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Eutanásia ativa, passiva e de duplo efeito

2. DELIMITAÇÕES CONCEITUAIS NECESSÁRIAS

2.2. Definição de eutanásia e conceitos derivados

2.2.4. Eutanásia ativa, passiva e de duplo efeito

Quanto ao modo de execução (ao ato em si mesmo), a eutanásia pode ser classificada em ativa (direta e indireta), de duplo efeito e passiva.

Segundo Maria Helena Diniz (2007, p. 323), a eutanásia ativa ou por comissão, também denominada de benemortásia ou sanicídio:

não passa de um homicídio, em que, por piedade, há deliberação de antecipar a morte de doente irreversível ou terminal, a pedido seu ou de seus familiares, ante o fato da incurabilidade de sua moléstia, da

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Debbie era uma mulher de vinte anos de idade, internada em um centro de tratamento oncológico, em fase terminal de câncer de ovário. Durante uma crise de dor o médico residente foi acionado para vê-la. Era a primeira vez que os dois se encontravam. Sonolento e cambaleante – estes são os dois adjetivos que resumem o estado de espírito do residente na narrativa – o médico é recebido por uma mulher destruída pela dor. O único diálogo travado entre os dois resumiu-se a um suplício de Debbie que lhe dizia “doutor, acabe com isso”. Bastou essa frase para que o médico injetasse uma dose excessiva de morfina em Debbie, o suficiente para provocar-lhe a morte imediata. O autor do relato, que assumiu para si a responsabilidade pelo ato, sabia que o medicamento mataria Debbie e justificou o feito em nome do direito de Debbie de deliberar sobre sua própria morte.

insuportabilidade de seu sofrimento e da inutilidade de seu tratamento, empregando-a, em regra, recursos farmacológicos, por ser prática indolor de supressão da vida.

A eutanásia ativa pressupõe uma intervenção direta que provoca a morte do paciente para lograr, desse modo, dar fim aos sofrimentos de sua agonia, que ocorre, por exemplo, quando se lhe ministra uma substância letal. Trata-se de matar outra pessoa com a finalidade de evitar que esta sofra de forma demasiada ou permaneça em condições de vida consideradas indignas, pressupondo ato direto e voluntário de por fim à vida.

Maria Helena Diniz (2007, p. 323-324) cita como exemplos os casos dos Drs. Hackenthal, médico alemão que aplicou uma dose de cianureto em uma enferma incurável de câncer de pele que, após treze operações, estava completamente desfigurada, e Harold Shipman, médico inglês que cumpre prisão perpétua desde 2000 por ter matado 15 senhoras idosas com injeções de heroína (um inquérito apurou que durante os 23 anos de medicina assassinou, na verdade, 215 pacientes seus, havendo forte suspeita de que matou mais 45).24

Dentre as modalidades dessa espécie, podem ser citadas a eutanásia ativa direta – quando se tem por objetivo maior o encurtamento da vida mediante atos positivos – e eutanásia ativa indireta ou de duplo efeito – onde o tempo de vida pode ser reduzido indiretamente através de medicamentos ministrados para aliviar a dor.

Nesse diapasão, fala-se em eutanásia ativa indireta ou de duplo efeito, quando o objetivo principal das ações médicas encontra fundamento no alívio do sofrimento de um paciente, sendo a morte acelerada em razão dos métodos utilizados (efeito indesejado), fato que ocorre, por exemplo, no emprego de uma dose de benzodiazepínico para minimizar a ansiedade e a angústia, gerando,

24 Podem ser elencados diversos casos dessa modalidade de eutanásia, como, por exemplo, o

do fazendeiro canadense Robert Latimer, que foi condenado a dois anos de prisão em 1998 por causar a morte de sua filha Tracy, que sentia fortes dores devido a uma paralisia cerebral; o do francês Vicent Humbert que, em 24 de setembro de 2000, sofreu um acidente automobilístico, ficando tetraplégico, cego e surdo, vindo a falecer em 27 de setembro de 2003, mediante administração de alta dose de barbitúricos através da sonda gástrica, após fracassadas tentativas de se obter autorização para a eutanásia; o da francesa Chantal Sébire que sofria de um raro tumor incurável, estava com o rosto deformado e sentia fortes dores, suicidando-se em 2008, por não ter conseguido autorização para a eutanásia; além do italiano Piergiorgio Welby, que sofria de distrofia muscular, sendo alimentado por tubos, falecendo em dezembro do ano de 2006, mediante desligamento dos aparelhos, após sucessivas negativas para autorização da eutanásia (GOLDIM, 2009).

secundariamente, depressão respiratória e óbito. (SIQUEIRA BATISTA E SCHRAMM, 2004, p. 34).

Ao discorrer sobre a modalidade referida, Osmard Andrade Faria (apud FELIX, 2006, p. 26) denomina-a de agatanásia, já que possui o sentido de “morte consequente ao duplo efeito medicamentoso, administrado o fármaco com a intenção de propiciar alívio ao paciente, mas que acaba por lhe acarretar a morte, não buscada intencionalmente”.

A eutanásia passiva poderia ser definida como a omissão de um tratamento imprescindível ou de qualquer meio que contribua para a prolongação da vida do paciente. Também pode ser abarcado em seu conceito o abandono do tratamento já iniciado, cessando todas e quaisquer ações que tenham por fim prolongar a vida, tudo com a finalidade de evitar interferir em um processo causal de consequências letais. Nesse norte, encontra-se a posição de Laura Lecuona (1997, p. 99):

Es importante no asimilar la distinción entre eutanásia activa y eutanásia pasiva a la distinción entre acción y omisión, pues aunque pudiera encontrar-se algún parentesco entre ellas, no son exactamente equivalentes. Um médico que desconecta el respirador de um paciente, por ejemplo, ciertamente está realizando una acción: está haciendo algo, a saber, retirando un aparato y por lo tanto dando muerte al paciente cuja vida dependía del mismo. Sin embargo, esa acción normalmente se clasificaría como um acto de eutanásia pasiva, puesto que sin el respirador la muerte del paciente sobreviene naturalmente, sin major intervención por parte del médico. Aquí, el médico no da muerte activamente a um paciente, sino que pasivamente le deja morir.

Assim, apesar da divergência doutrinária25, pode-se entender, nos termos da corrente majoritária, encontrar-se também enquadrada no conceito de eutanásia passiva a conduta equivalente ao desligamento dos aparelhos médicos que mantêm as funções vitais do paciente.

2.2.5. Eutanásia, ortotanásia, distanásia, suicídio assistido, tratamentos