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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO

5. SISTEMA PARA VERIFICAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE MANOBRA UTILIZANDO O SIAMA

5.2. Etapa 1 – Calibração do modelo físico

Conforme detalhado no item 2.4, existem diversos tipos diferentes de modelos físicos hidráulicos reduzidos que podem ser utilizados em ambiente costeiro. Para aplicação em estudos de manobra de navios, são de especial interesse as bacias tridimensionais com simulação de marés ou com sistema gerador de ondas (ou ainda com reprodução de ambos os fenômenos), dependendo das características ambientais do local a ser representado. Também é possível incluir a simulação do vento.

Em modelos físicos como estes, para garantir que os fenômenos representados em escala reduzida tenham correspondência com o ambiente real em pontos homólogos, além de garantir as condições de contorno de forma, que são a representação da topografia, batimetria e demais estruturas que tenham interface com o escoamento, e reproduzir as condições de fronteira hidráulicas, que são a geração de ondas e a vazão de entrada correspondente a cada instante de maré estudado, é preciso uma série de outras medidas para estabelecer condições semelhantes de escoamento entre o modelo e a realidade.

Isto ocorre fundamentalmente porque o modelo físico, em geral, reproduz apenas uma área limitada dentro de um complexo cenário costeiro ou estuarino muito mais amplo, de tal forma que as condições de ondas ou correntes precisam ser adequadas através de técnicas de laboratório para que atinjam os pontos de controle da maneira mais próxima possível ao observado em campo. Além disso, via de regra, as condições de contorno de topografia e batimetria no modelo físico não representam a mesma resistência ao escoamento do

meio real, sendo muitas vezes necessários ajustes na rugosidade de fundo para garantir a semelhança de comportamento. Em algumas regiões, a movimentação de material sólido altera significativamente a forma de fundo tornando o problema ainda mais complicado, pois a condição batimétrica real passa a ser variável com o tempo.

Por estes motivos, antes do início de qualquer tipo de ensaio em modelo físico é preciso realizar uma etapa de calibração das condições hidráulicas, de tal forma a garantir uma adequada reprodução nos pontos de interesse das alturas, períodos e direções de ondas, bem como dos níveis d’água, velocidades e direções de correntes em cada instante de maré.

Na etapa de calibração de um modelo físico, os dados resultantes de levantamentos de campo, conforme descritos no item 3.4.2, são as informações de referência para a realização dos ajustes necessários. Entretanto, deve-se destacar que estes dados são pontuais, e muitas vezes bastante espaçados entre si, principalmente por razões de custos envolvidos nos monitoramentos de campo. Isto muitas vezes dificulta a percepção global dos fenômenos hidrodinâmicos que controlam as condições de escoamento, e portanto, tornam a tarefa de calibração do modelo físico mais árdua e demorada, podendo algumas vezes, inclusive, comprometer a própria precisão dos resultados.

Desta forma, é altamente recomendável utilizar o apoio de modelos hidrodinâmicos computacionais para auxiliar na calibração do modelo físico. Os modelos computacionais têm a vantagem de representar áreas muito maiores do que os modelos físicos, o que permite o estabelecimento de condições de contorno mais amplas e a compreensão dos fenômenos globais que regem o escoamento na região de interesse. Além disso, uma vez aferidos e validados com os dados de campo, os modelos computacionais permitem a determinação das condições de ondas, níveis d’água e velocidades para diferentes cenários em qualquer ponto de sua grade, permitindo uma calibração muito mais detalhada do modelo físico.

Nos modelos físicos com simulação de maré, as condições de contorno impostas são as vazões e os níveis d’água. No caso dos modelos quase estáticos, que retratam as condições de escoamento para um instante específico de maré, e, portanto, operam em regime permanente (com vazão constante), uma primeira aproximação para a vazão pode ser obtida a partir da velocidade média do fluxo (oriunda dos levantamentos de campo ou dos resultados do modelo computacional) em uma dada seção multiplicada pela área molhada da mesma seção representada no modelo. Este procedimento pode ser feito para diversas seções no modelo físico que tenham levantamentos de velocidade, a fim de estabelecer um valor de referência. Evidentemente este valor de vazão terá de ser ajustado posteriormente durante os ensaios de calibração.

As vazões são controladas por registros instalados nas tubulações de alimentação do modelo físico. Destaca-se que, em modelos marítimos são normalmente utilizados dois sistemas de alimentação, um para representar maré enchente e outro para representar a maré vazante.

A medição da vazão nas tubulações de alimentação pode ser feita por diversas técnicas diferentes, sendo as mais comuns: medidores deprimogêneos inseridos (Venturi, Tubo Dall ou Diafragma), medidores por ultrassom e medidores eletromagnéticos. A Figura 5.1 mostra o exemplo de um medidor deprimogêneo tipo Venturi.

Além do controle da vazão é preciso estabelecer uma adequada distribuição do fluxo na entrada do modelo, de tal forma a conformar o escoamento de modo semelhante à realidade. Para isto, o sistema de alimentação conta também com distribuidores de vazão, sistema de tranquilização e placas direcionadoras, conforme ilustrado na Foto 5.1.

Foto 5.1 – Distribuidores de vazão (tipo colmeia, que são módulos com tubos de PVC que podem operar abertos ou fechados de forma a favorecer o escoamento em uma dada posição), sistema de tranquilização (estrutura gradeada de madeira que funciona

como flutuante e mitiga o efeito de turbulência na entrada do modelo) e placas direcionadoras de fluxo. Fonte: Acervo do LHEPUSP.

Para cada condição de maré, o modelo é considerado calibrado se os níveis d’água e velocidades medidos em cada ponto de interesse tem valor correspondente no ambiente real nos pontos homólogos.

Em cada uma das duas saídas do modelo (maré enchente ou vazante), comportas basculantes (Foto 5.2) permitem o controle de nível d’água, de tal forma a estabelecer ao longo de toda área de representação os correspondentes níveis obtidos em campo para cada condição de maré. Os níveis d’água no modelo são medidos por meio de pontas limnimétricas, que podem ser fixas em pontos estratégicos do modelo (Foto 5.3), ou acopladas a tripés que podem ser facilmente deslocados e posicionados de acordo com o interesse do estudo.

Foto 5.2 – Comporta basculante para regulação de nível d’água por jusante. Fonte: Acervo do LHEPUSP.

Foto 5.3 – Ponta limnimétrica para medição de nível d’água na área de representação do modelo físico. Fonte: Acervo do LHEPUSP.

No caso das velocidades, é preciso garantir a semelhança entre modelo e campo quanto à magnitude e a direção. No modelo físico, as velocidades são determinadas com uso de micromolinetes e medidores de direção, ambos ilustrados na Foto 5.4.

Foto 5.4 – Equipamentos para medição de velocidades – Micromolinete (esquerda) e medidor de direção (direita).

Os micromolinetes são pequenas hélices acopladas a um eixo horizontal ligado a uma haste fina vertical, que são imersas no ponto de interesse de medição de velocidades, posicionadas na direção preferencial do fluxo. Estes equipamentos funcionam em conjunto com um contador de giros, e são instrumentos projetados para girar em velocidades diferentes de acordo com a velocidade da água no ponto a ser medido. A relação entre velocidade da água e velocidade de rotação do molinete é a “equação do molinete”, que é determinada em tanque de aferição do laboratório.

Os medidores de direção de corrente são lemes metálicos com curvaturas nas extremidades, que são imersos no ponto de interesse de medição, posicionados sobre um eixo direcional escolhido, como, por exemplo, o eixo norte-sul. Como o arranjo é leve, o mesmo tende a estabilizar sua posição na direção do fluxo naquele ponto. Este leme é acoplado a uma haste vertical de pequeno diâmetro, que é interligada a um rolamento, onde o ângulo em relação ao eixo escolhido é medido por meio de um potenciômetro.

As velocidades obtidas nos ensaios em modelo físico precisam ser equivalentes em pontos homólogos aos dados de levantamento de campo.

Caso isso não ocorra, são possíveis diversos tipos de ajustes no modelo, tais como:

 Aumento ou redução da vazão de entrada para alteração correspondente na magnitude dos campos de velocidades;

 Instalação de placas de restrição de seção transversal (Foto 5.5), quando as velocidades precisam ser aumentadas em pontos específicos, mas já possuem boa correspondência em outras regiões;

Foto 5.5 – Placas para confinamento do fluxo e aumento de velocidades na seção de interesse. Fonte: Acervo do LHEPUSP.

 Modificação na distribuição da vazão de entrada com restrição de seções, instalação de novas placas direcionadoras ou reposicionamento das existentes para ajustes na direção do fluxo;

 Ajuste da rugosidade de fundo para alteração das propriedades de resistência ao escoamento e, consequentemente, dos campos de velocidades. Por exemplo, rugosidades artificiais são simuladas em modelo físico com colagem de pedriscos no fundo, que provocam redução das velocidades no trecho, conforme ilustrado na Foto 5.6. Em

caso de necessidade de redução da rugosidade, o fundo do modelo que normalmente é de argamassa pode ser revestido com cimento queimado ou com tintas especiais.

Foto 5.6 – Imposição de rugosidade de fundo para ajuste do nível d’água em modelo físico. Fonte: Acervo do LHEPUSP.

Equipamentos de acostagem fundamentais a serem instalados e calibradas de acordo com os objetivos da simulação no modelo físico de manobrassão as defensas.

No modelo reduzido, as defensas são representadas por lâminas em balanço (“cantilever”), que se flexionam com o impacto da embarcação, acopladas a sensores de deslocamento (Foto 5.7), que são calibrados de acordo com a curva de deformação (tensão x deformação) das defensas reais (Figura 5.2).

Foto 5.7 – Instrumentação adaptada ao berço de atracação em modelo físico para simulação e registro da deformação das defensas. Fonte: FCTH (2006).

Figura 5.2 – Curva tensão deformação de uma defensa real. Fonte: Bridgestone (2008)1 apud Gerent (2010).

O software do SIAMA 2014 permite o registro das deformações resultantes dos impactos sobre as defensas dos navios durante as manobras de atracação. Com este resultado é possível verificar se o limite de deformação não foi ultrapassado, conforme ilustrado no gráfico da Figura 5.3.

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BRIDGESTONE CORPORATION. Marine fender system proposal for Ponta da Madeira Brazil. Japan, 2008.

Figura 5.3 – Exemplo de gráfico de deformações nas defensas oriundas de impacto de modelo de navio durante simulação de manobra. Fonte: FCTH (2007).