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Estudos sobre a economia da região

4. A INTEGRAÇÃO FRONTEIRIÇA QUE OCORRE ATRAVÉS DAS RELAÇÕES

4.2 Estudos sobre a economia da região

34 A logística é entendida aqui como as atividades relacionadas com transporte, armazenamento, entrada e saída do país de cargas de importação e exportação e serviços relacionados.

Buscando pesquisas sobre a relação econômica entre os três países através desta região trinacional, é possível perceber poucos estudos acadêmicos sobre o tema. Áreas como as ciências sociais, a história, a sociologia, a geografia e a antropologia têm se preocupado em realizar produções sobre: a memória dos moradores na constituição da cidade (SOUZA, 2009b); a produção e a apropriação do espaço urbano em Foz do Iguaçu (RIBEIRO, 2015); a dinâmica criada pelos moradores da fronteira entre o Brasil e o Paraguai chamados de “brasiguaios” (ALBUQUERQUE, 2009); e Foz do Iguaçu dentro das redes de cidades em que ela está incluída (CONTE, 2012).

A maioria destes estudos é sobre Foz do Iguaçu e leva em conta, de forma secundária, a região trinacional. A questão da cidade brasileira estar hierarquicamente inserida em uma dinâmica maior que ela é pouco discutida.

Para Conte (2012, p.191), na análise de Foz do Iguaçu em uma rede de cidades, é possível identificá-la como um centro sub-regional que oferece bens e serviços para o entorno; como um enclave de fronteira, onde é a principal cidade; e como uma cidade inserida na rede internacional do turismo. A autora usa o conceito de rede urbana como um mapeamento de uma determinada localidade, através das funções que cada uma exerce no conjunto. O referido estudo destaca também Foz do Iguaçu, e consequentemente a região trinacional como ambiente de singularidade.

Temos ainda estudos como o de Lima (2011), que procura demonstrar como Foz do Iguaçu e Ciudad del Este constituem uma região econômica, constituída através da dinamização da construção da Itaipu Binacional.

Além de pesquisas acadêmicas, é possível encontrar documentos como o Plano de Desenvolvimento Econômico de Foz do Iguaçu, do ano de 2014, que foi desenvolvido sob encomenda da Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu e do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social de Foz do Iguaçu (CODEFOZ), por uma empresa de consultoria. O documento, elaborado para servir como base para o planejamento do desenvolvimento econômico do município fronteiriço brasileiro, identifica o que ele chama de “cadeias propulsivas” e “cadeias reflexas”, as primeiras são atividades econômicas que geram ingresso líquido para a região, auferindo renda de fora para dentro. As segundas são aquelas voltadas a suprir o mercado interno de consumo (PDE, 2014, p.36).

No referido documento são identificadas 07 “cadeias propulsivas” que são responsáveis por auferir renda ao local, que impulsionarão outras “atividades reflexas”. São elas: administração pública, produção agroalimentar, logística, geração e transmissão de energia elétrica, serviços públicos básicos de educação, serviços públicos básicos de saúde e turismo. Esta lista é feita baseada na quantidade de empregos gerados por atividade.

Outro documento não acadêmico, amplamente divulgado como um “estudo” é a cartilha intitulada “O Custo do Contrabando” publicada e divulgada pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF). Nesta cartilha informa- se que entre os produtos apreendidos como contrabando, 67,44% são cigarros que saem do Paraguai e são destinados a várias cidades do Brasil. O documento relata que o contrabando tem um alto custo negativo para as economias nacionais, como uma grande evasão fiscal, um incremento da corrupção e da violência. E para solucionar o problema são sugeridas três medidas: 1. Que seja reforçada a segurança na fronteira; 2. Que seja criada uma agenda que permita que o Paraguai se desenvolva “sem necessitar das atuais práticas heterodoxas de exportação de mercadorias irregulares”; e finalmente, 3. que o modelo de arrecadação de impostos no Brasil seja repensado (IDESF, 2015, p. 2).

Tanto no Plano de Desenvolvimento Econômico de Foz do Iguaçu, quanto no documento do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteira, os interesses representados são de frações de classes. O primeiro, representa o interesse dos comerciantes e “empreendedores” do município de Foz do Iguaçu. E o segundo representa os proprietários da indústria do cigarro, que em geral não estão localizados em apenas uma cidade ou região.

Embora se apresentem como documentos da “sociedade civil organizada”, apresentam a realidade como se sua ótica fosse a de toda a população local. Mas, olhando um pouco mais de perto, não se encontra nesses projetos de desenvolvimento a ótica do trabalhador. Embora não se possa negar que a geração de empregos e a arrecadação de impostos afetam a vida da classe trabalhadora, colocar o desenvolvimento das atividades comerciais como um fim em si, não necessariamente atende às necessidades da população. Um projeto de desenvolvimento na ótica do trabalhador discutiria que tipo de emprego e qual a aplicação dos impostos arrecadados.

O fato do contrabando ser uma atividade recorrente e rentável na região pode ser um indicador de que não há vagas de emprego formal, com garantias trabalhistas e remuneração adequada para uma parcela significativa de trabalhadores locais. As medidas propostas pelo segundo documento em questão não indicam o tratamento desta problemática. Já no primeiro documento, a atividade econômica praticada por grande número de trabalhadores informais do “circuito sacoleiro” não é tema de questionamentos35.

O ´circuito sacoleiro’ é uma atividade econômica compartilhada pela região dentro do circuito espacial produtivo do comércio informal intrafronteiras. Para Cardin (2010, p.23), o “Circuito Sacoleiro” é definido como o “conjunto de relações sociais desenvolvidas durante o percurso realizado pelas mercadorias que saem do município paraguaio de Ciudad del Este e entram no Brasil de forma ilegal, via Foz do Iguaçu”.

Seguindo com a análise de estudos que cita a região, em algumas publicações mais antigas, é possível identificar certo pessimismo quando se pensava na implementação do Mercosul. Isso fica claro no trecho de um estudo de 1996 sobre o tema:

Foz do Iguaçu é um entreposto, com 400 exportadores empregando 7 mil trabalhadores. Vende ao Paraguai autopeças, confecções, produtos hortigranjeiros e várias mercadorias de supermercados locais. No entanto, não são otimistas as perspectivas de seu futuro imediato. Com a globalização da economia, os comerciantes paraguaios passam a ter como opção a negociação direta com as grandes empresas importadoras brasileiras, não restringindo-se mais à intermediação de Foz do Iguaçu. Concomitantemente, a defasagem cambial provocada pelo Plano Real vem desfavorecendo as exportações brasileiras. Como resultado já é possível verificar o fechamento de inúmeras empresas exportadoras em Foz do Iguaçu. Algumas transferem-se para Assunção (Paraguai), estabelecendo- se no comércio importador de produtos brasileiros. Com o Mercosul, a previsão é de um desaquecimento entre 50% e 70% do comércio local, acirrando o caos social e o crescimento da violência urbana (KLEINKE, CARDOSO, ULTRAMARI E MOURA, 1996).

Outro texto, do ano de 2006, dez anos depois do trecho citado anteriormente, relata também aspectos negativos da criação do bloco para o local, afirmando que para as cidades a criação do Mercosul “foi um choque econômico, pois os compradores paraguaios e argentinos não precisavam vir a Foz do Iguaçu para adquirir suas mercadorias” e isso acabou gerando “desemprego e desvalorização 35 Outras problemáticas presentes na região como o tráfico de pessoas, o envolvimento de jovens com o tráfico de drogas e altos índices de criminalidade não são mencionados no PDE de Foz do Iguaçu como se essas questões sociais não tivessem relação com o desenvolvimento econômico.

dos imóveis” (PRATES, 2006). No entanto, o que se deu foi uma reorganização do comércio local, o aumento do comércio intrarregional e um fortalecimento de Foz do Iguaçu com os vizinhos.

Neste trabalho, após a descrição das atividades econômicas que são compartilhadas pela região, far-se-á o esforço de entender como a existência do Mercosul se relaciona com essa dinâmica. Procurando desvendar como está o “estado da obra” da integração latino-americana via Mercosul neste local em específico.

A seguir, apresentam-se as principais atividades econômicas da região36. O

critério de seleção destas foi a procura de atividades que apresentam importância econômica local e que são compartilhadas com mais uma, ou entre as três cidades da região.