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4. DELINEAMENTO METODOLÓGICO

4.1. Estar mediador em um museu de ciência

Um dos procedimentos utilizados para a produção de dados foi a atuação como mediador voluntário na Escola da Ciência – Física (ECF), momento em que pude conhecer o centro de ciência de maneira intensa, no sentido de estar com todos os sujeitos que fazem com que o espaço aconteça. Ao me dispor a este modo de pesquisar presente com os sujeitos da medição tive a oportunidade de compreender as diversas formas de utilização dos saberes adquiridos nos diferentes processos formativos dos/as mediadores.

Esta proposta teve por intenção um olhar outro com o cotidiano das pessoas que fazem o trabalho de mediação em seu contínuo processo de formação, pois entendemos que

para conhecer certas áreas ou dimensões de uma sociedade é necessário um contato, uma vivência durante um período de tempo razoavelmente longo, pois existem aspectos de uma cultura [...] que não são explicitados, que não aparecem à superfície e que exigem um esforço maior, mais detalhado e aprofundado de observação e empatia (VELHO, 2004, p. 124-125).

Dessa forma, atuei como mediador durante três meses (12 de junho a 06 de setembro de 2017) na ECF em que compartilhei de alguns conhecimentos teóricos a respeito de diferentes temáticas sobre centros e museus de ciência e aprendi sobre como é estar em um ambiente de popularização da ciência atendendo os públicos que visitam o local. Durante esses três meses pude conversar com os mediadores, com os professores e professoras que levavam as turmas em visitas agendadas à ECF, com visitantes, com funcionários que mantém o espaço organizado e preservado e com os responsáveis, de um modo geral, pelo funcionamento do ambiente tal como podemos desfrutar. Todas estas conversas, tensionamentos, aprendizagens, convergências e divergências foram registradas em um diário de campo reflexivo, documento pessoal produzido ao longo da pesquisa (WEBER, 2009), para que eu pudesse me recordar, caso fosse necessário, dos acontecimentos que se caracterizaram como experiências12 de um

12 Entendemos por experiências a conceituação que Jorge Larrosa (2002) nos traz, como sendo aquilo que nos acontece. Nesse sentido consideramos que as experiências são os atravessamentos que marcam nosso dia a dia, que ficam guardadas em nossas memórias a ponto de se tornarem marcas e episódios em nossas narrativas, histórias de nossas vidas. Nem todo acontecimento se constitui como uma experiência, por exemplo: a leitura de um livro, um encontro casual, uma conversa sobre o atual cenário político, um filme, porém cada uma dessas situações para se tornarem experiências irão

mediador.

Outra pretensão que tínhamos ao estabelecer este método na produção dos dados se refere ao modo como as rodas de conversa se dariam, pois acreditamos que ao estarem familiarizados com a presença do pesquisador, podemos potencializar as narrativas, uma vez diminuído o distanciamento afetivo entre pesquisador e sujeitos da pesquisa. Galvão (2005, p.342) conclui em seu trabalho essa necessária aproximação para a utilização das narrativas como ferramentas de investigação, pois para a autora “é necessário desbloquear desconfianças iniciais e estabelecer uma relação franca, indispensável ao fornecimento, por parte dos investigados, de dados o mais aproximado possível à sua realidade”.

Durante o tempo que estive como mediador, foram relatados em formato de diários de campo reflexivo alguns acontecimentos que, de alguma forma, chamaram minha atenção no que diz respeito a indicativos da origem dos saberes articulados pelos mediadores. Estes diários de campo nos permitiram compreender e identificar alguns dos mecanismos utilizados para a mediação e suas respectivas fontes, uma vez que observando os registros e refletindo sobre as ações temos a possibilidade de captar sinais, pistas e vestígios (GINZBURG, 1989) que passam despercebidos na construção das narrativas. Além do que, tal como podemos notar, as pessoas que passam por um centro de ciência eternizam suas presenças com fotografias, e os mediadores também fazem parte destas pessoas que vivenciam as interações diariamente no trabalho de divulgação científica. Desta forma foram feitas fotografias durante o período em que estive como mediador e o resultado está ao longo dos diálogos na pesquisa entrelaçados nestas páginas. Considero importante destacar que todas as fotografias que constam na pesquisa foram por mim produzidas, tendo como um de seus intentos a “função de registro: a fotografia é utilizada para documentar determinada ocorrência” (BORGES; LINHARES, 2008, p. 130). A partir do uso de fotografias, e de seus significados sociais e temporais, “interpretar uma imagem nos remete à aprendizagem que temos das situações fotografadas, considerando que a presença de uma imagem e de sua narrativa adquire significados diferenciados de outras situações em que percebemos ou só a imagem ou só a narrativa” (BORGES; LINHARES, p. 130).

Ao buscarmos as narrativas dos mediadores temos por intenção trazer o olhar que estes têm depender de fatores internos e externos a nós, não é toda leitura que nos marcam, nem todos os encontros, conversas ou filmes que assistimos, mas aqueles que modificam nossa maneira de ler o mundo e de pensar sobre o que nos cerca.

quanto a um episódio ou a uma sequência destes, entretanto essas memórias têm relação direta com o momento em que são produzidas, uma vez que fatores emocionais e ambientais costumam interferir nas recordações e memórias das pessoas.

O fato da pessoa destacar situações, suprimir episódios, reforçar influências, negar etapas, lembrar e esquecer, tem muitos significados e estas aparentes contradições podem ser exploradas com fins pedagógicos (CUNHA, 1997, p. 186).

Tendemos a nos lembrar de momentos gloriosos, cheios de alegria e satisfações pessoais da mesma maneira que é fácil recordar os episódios que ficam marcados como tristezas e decepções, isso porque “a memória é a mais épica de todas as faculdades” (BENJAMIN, 2012, p. 210) e ela nos permite ir e vir em vários sentidos que em determinados momentos fogem ao controle. Com os diários de campo conseguimos amarrar algumas fugas no diálogo entre as narrativas e as ações, foi possível observar e refletir junto às narrativas dos mediadores na busca por compreender quais eram essas passagens narradas e a importância que essas tiveram em sua formação profissional. Como escrito por Ginzburg (1989, p. 177): “Se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas – sinais, indícios – que permitem decifrá- la”, que foi possível com o ser mediador na ECF.