter superado esta etapa só por si, independentemente de ter adquirido novas ferramentas ou competências profissionais, representa um ganho inegável: “Consegui ultrapassar alguns dos meus
receios, e adquiri mais autoconfiança para lidar com certas situações e enfrentar novos desafios profissionais” [André]
Nesta experiência de estágios Leonardo da Vinci, o contato com pessoas estrangeiras, num país diferente e com traços culturais menos familiares pode ser vista como tão ou mais enriquecedora que o próprio percurso laboral do estagiário. Os testemunhos recolhidos apresentam-‐nos interessantes perspetivas sobre este tema. As vivências dos estagiários foram bem distintas, até quando ocorreram na mesma cidade. Um excelente indicador para compreender esta dimensão – e que pode fazer toda a diferença no impacto que ela poderá a vir ter – é a possibilidade ou capacidade que os estagiários tiveram de estabelecer relações pessoais neste período. O caso de Dora, estagiária em Pádua na Itália, demonstra bem esse peso. Diz mesmo que foi a nível pessoal que sentiu os principais ganhos. Para além dos laços de amizade criados – ganhou amigos espanhóis e italianos com quem ainda hoje partilha os principais momentos da sua via – reforçou a sua confiança, autonomia e disponibilidade para desafios futuros: “Ganhei a vivência de muitas experiências que me dotaram de maior autonomia, capacidade de adaptação, maior compreensão da realidade e maior grau de tolerância e flexibilidade. Senti ao longo daquele tempo um crescimento pessoal muito grande. Penso que estava totalmente predisposta a isso mesmo, e por isso correu tudo tão bem. Pessoas que foram para a mesma cidade, no mesmo ano que eu e no mesmo âmbito e que receberam a mesma formação de preparação para o intercâmbio não se deram tão bem, e acredito que também não receberam tanto”. É importante aqui também sublinhar a ideia referida por Dora de que o sucesso pessoal da experiência depende também, e em muito, do grau de abertura e vontade do próprio estagiário em procurar esse contacto com os autóctones.
Segundo o testemunho de Joana – estagiária em Berlim -‐ percebemos que existem outros fatores determinantes, como é o caso da capacidade de comunicar na língua do país. Sem esta ferramenta, todo este processo pode encontrar muitos obstáculos e até levar a situações mais complicadas, marcando assim todo o processo de integração: “Não me identifiquei muito com os alemães e não senti que fossem muito receptivos a pessoas de fora (cheguei mesmo a ter uma experiência desagradável em que, numa padaria, me disseram que, se eu estava no país deles, tinha de pronunciar perfeitamente as palavras)”. Podendo este até ser um caso insólito,
(note-‐se que no caso de Carina, que também esteve em Berlim, estabeleceu laços com alemães), fica aqui a interrogação se situações como esta não ajudarão a formar uma barreira exponencialmente maior à volta do alóctone onde, inadvertidamente este vai percepcionar o que a rodeia à luz dessa ideia concebida, impossibilitando deste modo a sua hipótese de interagir de um modo mais profundo com a cultura e pessoas do país onde reside. Dentro deste contexto, parece-‐nos também fulcral destacar uma opinião levantada por Carina, ou seja, a da maior facilidade de estabelecer esses laços com pessoas também estrangeiras e numa situação semelhante ao do estagiário. Pessoas que se encontram numa cidade nova, longe da sua família e amigos, estarão à partida mais predispostas a construir e procurar novos relacionamentos pessoais do que alguém que vive no mesmo país há muito tempo.
De qualquer modo, quando se consegue ultrapassar os eventuais obstáculos que esta experiência nos apresenta, os frutos podem ser verdadeiramente enriquecedores: “É fantástico poder ler os autores que já conheces na língua original, provar os pratos de que já ouviste falar, viajar pelo país de comboio, ouvir os diferentes dialetos, ver cinema italiano até a saturação, aprender os famosos gestos, descobrir que a fruta tem um sabor diferente e que até há tomates amarelos” [Lilian]. Por outro lado, pode desencadear o começo de novos interesses e de maior abertura para o conhecimento de novas realidades: “Eu sempre odiei História e, depois de ter vivido em Berlim (e durante essa época ter visitado a Polónia), fiquei a gostar de História e a querer saber mais”[Joana].