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Evolução das políticas internacionais de gestão de resíduos eletroeletrônicos

ENVOLVIDOS 1ª fase Pré-

6. Mesa de separação: para a separação

2.2 Evolução das políticas internacionais de gestão de resíduos eletroeletrônicos

Esta seção discute a evolução das políticas internacionais sobre a gestão de resíduos eletroeletrônicos a fim de se compreender como se dá a relação entre a regulação e o patenteamento de tecnologias de produto e processo sobre o tema.

Para discutir a evolução da regulação sobre reciclagem de resíduos eletroeletrônicos, realizamos um levantamento na base do StEP (Solving The E-waste Problem), o “E-waste World Map” 53. Partimos do Tratado da Convenção da Basiléia, considerado divisor de águas no marco regulatório internacional.

Para que o acordo da Convenção da Basiléia, como também as Diretivas da União Europeia, seja seguido pelos países signatários, é necessário que cada país regulamente as atividades do setor internamente por meio de um quadro regulatório próprio.

A Figura 2.1 apresenta a cronologia dessa evolução, de 1989 a 201054, no mundo. Foram incluídos nesta linha cronológica os países que se destacaram na preocupação com a gestão de resíduos eletroeletrônicos e foram pioneiros na discussão e fixação de legislação sobre esses resíduos. Dentre eles: Suíça (em 1998), Japão (em 1998), União Europeia (em

53 Esta base é alimentada com dados divulgados pelas agências nacionais de cada país membro da Organização das Nações Unidas (ONU - em 2014, somavam-se em 193 os países membros)53, e recebe atualização a cada dois anos. Portanto, pode haver diferença entre os dados utilizados nesta tese – coletados em fevereiro de 2014 (cuja atualização mais recente fora em 2012) e os dados atualmente disponíveis na base. A lista completa dos países membros da ONU pode ser consultada em: <https://nacoesunidas.org/conheca/paises-membros/>. Acesso em: 18 fev. 2016.

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O restante dos dados, com as legislações de cada país membro da ONU em linha cronológica, com o nome do instrumento regulatório (lei, norma, projeto de lei ou proposta) e o status de sua tramitação (proposta, aprovada ou em vigor), está disponível no Apêndice B.

2003), Estado da Califórnia (nos EUA, em 2003), Província de Alberta (no Canadá, em 2004), Alemanha (em 2005) e China (em 2008).

Os marcos regulatórios do Brasil foram inseridos nessa cronologia apenas a título de comparação, sendo que a primeira lei diretamente relacionada ao meio ambiente foi sancionada em 1999 – com a Política Nacional de Educação Ambiental. Entretanto, a gestão dos resíduos sólidos como um todo (dentre os quais se inserem também os resíduos de eletroeletrônicos) só foi contemplada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010. A problemática dos REEE no Brasil será discutida no capítulo quatro.

Figura 2.1: Cronologia das legislações sobre a reciclagem de resíduos eletroeletrônicos de 1989 a 2010.

A Convenção de Basiléia, pioneira na regulação dos REEE por meio de um tratado internacional assinado em 1989, foi concebida para controlar os fluxos transfronteiriços de resíduos perigosos (dentre eles os REEE) entre nações e sua disposição final. A adoção da Convenção ocorreu em meio a uma série de catástrofes ambientais causadas por grandes corporações, como a de 1976 em Seveso, na Lombardia, com o acidente industrial que causou a contaminação por dioxina TCDD (2,3,7,8-tetraclorodibenzo-p-dioxina) de grande parte do território dos municípios limítrofes de Cesano Maderno, Desio e Meda (o acidente ocorreu durante a produção de 2,4,5-triclorofenol, base de um herbicida, fungicida e de produtos químicos intermediários); ou a de 1986, quando do despejo de 14 mil toneladas de cinzas tóxicas na costa do Haiti e no mar pelo navio cargueiro Khian Sea (MARQUES, 2015).

Além destes eventos, a Conferência de Plenipotenciários, ocorrida em Basiléia, na Suíça, em 1989, foi conduzida em resposta ao clamor público após a descoberta, entre os anos de 1987 e 1988, de outro caso sério de depósito irregular de resíduos tóxicos ter ocorrido em Koko Beach, na Nigéria, envolvendo o envio de 18.000 tambores de resíduos perigosos da Itália ao país.

O texto final da Convenção operou, portanto, contra a existência de depósitos de resíduos tóxicos importados do exterior (Figura 2.2) presentes em diversos países em desenvolvimento, como China, Índia, Paquistão, Hong Kong, Vietnã, Senegal, Egito, Costa do Marfim, Gana e Benin (HUISMAN et al., 2012). A Convenção entrou em vigor em maio de 1992 e até maio de 2016 contava com 183 países partes e 53 países signatários, incluindo o Brasil com a ratificação, em 19 de Julho de 1993, pelo Ato 875 (via decreto federal).

Assim, com a legislação mais rigorosa sobre a disposição final de resíduos perigosos nos países industrializados durante a década de 1980, ocorreu um aumento significativo dos custos de descarte criando incentivos financeiros para a exportação dos resíduos para o tratamento e a disposição final.

Figura 2.2: Fluxos de exportação de resíduos tóxicos no mundo (incluindo os resíduos

eletroeletrônicos).

Fonte: Huisman et al. (2012, p. 13).

Por isso, a Convenção de Basiléia passou a regular a disposição destes resíduos por meio da combinação da lista de resíduos perigosos nela definidos (no Anexo VIII da Convenção) e do princípio de notificação prévia de intenções junto de uma autorização de exportação e importação (conforme o artigo 6º, parágrafos 1º, 2º e 4º) (LEPAWSKY; MCNABB, 2010).

Entretanto, o aparente rigor da Convenção não evitou a presença de contradições entre o tratado e as regulações nacionais (LEPAWSKY; MCNABB, 2010; MAZON, 2014). Uma delas reside entre a definição de resíduos perigosos, adotada pela Convenção, e as definições utilizadas nas legislações locais dos países signatários. Outra contradição ainda mais séria diz respeito à permissão de movimentos transfronteiriços de resíduos perigosos quando estes materiais forem destinados declaradamente à reutilização e/ou à recuperação por meio de reciclagem. Esta lacuna gerou o problema da exportação de resíduos impróprios para reuso de forma camuflada, visto que os exportadores declaram que os materiais são para reuso ou reciclagem quando na realidade estão sendo enviados para disposição final.

Para sanar este problema, foi criada, em 1994, a Emenda Basel Ban (“Proibição de Basiléia”) com a intenção de proibir totalmente a exportação de resíduos perigosos destinados à eliminação, recuperação ou reciclagem de materiais recicláveis de países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a países menos desenvolvidos. Esta alteração dividiu as partes signatárias: enquanto alguns países africanos reivindicavam a proibição total das importações e exportações de resíduos, outros países em desenvolvimento preocupavam-se com a perda de receita e de acesso mais barato às matérias- primas. Outros grupos, de interesses industriais, representados pelos países da União Europeia e dos Estados Unidos, também se preocuparam com a perda de receitas que resultaria da proibição do comércio internacional de materiais recicláveis. Consequentemente, a emenda ainda precisa ser ratificada por um número considerável de países para entrar em vigor (LEPAWSKY; MCNABB, 2010).

Paralelamente a diversos eventos catastróficos, a destinação de resíduos perigosos via exportação a países em desenvolvimento e as discussões da Convenção de Basiléia, no início de 1998, a União Europeia colocou em pauta a criação de regulações ambientais para o descarte e reciclagem de equipamentos eletroeletrônicos por meio de duas diretivas específicas: a WEEE (Waste Electrical and Electronic Equipment) e a RoHS (Restriction of Certain Hazardous Substances).

A fim de evitar a geração de resíduos perigosos (incluindo os REEE), a Diretiva 2002/95/CE (RoHS), que entrou em vigor no início de 2003, passou a exigir a substituição de substâncias tóxicas, tais como os metais pesados (chumbo, mercúrio, cádmio e cromo hexavalente), retardadores de chama bromados (bifenilas polibromadas (PBB) e éteres difenil- polibromados (PBDE)) em equipamentos elétricos e eletrônicos novos colocados no mercado a partir de 1º de Julho de 2006 (SCHWARZER et al., 2005).

Por meio da Diretiva n. 65 de 2011 (2011/65/EU), que atualiza a diretiva sobre REEE (Diretiva 2002/96/EC), a comunidade europeia sugeriu a classificação dos EEE em dez categorias55 a fim facilitar a discriminação do potencial de risco de cada classe de produto em função de suas especificidades, como: vida útil, composição por tipo de materiais, porte do equipamento, entre outros requisitos para a categorização (XAVIER; CARVALHO, 2014). A Diretiva WEEE (2002/96/EC) sofreu outra revisão e uma nova versão foi publicada em 2012 (2012/19/EU).

A promulgação conjunta das diretivas, RoHS e WEEE, representa, em termos legais, um avanço na gestão da cadeia produtiva de ciclo fechado de eletroeletrônicos visto que a gestão dos REEE deve ser considerada desde o projeto do produto e a fabricação dos equipamentos até a reciclagem e o reaproveitamento das matérias-primas pela indústria (caracterizado como princípio “cradle to cradle”) (MAZON, 2014).

A característica principal das diretivas gira em torno do princípio da responsabilidade estendida do produtor (EPR), que estipula que produtores, importadores e distribuidores de EEE sejam responsáveis pelo ciclo de vida dos produtos arcando com os custos de coleta seletiva, dentre outras atribuições (conforme conteúdo resumido no Quadro 2.1).

Quadro 2.1: Atribuições do Princípio da Responsabilidade Estendida do Produtor (Diretiva

WEEE 2012/19/EU).