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O conhecimento e a investigação da microestrutura ou rede de gel formada pelo sistema estruturante tem sido alvo de exploração nos últimos anos já que características específicas foram diretamente relacionadas as propriedades reológicas e resistência do gel formado (Li et al, 2009; Dassanayake et al., 2009; Morales-Rueda et al., 2009 ab; Rocha et al., 2013; Martins et al., 2016).

Li e colaboradores (2009) utilizaram microscopia em tempo real para avaliar o processo de formação da rede de gel do ácido 12-hidroxiesteárico (12-HSA) (Figura 1.2 a). As imagens indicam que o processo de formação da rede de gel se dá pela nucleação do ácido 12- HSA, seguido pelo crescimento da fibra e consequente ramificação da mesma. Com base neste mecanismo, eles identificaram que é possível a formação de uma rede de gel forte quando as extremidades e laterais das fibras formadas sofrem um processo de ramificação chamado pelo termo em inglês de “crystallographic mismatch branching (CMB)” (Figura 1.2 b). Pelo controle de processos de supersaturação do estruturante e super-resfriamento da mistura foi possível o controle das características elásticas da formulação.

Figure 1.2. (a) Observação em tempo real da rede de gel fibrilar formada pelo estruturante ácido 12-hidroxiesteárico a 55 °C (A) 3, (B) 4, (C) 5, e (D) 10 min. (b) Esquema do mecanismo de formação da rede de gel tridimensional do ácido 12-hidroxiesteárico (Li et al., 2009)

1.3.1. Microscopia de Luz Polarizada

A microscopia de luz polarizada é uma técnica analítica bastante utilizada para avaliar a microestrutura cristalina de gorduras e cristais lipídicos. Essa técnica explora o alto contraste entre a microestrutura sólida birrefringente da rede cristalina que se apresenta com brilho intenso e a fração líquida não-birrefringente representada pelo fundo escuro da imagem (Campos, 2005). Com o destaque do material cristalino, essa técnica é amplamente utilizada no estudo da rede de gel formada por estruturantes no processo de gelificação de líquidos orgânicos (Toro-Vazquez et al., 2007; Dassanayake et al., 2009; Hughes et al., 2009; Morales-Rueda et al., 2009 ab; Rocha et al., 2013; Martins et al., 2016; Patel, 2017).

A técnica permite a observação da morfologia e tamanho do cristal formado, bem como a averiguação da presença de aglomerados cristalinos, ou uma formação de rede de gel difusa que em geral é associado a uma maior eficiência do aprisionamento de fase oleosa externa (Figura 1.3). Pieve e colaboradores (2010) estudaram organogéis estruturados com 5% de monoglicerídios e óleo de fígado de bacalhau. Os organogéis resfriados sob cisalhamento tiveram sua microestrutura e reologia avaliados. O estudo da microestrutura dos géis formados evidenciou a formação de longas lâminas de cristais apenas para a amostra que não sofreu cisalhamento ao longo do resfriamento. Amostras que sofreram cisalhamento tiveram sua forma

cristalina alterada caracterizado pela presença de pequenos aglomerados cristalinos e uma rede cristalina menos difusa. A microestrutura esteve diretamente relacionada as propriedades reológicas dos organogéis que apresentaram maior viscosidade aparente e módulo elástico consideravelmente maiores apenas para a amostra que não sofreu cisalhamento.

Figure 1.3. Microscopia de luz polarizada de organogéis de monoglicerídios. Cristalização sob diferentes taxas de deformação (a 0 s−1, b 50 s−1, c 100 s−1, d 200 s−1, e 1.000 s−1, f 2.000 s−1) (Pieve et al., 2010).

A técnica vem sendo também utilizada na avaliação de emulsões estruturadas pela utilização de organogéis. Toro-Vazquez e colaboradores (2013) estudaram as propriedades físicas de emulsões de água em oleogel, estruturadas por uma mistura de cera de candelilla e monoglicerídios em óleo de cártamo. As emulsões contendo 20% (m / m) de fase aquosa e 80% de organogel foram preparadas por homogeneização a alta pressão a 65 °C. Microscopia de luz polarizada foi utilizada para acompanhar o processo de cristalização do sistema estruturante.

Pode-se observar na Figura 1.4 a presença de cristais de estruturante dispersos na fase oleosa externa da emulsão. Não foi observado a presença de aglomerados na interface água/óleo da emulsão. A imobilização de gotículas causada por organogelificação da fase oleosa externa foi descrita como a característica mais importante para evitar a desestabilização de gotículas de água.

Figure 1.4. Microscopia de luz polarizada de emulsões água/óleo preparadas a partir de organogéis de cera de candelilla e monoglicerídios. Cristalização sob diferentes concentrações da mistura de cera de candelilla (CW) e monoglicerídios (MG) (A) 3% CW–0% MG, B) 3% CW–0,25% MG, C) 3% CW–0,5% MG, D) 2% CW–0% MG, E) 2% CW–0,25% MG, F) 2% CW–0,5% MG) (Toro-Vazquez et al., 2013).

1.3.2. Reologia dos Organogéis

Dentre as propriedades dos organogéis, o comportamento reológico e as propriedades térmicas são de fundamental importância para sua caracterização e exercem grande efeito sobre a qualidade do produto final.

A reologia é conhecida como ramo que estuda a deformação e escoamento da matéria como resposta a uma força aplicada. Elasticidade, plasticidade e viscosidade são algumas das propriedades estudadas neste ramo. O estudo da reologia de um fluido pode

fornecer informações fundamentais para o entendimento da estrutura interna de um material (Steffe, 1996).

A consistência dos organogéis dá-se pela rede de gel tridimensional formada pela auto-associação das moléculas do agente estruturante que chegam a promover um aumento de viscosidade da ordem de 1010. O estudo da estrutura do gel pela reologia pode revelar os tipos de interação entre as moléculas do solvente e o estruturante, bem como a dependência com relação à morfologia da rede de gel (Terech et al., 2000). O estudo reológico é também uma ferramenta importante para avaliar propriedades como elasticidade, espalhabilidade, e a capacidade de absorção do óleo pela rede de gel (Yang et al., 2008). Desta forma, o estudo reológico torna-se necessário para definir a melhor formulação e obter a textura mais apropriada do produto final.

Morales-Rueda e colaboradores (2009a) estudaram as propriedades reológicas dos organogéis de cera de candelilla, bem como dos organogéis de n-dotriacontano puro (C32), um dos principais componentes desta cera. Neste estudo foi possível correlacionar os parâmetros reológicos dos organogéis com os resultados fornecidos pelo estudo de microscopia com luz polarizada da estrutura formada por estes agentes. N-dotriacontano puro mostrou ter uma maior capacidade estruturante, com a formação de longos cristais aciculares os quais foram responsáveis pela formação de uma rede de gel mais resistente a ruptura (de acordo com os resultados reológicos). É importante ressaltar que os resultados reológicos estiveram diretamente ligados às condições de tempo e temperatura do processo.

Os testes oscilatórios de varredura de temperatura são também utilizados para avaliar e diferenciar a estrutura dos géis através de parâmetros como o início da cristalização (Tco), a temperatura de gelificação (Tg) e a temperatura de fusão (Tm). De acordo com Lupi et al. (2012) e Lupi et al. (2013), o início da cristalização (Tco) é o valor da temperatura em que um aumento rápido do módulo complexo (G*) é observado na rampa de resfriamento. Ele corresponde à temperatura em que as moléculas de estruturante começam a se agregarem e iniciam a transição entre o estado líquido e o estado gelificado (Lupi et al., 2012). A correlação oposta, quando as moléculas começam a se dissociar pelo aumento de temperatura, é definida como a temperatura de fusão do gel (Tm) que é observado na rampa de aquecimento (Martins et al., 2016). Já a temperatura de gelificação (Tg) é definida como a temperatura onde os aglomerados de estruturantes começam a se interligar formando a rede de gel e apresentando

valores superiores de Módulo Elástico (G’), ou seja, a Tg é determinada pelo cruzamento entre módulos elásticos e viscosos (G”) e podem ser determinados pelas curvas de aquecimento e resfriamento (Figura 1.5).

Figura 1.5. Representação gráfica das temperaturas de gelificação (Tg), temperatura de fusão (Tm) e a temperatura de início da cristalização (Tco) obtidas por testes oscilatórios de varredura de temperatura em baixa amplitude.

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