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3.5.4 Estratégias criativas em áreas urbanas de baixa densidade

A maioria da investigação e bibliografia, quer nos contextos académicos quer nas políticas públicas, considera que a criatividade como motor de desenvolvimento é um fenómeno essencialmente das grandes cidades, pois é nestas que se concentram os recursos económicos, humanos e institucionais. No entanto, embora a atenção recaia nas principais cidades, as áreas urbanas mais pequenas também têm um papel a desempenhar na economia criativa. Muitas vezes é esquecido que muitos trabalhadores das indústrias criativas optam por trabalhar e viver em cidades de pequenas dimensões ou mesmo em zonas rurais.

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Luís Serpa (empresário cultural, galerista, presidente da Induscria – Plataforma para as Indústrias Criativas) em entrevista a Luís Santiago Baptista e Paula Melâneo, intitulada “Mercados Criativos. Perspectivas Críticas”. Revista Arq/a: Arquitectura e Arte, nº. 80/81, Lisboa, Maio/Junho 2010, pág.38.

A criatividade pode ser o motor do desenvolvimento económico, social e cultural de pequenos e médios centros urbanos, e não apenas de grandes cidades. A “indústria criativa” e a “classe criativa” podem ser a solução para a sua revitalização, regenerando os seus espaços e contrariando a desertificação e o despovoamento. De facto, o novo valor económico, criado através de criatividade artística, inovação tecnológica e boa gestão empresarial dos produtos e serviços culturais e criativos (que reagem de forma rápida e ágil a novas tendências), cada vez mais é utilizado em prol das cidades de pequenas dimensões e áreas rurais.

Existe uma relação recíproca: a particularidade destes lugares proporciona o cenário físico/natural, histórico-cultural e simbólico necessário ao desenvolvimento das indústrias criativas, e estas, por sua vez, tornam-se importantes para a revitalização destes lugares. Para além disso, as indústrias criativas “fornecem contributos inovadores para outros sectores de actividade das economias locais, como a agricultura, o artesanato, o mobiliário, o têxtil, o

turismo ou a gastronomia, promovendo o seu desenvolvimento e prosperidade”90.

A classe criativa que se desloca para áreas territoriais de baixa densidade privilegia e procura características peculiares que estas dispõem, como por exemplo: locais de trabalho calmos, ambientes singulares que estimulam o pensamento criativo, preservação do meio ambiente, espírito de comunidade, relações de vizinhança e proximidade, e um estilo de vida saudável (física e mentalmente).

Ainda existem diferenças entre a “classe criativa urbana” e a classe criativa dos pequenos centros urbanos. Está “demonstrado que as áreas de baixa densidade atraem jovens famílias talentosas, pessoas em fase de mudança de carreira e reformados activos. Além do mais, os talentos que habitam em áreas rurais tendem a pertencer a uma escala etária mais elevada e a serem casados e com filhos, comparativamente aos talentos urbanos. Contudo, de acordo com um estudo desenvolvido pela Morel Research, também os mais jovens procuram cada vez mais as áreas rurais devido ao baixo custo da habitação, à melhor qualidade de vida e à presença de escolas de qualidade, o que é necessariamente facilitado pela utilização das tecnologias de informação e comunicação”91.

Para que seja possível atrair e fixar a classe criativa nestas cidades é crucial que existam políticas públicas locais e estratégias que apostem no desenvolvimento e apoio das indústrias criativas e na criação de espaços e infra-estruturas que sirvam de locais de encontro, partilha, aprendizagem e experimentação, que promovam a criatividade e a inovação. Neste sentido, um estudo realizado pela INTELI sistematizou um conjunto de ideias para a definição e implementação de estratégias baseadas na criatividade em cidades de pequenas e médias

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Catarina Selada, Inês Vilhena da Cunha, “Criatividade em Áreas de Baixa Densidade: O Caso da Vila de Óbidos”, in António Oliveira das Neves (coord.), Criatividade e Inovação - Cadernos Sociedade e Trabalho. Gabinete de Estratégia e Planeamento - Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, págs.197-211, Lisboa 2010, pág.9.

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dimensões92, com a intenção que possam ser úteis para os decisores políticos e os

stakeholders (intervenientes ou partes interessadas):

Liderança local como motor para o desenvolvimento: Os líderes locais podem ser

promotores ou facilitadores do desenvolvimento de ecossistemas criativos, se forem proactivos, voltados para o futuro, aceitarem a mudança e assumirem riscos.

Agentes de mudança como motores da transformação criativa: Actores específicos, como um grupo de pessoas, uma única pessoa ou uma organização, podem funcionar como agentes de mudança, promovendo a transformação criativa de cidades de pequenas e médias dimensões.

Colaboração e envolvimento da comunidade: Fomentar a colaboração a todos os níveis (autoridades políticas, universidades, institutos tecnológicos, empresas e sociedade civil) e promover o envolvimento da comunidade são factores de sucesso cruciais na implementação de estratégias baseadas na criatividade.

Agentes criativos que promovam uma abordagem interdisciplinar: O papel dos agentes criativos (creative brokers) em cidades de pequenas e médias dimensões é muito importante porque eles podem actuar como conectores entre indústrias, áreas do conhecimento, disciplinas e actores (players), promovendo a interdisciplinaridade.

Construir redes criativas territoriais e parcerias: Os territórios pequenos podem desempenhar um papel decisivo como âncoras para o desenvolvimento das regiões vizinhas, e também como pontes entre o “local” e o “global”, participando em redes territoriais focadas na criatividade.

Planeamento experimental e informal e avaliação de resultados criativos: As estratégias baseadas na criatividade devem ser flexíveis, informais e ter uma natureza experimentalista, apesar da importância dos sistemas de monitorização e avaliação usados para medir os seus resultados e impactos.

Evitar conflitos locais e elitização social: A fim de contribuir para um melhor ambiente criativo local, a implementação de estratégias baseadas na criatividade deve englobar um programa de resolução de conflitos, evitando a elitização social.

Dar visibilidade a pessoas criativas locais – “talentos invisíveis”: É importante mapear pessoas criativas locais para que a real dimensão do talento local não capturado por análises quantitativas oficiais em cidades de pequenas e médias dimensões se tornem visíveis.

Sistemas de educação locais “Creativity-friendly”: As escolas de alta qualidade não são só um factor de atracção de pessoas criativas, são também uma fonte interna de indivíduos criativos para o território. É estrategicamente importante desenvolver um sistema de educação local “creative-friendly” e não apenas importar talentos de fontes externas.

Espaços criativos para convergência e experimentação: A criação de espaços criativos para

convergência e experimentação (como residências artísticas, live-work houses,

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INTELI, Creative-based Strategies in Small and Medium-sized Cities: Guidelines for Local Authorities. INTELI, Lisboa, June 2011, pág.7-8.

incubadoras criativas, espaços de encontro, etc.) é um factor de sucesso, para a atracção de artistas visitantes temporários e novos residentes.

Espaços criativos flexíveis, temporários e “low-cost”: A utilização flexível do espaço é um ingrediente chave nas estratégias baseadas na criatividade numa era onde as práticas de trabalho estão a mudar. Os espaços vazios podem ser usados para actividades criativas efémeras a um baixo custo.

Promover o bem-estar e a qualidade de vida: É essencial que se promovam padrões elevados de qualidade de vida num lugar, para a criação de “comunidades criativas sustentáveis”. As actividades que visam o bem-estar da população, inclusão social e sustentabilidade são alguns exemplos que são relevantes para fomentar a qualidade de vida.