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Esta seção trata da análise dos arranjos institucionais ao longo do tempo. O tema tem sido pouco explorado pela ECT, visto que na literatura predominam as análises comparativas de arranjos institucionais discretos para situações estáticas. Assim, configura-se o desafio de manter os fundamentos dessa corrente teórica e adaptar suas ferramentas para a análise dinâmica da coordenação em sistemas produtivos.

Inicialmente, é necessário identificar os tipos de contrato a ser abordados. Por estarem ligados a transações de mercado, os contratos neoclássicos são, por natureza, de curto prazo, não apresentando maior interesse com relação ao tema do presente capítulo. Os contratos de forbearance ocorrem dentro das firmas e têm prazo indefinido, mas o estudo da duração desses arranjos foge ao escopo deste estudo, por envolver outros aspectos organizacionais.

Assim, os contratos de maior interesse são os contratos relacionais, por envolverem transações entre firmas e representarem arranjos institucionais híbridos, nas quais os agentes criam um relacionamento estreito, a especificidade de ativos está presente e existe flexibilidade para adaptações do contrato em resposta a choques externos. Por essas características, existe um interesse mútuo em que a transação perdure no tempo.

As relações entre as estratégias das empresas e a evolução dos arranjos institucionais são tratadas em estudo sobre a organização da distribuição na indústria de refrigerantes norte- americana (MURIS, SCHEFFMAN e SPILLER, 1992). Os autores analisam, sob a ótica da Teoria dos Custos de Transação, a mudança nos canais de distribuição da Coca-Cola e da Pepsi-Cola, que utilizavam engarrafadores independentes e passaram a adotar a integração vertical com subsidiárias. A hipótese formulada é a de que as mudanças no ambiente e nas estratégias das empresas aumentaram os custos de transação com os engarrafadores independentes. O estudo abrange uma primeira etapa qualitativa de levantamento da hipótese, seguida da etapa quantitativa, com dois testes empíricos. O primeiro explora as diferenças entre a Coca-Cola e a Pepsi-Cola, na distribuição do produto para as máquinas de refrigerante. O segundo envolve análises estatísticas dos efeitos competitivos da maior integração vertical nos canais. Os testes suportaram a hipótese considerada.

Ao estudarem as formas de coordenação entre produtores e processadores nos sistemas agroindustriais de suínos e bovinos nos EUA, LAWRENCE e HAYENGA (2002) observam uma significativa mudança das transações a mercado para os contratos de longo prazo ou para a integração vertical, no caso de suínos, enquanto no setor de bovinos predominam ainda o mercado spot e os contratos de curto prazo com processadores. Para os autores, as diferenças

nas formas de coordenação parecem estar relacionadas, no caso dos suínos, com a concentração de escala de produção, e a pequena quantidade de processadores disponíveis na região Sudeste e os maiores investimentos específicos de produtores independentes ou processadores detentores de marcas. Com relação ao setor de bovinos, observa-se uma cadeia produtiva com mais etapas e uma ênfase mais tardia em programas de valorização de marcas. Assim, no volume total de suínos, de 1993 a 2000 a participação percentual das transações a mercado passou de 87% para menos de 2%, a integração por processadores passou de 2% para 18% e os contratos evoluíram de 11% para 60%. Os contratos de suínos apresentam duração de 3 a 10 anos ou renovação perpétua.

Analisando a coordenação vertical da indústria de suínos na Austrália, Gall e Schroder (2002) avaliaram as alternativas e as razões ds escolha dos produtores para o escoamento do produto, a situação atual e as perspectivas sobre o relacionamento com compradores e outros agentes de suporte à atividade. As principais mudanças identificadas nos produtores foram: passagem da comercialização por leilões para a negociação direta com os abatedouros, e mudança da operação independente para um relacionamento mais estreito com os principais compradores, outros produtores e principalmente veterinários e fornecedores de insumos. Os autores observam também que as maiores fontes de vantagem competitiva são provenientes de ganhos de produtividade relacionados à saúde dos animais. Os resultados da pesquisa indicam que o estreitamento das relações com veterinários e fornecedores de insumo gerou maiores impactos na qualidade e nas performances técnicas e financeiras dos produtores do que o relacionamento destes com os principais compradores, que são os processadores.

4 COORDENAÇÃO NA AVICULTURA DE CORTE

4.1 Ambiente Institucional

Ao analisar o sistema LABEL ROUGE da indústria avícola francesa, Menard (1996) aborda de maneira bastante abrangente a influência do ambiente institucional sobre os arranjos institucionais vigentes, que constituem formas híbridas (intermediárias entre as transações de mercado e a integração vertical). Utilizando conceitos da Teoria dos Custos de Transação, o autor levanta questões sobre o processo de coordenação existente, sua eficiência e a coexistência de diferentes estruturas organizacionais. Assim, identifica-se o papel das organizações certificadoras privadas, que estabelecem os padrões de processo e de produto para o uso da marca LABEL, com o suporte de organismos e regulamentos federais, o que reforça o conceito de autoridade para a coordenação das cadeias. Para o autor, trata-se de um tipo de poder concedido e limitado pelos agentes envolvidos, diferente da hierarquia nas firmas, a qual é resultado dos direitos de propriedade.

No Brasil, é possível identificar a influência do ambiente institucional em diversos momentos da história da avicultura. Sua origem em moldes mais comerciais ocorreu nos anos 40, a partir da especialização da colônia de imigrantes japoneses da região de Mogi das Cruzes, no Estado de São Paulo. Temos, neste caso, a cultura e os hábitos de uma comunidade específica condicionando uma atividade econômica. Esse ambiente favoreceu a especialização de agentes independentes em cada etapa do sistema agroindustrial (ração, pintos, engorda e abate).

A introdução, pioneira por uma agroindústria, dos contratos de parceria com produtores no Oeste de Santa Catarina ocorreu no início dos anos 60. A existência de financiamentos governamentais subsidiados para a atividade representou um suporte essencial para a disseminação do modelo. Também contribuiu para o sucesso da atividade na região a uniformidade cultural (imigrantes europeus) e de estrutura fundiária (pequenas unidades de produção) dos produtores, além da proximidade das propriedades. Essas condições

favoreceram a transmissão do pacote tecnológico, o controle do manejo zootécnico e veterinário e a logística de transporte de ração, pintos e frangos para abate.

Outro evento significativo no âmbito institucional formal foi a decisão das autoridades econômicas de permitir a atuação de empresas estrangeiras de genética avícola no Brasil, que passaram a produzir avós e matrizes no país nos anos 60. A iniciativa dificultou o desenvolvimento tecnológico nessa área por empresas brasileiras. Trata-se de um segmento tradicionalmente controlado por algumas empresas multinacionais de grande porte, que inicialmente forneciam seus produtos no mercado e posteriormente estabeleceram contratos com as grandes agroindústrias processadoras do setor.

Em 1995, no auge da crise provocada nos agronegócios pela implementação do Plano Real em 1994, com a sobrevalorização cambial e a abertura comercial, novamente o governo criou um programa de crédito rural específico para os sistemas de parcerias. Por meio desse mecanismo, vigente até hoje, os recursos são alocados pelos bancos às agroindústrias, que os repassam aos produtores parceiros.