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3 O ENSINO SUPERIOR EM DISPUTA: OS CAMINHOS DA EXPANSÃO E O PERFIL DISCENTE DA REDE FEDERAL DE ENSINO E DA UFMG

3.5 Expansão e perfil discente da UFMG pós-REUN

A UFMG completou, em 2017, 90 anos de fundação como instituição de ensino superior. A inicialmente denominada Universidade de Minas Gerais (UMG) resultou da unificação de faculdades isoladas já existentes em Belo Horizonte e a sua federalização ocorreu em 1949, sendo denominada UFMG apenas em 1965. Com uma história bem consolidada nas áreas de ensino, pesquisa e extensão, a universidade já possuía um projeto de expansão antes mesmo da publicação do decreto que instituiu o REUNI. De acordo com Coelho (2014), desde 2006 a UFMG já tinha instituído uma comissão que faria uma avaliação da forma como a universidade poderia ampliar suas vagas na graduação e de reformular suas práticas didáticas e curriculares.

Quando o REUNI foi estabelecido em 2007, muitas orientações que constavam no decreto já estavam contidas no relatório apresentado pelo grupo que fez o estudo de expansão da universidade. Assim, em linhas gerais, o projeto de expansão elaborado pela UFMG teve como objetivo aliar a expansão estratégica de matrículas, especialmente noturnas; a criação de novos cursos nos campi já existentes; o desenvolvimento de novas metodologias de ensino e reordenamento dos currículos; o estreitamento das relações entre a graduação e pós- graduação; mobilidade acadêmica; aumento da taxa de conclusão dos cursos e aprimoramento do seu processo seletivo (UFMG, 2008).

No relatório é salientada a importância do projeto expansionista, como pode se observar no documento institucional em que se afirma:

Os valores que o sustentam, a saber, a defesa da expansão estratégica de vagas no sistema federal de ensino superior, o incentivo a novas tecnologias didático-metodológicas, o apoio a medidas capazes de sustentar currículos, ao mesmo tempo, modernizados e qualificados, o incentivo a que formações estritamente disciplinares cedam lugar a percursos curriculares mais diversificados, a compreensão dos laços estreitos que vinculam a graduação e a pós-graduação e, fundamentalmente, os recursos financeiros aportados para sua execução segura constituem uma oportunidade singular para o

avanço na missão histórica das Instituições Federais de Ensino Superior.

(UFMG, 2008, p. 84-85, grifo nosso).

Baseado no estudo dos relatórios de gestão da UFMG, Lima e Machado (2016) declaram que a universidade cumpriu quase que integralmente as metas relativas à sua expansão quantitativa. Por exemplo, citam os autores, a UFMG implantou 27 dos 30 novos cursos previstos, atingiu 96% da meta de aumento de vagas, criou cursos noturnos, adotou o

SISU como processo de seleção35 e, em 2013, aderiu à Lei 12.711/2012, conhecida como Lei de Cotas; além do avanço nas instalações da universidade. Contudo, o projeto de expansão ainda foi insuficiente em relação a várias áreas e ainda apresenta muitos desafios a serem superados, tais como a conclusão de obras, cursos com vagas não preenchidas e os índices de evasão discente.

Lima e Machado (2016) apontam problemas fundamentais que a universidade enfrenta em um contexto pós-Reuni (2008-2012). As questões envolvem a falta de liberação de vagas de servidores; o não preenchimento de vagas disponibilizadas no vestibular, especialmente, dos novos cursos; a evasão estudantil e a necessidade de aumento de verbas para a assistência estudantil, estes últimos diretamente relacionados. Soma-se a estes fatores a falta de uma política de investimento às IFES que, após o REUNI, ficaram com o orçamento defasado em função da demanda que a expansão trouxe, além das obras ainda não concluídas previstas no projeto de expansão.

O impacto da adesão da UFMG ao projeto REUNI provocou modificações importantes tanto quantitativa quanto qualitativamente no cotidiano universitário. Adentrando mais especificamente aos interesses deste trabalho, é importante ter conhecimento de quais impactos teve o perfil acadêmico da instituição em decorrência deste processo, já que, em um contexto mais amplo das IFES brasileiras, as pesquisas citadas anteriormente realizadas pelo FONPRACE, demonstraram uma alteração importante no que se refere às condições socioeconômicas dos discentes. Para analisar os cenários destas mudanças na UFMG, o Setor de Estatística da Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) realizou um levantamento em 2015 sobre o perfil do graduando da instituição36. Estas informações também serviram como subsídio à construção de estratégias não apenas para programas da assistência estudantil, mas também para entender as novas trajetórias acadêmicas do estudante no que se refere à evasão, trancamento e reopção de curso frente às mudanças desde a expansão. A necessidade deste levantamento é justificada pela preocupação apresentada no Relatório de Gestão 2010-2014, que apontou para os efeitos da expansão no âmbito da universidade e os desafios que as mudanças trouxeram ao interior da instituição.

Dos dados proporcionados pelo estudo, são apresentadas a seguir aquelas informações que interessam no que se refere à análise do trabalho, ou seja, o possível público do PNAES.

35 Vale ressaltar que mesmo antes da lei de cotas, a UFMG já tinha implementado o Programa Bônus que concedia 10% a mais na nota dos candidatos egressos de escolas públicas. Este programa vigorou até a implementação da Lei de Cotas.

36 Para conhecer os dados completos da pesquisa, acessar:

Nos gráficos, ressalta-se a importância de termos como referência o período da expansão e o impacto para a mudança do perfil discente da instituição em análise.

GRÁFICO 01. Candidatos aprovados GRÁFICO 02. Cor ou raça no vestibular por tipo de escola declarada pelos candidatos no ensino médio de 2000 a 2014 aprovados de 2003 a 2014

Fonte: UFMG (2015). Fonte: UFMG (2015).

GRÁFICO 03. Renda familiar mensal dos candidatos aprovados 2000-2014

Fonte: UFMG (2015).

Os dados disponibilizados dos processos de seleção até 2015, demonstram que a percentagem de brancos passou de 41,99% em 2011 para 47% em 2015, depois de uma leve baixa entre 2013 e 2014. Negros, pardos e indígenas passaram de 49,1% em 2011 para 43,52% em 2015, com leve alta nos vestibulares de 2013 e 2014. Especificamente entre os

autodeclarados negros, observa-se um movimento de queda nos processos seletivos que, em 2011 representou 10,44%, 2012 de 10%, 9,85% em 2013, caindo para 6,55% em 2014 e, em 2015, para 6,59% (UFMG, 2015). A tendência de leve alta entre os anos 2013 e 2014 de estratos sociais sub-representados no âmbito da universidade também foram identificados nos egressos de escolas públicas e com renda per capita de até 5 salários mínimos.

É fato que 2008 foi o marco do início da alteração do perfil do ingresso da UFMG, quando a universidade adotou o Programa Bônus que concedia um incentivo aos estudantes egressos de escola pública no processo de seleção. Esta diversificação ficou em ascensão na universidade após a adesão do ENEM como parte do vestibular, posteriormente ao SISU e, por último, à adesão à Lei de Cotas. Aliados à estas mudanças observam-se os impactos dos anos de recebimento de recursos pelo REUNI e aumento de vagas na universidade. Assim, acredita-se que estes fatores podem ser algumas das hipóteses que justifiquem os números apresentados pelo estudo da PROGRAD.

Observa-se nos quadros que, a partir de 2013, quando os números de egressos de escola pública chegam muito próximos aos da escola particular e negros se igualam aos declarados brancos, inicia uma tendência regressiva da representação destes grupos entre os aprovados. A mesma trajetória é observada entre os estudantes com renda mensal de até 5 salários mínimos. O ano de 2013 marca o fim do recebimento dos recursos do REUNI e a falta de uma política permanente de investimento às IFES. No mesmo ano, o PNAES apresenta seu mais baixo nível de investimento. Contudo, os grupos que ingressaram nas instituições de ensino necessitam permanecer e concluir seus cursos, e este torna-se o maior desafio das IFES. Como lidar com as consequências da expansão sem uma política de financiamento estável? Aos objetivos deste trabalho, surgiram indagações sobre como lidar com estes grupos que acessaram a universidade e agora precisam se manter para concluírem seus estudos. Ao se considerar que a democratização só é efetivada quando, qualitativamente falando, forem garantidas todas as fases pós acesso ao nível de ensino, é preciso analisar quais mecanismos garantirão a plenitude destes estudantes durante seu curso.

4 AS INTERFACES ENTRE A ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL E A ASSISTÊNCIA