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Estética da Retomada: Luz, Som e Montagem

No documento Matheus Andrade* INTRODUÇÃO (páginas 40-44)

BAILE PERFUMADO E OUTRA REPRESENTAÇÃO DO SERTÃO NORDESTINO

3.3 Estética da Retomada: Luz, Som e Montagem

encontra caminhos para realizar seu filme. Com as películas da fazenda e do gado de um poderoso fazendeiro da região, ele consegue financiamento para seu trabalho. As

imagens de Lampião e seu bando seduzem os jornalistas, mas não as autoridades, acabando com sonho de Benjamim Abrahão. A força das imagens do cinegrafista determinaram o fim, contribuindo tanto para a extinção do cangaço quanto para sua própria morte.

O roteiro elaborado pelos diretores e Hilton Lacerda, fundamentado em fatos reais, mistura tradição e modernidade. É um filme com caráter autoral preciso, afim às temáticas do cangaço e do messianismo, tão utilizadas no país para representar a região Nordeste, porém inverso à abordagem prevalecente nos filmes de cangaceiro realizados até então. Baile Perfumado foge dos enredos centrados na luta entre os bandos e os “macacos” da polícia ou da alienação religiosa do povo do Sertão nordestino. Esses fatos encontram-se presente no filme, todavia, não como centro da narrativa, e sim como fatos pertinentes à época. O objetivo maior da narrativa não é o cangaço em si, mas sim o percurso do mascate libanês em busca de capturar imagens de Lampião e seu bando, gerando uma nova versão a propósito do cangaceiro e seu bando.

O foco narrativo de Baile Perfumado está centrado no ponto de vista do estrangeiro, o protagonista Benjamim Abrahão, que vê no cangaço uma excelente história para o cinema. No filme, Virgulino Ferreira da Silva ganha um tratamento

autêntico e unívoco no gênero cinematográfico, condizente com a vida urbana, oposto ao mito nordestino de “bandido-herói” do espaço rural. Em meio a seus conflitos, Lampião vai ao cinema, ouve música, usa perfume francês, bebe whisky escocês, um cidadão urbano moderno.

A fusão entre fatos reais e ficção, a exposição dos acontecimentos verdadeiros re-elaborados em forma de drama e a aproximação estabelecida entre tradição e

modernidade, incorporando o tradicional a uma linguagem contemporânea, presente na narrativa de Baile Perfumado, faz do filme uma obra com um estilo autêntico,

estabelecendo uma parceria da ficção com o documental, revigorando as tradições regionais, questionando o estado de desenvolvimento do cinema no país. Baile

Perfumado mostra o Sertão e o Nordeste brasileiro sem os problemas causados pela

seca. É em meio ao Sertão verde e à exuberância da natureza nordestina que os inquietos como Abrahão e o cangaceiro Lampião buscam mudar o mundo, e cineastas como Paulo Caldas e Lírio Ferreira fazem uma nova interpretação sobre a natureza arcaica da região.

3.3 Estética da Retomada: Luz, Som e Montagem

No começo dos anos 90, o cinema brasileiro, até pouco tempo praticamente estagnado, inicia uma nova fase, após acordar de um sono que parecia profundo e de uma baixa nas produções cinematográficas, superando lentamente as dificuldades de realizar filmes no país. Aos poucos, os filmes brasileiros ressurgiam no cenário nacional; surge uma safra de novos diretores e profissionais mais experientes, trabalhos bem sucedidos, com reconhecimento geral. À tal fase da cinematografia nacional, iniciada a partir de 1993, convencionou-se chamar de renascimento ou retomada do cinema brasileiro.

Nesse período, a qualidade do cinema produzido no Brasil teve um avanço considerável, firmando trabalhos com nível técnico mais alto do que os de décadas passadas. Os filmes produzidos na década de 90 demonstram a evolutiva determinação dos profissionais da área, refletido no domínio tecnológico apresentado nos filmes, mais precisamente em relação a som e imagem, e na forma pelas quais as temática nacionais são abordadas. Na retomada do cinema brasileiro, a produção conta com uma vasta diversificação de estilos, livre de determinados ideais políticos que intervinham nos enredos, possibilitando aos cineastas mais liberdade de expressão em suas obras para contar histórias retratadas com a presença de diversas influências das vanguardas cinematográficas na estética dos filmes. Nesse momento, o cinema nacional começou a

projetar uma nova imagem, mostrando-se maduro, reconquistando o público brasileiro com sua competência. Surge uma série de filmes que projetam o cinema brasileiro, não apenas no próprio país, como também no mundo.

Segundo Xavier (p.44), a partir 1993, a nova safra de filmes se tornou mais apresentável ao grande público e, em 1995, o cinema adquiriu mais densidade, uma produção com personalidade indefinida, marcada pela grande variedade de estilos. “O dado típico da década de 1990 foi a diversidade, não apenas tomada como fato, mas também como valor”. Uma fase do cinema nacional sortida de filmes dos mais diferentes gêneros, prevalecendo temáticas variadas e formas criativas aplicadas a partir das condições de produção, com livre arbítrio dos cineastas.

Para algumas fontes, Alma Corsária (Carlos Reichenbach, 1994) é o filme que abre as portas da retomada do cinema brasileiro. Ele retrata a busca ao sentido da vida, tratando de forma peculiar e real o tema da periferia. Para Cristiane Nova (1996), o filme

O Qu4trilho (Fábio Barreto, 1995) é o ponto referencial do renascimento cinematográfico

dos anos 90. Depois de anos, o filme levou o cinema brasileiro ao exterior tendo indicação para o Oscar, num contexto que auxilia a produção nacional a se reerguer. O roteiro aborda a relação de dois casais de imigrantes italianos determinados a crescerem social e economicamente no Brasil. A história apresenta adultério entre os casais. Para Nova (p.164), O Qu4trilho deve ser observado “não apenas como um bom momento do cinema brasileiro, mas ainda como um documento do ‘renascimento’ da cinematografia brasileira”. Ainda no início da década de 90, a distribuição do cinema nacional na salas comerciais e nas emissoras de tevê era um grande problema para nossa produção. A viabilização e a repercussão dos trabalhos dos cineastas encontrava barreiras, pois o mercado nacional estava dominado pela assídua produção do cinema estrangeiro.

O filme Baile Perfumado foi produzido com liberdade, apostando nas possibilidades estéticas, característica da retomada do cinema brasileiro, trabalhando com o referencial histórico em seu enredo e uma linguagem contemporânea em suas imagens. Segundo Xavier, no cinema brasileiro dos anos 70 e 80, os cineastas começaram a focalizar o passado do povo para auxiliar na construção de roteiros e na discussão da problemática política do presente. Para ele (p.97),

esse diálogo com a história se desdobra também no levar à tela material de arquivo, peças de museu, monumentos, num impulso traduzido no aluvião de documentos convencionais ou nos poucos trabalhos experimentais que discutiram a questão de como representar a história, como estabelecer recortes na experiência visual e sonora de modo a despertar a reflexão.

Nessa perspectiva, Baile Perfumado insere-se no contexto de filmes históricos citado por Ismail Xavier, contando com a presença de elementos concretos da história da região caracterizando a encenação de fatos reais. Na época, o filme de Caldas e Ferreira não foi o único a enquadrar-se nesse estilo, podemos encontrar, ainda, alguns filmes de ficção produzidos nos anos 90 que deram ênfase aos acontecimentos históricos do país.

Nesse mesmo período, surgiu, na cidade do Recife, o movimento musical

denominado de manguebit, liderado pelo músico Chico Science e o grupo Nação Zumbi, Fred O4 e Mundo Livre. O ideal estabelecido pelo movimento era de elaborar um

tratamento contemporâneo para as manifestações culturais pernambucanas, unindo a arte popular tradicional à estética artística moderna. O manguebit, com sua música irreverente, contagiou o grande público e a produção artística local. Segundo Figueirôa (p.105), com a nova forma de expressão, “os cineastas também lançaram sua marca de fantasia, intitulando a produção pernambucana de árido movie, uma brincadeira, mas uma tentativa de identificar e unir essa produção em torno de ideais compartilhados”. Ainda segundo Figueirôa, os filmes do árido movie recebiam um tratamento cuidadoso em sua forma, diferenciando-se da produção local.

Baile Perfumado não foi o primeiro trabalho desse movimento pernambucano mas,

pela sua repercussão e reconhecimento, sem dúvida, é o filme mais significativo do árido

movie. Uma estética formulada a partir de elementos tecnologicamente modernos,

distribuídos entre a fotografia, a sonoridade e a montagem do filme, aspectos que fazem com que sua linguagem se torne contemporânea, dando vida nova às tradições nele representadas.

A fotografia de Baile Perfumado, dirigida por Paulo Jacinto dos Reis, confere grandiosidade à narrativa a partir dos movimentos de câmera e enquadramentos

aplicados no filme. Planos aéreos, travellings, panorâmicas, planos seqüência, câmera na mão, uma linguagem que glorifica a história representada. Em alguns planos, a

fotografia segue uma linha baseada no expressionismo alemão, na qual observa-se a predominância das sombras dos personagens bem definidas pela luz, imagens com proporções distorcidas pela utilização de lente grande angular e cenas compostas com espelho e reflexo.

O filme explora com abundância a cor verde nas cenas externas referentes ao cotidiano dos cangaceiros no Sertão, a cor azul nas imagens flashback de Benjamim Abrahão e a luz artificial amarela nas cenas internas. A coloração aplicada no filme valoriza o espaço em representação, subsidiando o fortalecimento das tradições

sertanejas. Em Baile Perfumado, a luz amarelada, montada artificialmente nas locações interiores, ironiza a exacerbação da luz amarelada natural dos espaços áridos, explorada com freqüência por vários filme que abordam a temática do Sertão. Contudo, a

artificialidade da iluminação de algumas cenas transparece claramente.

A câmera comandada por Jacinto Reis, conduzida a partir do ponto de vista de Benjamim Abrahão, a quem se dá o foco narrativo do filme, confere centralidade à trajetória do libanês em busca das imagens de Lampião e seu bando de cangaceiros. Às vezes, os diretores chegam a colocar o espectador na subjetividade das câmeras do libanês, como nas cenas em que Abrahão está fotografando uma família e a imagem aparece ao contrário, como também nas filmagens do bando.

A sonoridade de Baile Perfumado está totalmente agregada à musicalidade do movimento manguebit. Com direção musical de Paulo Rafael, as músicas utilizadas como trilha sonora do filme foram compostas por Chico Science, Lúcio Maia, Siba e Fred O4, contando, ainda, com a participação outros músicos pernambucanos, como Mestre Ambrósio, Lenine, Alceu Valença, Stella Campos, Luis e Manuel Paixão, Márcio Miranda e Ortinho Coelho.

A música do Baile Perfumado assume um papel de relevância no enredo do filme, as letras e a sonoridade participam da trama e da estética proposta com grande

afinidade. Segundo Brito (p.06), a música do manguebit usada como trilha sonora do filme “não tem nada do Olê mulher rendeira da tradição”, utilizada com freqüência nos demais filmes de cangaceiro. A trilha sonora contribui com a idéia de fundir tradição e modernidade traçada desde o roteiro.

No filme, o Capitão Virgulino Ferreira da Silva, no barco com o bando e outros tripulantes, pede para alguém tocar uma música. Após insistir, um músico se oferece para tocar para os cangaceiros. O músico do barco diz para Lampião: “Capitão, tem um tal de um Baile Perfumado que eu não sei tocar direito, não, mas vou fazer uma meia sola aqui para vê se é do seu agrado”. Então ele pega a rabeca, confere a afinação e toca a música para o bando. A sonoridade natural da rabeca, logo se funde com uma trilha sonora no estilo manguebit, transformando a situação sonora do filme para o espectador, ou seja, a música se torna heterodiegética. A música Baile Perfumado, versão rabeca, é a canção executada no barco, que se ouve em cenas posteriores em outros arranjos.

No bando, a mando de Lampião, inicia-se um baile com direito a bebida e música ao vivo. A festa dos cangaceiros é animada pelo grupo pernambucano Mestre Ambrósio, numa estrutura de sonoridade tradicional da região, tocando, mais uma vez, a música

Baile Perfumado, em versão sanfona. Enquanto isso, o libanês registra, com sua câmera

de filmar, os cangaceiros dançando alegremente e embriagando-se. Pouco depois, Abrahão se junta à festividade do bando. A música faz parte do espaço diegético do filme enquadrando-se, também, às pretensões inovadoras dos diretores.

A sonoridade do filme também é exposta através de equipamentos modernos, referentes à época, como na cena em que Benjamim Abrahão está na casa de Zé de Zito, após tomarem aperitivo, conversando com a mulher do dono da casa, ao som da música tocada no gramaphone; ou ao término do baile dos cangaceiros, quando Lampião narra uma de suas histórias ao som de um vinil tocado no gramphone e, ainda, as notícias radiofônicas sobre as imagens de Abrahão.

As últimas imagens do Capitão Virgulino Ferreira apresentadas no filme estão postas em forma de clip ao som da música Sangue de Bairro, de Chico Science. Os diretores misturam imagens aéreas do Raso da Catarina, onde os cangaceiros, por vezes, se abrigavam, aos registros originais de Lampião feitos por Abrahão nos anos trinta e aos monumentais planos do “Governador do Sertão” sobre os rochedos de sua localidade. Nesse instante, a letra de Science favorece a mitificação do cangaceiro proposta pela cena. Ao som da guitarra distorcida, a música cita o nome dos integrantes do bando de Lampião e faz questionamento sobre vida e morte, característica marcante do cotidiano dos cangaceiros.

Na montagem, Baile Perfumado se constitui uma narrativa com estrutura não-linear, em que se dissolve a idéia de cronologia da história. Para Brito (p.06), a montagem do filme “desmonta a convenção fazendo a estória se fechar, não no final, mas no começo, ‘vinte e cinco anos atrás’”.

A não-linearidade da montagem de Baile Perfumado reduz a carga de importância do desfecho tradicional das histórias de Lampião, centradas na morte do cangaceiro. A cena em que os diretores tratam da morte dele, quando um soldado depõe sobre a morte dos onze cangaceiros pegos numa emboscada na cidade, encontra-se dispersa pela localidade empregada no filme, posta bem antes do encerramento. A cena final de Lampião no filme mostra o Capitão Virgulino Ferreira pairando sobre a paisagem do Sertão nordestino, estratificado sobre os rochedos como uma espécie de mito regional. Essa seqüência indica o fim do cangaceiro e cristaliza a imagem do mitológico

“Governador do Sertão”.

A junção dos elementos sonoros com os imagéticos estabelecem um ritmo ágil e dinâmico, composto por cenas rápidas, derivadas do vídeo clip. Uma performance que transforma o arcaísmo do Sertão nordestino em cultura contemporânea, fortificando um outro discurso sobre a região Nordeste, não mais o da problemática causada pela seca.

O ponto crucial da montagem de Baile Perfumado está no uso das imagens reais de Lampião, feitas por Benjamim Abrahão na década de trinta, dentro da ficção que narra o percurso percorrido para a captura das mesmas. O emprego de tais imagens na montagem contribui claramente para o teor de credibilidade histórica do filme, ajudando a legitimar a história narrada como registro do fato em si, ciente de que essas são as únicas imagens de Lampião existentes até os dias de hoje. Segundo Brito (p.06), um grande momento do filme “está na utilização dos documentários da época, e na criação de falsos documentários, todos misturados e confundidos com a mise-en-scène de modo a instantaneamente não permitir distinção”. Numa análise posterior sobre a narrativa, as imagens reais de Lampião e seu bando desvendam o realismo exposto pela ficção, o caráter de versão cinematográfica de ficção é contrastada com o documentário no

momento em que elas aparecem. O que até então parecia verdadeiro transfere-se para o plano de representação fictícia da história do mascate libanês que filmou o Capitão Virgulino Ferreira da Silva e seu bando.

Outro ponto importante sobre a utilização de imagens históricas do cinema pernambucano, na montagem de Baile Perfumado, está na presença de trechos de A

Filha do Advogado (Jota Soares, 1927). O filme representa a obra mais importante do Ciclo do Recife. Segundo Figueirôa (p.18), o filme de Soares “marcou o apogeu do

prestígio da produção pernambucana, tendo sido exibido comercialmente no Rio de Janeiro em 31 cinemas”. A exibição do filme de Soares na cidade do Recife não se deu na década de 30, a colocação dessas imagens em Baile Perfumado são uma menção à produção local, uma homenagem de Paulo Caldas e Lírio Ferreira ao cinema dos pioneiros da década de 20, cuja produção é considerada marco inaugural do cinema pernambucano, conhecido nacionalmente como o “Ciclo do Recife”.

A organização da conexão entre as cenas de Baile Perfumado cria um aspecto de unidade espacial aproximando o espaço rural ao urbano do Nordeste. A montagem diminui a distância ideológica e geográfica entre a zona urbana e a rural no filme, diminuindo assim a dicotomia social entre matuto e citadino.

Diante de suas condições de produção, o filme de Caldas e Ferreira possui uma resolução estética madura, com a utilização de movimentos de câmera, trilha sonora e seqüência de cenas que tornam a narrativa de Baile Perfumado, por vezes, um pouco hermética para espectadores medianos. O filme expõe o potencial criativo dos cineastas que trabalharam com poucos recursos financeiros.

3.4 A Terra Fértil

A representação do Sertão nordestino em Baile Perfumado centra-se num momento de produtividade da região, repleto de água e terras verdes. A cena de

apresentação do ambiente em que a história se passa, constitui um plano aéreo em que a câmera sobrevoa um rio com grande quantidade de água e falésias, mostrando a vegetação verdosa das terras da caatinga, ao som do estilo musical manguebit. O plano exibe as terras do Sertão brasileiro com grandiosidade e excelência.

O filme trás com freqüência, durante a narrativa, imagens do verde da vegetação da caatinga e de águas correndo nos rios e armazenadas em açudes. O cenário de Baile

Perfumado difere dos demais cenários utilizados nos filmes que abordam o Sertão,

realizados anteriormente, onde a aridez e o clima tórrido de suas terras eram elementos primordiais de tais narrativas.

No Diário de Pernambuco, o cinegrafista Benjamim Abrahão fala com orgulho das imagens, por ele capturadas, aos jornalistas. Na entrevista, um jornalista pergunta sobre a caatinga para o libanês que descreve a região da seguinte forma: “Olha, o caatinga é um coisa muito séria. Desanima! A gente vê pra todo lado espinho de mandacaru, facheiro, urtiga e macambira. Ser um excelente inferno!”. Paradoxalmente, Abrahão revela em seu discurso a variedade de plantas existente na região, diferenciada da vegetação sertaneja apresentada em outros discursos, dos galhos secos e da terra rachada, mesmo afirmando que a caatinga ainda é um “inferno”.

A proximidade entre a zona rural e a zona urbana, projetada no filme, expressa o fortalecimento da região Nordeste como um todo, constituindo um Sertão sem aspectos de miséria ou escassez, com recursos e equipamentos modernos, que se agregam à sociedade do campo.

O espaço urbano nordestino da época, representado em Baile Perfumado, apresenta um estado de desenvolvimento citadino atualizado, marcado pela utilização cotidiana de diversos equipamentos novos, constituintes de uma sociedade moderna. No filme, há algumas cenas que expressam o desenvolvimento do Nordeste na década de 30. Benjamim Abrahão está sentado à mesa de jantar com algumas pessoas, lendo, com orgulho, a matéria publicada com o depoimento de Lampião sobre suas filmagens

quando, de repente, falta energia. O libanês acende um palito de fósforo e diz com ironia: “Você esqueceu de pagar a tarifa da eletricidade!”.

Ainda nos primeiros contatos para realizar suas filmagens, Benjamim Abrahão encontra-se com Zé de Zito na estação ferroviária. Para tratar de negócios, Zé de Zito leva o libanês, de automóvel, para sua casa. No caminho, Zé de Zito pergunta a Abrahão se poderia andar mais rápido no carro, em seguida acelerando o automóvel e afirmando: “velocidade! Isso é bom feito a peste!”. A frase se torna cômica quando ele afirma que já chegou a quase 60 Km, dirigindo nas ruas do Recife. O automóvel, nessa e em outras cenas, é um elemento que afirma o desenvolvimento regional, e a velocidade remete ao ritmo do processo de modernização.

Quando o libanês chega com a idéia de fazer cinema em Pernambuco, isso já não era mais novidade. Em Baile Perfumado, a cena de apresentação de Lampião e Maria Bonita se passa no cinema, vendo A Filha do Advogado. O filme de Soares foi produzido em Recife e apresenta imagens do centro da cidade na década de 20, com automóveis e pessoas transitando pelas ruas.

No documento Matheus Andrade* INTRODUÇÃO (páginas 40-44)

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