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3 O ALCANCE DA RESPONSABILIDADE CIVIL FACE AOS RISCOS DAS

3.2 EVOLUÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL E TEORIA DO RISCO

É sabido que, por muito tempo, prevaleceu o entendimento de responsabilidade fundada na culpa, responsabilidade subjetiva, e isso não quer dizer que seja imutável. A Revolução Industrial teve grande influência no surgimento da teoria da responsabilidade objetiva devido às ocorrências de diversos acidentes de trabalho. A evolução, em termos econômicos, industriais e tecnológicos, concorreu para a ampliação de situações lesivas, em que se mostrava impossível ou extremamente difícil e com precisão do agente causador do dano.214 Observa-se frequentemente, nos casos de acidente do trabalho e aqueles decorrentes de contratos de transportes, atividades ilícitas e socialmente desejadas, que estão revestidas de riscos previsíveis, embora poderiam ser minimizados ou até eliminados.

Buscando se adequar aos novos problemas que surgem na sociedade moderna, alcança-se nova teoria para sustentar o instituto da responsabilidade civil: a da responsabilidade objetiva, para a qual basta a demonstração do nexo causal entre o dano e a atividade perigosa desenvolvida pelo agente, prescindindo do exame de culpa ou dolo, elemento subjetivo do agente.

No ordenamento jurídico brasileiro, especificamente, no art. 927,215 I, do Código Civil de 2002, mostra uma ampliação das hipóteses de responsabilidade por risco, abandonando o critério seguro da previsão legal para preconizar o desenvolvimento da atividade que cria o risco. Esse regime prescinde da existência de culpabilidade e reclama a coexistência do dano, de uma atividade ou conduta e do nexo causal para caracterizar o dever de reparar. Todavia, verifica-se que, no caput do art. 927 do Código Civil, está a regra da responsabilidade civil subjetiva fundada na prática da conduta culposa.

Com efeito, os fatos jurídicos conduzem à análise de dois regimes de tutela civil: de um lado, a regra tradicional da responsabilidade civil subjetiva, fundada no elemento culpa do agente causador do dano e, de outro, a responsabilidade civil objetiva, erigida no risco da atividade com a consequente dispensabilidade da culpa do agente. No entanto, em qualquer

214 MONTENEGRO, Magda. Meio Ambiente e responsabilidade civil. São Paulo: IOB Thomson, 2005, p.27-

28.

215 Art. 927 - Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 9 ago. 2019.

uma das hipóteses de responsabilidade civil, o nexo causal é elemento indispensável para a configuração do dever de reparar.216 À mesma ideia filia-se Montenegro,217 quando diz que:

A obrigação de indenizar é, portanto, imposta pela lei independentemente da prática de qualquer ato ilícito, baseando-se no princípio de que determinadas atividades humanas criam riscos especial para outrem e que o exercício de certos direitos deve implicar no dever de reparar o prejuízo que eventualmente originem, ainda que não resultem de atos ilícitos propriamente ditos. Ocorrer, que, a cisão entre ilicitude e responsabilidade, a qual passa a se relacionar com a criação ou o controle de riscos inseridos no seio da sociedade.

Nesse sentido, Nery Júnior e Nery, citando Varela,218 escreveram que, à primeira vista, a ilicitude da atividade e o dever de indenizar é apenas aparente à conduta lícita, que visa satisfazer um interesse coletivo ou qualificado, mas, ao mesmo tempo, pode não ser justa, respeitando a justiça comutativa ou distributiva. Com a nova leitura da teoria da responsabilidade, que a torna uma lei de criação de riscos, tendo em vista uma percepção clara de que a responsabilidade subjetiva não mais lograva êxito em responder de forma adequada aos riscos e fatos crescentes da sociedade sedenta pela modernidade, com seus danos massivos, o meio jurídico e a sociedade estavam em um embate quanto ao princípio da justiça social.

Trata-se apenas de crise no sistema clássico de reponsabilidade civil, que não consegue mais se enquadrar os novos tipos de risco, perigo e dano dentro dos moldes conhecidos, assim como sua reparação justa e adequada. Tepedino219 assevera que “de fato: a culpa, a velha culpa que tão sobranceira parecia encontrar-se às mutações que a seu lado se iam processando no mundo jurídico, acabou finalmente, também ela, por ser envolvida na maré montante.”

Segundo Cavalieri Filho,220 os juristas franceses já buscavam entendimento e estavam à procura de fundamento para a responsabilidade objetiva. Em consequência, conceberam a chamada doutrina do risco, segundo a qual todo aquele que desenvolve uma atividade perigosa deve assumir os riscos e reparar o dano dela resultante, independentemente de culpa.

216 KOHLER, Graziela de Oliveira. Responsabilidade civil ambiental e estruturas causais: o problema do

nexo causal para o dever de reparar. Curitiba: Juruá, 2011, p. 26-27.

217 MONTENEGRO, op. cit., p. 28.

218 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Responsabilidade Civil, meio ambiente e ação

coletiva ambiental. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. (Coord.). Dano Ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 282.

219 TEPENDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 203.

220 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores,

Através de uma nova visão apresentada pela Carta Constitucional de 1988, nesse aspecto, Cruz destaca que,

[...] a nova realidade social, fundada depois do advento da Constituição Federal de 1988, que tem como princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e a solidariedade social (art. 3º, I) – impõem que hoje a responsabilidade civil tenha por objetivo não mais castigar comportamentos negligentes, senão proteger a vítima do dano injusto. Em busca da reparação mais ampla possível, assistiu-se a um manifesto processo de desculpabilização, com o incremento das hipóteses de responsabilidade objetiva.221

A responsabilidade objetiva, prevista em lei decorrente da atividade de risco, afasta-se da ideia inicial em que pressupostos são a ação222 ou a omissão, o dano, o nexo de causalidade e a culpa. Desse modo, não há como estabelecer a culpa como única comprovação. Foi somente após a Revolução Industrial, que surgiram as primeiras manifestações ordenadas da teoria objetiva ou do risco.223 Teoria essa que afastou o elemento culpa para caracterizar a responsabilidade civil nos casos que envolvem atividades de riscos, porém a análise causal permaneceu sólida aos ditames iniciais.

Dias224 assevera que a culpa e o risco são títulos e modos de responsabilidade civil. A culpa não importa como fonte de responsabilidade, e o risco não pode ser repelido, pois se pode sancionar uma injustiça geradora de responsabilidade civil. Risco, de acordo com Cavalieri Filho,225 é perigo e probabilidade de dano, importando, para isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve assumir os riscos e reparar o dano dela recorrente, ou seja, o problema se resolve na relação de causalidade, independentemente se o causador do dano agiu ou não com culpa.

Seguindo essa linha de pensamento abordaremos a questão da nanotecnologia tecnologia que carrega consigo a necessidade de os seus riscos serem prevenidos e evitados, uma vez que são relativos à própria natureza e porque sofrem alterações caracterizando-se pelas incertezas de suas respostas. A responsabilidade objetiva funda-se no risco, como

221 CRUZ, Gisela Sampaio da. O problema do nexo causal na responsabilidade civil. Rio de Janeiro:

Renovar, 2005, p. 16-17.

222 Cabe esclarecer, rapidamente, que a ação consiste em um facere, conduta humana importante para a produção

do resultado dano. Já a omissão é um non facere que tem relevância para o direito, quando atinge um bem juridicamente relevante.

223 Da teoria do risco surgiram variações, as quais as doutrinas modernas citam como sendo sete modalidades:

proveito, integral, de desenvolvimento, administrativo, criado, profissional, excepcional, entre outros.

224 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1944, p. 18-19.

225 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores,

esclarece Pereira:226 “O conceito de risco que melhor se adapta às condições de vida social é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que gera.” Portanto, não dependem de os danos serem devido à imprudência, à negligência ou à imperícia. Assim, devemos utilizar a responsabilidade civil objetiva como mecanismo de coibição para o plano global econômico. De forma resumida, as várias modalidades de risco surgiram para justificar a teoria objetiva, conforme asseveram Borjes, Gomes e Engelmann:

Risco administrativo, dos entes públicos – artigo 37, §6º, da Constituição Federal; risco criado, atividades geradoras de riscos para as pessoas independentemente da aferição de lucros; risco proveito, aquele que desenvolve atividade perigosa e retira lucros dela, deve arcar com as consequências – ubi emolumentum ibi ônus; risco profissional, dos empregados pelos danos causados por seus empregados, em decorrência da relação de trabalho; risco integral, não admite qualquer tipo de excludente, geralmente aplicado no direito Ambiental; risco do desenvolvimento, aquele que não é conhecido quando o produto é colocado no mercado, mas posteriormente, após sua utilização; teoria do risco excepcional, do qual a responsabilidade civil surge sempre que foge a atividade comum ou normalmente exercida pelo agente.227

A teoria do risco do desenvolvimento deve ser aplicada às nanotecnologias (tópico a ser estudado em capítulo próprio), pois não permite que a ciência tenha conhecimento dos riscos que poderão causar, somente sendo conhecidos posteriormente com o uso e o avanço tecnológico. Com grande perspicácia, Passos sintetiza a essencialidade da aplicação da teoria do risco in verbis:

Os proveitos e vantagens do mundo tecnológico são postos em um dos pratos da balança. No outro, a necessidade de o vitimado, em benefício de todos, poder responsabilizar alguém, em que pese o coletivo da culpa. O desafio é equilibrá-los. Nessas circunstâncias, fala-se em responsabilidade objetiva e elabora-se a teoria do risco, dando-se ênfase à mera relação de causalidade, abstraindo-se, inclusive, tanto a ilicitude do ato quanto a existência de culpa.228

No entendimento de Lopez,229 o ramo do Direito esteve tão desenvolvido, essencialmente depois do Código de 2002, que o incremento da responsabilidade civil começou

226 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 270.

227 BORJES, Isabel Cristina Porto; GOMES Taís Ferraz; ENGELMANN, Wilson. Responsabilidade civil enanotecnologias. São Paulo: Atlas, 2014, p. 51.

228 PASSOS, José Joaquim Calmon de. O imoral nas indenizações por dano moral. Revista Jus Navigandi,

Teresina, ano 7, n. 57, 1º jul. 2002.

229 LOPEZ, Tereza Ancona. Princípio da Precaução e Evolução da Responsabilidade Civil. São Paulo:

no Código de 1990, quando a teoria do risco da atividade tomou impulso pela tipificação da responsabilidade pelo produto e do serviço que colocam em risco e perigo a segurança dos consumidores. Com o acelerar das invenções tecnológicas científicas e com a produção e o consumo em massa, surgiu a responsabilidade pelos riscos.230 No mundo contemporâneo, essencialmente tecnológico e industrializado, o desenvolvimento das possibilidades e dos modos de atuação dos homens multiplicou os riscos e os danos, criando um sentimento de remodelação da responsabilidade civil que inundou muitos doutrinadores, como ensina Moraes:

O sentimento de angústia aprofunda-se diante do descompasso existente entre a velocidade do progresso tecnológico e a lentidão com a qual amadurece a capacidade de organizar, social e juridicamente, os processos que acompanham esse progresso. A todo o momento, de fato, percebe-se a obsolescência das soluções jurídicas para fazer frente a um novo dado técnico ou a uma nova situação conflituosa.231

Portanto, “a necessidade do alargamento da noção de responsabilidade civil para além do elemento culpa, visando atender aos novos anseios de uma sociedade em constante movimento, era premente e defendida.”232 Todavia, a responsabilidade objetiva está ligada ao sentimento de solidariedade, responsabilizando os que tiram proveito dos riscos criados com sua atividade pelo dano causado à vítima, independentemente da culpa.

Lima233 entende que, se os criadores de riscos devido às suas atividades colhem os proveitos ou pelo menos agem para consegui-los, é justo que suportem os encargos, que responsam pelos danos, enfim, que respondam pelos riscos disseminados na sociedade. Assim, não se deve admitir que a falta de justiça faça com que a vítima suporte os azares da atividade alheia. Não resta dúvida quanto à adoção da teoria do risco da atividade (responsabilidade civil pelos danos ambientais), sendo irrelevante a conduta do agente. O próprio risco funciona como pressuposto. A tendência de adoção da responsabilidade objetiva não está somente no Direito Pátrio, mas no Direito Comparado, evidenciando uma socialização dos riscos e desviando o foco do evento danoso para a vítima e para a reparação do dano.

No que diz respeito à matéria ambiental, em que os danos ocorrem em maior proporção, com gravidade normalmente causada por grandes catástrofes geradas por empresas

230 Ibid., p. 58.

231 BODIN DE MORAES, Maria Celina. Na medida da pessoa humana: estudos de direito civil. Rio de

Janeiro: Renovar, 2010, p. 322.

232 BORJES, Isabel Cristina Porto; GOMES Taís Ferraz; ENGELMANN, Wilson. Responsabilidade civil e nanotecnologias. São Paulo: Atlas, 2014, p. 51.

ou mesmo pelo próprio Estado (por empresas estatais), vem impossibilitando a comprovação da culpa concreta do agente causador, o que resulta na aplicação da teoria da responsabilidade objetiva. A transmutação da concepção do instituto da responsabilidade objetiva de uma dívida para crédito de indenização do dano não deve ser somente para a vítima, de forma individualizada, mas deverá ser para a coletividade. É inconteste que a reparação do dano não pode justificar seu desamparo e, portanto, a responsabilidade civil é necessária para garantir a proteção dos danos ao meio ambiente e à saúde humana.

Não menos importante, mas de forma abreviada, mencionaremos sobre a responsabilidade civil do Estado. Compreender o risco sob o olhar da responsabilidade civil do Estado traz o quanto sua interferência se faz presente, muito embora possa ocorrer por ação ou omissão, influente no meio social, tendo um grande potencial de promoção de dano a outrem, o que faz com que seja necessário o estabelecimento de como acontece e de como deve ser encarada essa responsabilidade.

A CF é moldada com o fim de amparar o cidadão e de esclarecer que o posicionamento do Estado sempre deve acontecer de forma a promover a justiça, a igualdade e o equilíbrio social, com o estabelecimento de garantias que tem um poder soberano e que carrega a possibilidade de dar às pessoas proteção aos seus direitos.

A visão de que o Estado ocupa um lugar de administração, no entanto, não pode trazer consigo o entendimento de que ele pode agir de forma arbitrária, mesmo que traga danos às pessoas, já que o dever de reparação é sempre cabível, ainda que o dano seja cometido por ente estatal. Conforme Silva e Siqueira:234 “Esta forma de garantia é denominada de Responsabilidade Civil Extracontratual, e vem para limitar as condutas lesivas, garantindo assim os direitos patrimoniais e extrapatrimoniais dos indivíduos.” As autoras continuam a reflexão trazendo como o Estado responde aos danos que provoca em terceiro:

Apesar de suas peculiaridades, com o Estado não acontece diferente, e este responde de forma objetiva, pois a própria lei dispensa a discussão do elemento culpa com base na teoria do risco, onde caracteriza que a própria atividade desempenhada pelo Estado implica na exposição de bens ao risco, e por este motivo a condenação do Estado independe de culpa, ou seja, serão observados apenas os outros elementos fundamentais para caracterizar a responsabilidade civil, quais sejam conduta, nexo de causalidade e dano/prejuízo. A adoção da Teoria do risco administrativo de certa forma é

234 SIQUEIRA, Giselle; SILVA, Priscilla Monique da. Teoria do risco aplicada à responsabilidade civil do

Estado: risco administrativo ou integral: Perguntas e Respostas sobre Introdução ao Estudo do Direito - Introdução ao Estudo do Direito. Jus.com.br, [s.l.], p. 1-5, 1 nov. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/62476/teoria-do-risco-aplicada-a-responsabilidade-civil-do-Estado-risco-

uma proteção ao cidadão perante o Estado, que por sua supremacia já se presume que em vários aspectos é privilegiado, e quando aplicada a responsabilidade objetiva para o Estado, se iguala os polos, garantindo uma distribuição igualitária dos ônus e encargos, tirando assim o poder público da zona de conforto e garantindo uma prestação de serviço público eficaz para os cidadãos. Apesar disto ainda é possível encontrar situações onde o Estado viola direitos de outrem por sua ação ou omissão, direta ou indireta sem que haja a reparação. Além disto, quando não for possível demonstrar o nexo causal entre a conduta do Estado e o dano causado, recairão as hipóteses de excludentes da responsabilidade civil estatal quando houver culpa exclusiva da vítima, caso fortuito, força maior, ou atos de terceiros.235

Compreende-se, então, que, como a visão do Estado traz prerrogativas protetivas e que o colocam em uma posição de privilégio administrativo e decisivo, trazer para sua interpretação legal a Teoria do risco dá ao cidadão a chance de ter uma resposta justa e promover equilíbrio na relação entre ele e o Estado. A responsabilidade civil repousa, portanto, no entendimento de que sempre que houver atos ilícitos, há a evidente necessidade de se estabelecer uma reparação que atinge diretamente os bens de quem originou a lesão que vitimou o terceiro, sendo uma forma de se estabelecer uma garantia de que a vítima volte ao status que ocupava antes da lesão pelo ressarcimento que terá.

A extensão da compreensão da responsabilidade civil chega então ao panorama do Estado e da responsabilidade que se coloca sobre esse quando causa dano a outrem, já que cabe ao Estado trazer um ressarcimento a quem foi lesado por ação estatal, advinda da administração pública. A responsabilidade civil extracontratual recai ao Estado quando o seu proceder e suas ações causarem lesão a algum indivíduo. O entendimento doutrinário traz à baila que essa responsabilidade é objetiva e compreendida como um risco administrativo. Silva e Siqueira estabeleceram o contexto dessa responsabilidade:

Preferimos a designação responsabilidade civil da Administração Pública ao invés da tradicional responsabilidade civil do Estado, porque, em regra, essa responsabilidade surge de atos da Administração, e não de atos do Estado como entidade Pública. Os atos políticos, em princípio não geram responsabilidade civil, como veremos adiante. Mais próprio, portanto, é falar-se em responsabilidade civil da Administração Pública do que em responsabilidade do Estado, uma vez que é da atividade dos órgãos públicos, e não dos atos de governo, que emerge a obrigação de indenizar.236

235 Ibid., p. 2.

236 SIQUEIRA, Giselle; SILVA, Priscilla Monique da. Teoria do risco aplicada à responsabilidade civil do

Estado: risco administrativo ou integral: Perguntas e Respostas sobre Introdução ao Estudo do Direito - Introdução ao Estudo do Direito. Jus.com.br, [s.l.], p. 1-5, 1 nov. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/62476/teoria-do-risco-aplicada-a-responsabilidade-civil-do-Estado-risco-

A responsabilidade civil do Estado, portanto, não necessita do elemento culpa para que seja configurada. Pela própria natureza da administração pública e, sendo compreendida como objetiva, somente se analisa os elementos de relação entre o dano sofrido pelo indivíduo e o nexo de causalidade com ação do Estado ou a esse concernente. O estabelecimento da não exigência de culpa para que se configure a responsabilidade do Estado, que é considerada como objetiva, também atinge o plano das situações de omissão pelo Estado. Corroborando com o entendimento, Wedy trouxe à baila o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF):

O STF, em seus recentes entendimentos, alterando posição histórica, tem entendido que a responsabilidade do Estado é objetiva, mesmos nos casos de omissão: “RESPONSABILIDADECIVIL OBJETIVA DO PODER

PÚBLICO – ELEMENTOS ESTRUTURAIS –

PRESSUPOSTOSLEGITIMADORES DA INCIDÊNCIA DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA –TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO – MORTE DE INOCENTE CAUSADA POR DISPAROEFETUADO COM ARMA DE FOGO PERTENCENTE À POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO MATOGROSSO DO SUL E MANEJADA POR INTEGRANTE DESSA CORPORAÇÃO – DANOS MORAIS EMATERIAIS – RESSARCIBILIDADE – DOUTRINA – JURISPRUDÊNCIA – RECURSO DE AGRAVOIMPROVIDO – Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damnie o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público,(c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público que tenha, nessa específica condição, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. Precedentes. A ação ou a omissão do Poder Público, quando lesiva aos direitos de qualquer pessoa, induz à responsabilidade civil objetiva do Estado, desde que presentes os pressupostos primários que lhe determinam a obrigação de indenizar os prejuízos que os seus agentes, nessa condição, hajam causado a terceiros. Doutrina. Precedentes. Configuração de todos os pressupostos