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b) O lugar dos sujeitos da pesquisa: c) Características da população: d) O corpus de análise:

e) Caminhos no processo da coleta de dados: f) Referencial metodológico:

g)Princípios metodológicos: 1) Método Laban:

2) O Método da Análise do Discurso: h) Congruência das teorias e métodos: i) Procedimento de análise:

2.1 Delimitação do problema e base de constituição do corpus:

A dança como forma de conhecimento nos remete para a junção de duas áreas de estudo: Arte e Educação Física. A coexistência entre essas áreas é muito polêmica tanto quanto ao seu valor, quanto a sua contribuição enquanto educação estética e o papel que ela pode desempenhar no currículo escolar. (PELEGRINI, 1988; MIRANDA, 1991, REPOLDI FILHO, 2002). Muitos profissionais a vêem enquanto periférica como sendo apenas uma atividade motora, outros a vêem como um caminho para atingir outros fins além daqueles específicos da dança.

Segundo Hays (1980), a dança passou a ser estudada em instituições de ensino superior através da Educação Física. A inclusão desta disciplina no currículo gerou muitas opiniões favoráveis e desfavoráveis.

Atualmente existem muitos pesquisadores que apóiam a separação da Dança e da Educação Física. Há outros que defendem a possibilidade da mesma ser contemplada por ambas áreas.

Em relação a essas questões existem muitas pesquisas que discutem esta temática tais como: Mariz de Oliveira (1988); Lambert (1978); Ziecler (1977); Claro (1994) e Miranda (1991).

Podemos resumir quase que o consenso destas pesquisas, na fala de Claro (1994), quando ele diz que a Arte e a Educação Física possuem objetivos próprios em relação ao desenvolvimento de dança e ocupam posições comparáveis.

Sendo esta modalidade desenvolvida pela Faculdade de Artes ou pela Educação Física, os estudos da dança têm se dado por via de regra por dois caminhos: Por um lado alguns estudos têm como objetivo avaliar e remeter a “dança” a julgamentos de valor. Estes julgamentos têm como referencial o conceito de estética, isto quer dizer que os valores dos movimentos corporais apresentados nas diversas modalidades de dança obedecem a um contexto histórico.

Já por outro lado, estes também têm-se preocupado em estudar os movimentos, enquanto qualidades e possibilidades sem se preocupar com julgamento de valores, mas

simplesmente uma constatação de movimentos caracterizados como movimentos de dança. Estes estudos têm apresentado boas contribuições para pensar o movimento corporal e em especial a dança em cadeira de rodas.

Ambos estudos são relevantes e complementares, porque como veremos nos capítulos posteriores, o conhecimento adquirido pelo movimento corporal e valores estéticos estão intimamente relacionados no decorrer da história da dança.

O conhecimento estético nos dá a possibilidade de apreciar, julgar, e conseqüentemente de estabelecer critérios. Já a dança enquanto conhecimento prático, conhecimento performático nos permite experimentar situações e projetar nestas situações os nossos sentimentos e nossas perspectivas. Temos aqui a possibilidade de realizar movimentos com o nosso corpo e de apreciar os movimentos dos outros. Então a dança não pode ser aplicada enfatizando ora o estético ora o vivencial, mas a relação que existe entre estes dois. (REPPOLDI FILHO, 2002).

De um modo geral, os estudos de dança, têm sido um instrumento para atingir diversos objetivos como por exemplo: i) aquisição de conhecimento; ii) desenvolvimento de virtudes morais, remetendo-se ao campo da ética; iii) construção de valores sociais e iiii) busca da felicidade e da alta realização social Evidentemente dentre estes objetivos há diferentes possibilidades de articulações entre si.

Embora os estudos de dança em cadeira de rodas vem sendo desenvolvido localizadamente mais pelas Faculdades de Educação Física, esta modalidade poderá melhor ser compreendida se a mesma se constituir do diálogo entre a Educação Física e as Artes.

A dança em cadeira de rodas tem-se difundido mais nesta última década. O aparecimento constante de novos grupos, a iniciativa de órgãos públicos e privados, assim como a emergência da discussão acadêmica, passaram a reconhecê-la no cenário nacional. Esta modalidade vem apontando para a sua legitimação, porém ela ainda não se afirmou no sítio de significância da dança, de um modo mais específico.

Esta legitimação que se faz presente a partir das iniciativas acima citadas, possivelmente é conseqüência de três movimentos, que apresentam as seguintes direções: i) A primeira é pensar que a dança em cadeira de rodas foi iniciada pelo incentivo dado

pelo movimento de inclusão que possibilitou sua implantação mais efetiva. ii) A segunda das direções é considerar que esta atividade tem se desenvolvido num momento em que a sociedade encontra-se mais aberta para as diferenças individuais. iii) A terceira direção é estabelecida pela relação do corpo que dança, que vem desde Isadora Duncam provocando manifestações no sentido de estabelecer rupturas no processo de constituição da dança artística.

Em termos do desenvolvimento, no âmbito geográfico brasileiro, esta modalidade tem-se desenvolvido por diversas regiões do país, com predominância nos grandes centros culturais. Há uma tendência também de aparecimento e desaparecimento de muitos grupos. Este fato se dá talvez pela exaltação de iniciativas individuais de alguns profissionais que não encontrando respaldo social e econômico buscam outras alternativas de atuação profissional. A dificuldade de espaço adequado, assim como transporte dos dançarinos tem sido também um dos fatores determinantes da oscilação de continuidade desta atividade por parte de alguns grupos. Por outro lado, muitos grupos se mantêm desde a sua criação se fazendo presente em muitos eventos sociais, artísticos, culturais e científicos.5

Entender a dança em cadeira de rodas como uma modalidade de dança artística, implica uma ação ininterrupta de uma cadeia de significados com infinitas mediações sobre o que é movimento estético e o que é a deficiência, onde a imprecisão e a indeterminação do processo lógico de movimento, de um modo geral, constituem o próprio arcabouço do que se denomina como dança em cadeira de rodas.

Esta modalidade tem se afirmado com uma complexidade alargada, por que a mesma vem propondo a substituição da imagem estética dominante na dança de um modo geral. Este parece-nos um processo provavelmente irreversível. Conseqüentemente ao pensarmos nesta possibilidade de mudança nos deparamos também com questionamentos sobre o que é o corpo que dança e o que é movimento desta dança.

Acreditamos que estas mudanças que se fazem presentes são possíveis porque a dança, acima de tudo, é um resultado transitório, dado em um certo momento social. Porém temos aqui duas de suas características que coloca o corpo deficiente em evidência:

1) a materialidade da dança se dá no corpo físico e 2) a elaboração dos gestos se constitui no que é a própria dança.

Considerando que a dança ocorre num suporte físico específico que é o corpo possível de movimentos, então o ato do movimento na dança, tem uma relação direta com a estrutura locomotora. Músculos, ossos e pele interligam-se nessa estrutura estabelecendo os gestos corporais, desenhados no espaço e tempo. Podemos dizer então que o corpo possui identidade própria, onde ele é produto e produtor, ou seja, o corpo faz determinados movimentos e, ao mesmo tempo, resulta dele.

Nesta perspectiva, Laban (1975) diz que: o corpo possui distribuições gravitárias, que ao mexer determinada parte do mesmo, isto modifica a sua relação com o espaço. Esta relação se dá pela especificidade da organização estrutural do movimento.

Portanto, queremos aqui apontar que a configuração corporal do dançarino com deficiência física, de um modo geral, apresenta também a cadeira de rodas, podendo aqui dizer que ela torna-se um acréscimo6 nesta estrutura corporal. Este corpo que dança

sobre uma cadeira de rodas é então uma ruptura do modelo de corpo estabelecido para a dança.

Podemos dizer ainda que a dança em cadeira de rodas, é antes de mais nada, uma nova experimentação corporal. Esta atividade então tornou-se um novo objeto de estudo, porque o percurso do seu desenvolvimento e crescimento tem provocado muitos questionamentos e reflexões sobre o que é a própria dança e sobre o que é o gesto corporal.

Os primeiros trabalhos vistos no Brasil, foram demonstrados a partir de 1991, (FERREIRA, 1998), e uma de suas características tem sido, ao longo destes anos, a predominância de movimentos que resultam na configuração de estruturas que apresentam formas corporais que indagam os padrões estéticos predominantes.

Sua performance tem um caráter próprio aos vários e possíveis posicionamentos corporais que são modos de ocupar plasticamente o espaço, até então não vistos,

6 Acréscimo do ponto de vista da Análise de Discurso, segundo Orlandi (2000), o acréscimo 'funciona na

formulação como algo que "lineariza", o que significa o sujeito em sua discursividade. Discursividade aqui é vista a partir da constituição de uma coreografia elaborada a partir de uma técnica de dança com mais a cadeira de rodas.

processando-se sobre uma silhueta giratória que se transcreve no espaço e tempo de forma particular e individualizada.

A cadeira de rodas, que é simbolizada como pernas dos dançarinos, materializadamente é uma cadeira que apresenta, na sua estrutura concreta: rodas, espaldar, assento e encosto, e que tem como objetivo o deslocamento espacial. A dança em cadeira de rodas é vista de forma paradoxal. Se por um lado ela representa a limitação de movimentos corporais e sociais, por outro lado, ela é a garantia de autonomia e a possibilidade da transformação desta limitação.

Cada movimento executado nas coreografias é revelador de possibilidades. Estes movimentos registram momentos que mostram uma linha corporal que não busca essencialmente a representação de figuras7, mas principalmente reivindica um posicionamento social.

A locomoção com uma intenção de movimento ritmado constitui o que é hoje denominado de dança em cadeira de rodas. Esta possibilidade de dança abre horizontes para além do que já conhecemos. É antes de tudo o reflexo da relação do corpo com o trabalho simbólico que se tem sobre ele.

Discursos desdobrados da pesquisa realizada no mestrado por Ferreira (1998), mostra que tanto faz a pessoa ser deficiente ou não, todos se identificam com a possibilidade da dança, ou seja, a dança é um lugar possível para que as pessoas possam transformar a relação com elas mesmas. A dança também é o lugar do processo de passagem do impossível – possível, do irrealizável – realizável. Isto se dá pelo simbólico.

Katz (1994a) diz que, a pedagogia da dança diverge a respeito da existência ou não de uma “Alfabetização básica” do corpo. Porém, o que prolifera no ambiente da dança, são enunciados que dizem que a dança é algo que vem de “dentro”, onde os partidários deste enunciado acreditam que a dança é uma linguagem universal.

Ora, se a dança é algo que vem de “dentro”, é importante considerar que cada dançarino é um exemplar único, com diferenças sócio/históricas/corporais. Então, se a dança é a manifestação deste “dentro”, porque a dança em cadeira de rodas é colocada à margem social? Partindo deste questionamento, a questão a ser compreendida é: Sendo,

ou não, a dança a manifestação deste “dentro” quais são as marcas do processo de constituição da dança em cadeira de rodas?

Diante disto, este trabalho, se construiu como um lugar possível para o entendimento da dança e suas relações. Sendo assim, os objetivos desta pesquisa foram: a) compreender o discurso sobre a dança em cadeira de rodas num processo relacionado com dança artística. E para tal nos reportamos aos indícios dado pela memória que se tem da dança, apontados nas entrevistas realizadas; b) compreender os processos de subjetivação e de individualização construídos no sujeito-deficiente, a partir da constituição, formulação e circulação dos sentidos constituídos pela dança.

Quando pensamos os processos de subjetivação constituído pela dança, interessou- nos perceber como é que este sujeito que dança, configurou sua identidade de dançarino deficiente.