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Turner (1982) uma vez argumentou que as dinâmicas e os fenômenos sociais que o antropólogo encontra durante seu trabalho de campo, embora cheios de cores, formas, odores e sons, e sempre em constante mudança, quando traduzidos para a escrita antropológica tendem a se tornar estáticos, sem vida. Muitas vezes incapaz de traduzir a vi- vacidade, a dramaticidade e a flexibilidade da matéria sobre a qual se debruça, essa escrita antropológica acaba por dar à luz uma narrativa fria, dura e distanciada do encontro de subjetividades do qual se origi- na. Nossa análise, diria Turner (1982), “pressupõe um cadáver”.

Na direção contrária a essa tendência, muitos antropólogos têm experimentado as mídias audiovisuais, acreditando que, se é possível evocar os gestos, as cores e os sons com que se deparam em suas ex- periências de pesquisa e de vida, é possível devolver a carne e o pulso ao esqueleto abstrato a que Turner (1982) faz alusão em sua crítica. é nesse lugar, ou seja, na devolução de um corpo vivo à antropologia, que a articulação entre imagem, som e texto ganha expressão. Os fil- mes etnográficos são, em grande medida, resultado dessa aposta. No entanto, se, por um lado, prolifera o discurso acerca da importância desse gênero na disciplina, por outro, frequentemente se esquece que

tal meio de produção e exposição do conhecimento é, por excelência, de natureza audiovisual, isto é, constitui-se a partir da articulação en- tre som, imagem e texto, e não apenas entre imagem e texto.

Som e imagem definem o nosso entendimento do Outro e da re- alidade representada. O próprio ato de mediar essa realidade se faz por meio de som e imagem. Nesse processo, como já salientado pelo teórico de som Chion (1994) e pelos antropólogos Iversen e Simonsen (2010, p. 10):

O som modifica a imagem, e a imagem modifica o som. Assim, as dimensões visual e aural devem ser analisadas conjuntamente, pois não podem se separar, e não são separadas pelos membros da audi- ência que experimentam som e imagem simultaneamente. Ao sen- tar num auditório para assistir um filme etnográfico, um mundo se projeta e é criado através de sons tanto quanto de imagens, de modo que ambos contribuem para a narrativa, para a feitura deste mundo, e a nossa experiência de assistir uma realidade mediada .

Todavia, o som foi e continua a ser objeto de poucas reflexões na antropologia. O presente texto discute o lugar (negligenciado) do som no filme etnográfico. Partindo da compreensão de que a trilha sonora de um filme é constituída por todo o conjunto de sons que lhe caracte- riza, isto é, música, efeitos sonoros, diálogos e comentários; faço eco à afirmação de outros autores, para quem, salvo algumas exceções que só confirmam a regra, os sons e, em especial os sons não-verbais, raras vezes foram objeto de atenção para a antropologia audiovisual, assim como para a antropologia de um modo geral. (hENLEY, 2010)

Por sons não verbais me refiro aos sons do ambiente natural e humano, os quais formam, nos termos de Schafer (1977), nosso am- biente sônico, ou a paisagem sonora a qual vivenciamos. Através da argumentação presente neste texto, procuro mostrar como a pouca atenção dada à dimensão sonora, não verbal, do filme etnográfico, constitui um reflexo do próprio modo como se concebe, ao longo do século xx, o uso de mídia audiovisual na antropologia. Trazendo para o texto referências diversas, exploro a ideia de que os sons não verbais, uma vez captados e tratados de forma competente, têm por função

contribuir não só para com o aumento da densidade etnográfica dos processos abordados como também para a adição de um caráter mais sensorial à experiência de contato com o filme.

Em termos de organização, após uma caracterização de como a mí- dia audiovisual adentra a cena da pesquisa antropológica, apresento as ideias centrais que norteiam o texto “Seeing, hearing, feeling: sound and the despotism of the eye in ‘visual’ anthropology”, do antropólogo Paul henley (2010), no qual se aponta para a forma como o som é pen- sado no cinema de ficção, em contraste com o cinema documentário e o filme etnográfico. As ideias de henley (2010) são fundamentais para a construção do argumento aqui apresentado, pois o mesmo afirma que se os realizadores de filmes etnográficos dessem tanta atenção à captação e à edição de sons como costumam dar aos problemas de téc- nica, metodologia e estilo no uso da câmera, bem como às teorias de edição de imagens, seria possível realizar filmes com mais qualidade, complexidade e grau de etnograficidade. Partindo da sugestão de hen- ley, discuto a inaudibilidade do som não verbal no filme etnográfico, em seguida, trazendo para o texto exemplos de autores-realizadores que romperam com tal padrão, com filmes em que tais tipos de sons foram sistematicamente organizados a fim de intensificar a textura experiencial e conotativa do espectador.

filme etnográfico: do nascimento ao desenvolvimento

Quem trabalha com antropologia geralmente tem a oportunidade de observar e participar de uma série de acontecimentos centrais para a organização das vidas sobre as quais se debruça, seja no contexto urba- no, rural, local ou transnacional. Os eventos aí observados com frequ- ência acontecem em espaços públicos, onde diversos tipos de audiên- cia e, portanto, diversas práticas discursivas interagem entre si, dando a esses estudiosos a oportunidade de elaborar narrativas etnográficas verdadeiramente ricas. Aqui, penso, por exemplo, na importância que tem, para a pesquisa de muitos etnólogos, a realização das rodas de Toré, dança-ritual bastante difundida entre populações indígenas do nordeste brasileiro; nos momentos de efervescência musical e religio-

sa que afloram nos encontros de comunidades rurais negras e quilom- bolas, presentes em diversos estados da região; nos muitos cortejos, procissões e paradas que se dão durante o calendário festivo de povos do mar, ao longo de toda a costa brasileira; além das festas de povos de terreiros e outras comunidades religiosas. A lista de exemplos poderia se estender ad infinitum. No entanto, interessa-me pensar como essas manifestações, que em sua maioria não se restringem às datas em que se fazem públicas e que articulam em si noções tão vastas e vagas como as de cultura, tradição, identidade, autenticidade, etnicidade e raça, são descritas por aqueles que dentro das ciências sociais se identificam como antropólogos.

Não seria incorreto dizer que impera, nas ciências sociais como um todo, e na antropologia mais especificamente, uma tendência a re- presentar essas manifestações por meio da escrita, onde movimentos corporais, gestos, e, sobretudo, sons (aqui incluindo mas não se limi- tando à palavra falada tanto quanto a cantada) são “re-constituídos” essencialmente pela descrição textual. Trazendo para o cotidiano mais uma vez da etnologia, podemos pensar, por exemplo, que a experiên- cia do engajamento na performance do Toré é frequentemente reduzi- da à descrição por meio do texto, bem como à transcrição das letras de canções e a tentativa de uma definição em torno do ritual. Não raras vezes, contudo, em uma roda de Toré, o texto da canção pode vir a ser o que menos importa. De fato, para evocar e analisar a intensidade dessa experiência, e os significados a ela atribuídos, faz-se necessário dizer, sobretudo, de como os múltiplos sentidos dos participantes e do antropólogo são ativados e se combinam a partir de elementos, tais como o ambiente sonoro do espaço em que tal pratica se dá, o ritmo percussivo, a escala tonal do canto, o contato daqueles que dançam com o solo, o contato destes com os demais corpos, o movimento pró- prio da dança, a ingestão de bebida fermentada, a inalação de odores (de fumo ou incenso, por exemplo) e a escuta de palavras de ordem, para citar apenas alguns elementos. Porque estamos falando de uma experiência que é, por natureza, sensorial, não podemos restringir a tentativa de traduzir sua vivacidade a uma mera descrição dos textos característicos do evento.

é certo que não há nada na linguagem escrita que impeça o an- tropólogo de tentar evocar esse cenário para problematizar e explicar aquilo que estuda. Entretanto, é plausível afirmar que se por um lado não há impedimento de ordem formal, por outro, a depender dos ele- mentos que se deseja abordar, há uma dificuldade muito maior em se realizar tal tarefa somente por meio da escrita. Nesse sentido, faz- -se necessário articular mídia audiovisual e texto, pois é com imagem e som que se pode dar conta de experiências que condensam em si elementos de ordem eminentemente visual, aural, táctil e, portanto, sensorial. Representações por meio da imagem e do som não são fun- damentalmente verbais e, portanto, não se prestam a linhas de racio- cínio da mesma forma que o texto escrito o faz, mas possuem uma qualidade sinestésica que permite ao antropólogo comunicar o senti- do de uma experiência corporal/corporificada, a qual geralmente está para além das possibilidades do texto escrito. (MACDOUGALL, 1998, 2006; MARkS, 2000; PINk, 2007; POSTMA; CRAWFORD, 2006)

Ensaios fotográficos, filmes etnográficos e registros sonoros per- mitem “recriar contextos específicos, dramáticos, em que forças cul- turais e sociais são, em última instância, expressas”. (MACDOUGALL, 1998, p. 262-263) Além da capacidade de evocar as experiências de vida das pessoas com que o antropólogo trabalha, as imagens e os sons da pesquisa trazem à tona as próprias experiências do pesquisador em campo, pois contêm “uma riqueza de associações”, simultaneamente pessoais, históricas e políticas; associações estas que apontam para “indivíduos únicos em consciência e corpo”, isto é, “[...] cada pessoa como distinguível de todas as demais”. (MACDOUGALL, 1998, p. 259)

A consciência acerca das possibilidades trazidas pela mídia audio- visual acompanha toda a história da disciplina antropológica, estan- do presente já na fundação da chamada antropologia moderna, com Alfred haddon e a Expedição de Cambridge ao Estreito de Torres, na Austrália. haddon, um entusiasta da utilização da fotografia no trabalho de campo, levou consigo todo um aparato tecnológico para realização de fotografia (em cor) e filmagem (em película) de danças cerimoniais e registro sonoro de canções em língua nativa. A iniciati- va de haddon, em 1898, não constituiu fato isolado. Mais tarde, em

1914, Edward Curtis realizou uma espécie de etnoficção (para uns, um documentário, para outros, um melodrama) com os índios kwakiutl, no Canadá. Muito embora Curtis não fosse antropólogo de formação, seu trabalho filmográfico e fotográfico serviu, como serve até hoje, de inspiração para a disciplina, sendo considerado de importância tanto para a fotografia quanto para a etnologia.

Em sintonia com tal movimento, em 1922, Flaherty, um explora- dor, vai a campo guiado por proposições que em muito ecoariam às de seu contemporâneo Malinowski, dando à luz o que viria a ser consi- derado o primeiro filme documentário (o primeiro filme etnográfico, a primeira docuficção), ou, quem sabe, a mais conhecida de todas as etnoficções: Nanook, O Esquimó. Se não foi o primeiro registro ou a pri- meira tentativa de contar uma história “não-ficcional”, foi com certeza a primeira experiência de articulação entre antropologia e cinema, re- alidade etnográfica e narrativa audiovisual, ou seja, uma das primeiras tentativas de unir episódios calcados em um mundo histórico e con- venções cinematográficas.

Nos bastidores dessa realização, as notas de Flaherty revelam uma incrível semelhança ao que na mesma época propunha Malinowski, no mesmo ano em que sua obra-prima, Os Argonautas do Pacífico Oci- dental, veio à tona, recheada de fotografias que até hoje nos causam impacto. De fato, tanto quanto a escrita fluída de Malinowski são as fotos de seus interlocutores e dos artefatos envolvidos no kula que permanecem na mente de muitos de seus leitores. A atenção para o detalhe e a proximidade para com a então figura do “nativo” uniu as perspectivas dispostas em Nanook e nos Argonautas. há, por isso, quem considere que as visões de Flaherty e Malinowski, apesar de ancoradas em desejos distintos, não eram tão distintas assim. Ambos romperam, cada qual em seu campo, com modos de proceder na prática cinemato- gráfica e antropológica, lançando mão de uma percepção que, embora mais tarde taxada como romântica e ingênua, mostrava-se original, pois que dotada de uma retórica de humanização do outro, percepção esta, simplesmente inexistente na obra de seus predecessores. (GRI- MShAW, 2001)

Como em uma crescente, iniciativas semelhantes despontariam em diversos lugares, com tecnologias de captação de imagem e som ga- nhando espaço dentro da disciplina. Em 1930, Franz Boas, aos 70 anos de idade, levaria consigo um gravador de som e uma câmera de filmar para o que viria a ser sua última experiência de trabalho de campo com os já mencionados kwakiutl. Na película de 16 mm, ficariam impres- sões de danças, jogos, fabricação de artefatos. Nos cilindros de cera, as vozes e canções de um povo. Boas foi um dos primeiros antropólogos, e talvez o primeiro cientista social, a utilizar a câmera de filmar como parte da sua estratégia de pesquisa, com a clara intenção de gerar da- dos in loco para estudos sobre gesto, movimento e dança. (RUBY, 1980) Uma análise de seu trabalho fotográfico sobre o potlatch, ou sobre a re- lação entre comportamento e formas estéticas e expressivas de cultu- ra, revelam o lugar que os equipamentos de captação de imagem tive- ram em seu trabalho. Por essa razão, alguns advogam; Boas deveria ser considerado um dos pais da chamada antropologia audiovisual, sendo parcialmente responsável por tornar o ato de fotografar e filmar algo normativo na experiência de campo do antropólogo.

Nos anos seguintes, ainda na década de 1930, Margaret Mead, en- tão orientanda de Boas, e seu companheiro, Gregory Bateson, inova- riam na forma como dispunham da fotografia e do filme em seu cam- po. Só em Bali, onde chegaram em 1936, Mead e Bateson produziram 25 mil fotografias e 22 mil metros de filme. Em 1938, quando retor- naram para Nova Guiné, produziram mais 8 mil fotografias e 11 mil metros de filme. Considerando as dificuldades e o alto custo envolvido na produção dessa mídia, pode-se dizer que o esforço de Mead e Ba- teson foi colossal. Mead retornaria a essas imagens nas duas décadas seguintes, a fim de editar o material fílmico em sequências que viriam a ser amplamente conhecidas e utilizadas em salas de aula de todo o mundo. (JACkNIS, 1988) De fato, o trabalho de Mead e Bateson mais conhecido, A Balinese Character, é celebrado como o primeiro projeto em que a fotografia funciona como dispositivo primário de pesquisa, e não apenas como mera ilustração.

Após o experimento de Boas, Mead e Bateson, a maior parte dos antropólogos iria flertar, em algum momento de suas carreiras, com os equipamentos de fotografia, vídeo e captação de áudio.1 A partir

desse momento, a lista de autores e realizadores cujos trabalhos se tor- nariam referência na disciplina se estende de modo significativo.2 Ao

longo de mais de um século, toda uma tradição se estabelece, dando à luz um amplo acervo de ensaios fotográficos, registros fonográficos e filmes etnográficos.

a fantasia realista e a suspeita em torno da imagem e do som

Muito curiosamente, passados 115 anos desde a iniciativa de Alfred haddon, a inserção de mídia audiovisual na pesquisa em antropologia continua a ser pensada como novidade. No contexto mais geral da dis- ciplina, a chamada antropologia “visual”, ou audiovisual (como prefiro nomear), é muitas vezes encarada como uma invenção recente; uma espécie de subdisciplina que ainda está por dizer ao que veio, marginal à tradição hegemônica de produção e exposição do conhecimento an- tropológico por meio da escrita. Em outras palavras, malgrado o tem- po de estabelecimento, uma antropologia que se faz com e a partir da 1 Enquanto escrevo esse texto, me vem à mente uma pilha de discos que ficava guardada na videoteca onde trabalhei durante três anos, que depois descobri se tratar de registros sonoros, possivelmente realizados pelo time de pesquisa de Max Gluckman, durante a primeira metade do século XX, no continente africano. Materiais como esse se acumulam pelos departamentos de antropologia mundo afora, demonstrando que a produção audiovisual no contexto da pes- quisa em antropologia não é pequena, embora quase sempre desconhecida.

2 Em minha experiência como docente, costumo abordar um pouco da história da realização de filmes etnográficos em um curso semestral, o que inclui uma bibliografia e uma filmografia que representam apenas uma diminuta parte do que já se fez, deixando de lado a fotografia etnográfica, as etnografias sonoras e as muitas experiências de articulação entre texto, gravura, colagem, e arquivos sonoros. Dito de outra forma, somente para abordar o debate que se dá em torno da obra de 10-12 grupos de autores (tais como Alfred Haddon, Robert Flaherty, Margaret Mead & Gregory Bateson, Timothy Asch, Asen Balikci, John Marshall, Robert Gardner, Jean Rouch, antropólogos que filmaram monografias clássicas para TV, cineastas indígenas e as representantes de uma antropologia audiovisual feminista), são necessários pelo menos quatro meses, o que indica como a pesquisa nessa área, embora pouco conhecida fora da chamada antropologia audiovisual, é significativa tanto do ponto de vista qualitativo quanto quantitativo. Há autores cuja produção é tão extensa, como no caso do francês Jean Rouch, que simplesmen- te discuti-la demandaria um curso inteiro.

imagem e do som permanece invisível ou inaudível fora de núcleos, festivais e fóruns especializados no assunto.3

Longe de se tornar hegemônica, a prática de utilização de fotogra- fia, vídeo e áudio na antropologia se submete a uma necessidade de “comprovar” e/ou complementar aquilo que é exposto por meio do texto, assim reafirmando sua subordinação à escrita. Mesmo aqueles que não submetem à supremacia do texto acadêmico seu trabalho com imagem e som – produzindo, por exemplo, filmes etnográficos que são autossuficientes (isto é, que não dependem do acompanhamento de monografias ou artigos para serem apreciados), em geral seguem a tendência de relegar ao audiovisual a função de atestar a veracidade e a autenticidade da matéria sobre a qual se debruçam.

De fato, grande parte das iniciativas nesse campo, com raras ex- ceções (Jean Rouch sendo a maior delas, seguido por Robert Gardner e, mais tarde, grupos de cineastas indígenas), aponta para a presença ubíqua de uma espécie de fantasia positivista de captação do real e de uma crença forte no ilusionismo das imagens-e-sons-espelho do mun- do. Tal fantasia é quase sempre acompanhada de um desejo nostálgico de salvaguardar aquilo que está, discursivamente, sempre em vias de se extinguir. Produções como essas apontam, sobretudo, para uma ten- dência à romantização dos sujeitos retratados. Essa romantização, por sua vez, só pode ser efetuada através de uma cuidadosa reconstrução de cenários e situações (como no caso das produções de Alfred haddon, Edward Curtis, Robert Flaherty e John Marshall, para citar apenas al-

3 É interessante perceber como, apesar de haver profissionais atuando na área em diversas regi- ões do mundo e do Brasil, poucos são os departamentos em que se estabeleceram unidades de referência na pesquisa e na docência em antropologia audiovisual. Estudantes em geral de- monstram imenso interesse pelas possibilidades abertas, há mais de um século, por todos aqueles que ousaram inovar em suas pesquisas, articulando imagem, som e texto. No entanto, esses mesmos estudantes têm imensa dificuldade em desenvolver projetos que conjuguem texto e mídias audiovisuais, em parte devido à falta de familiaridade com questões técnicas e conceituais, em parte devido ao fato dessas experiências de formação serem bastante descon- tínuas. Os pesquisadores que, mesmo assim, seguem por esse caminho esbarram em duas situações típicas, que são, na verdade, parte do mesmo problema: a dificuldade de ter seu traba- lho avaliado do ponto de vista formal e a impossibilidade de tê-lo reconhecido como produção acadêmica de fato (seja nos baremas de concurso, em um sistema de padronização de currículo como o Lattes, ou até mesmo em avaliações de natureza mais informal).

guns exemplos).4 Essas produções também demonstram uma certa ne-

gação da autoria do pesquisador-cineasta, como se a explicitação (ou não) de sua presença em campo continuasse a ser parte de um dilema.

Ou seja, ora movidos pelo desejo de gerar dados de pesquisa para