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De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2014, mais de 1.9 biliões de adultos (≥ 18 anos) em todo o mundo tinham excesso de peso (38 % nos homens e 40 % nas mulheres) e obesidade (11 % vs. 15 %), sendo que a obesidade mais do que duplicou desde 1980 (OMS, 2015). Uma análise sistemática, publicada no mesmo ano, do “GBD (Global Burden of Disease) Obesity Collaboration”, estimou que 2.1 biliões de pessoas (incluindo crianças e adolescentes) tinham excesso ponderal/obesidade, consistente com o aumento na prevalência de 27.5 % nos adultos (Figura 1.1) e de ≈47 % nas crianças, em comparação com 1980 (M Ng et al., 2014).

a)

b)

Figura 1.1. Prevalência da obesidade, em função da idade (≥ 20 anos), em homens (a) e mulheres (b). (Adaptado de M Ng et al., 2014).

Duas observações relevantes são retiradas dos resultados deste estudo: 1) em nenhum dos países incluídos na análise verificou-se um declínio significativo no excesso ponderal/obesidade nos últimos cerca de ≈30 anos; contudo, 2) nos países desenvolvidos a epidemia da obesidade pode ter atingido o ”plateau”, enquanto que nos restantes países pode não atingir os valores observados naqueles países, em alguns casos superior a 40 % (M Ng et al., 2014).

Em Portugal, à semelhança de outros países, a obesidade é um problema importante de saúde pública. Em 2005, a Direção Geral de Saúde (DGS), colocou o combate contra a obesidade como uma prioridade, em articulação com outros programas nacionais que integravam o Plano Nacional de Saúde 2004-2010 – incluindo o Programa Nacional de Prevenção e Controlo das Doenças Cardiovasculares e da Diabetes, com o objetivo geral de “contrariar a taxa de crescimento da prevalência da pré-obesidade e da obesidade em Portugal” (DGS/MS, 2005). Este relatório estimou que os custos diretos da obesidade, em Portugal, rondariam os 3.5 % dos custos totais da

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saúde, sendo a 2º causa de morte passível de prevenção, logo a seguir ao tabagismo (DGS/MS, 2005).

O Inquérito Nacional de Saúde (INS) de 2014 indicou um aumento da prevalência do excesso ponderal/obesidade entre a população portuguesa adulta (≥ 18 anos), na última década, para valores próximos dos 53 % (vs. ≈51 % em 2005), com maior expressão no género feminino, e no escalão etário entre os 45 e os 74 anos (5º INS-INSA/INE, 2015). Outros dados do INS de 2014 apontam para a estabilização no número de fumadores (≈20 %), entre a população ≥ 15 anos, sendo que ≈35 % consumia bebidas alcoólicas numa base diária e, para um aumento das doenças crónicas reportadas, incluindo dor crónica e artroses, hipertensão arterial (HTA), diabetes, doenças pulmonares, CVD, ou problemas renais, este último com um aumento de 1.8 % para 4.6 %, em 10 anos. Cerca de 74 % das mulheres e 40 % dos homens referiram nunca ter fumado (≈58.2 % no total), sendo a percentagem de ex-fumadores de ≈22 %. Na população ≥ 15 anos a prescrição médica (consumo de medicamentos), nos 15 dias anteriores ao inquérito, foi de 56 %, com valores de 90 % para os indivíduos com idade ≥ 75 anos, e inferiores a 30 % entre a população com menos de 35 anos (5º INS-INSA/INE, 2015).

A obesidade (Índice de Massa Corporal, IMC ≥ 30 kg/m2) e o excesso ponderal (25≤ IMC <30 kg/m2), caracterizam-se pela acumulação excessiva, anormal, local/generalizada, de gordura, e que pode causar danos para a saúde (OMS, 2015). A etiologia/etiopatologia da obesidade, como doença crónica e pandémica, é complexa e multifatorial, com particular destaque para os fatores ambientais, genéticos, e comportamentais, que contribui para um aumento da mortalidade e morbilidade, e necessita de tratamento ao longo da vida (FL Greenway, 2015 e A Wirth et al., 2014). Independentemente da estratificação dos fatores ou do seu eventual efeito aditivo, a causa fundamental do excesso de adiposidade parece estar associada a um desequilíbrio crónico no balanço energético e, em particular, entre o aumento do consumo e a diminuição no gasto de energia, usualmente associado a um padrão alimentar com elevado consumo de alimentos energeticamente densos (ricos em calorias, e.g., gorduras e H. C.) e/ou à diminuição da atividade física (OMS, 2015; A Wirth et al., 2014 e FL Greenway, 2015). Fatores que concorram para a alteração da capacidade de homeostasia no balanço energético, de forma continuada/intermitente e crónica, podem contribuir para o aumento de peso corporal (Figura 1.2.) (FL Greenway, 2015).

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Periférico

Estilo de vida Fatores genéticos

Ingestão de nutrientes (energia)

Homeostasia NPY AgRP Anorexigénico Orexigénico Central/hipotálamo Grelina GIP Periférico GLP-1 Insulina CCK Leptina PYY Gasto de energia

Metabolismo basal (REE), termogénese, Atividade (NREE)

Fatores ambientais Fatores comportamentais

Central/hipotálamo

Figura 1.2. Fatores envolvidos na regulação do balanço energético e no peso corporal.

Um sistema de auto-controlo é gerado entre o SNC (e.g., hipotálamo) e os órgãos/tecidos periféricos (e.g., trato gastro-intestinal, pâncreas, fígado, ou o tecido adiposo). A insulina tem um efeito anorexigénico central, mas funciona como uma hormona “orexigénica” perifericamente e, ao contrário do que, aparentemente, ocorre com a GIP.

AgRP, “agout-related peptide”; NPY, “Neuropeptide Y”; GIP, “glucose-dependent insulinotropic polypeptide”; GLP-1, “glucagon-like peptide-1”; CCK, “cholecystokinin”; PYY, “peptide YY”; REE, “resting energy expenditure”; NREE, “non-resting energy expenditure”. Nota: ‘Central’ e ‘periférico’ indica o local onde as moléculas são

produzidas (adaptado de FL Greenway, 2015).

Neurotransmissores, e.g. canabinóides

Outros fatores podem estar envolvidos, incluindo a privação do sono, epigenética, disruptores endócrinos, e/ou o efeito pro-inflamatório dos SFA da dieta no hipotálamo, mediado pelas células gliais, e relacionado com a alteração da função neuronal e na resposta à leptina (FL Greenway, 2015). A alteração da microflora intestinal, por exemplo pelo efeito da dieta, tem sido igualmente relacionada ao aumento da obesidade e comorbilidades associadas, pelo seu efeito sobre o metabolismo energético e a resposta inflamatória (PJ Turnbaugh et al., 2009; Z Wang et al., 2011 e H Tilg e A Kaser, 2011). Por exemplo, estudo em modelos animais, identificou vários metabolitos derivados da PC da dieta, por ação da microflora intestinal, com a maior propensão para desenvolver aterosclerose, e relacionada com a expressão de múltiplos recetores, e o aumento da acumulação de colesterol, nos macrófagos (Z Wang et al., 2011).

Contudo, a real contribuição destes fatores para a epidemia da obesidade e comorbilidades associadas, baseada em dados epidemiológicos e pré-clínicos (FL Greenway, 2015) é limitada, carece de ciência-baseada na evidência e, em alguns casos, de transposição para os humanos.

Várias patologias (comorbilidades) estão associadas ao excesso ponderal/obesidade, como sejam as CVD (e.g., doença cardíaca e trombose), t2DM, HTA, alguns tipos de cancro, apneia de sono, patologias do sistema digestivo e urinário, ou alterações músculo-esqueléticas (e.g., osteoartrite); em muitos casos relacionadas com a dislipidemia aterogénica, a inflamação, e/ou a insulino-resistência (IR) (E Klimčáková et al., 2011; A Astrup, 2001 e OMS, 2015) (ver Capítulo 2). A distribuição da gordura corporal é igualmente um fator de risco independente, estando, por exemplo, o aumento do perímetro abdominal relacionada com a maior propensão para desenvolver t2DM ou CVD (P Brauer et al., 2015). Em 2010, a estimativa de mortes associadas ao excesso ponderal e obesidade, devido principalmente às CVD, foi de 3.4 milhões (Lim SS et al., 2012 citados por M Ng et al., 2014).

A análise agrupada, de vários estudos prospetivos (n >1.45 milhões de adultos Caucasianos, não hispânicos, com idades entre os 19 e os 84, mediana de 58 anos) com um “follow-up” entre os 5 e os 28 anos (mediana de 10 anos) concluiu que o excesso ponderal e a obesidade (mediana de 26.2

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Kg/m2) estavam associadas ao aumento da mortalidade, independente da causa (Figura 1.3.) (AB de Gonzalez et al., 2010). Associação que se manteve após ajuste para a ingestão de álcool (g/dia), a atividade física, o nível educacional, e o estado civil. Este estudo refere que a associação entre o IMC e a mortalidade apresenta um comportamento em forma de “J”, principalmente entre os indivíduos saudáveis e que nunca fumaram, com a zona de inflexão situada no intervalo de IMC entre os ≈20.0 a 24.9 Kg/m2 (Figura 1.3.). A associação com todas as causas de morte era mais forte entre os participantes cujo aumento de IMC ocorreu antes dos 50 anos. Contudo, os “hazard ratios” não apresentavam diferenças significativas entre géneros (AB de Gonzalez et al., 2010).

Figura 1.3. “Hazard ratios” estimados e IC a

95 % para a mortalidade, independente da causa, de acordo com o IMC, em função do género, para todos os participantes e para os indivíduos saudáveis (sem doenças on- cológicas e do coração na “baseline”) e que

nunca fumaram

(adaptado de AB de Gonzalez et al., 2010)

IMC Homens

Mulheres

Indivíduos saudáveis que nunca fumaram

Indivíduos saudáveis que nunca fumaram

Todos

Todos

IMC

Singh et al., numa análise quantitativa de vários estudos, incluindo indivíduos (n> 1.4 milhões) de diferentes regiões do globo e de diferentes raças, e mais de 50.000 eventos de CVD, estratificados para a idade, observaram que, apesar da análise agrupada poder incidir sobre diferentes estudos com diferentes “outcomes” clínicos, um aumento de, 10 mmHg SBP, 1 mmol/L nos níveis de colesterol total (Total-c), 1 mmol/L nos níveis de glucose em jejum, e o aumento do IMC de 5 kg/m2, estavam fortemente relacionados com o aumento de risco para as CVD. Contudo, estes autores referem que o risco relativo (RR), associado aos fatores de risco metabólicos sobre as CVD, diminui com a idade, apesar de consistentes entre géneros, e que, com exceção da associação entre o IMC e, e.g., a t2DM, poucas diferenças foram observadas em função da região geográfica, para os fatores de risco analisados (GM Singh et al., 2013). Sendo que, por exemplo, o RR associado a um aumento no IMC de 5 kg/m2 e a t2DM, para o escalão etário entre os 35 e 44 anos, era de 3.07 (Figura 1.4.) (GM Singh et al., 2013).

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Figura 1.4. Riscos relativos (RR) estimados, para as comorbilidades associadas ao excesso ponderal/obesidade (doença cardíaca isquémica, trombose isquémica, trombose hemorrágica, doença cardíaca hipertensiva, diabetes), em função da idade (Figura integral de GM Singh et al., 2013). PSC (Prospective Studies Collaboration), APCSC (Asia Pacific Cohort Studies Collaboration), ERFC (Emerging Risk Factor Collaboration); IHD “Ischemic Heart Disease”; *trombose hemorrágica, análise agrupada das meta-análises dos estudos ERFC e PSC.

Por outro lado, numa análise agrupada de 97 estudos prospetivos, incluindo indivíduos adultos (≈1.8 milhões) com IMC >20 kg/m2 e sem história prévia de CHD ou trombose, com mais de 57.000 CVD e 31.000 eventos de trombose, concluiu que ≈50 % e 75 % do risco de CHD e trombose, respetivamente, associado ao aumento do IMC (de 5 kg/m2), era mediado por 3 fatores de risco cardiometabólicos: a tensão arterial, os níveis de colesterol, e de glucose (Figura 1.5.) (Global Burden of Disease, 2014).

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Figura 1.5. Percentagem de excesso de risco, em função do aumento do IMC (5 kg/m2), mediada pela combinação dos diferentes fatores de risco cardiometabólicos. CHD “coronary heart disease” /doença cardíaca coronária. (Adaptado deGlobal Burden of Disease, 2014)

Pelo que, cerca de metade do risco de CHD, e 1/4 do risco de trombose, associado à obesidade, parece ser independente da HTA, e dos níveis de colesterol e de glucose e, menos de metade quando se considera o efeito aditivo do colesterol e da HTA; o que pode representar que, mesmo com terapêutica farmacológica para estes fatores de risco, uma parte substancial do risco de CVD, associado ao aumento da adiposidade, poder-se-á manter. O mesmo pode afirmar-se em relação a outras comorbilidades associadas à obesidade, como a t2DM ou o cancro (Global Burden of Disease, 2014 e M Ng et al., 2014).

De entre os fatores comportamentais associados à obesidade e suas comorbilidades, e passíveis de modificar, a intervenção dietética é particularmente importante. Por outro lado, numa perspetiva de saúde pública, a identificação de grupos de alimentos com efeitos positivos vs. negativos sobre a etiologia/etiopatologia da obesidade, pode ser útil, mais fácil de implementar e, tendo por base, as recomendações dietéticas/nutricionais. A intervenção dietética que privilegie o consumo de frutas e vegetais, gorduras insaturadas, e alimentos menos processados, em detrimento do consumo de sal, dos SFA, dos AG trans, ou dos H. C. refinados, pode melhorar o perfil de risco metabólico, mesmo quando o valor calórico total (VCT) permanece inalterado (FJ He e GA MacGrgor, 2009 e N Ikeda et al., 2008 citados por Global Burden of Disease, 2014).

De acordo com Wirth et al., numa análise sistemática da literatura entre 2005 e 2012, devido à elevada prevalência da obesidade, e ao seu difícil tratamento, a prevenção é particularmente importante (A Wirth et al., 2014). Curiosamente, estudos delineados no sentido de prevenir o excesso ponderal/obesidade em indivíduos normoponderais são raros (P Brauer et al., 2015). Indivíduos com obesidade, ou com excesso ponderal e de localização abdominal ou com concomitante presença de comorbilidades, e.g., t2DM e/ou HTA, são elegíveis para tratamento (A Wirth et al., 2014). Em relação ao tratamento, os objetivos são definidos em função, 1) do grau de

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adiposidade: para indivíduos com excesso ponderal (25≤ IMC <30 kg/m2) e obesos, uma diminuição >5 % e >10 %, em relação ao peso inicial, respetivamente, e 2) centrados na melhoria dos fatores de risco, na diminuição das comorbilidades, e nas causas de morte prematura, associados à obesidade (A Wirth et al., 2014). Perdas entre os 5 e os 10 % do peso corporal inicial, dependendo do tempo de evolução das comorbilidades associadas à adiposidade, são consideradas clinicamente relevantes, estando normalmente associadas à diminuição dos fatores de risco das CVD (como sejam a HTA, os níveis de colesterol total, e a glicemia), e previnem/retardam o desenvolvimento da t2DM, e/ou de outras comorbilidades relacionadas com o excesso de adiposidade (DGS/MS, 2005; SZ Yanovski e JA Yanovski, 2014 e P Brauer et al., 2015). Por exemplo, em indivíduos com excesso ponderal/obesidade e t2DM (n = 5.145, ≈41 % homens) perdas de peso entre os 5 e os 10 %, ao fim de 1 ano, estavam significativamente associadas, com a melhoria dos fatores de risco das CVD e, em particular, com a diminuição da HTA, dos TAG, com a melhoria do controlo glicémico, e o aumento do colesterol das HDL (HDL-c), mas não com a concentração do LDL-c e independentemente do uso de medicação; sendo que, com exceção dos níveis de HDL-c, o valor de IMC na “baseline” não foi determinante para os resultados obtidos (RR Wing et al., 2011). Para esta amostra populacional, a melhoria no controlo glicémico foi particularmente evidente, mesmo para valores de redução do peso corporal inferiores a 5 %. Para a diminuição intencional de peso é definido como objetivo a redução de, pelo menos, ≈500 Kcal/dia em relação ao VCT estimado para o indivíduo. Para atingir este valor várias estratégias nutricionais são propostas, como a diminuição da ingestão de gorduras, hidratos de carbono, ou de ambos, e uma dieta que contenha poucos alimentos energeticamente densos, com o objetivo não só de reduzir, como estabilizar, o peso corporal, e em conjunto com o aumento da atividade física e/ou de terapia comportamental (A Wirth et al., 2014). Uma diminuição de ≈500-600 Kcal/dia pode permitir uma perda de peso de ≈0.5 Kg/semana, durante um período de 12 a 24 semanas (MD Witham e A Avenell, 2010 citados por A Wirth et al., 2014). Contudo, a intervenção cirúrgica é mais efetiva, na redução de peso, na melhoria das comorbilidades associadas à obesidade, e na diminuição da mortalidade, que os tratamentos mais conservativos. Num período de 1 a 2 anos, a redução de peso de ≈4-6 kg pode ser obtida apenas pela intervenção dietética, 2-3 kg pelo aumento da atividade física, e 20-40 kg pela cirurgia bariátrica (A Wirth et al., 2014).

Uma perspetiva geral, completa e exaustiva, da intervenção cirúrgica e do uso de medicamentos para o tratamento do excesso de adiposidade, está fora do âmbito do presente trabalho de investigação; apesar de, por exemplo, a utilização de medicamentos quando acompanhada, sempre que se justifique e tal seja possível, da intervenção dietética, e/ou outras alterações comportamentais, contribuir para uma redução do peso corporal mais efetiva e consistente ao longo do tempo, como observado em ensaios clínicos randomizados e controlados (RC) (SZ Yanovski e JA Yanovski, 2014 e P Brauer et al., 2015). Por outro lado, algumas recomendações vão no sentido do uso meramente excecional da intervenção farmacológica e/ou cirúrgica em indivíduos obesos (P Brauer et al., 2015).

Contudo, como alteração/desordem heterogénea, é necessária uma intervenção personalizada, nos cuidados, na estratificação do risco, e no tratamento do excesso de adiposidade. Sendo que, as intervenções mais efetivas são, por norma, elas próprias, as mais heterogénias/multifacetadas (P Brauer et al., 2015).

O OrlistatTM, por exemplo, aprovado nos anos 90 para a obesidade, está indicado para doentes com IMC acima de 28 Kg/m2, e com outros fatores de risco ou comorbilidades, ou para indivíduos adultos, ou adolescentes, com IMC > 30 kg/m2 que perderam menos de 5 % do seu peso, nos últimos 6 meses, por exemplo, pela intervenção dietética (B Hutton e D Fergusson, 2004 citados por A Wirth et al., 2014). A estrutura química da tetrahidrolipstatina, inibe a ação das lipases no trato digestivo, pela ligação covalente, seletiva e irreversível, ao resíduo 152 da serina, e reduz a

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digestão e absorção das gorduras da dieta (em ≈30 %), favorecendo a sua posterior eliminação (FL Greenway, 2015; SZ Yanovski e JA Yanovski, 2014 e P Hadvary et al., 1991). A ocorrência de transtornos gastro-intestinais e hipovitaminose, são possíveis efeitos secundários, e o simultâneo delineamento dietético importante (SZ Yanovski e JA Yanovski, 2014 e B Hutton e D Fergusson, 2004 citados por A Wirth et al., 2014).

Para indivíduos obesos com t2DM, o uso de miméticos/análogos da GLP-1 (“glucagon-like protein- 1”) e inibidores da SGLT1/2 (“sodium-glucose co-transporter 1/2”), podem ser aconselhados, quando a intervenção comportamental, em particular a intervenção dietética apresenta-se insuficiente, e em situações em que o controlo glicémico é inadequado, e como alternativa aos ADOS que, tal como a insulina, podem promover o aumento de peso (M Monami et al., 2012 citados por A Wirth et al., 2014; F Bonnet e AJ Scheen, 2014 e J Rosenstock et al., 2015). Por exemplo, em relação aos inibidores da SGLT (SGLTi), uma dieta pobre em cloreto de sódio (NaCl), pode contribuir para a diminuição da absorção da glucose via co-transportadores do Na+. Ao alterar, por mecanismos maioritariamente independentes da insulina o metabolismo da glucose, os SGLTi podem favorecer um balanço energético negativo e contribuir para a perda de peso corporal, em conjunto com a melhoria do controlo glicémico, a redução da glucose pós-prandial, e/ou a diminuição da SBP (WT Cefalu e MC Riddle, 2015; M Abdul-Ghani, 2015; M Monami et al., 2012 citados por A Wirth et al., 2014 e F Bonnet e AJ Scheen, 2014). Estudos pré-clínicos, indicam que a inibição da SGLT1 leva ao aumento dos níveis pós-prandiais de GLP-1 e do péptido YY (J Rosenstock et al., 2015), e com os níveis em jejum, da forma ativa do PYY, fortemente associados com a obesidade e a IR/t2DM, e com a associação com a t2DM a mostrar ser independente da adiposidade (expressa pelo IMC), da idade e do género (OH Ukkola et al., 2011).

A GLP-1 é sintetizada, e libertada, principalmente pelas células L da mucosa intestinal, como um derivado pós-translacional do produto do gene da proglucagina, em que a forma maioritária em circulação, e com aumento da atividade biológica, ocorre após clivagem proteolítica dos a.a. no domínio N-terminal (CF Deacon, 2004 citado por A Sheikh, 2013). Em conjunto com as células enteroendócrinas, o sistema nervoso central (SNC) está igualmente envolvido na produção e regulação da atividade da GLP-1 mediada, e.g., pelos recetores da GLP-1 (GLP1R), contribuindo, em doses fisiológicas ou farmacológicas, para um balanço energético negativo (M Shah e A Vella, 2014 e JE Campbell e DJ Drucker, 2013). Os análogos da GLP-1, utilizados, para o tratamento da obesidade, contribuem para o aumento da saciedade (e.g., pela modificação do esvaziamento gástrico), e para a regulação das hormonas do apetite (supressão do apetite pela ativação dos recetores da GLP-1 (GLP1R) no hipotálamo), podendo ser particularmente úteis após a intervenção dietética para a redução do peso corporal (A Astrup et al., 2009 e TA Wadden et al., 2013 citados por FL Greenway, 2015; AS Kelly et al., 2013 e A Sheikh, 2013) e, deste modo, contribuir para a sua manutenção (Figura 1.2).

Á semelhança da GLP-1, a libertação da GIP (“glucose-dependent insulinotropic polypeptide”), é regulada pela ingestão dos alimentos (nutrientes) da dieta, atuando, contudo, sobre as células beta, nos Ilhéus de Langerhans, e estimulando a secreção da insulina (A Sheikh, 2013 e JE Campbell e DJ Drucker, 2013). A GLP-1 e a GIP são as principais hormonas do grupo das incretinas, com efeito pronunciado sobre o metabolismo dos nutrientes. A GIP, é libertada pelas células K no intestino delgado (e.g., no duodeno) e, apesar da sua principal função estar relacionada com o aumento da secreção da insulina mediada pela glucose, parece estar igualmente envolvida no aumento da entrada de lípidos no adipócito, e ao contrário da GLP-1 (A Sheikh, 2013 e JE Campbell e DJ Drucker, 2013). Animais modelo Gipr(-/-) ou [Gipr(-/-),Lep(ob)/Lep(ob)], alimentados com uma dieta rica em gorduras, não desenvolviam obesidade e IR, ou apresentavam um menor aumento de peso e menos adiposidade, na ausência dos recetores da GIP (GIPR), quando comparado com animais Lep(ob)/Lep(ob), respetivamente (K Miyawaki et al., 2002 citados por A Sheikh, 2013).

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Contudo, em humanos, o eventual efeito anabólico da GIP no AT parece estar dependente da presença de hiperinsulinemia e hiperglicemia (M Asmar et al., 2014 citados por LS Hansen et al., 2016). Curiosamente, os animais Gipr(-/-) utilizavam preferencialmente os lípidos como substrato energético (K Miyawaki et al., 2002, Abst).

Os recetores da GIP (GIPR) e da GLP-1 (GLP-1R) pertencem à família dos recetores acoplados à proteína-G, sendo que, pelo menos a via da AMPc/PKA (“adenosina monofosfato cíclica/proteína cinase A), por ação da adenilciclase, está envolvida na secreção de insulina, nas células β, mediada pelos GIPR (A Sheikh, 2013 e JE Campbell e DJ Drucker, 2013).

A expressão dos GIPR, e.g., nas células beta, parece ser regulada pela família dos PPAR, e em particular pelo PPARg; sendo que a diminuição da expressão e/ou o aumento da degradação dos GIPR está associada à hiperglicemia, enquanto que o aumento dos AGL (NEFA, do inglês) em circulação parece estar envolvido na diminuição dos GLP-1R (JE Campbell e DJ Drucker, 2013). Ambas as incretinas sofrem clivagem proteólica no domínio N-terminal pela DPP-4 (“dipeptidyl peptidase-4”), pelo que o seu tempo de vida é relativamente curto e, por exemplo, no caso da GIP, o produto resultante da clivagem pode funcionar como um antagonista do GIPR (A Sheikh, 2013 e LS Hansen et al., 2016).

Os inibidores da DPP-4 (DPP-4i) aumentam a concentração da GLP-1 e da GIP em circulação, contribuindo desta forma para a diminuição dos níveis de glucose, pela capacidade de estimular a secreção de insulina e de inibir a produção endógena de glucose (EGP, do inglês) (M Abdul-Ghani, 2015).

Em relação aos inibidores da metionina aminopeptidase-2 (MetAP2i, “methionine aminopeptidase-2”), em fase de desenvolvimento para uso no tratamento da obesidade (FL Greenway, 2015 e AA Joharapurkar et al., 2014), a sua ação anti-obesogénica decorre da

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