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2.6.5 Resolução em benefício da massa insolvente

2.9 Executoriedade do acordo

Conforme n.º 4 do art. 30º do RERE, o acordo de reestruturação constitui título executivo86 relativamente às obrigações pecuniárias nele assumidas pelo devedor.

O legislador, com esta consagração, integra o acordo de reestruturação no elenco taxativo dos títulos executivos constante no art. 703º, n.º 1 al. d) do CPC, reconhecendo assim a força probatória suficiente ao acordo de modo a que este, em caso de incumprimento, seja documento bastante para a cobrança coerciva do crédito exequendo.

Urgem algumas questões a respeito e vários cenários que tentaremos projetar na prática. Ora, imaginemos que antes da celebração do acordo, se encontra pendente uma execução na qual exequente intervém no acordo e subscreve-o. O acordo começa a produzir efeitos e de acordo com o RERE, a execução, extinguir-se-á. No caso de incumprimento do acordo, o que poderá/deverá fazer o credor que outrora foi exequente mas que agora se mune de um título executivo diverso do título que serviu de base à ação executiva mas que versa sobre o mesmo crédito?

A resposta é complexa.

Sendo a relação cambiária subjacente a mesma, mas fundada em títulos diversos, pensamos que a “chave” reside no momento concreto da execução e no caso concreto. Assim, de modo geral, e de acordo com o RERE, partindo do princípio que a execução se extingue, se o credor com o qual o devedor incumpriu o acordo, intentar nova ação executiva com base no novo título, terá necessariamente na exposição dos factos alegados no requerimento executivo de justificar o motivo pelo qual o montante em dívida é diverso do título executivo

86 Título executivo é o documento que se consubstancia no exteriorizar de uma obrigação entre as partes, que

irá determinar os fins (art. 550º CPC) da ação executiva. Associado ao mesmo está uma presunção de veracidade e força probatória do mesmo, motivos pelos quais os embargos de executado em sede de oposição são tanto mais taxativos, consoante o tipo de título executivo em causa (art. 703º CPC).

Em termos processuais, o acordo de reestruturação seria título executivo por força do art. 703º, n.º 1 al. d) do CPC e consoante o valor da quantia exequenda (valor em dívida apenas referente ao credor exequente e não o valor total em dívida de todos os credores que constam do acordo) a forma de processo seria sumária, se o valor fosse inferior ao dobro da alçada da primeira instância, ou seja, 10.000,00 Euros (art. 550º, n.º 2 al. d) conjugado com o art. 44º da LOSJ) ou assumindo a forma de processo ordinária caso o valor excedesse os 10.000,00 Euros.

No caso do acordo de restruturação fosse homologado nos termos do art. 29º da Proposta de Lei 84/XIII, então independentemente do valor da ação, a forma de processo seria sumária uma vez que ao abrigo do art. 705º do CPC, são equiparados às sentenças do ponto de vista executório, os despachos e quaisquer outras decisões ou atos da autoridade judicial que condenem ao cumprimento de uma obrigação.

53 bem como ter em conta os montantes já recebidos por via do acordo e/ou por via da execução que anteriormente decorria.

Pensamos que, se a possibilidade de renovação da instância fosse permitida conforme os termos do art. 850º do CPC, facilitava em muito o processado dado que o historial do processo já existia, os montantes recebidos/penhorados eram tidos em conta87.

Certo é que, o credor ficaria munido de um outro título executivo que versava sobre a mesma relação cambiária mas que em nada afeta o devedor no caso de execução simultânea ou posterior uma vez que este, em sede de embargos de executado, opunha-se à execução com fundamento no caso julgado (art. 729º, al. f) se o acordo for homologado ou art. 731º do CPC).

Importa ainda referir o panorama da extinção da execução contra o devedor mas com existência de reclamações de créditos na execução, feita por credores públicos que não interferem no acordo de reestruturação em virtude da indisponibilidade dos seus créditos. Se é verdade que a execução extingue contra o devedor, esta poderá prosseguir os seus termos para a venda de bens do devedor, sobre os quais tenham sido reclamados créditos. Esta situação afigura-se algo complexa uma vez que o bem que poderá fazer a diferença na tomada de decisão dos credores no âmbito do RERE, encontra-se penhorado e com as diligências em curso até à venda judicial.

Analisado de forma geral o RERE, será absolutamente crucial a abordagem e compreensão da figura do mediador de recuperação de empresas que desempenhará um papel preponderante na obtenção do acordo de reestruturação, bem como ao potencial impacto que este regime, inserido no contexto socioeconómico atual, possa deter a médio/longo prazo, o que procuraremos descortinar no capítulo seguinte.

87 Na eventualidade de se encontrar um bem penhorado na execução, por exemplo, bem imóvel, e na execução

os credores públicos já tivessem sido citados (art. 786º, n.º 2º CPC) e tivessem vindo reclamar créditos, se após esta fase e antes da venda o credor e o devedor chegassem a acordo por via do RERE, a execução extinguia-se por força do acordo e prosseguia com os credores reclamantes para ressarcimento por via do produto da venda do bem sobre o qual reclamaram créditos. Ora, ainda antes da venda, se o devedor incumprisse o acordo, o anterior exequente e credor, potencial detentor de hipoteca voluntária, não faria sentido iniciar uma nova execução para cobrança coerciva. A possibilidade de renovação da instância quanto a este, mediante requerimento com atualização do valor em dívida, era motivo bastante para não contribuir para a pendência processual e agilizar o processo executivo que prosseguiria com o credor reclamante em relação ao bem que reclamou créditos e com o credor que assume novamente a posição de exequente para cobrança coerciva dos bens do devedor que sejam suscetíveis de penhora.

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3. Estatuto do Mediador de Recuperação de Empresas

A Lei n.º 6/2018, de 22 de fevereiro, estabelece o Estatuto do mediador de recuperação de empresas (doravante designada por Estatuto), cuja análise levaremos a cabo no presente capítulo, pretendendo-se observar o seu papel enquanto profissional no desempenho das suas funções. Sempre que se considerar pertinente teremos em conta a lei geral de mediação (Lei n.º 29/2013).