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A revisão sistemática (RS) tal como se compreende hoje foi padronizada pelos esforços da Colaboração Cochrane que constitui uma organização internacional, sem fins lucrativos e sem fontes de financiamento, criada em 1993 no Reino Unido, com sede em Oxford, que se desenvolveu em resposta à solicitação, por revisões sistemáticas periodicamente atualizadas de todos os ensaios clínicos aleatórios relevantes sobre intervenções em saúde, feita por Archie Cochrane. Este médico e pesquisador britânico, que muito contribuiu para o desenvolvimento da epidemiologia como ciência, afirmava: “É certamente uma grande crítica para nossa

profissão que não tenhamos organizado um sumário crítico, por especialidade, subespecialidade e atualizado periodicamente, de todos ensaios clínicos aleatórios” (STARR et al., 2009, p. 182).

A Colaboração Cochrane tem como objetivo produzir, manter atualizadas e assegurar o acesso à revisões sistemáticas sobre efeitos de intervenções na área de saúde, tornando-se uma referência do paradigma da pesquisa baseada em evidências (LEUCHT et al., 2009).

No Brasil, o Centro Cochrane foi inaugurado em 1996 e encontra-se vinculado à Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo, desenvolvendo revisões sistemáticas, pesquisa clínica e avaliações de tecnologias em Saúde, com informações adicionais presentes no site www.centrocochranedobrasil.org.

A RS é um processo de seleção minuciosa e criteriosa de artigos provenientes da literatura científica que visa responder uma indagação claramente formulada por meio de métodos sistemáticos e explícitos para identificar, selecionar e avaliar criticamente estudos primários relevantes, bem como, os métodos de síntese analítica (metanálise) desenvolvidos, promovendo a transparência e reprodutividade dos resultados apresentados (CLARKE et al., 2001; Cochrane Collaboration, 2011; GLANVILLE; SOWDEN, 2001; MOHER et al., 2007; RICHARDSON et al., 1995).

Trata-se de uma técnica científica objetiva, eficiente e reprodutível, que permite identificar dentre os inúmeros estudos publicados sobre o tema em pauta, aqueles com superior qualidade metodológica, extrapolando os achados de estudos independentes, avaliando a consistência individual dos mesmos e explanando as

possíveis inconsistências e conflitos. Adicionalmente, a RS promove o aumento da acurácia dos resultados e a melhora da precisão das estimativas de efeito de uma determinada intervenção clínica, consistindo em uma relevante ferramenta de investigação científica que interliga as pesquisas e a prática clínica (ATALLAH, 1997, 1998; EGGER et al., 2001; MULROW, 1994).

As conclusões de uma RS podem ser formuladas através de síntese descritiva e metanálise. A primeira contempla a descrição dos resultados dos trabalhos originais de objetivos similares cujas tabelas descritivas, incluindo as características essenciais e resultados dos artigos selecionados, oferecem uma estimativa geral sobre a contribuição de cada estudo para formulação das conclusões da RS. Já a segunda, trata-se de uma relevante técnica estatística de integração e sumarização dos resultados de diversos estudos originais, oferecendo uma estimativa de efeito mais precisa em relação ao risco-benefício do tratamento, se comparada à dados peculiares extraídos de um trabalho individual (OXMAN, 1994).

A metodologia das revisões sistemáticas e metanálise reflete um avanço importante, visto que tais estudos representam o mais alto nível de evidência, em especial, ao se considerar as limitações que um único estudo pode apresentar, incluindo problemas na variabilidade da amostra, no tamanho da população do estudo e, consequente, não detecção de associações. A seleção criteriosa diante de procedimentos preestabelecidos neste permite uma análise de estudos comparáveis cuja combinação de seus resultados visa alcançar uma amostragem superior onde efeitos de menor significância podem ser detectados ou excluídos com mais segurança. A sumarização e síntese do conjunto de resultados individuais permitem a verificação mais objetiva do que foi realizado na área, determinando adequações ou aprimoramentos em práticas clínicas vigentes ou sugerindo o desenvolvimento de novas linhas de pesquisa (EGGER et al., 2001).

Levantamentos realizados em Universidades acadêmicas apontam que aproximadamente 40% das decisões clínicas não são baseadas na literatura científica disponível. Este dado está relacionado à sobrecarga de informação cujos artigos inseridos apresentam resultados inconclusivos ou contraditórios, com aceitação de forma não crítica, vinculada à confiança excessiva na própria experiência, na opinião de especialistas, ou da influência de conflitos de interesses diante de elevados patrocínios proporcionados (GRAY; PINSON, 2003).

Desta forma, a prática no desenvolvimento de revisões sistemáticas está cada vez mais em evidência, cujo processo de revisão abrangente e atualizado da literatura se faz essencial, uma vez que seus resultados permitem a atualização de profissionais de saúde e contribuem para a elaboração de diretrizes e tomadas de decisões na área, auxiliando gestores de políticas públicas ou indivíduos interessados em informações sobre tratamentos distintos; e, ainda, na resolução de questões contraditórias, na promoção de novas hipóteses de estudo, identificação da necessidade de mais pesquisa em determinada área, com o intuito de verificar os benefícios e/ou riscos de determinadas intervenções e promover a necessidade de adequar uma conduta vigente ou definir uma nova prática ao usufruto da sociedade.

Um dos fatores que refletem o crescimento no interesse de RS está vinculado ao rigor metodológico que a compete, incluindo procedimentos bem definidos e específicos, tais como; a elaboração da pergunta de pesquisa; a preconização dos critérios de elegibilidade para inclusão dos estudos; a definição das bases de dados, bem como, as estratégias de busca a serem empregadas; a seleção dos estudos elegíveis e a avaliação de qualidade metodológica dos mesmos; e, o processo de extração, síntese e análise dos dados para posterior agrupamento estatístico de resultados que contemplam a metanálise. A conclusão de todas estas etapas metodológicas predefinidas constitui no poder diferencial das revisões sistemáticas quando comparadas às revisões tradicionais ou narrativas, uma vez que estas últimas, não relatam as fontes de informações utilizadas, a metodologia para busca de referências, nem os critérios usados na avaliação e seleção dos artigos, constituindo basicamente da literatura publicada em livros e revistas na avaliação e análise crítica pessoal do autor (ATALLAH, 1997, 1998; KLASSEN et al., 1998; MOHER et al., 2007).

Dentre as etapas supracitadas empregadas na condução de RS, vale destacar a análise da qualidade metodológica dos estudos a serem incluídos, uma vez que a relevância dos resultados obtidos para a tomada de decisões em saúde dependerá da qualidade dos estudos presentes na sua elaboração e, posterior, metanálise dos resultados encontrados (JADAD et al., 1996; JADAD et al., 1998; MALLEN et al., 2006). Por este motivo, o critério de escolha de artigos científicos deve englobar os requisitos supracitados para se evitar ou minimizar vieses durante

a análise, tanto os intrínsecos referentes a cada ensaio clínico, como os extrínsecos vinculados aos de seleção (HIGGINS et al., 2011).

Todo este processo de planejamento de avaliação sistemática deve cumprir as normas preconizadas pela Colaboração Cochrane (CLARKE; OXMAN, 2003; Cochrane Collaboration, 2011), por EGGER et al. (2001) e pelo Centre of Reviews

and Dissemination (CRD) da Universidade de York (2009) - pioneiros na área da

saúde ao defenderem e padronizarem o uso do método científico para investigar a eficiência, eficácia e segurança de tratamentos e doenças.

Observa-se, portanto, um aumento progressivo da inserção de revisões sistemáticas/metanálises em periódicos de impacto significativo, aspectos este que ratifica o crescente reconhecimento da força de evidência deste delineamento, apresentando recentes publicações que orientam à prática em algumas áreas da pesquisa básica experimental e da pesquisa clínica (CHALMERS et al., 2002).