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A cidade de Salvador, desde a sua fundação, apresentou um processo de diferenciação por classes sociais na ocupação de seus espaços. No decorrer de sua expansão, com a incorporação de novas áreas ao espaço urbano, iam-se desenhando novas territorialidades com limites bem marcados entre áreas ocupadas por populações de classes de renda mais altas e outras ocupadas por classes de renda inferior. Ademais, a segregação social no município vem tomando novas formas ao longo do seu processo de expansão urbana, tendo como principais atores envolvidos o poder público, através das políticas públicas de ocupação e ordenamento do solo urbano, o poder econômico, representado principalmente pelo capital imobiliário, e a população envolvida. Destarte, para um melhor entendimento do quadro atual de segregação socioespacial em território metropolitano, faz-se necessário uma breve revisão acerca do seu processo de expansão urbana, da atuação do mercado imobiliário e das políticas públicas.

2.3.1 Expansão urbana em Salvador no decorrer do século XX

O estudo da expansão urbana de determinado bairro de uma cidade só pode ser mais bem compreendido com o estudo da dinâmica urbana do contexto no qual está inserido, ou seja, da cidade e de sua dinâmica. A cidade de Salvador apresentou um crescimento vertiginoso nas últimas décadas, sendo que um dos principais fatores que contribuíram para isso foi a migração de habitantes do interior do Estado para a capital.

Antes do século XX, a cidade apresentou um crescimento lento e gradual, como pode ser observado na Figura 2.1. A cidade basicamente se restringia ao centro antigo, a partir do qual apresentava alguma expansão para as demais zonas do município. Nos séculos XVII e XVIII, a cidade possuía o principal porto do Atlântico Sul, conforme Andrade e Brandão

(2009), por onde escoava os produtos de subsistência – cana-de-açúcar e fumo do Recôncavo Baiano – estando articulada com as rotas mundiais de comércio. Nesse período houve expansão e embelezamento da cidade que atingia a península de Itapagipe, com fazendas e engenhos interiores, como exemplos em Brotas e na Federação.

Na segunda metade do século XVIII e no decorrer do XIX, Salvador passou por um período de decadência econômica, marcada, principalmente, por quatro elementos: transferência estratégica da capital para o Rio de Janeiro em 1963; forte concorrência externa, principalmente do Caribe, na produção do açúcar mundial; concorrência interna com a expansão do ciclo do café no Paraná e São Paulo; e o estabelecimento, paulatino, das leis que conduziram ao fim do tráfico negreiro em 1850 e a abolição da escravatura em 1888. Apesar da retração política e econômica, houve a implantação do sistema de transporte urbano sobre trilhos, a modernização e eletrificação de ascensores e expansão da cidade sobre o mar com o aterro do comércio ao final do século XIX (ANDRADE; BRANDÃO, 2009).

No século XX, a expansão urbana da cidade de Salvador é marcada por dois processos, conforme cita Vieira Junior (2007). O primeiro deles foi a intervenção na malha urbana existente, na primeira metade do século, seguindo o modelo da reforma urbana da capital federal de então, o Rio de Janeiro (1902-1906), que por sua vez seguiu o modelo das reformas do Barão de Haussmann em Paris. O outro processo, tendo se verificado na segunda metade do século, foi marcado pela expansão da malha urbana para as terras ainda desabitadas do território municipal, seguindo o modelo urbanizador americano com a abertura das park-ways, caracterizada pelo aproveitamento das linhas de fundo de vale e o paisagismo das vias, como as construídas no final da década de 1960, com o intuito de melhorar a circulação.

Na segunda metade do século XX, a imigração contribui decisivamente para as elevadas taxas de crescimento demográfico da população de Salvador. Os fatores principais que contribuíram para isso foram a crise agrícola na área de influência da capital, principalmente no Recôncavo Baiano, e a industrialização da cidade e de sua região metropolitana, principalmente após a descoberta do petróleo na baía de Todos os Santos na década de 1950. Com o incremento da atividade industrial na década de 1950, com a implantação da Petrobrás (1953), do Centro Industrial de Aratu (CIA) em 1967 e do Complexo Petroquímico em Camaçari (COPEC) em 1976, a cidade apresentou um crescimento vertiginoso, ocupando terras antes desabitadas do território, conforme pode ser observado na Figura 2.1. As indústrias atraíram fluxos migratórios e a cidade se expandiu para o interior da península e ao longo da orla atlântica. Segundo Andrade e Brandão (2009), houve uma densa e abrupta

ocupação do espaço urbano no período de três a quatro décadas, produzindo diversos problemas socioambientais como a periferização e a ocupação ilegal do solo.

A crescente oferta de emprego não absorvia o contingente de mão-de-obra existente, que crescia a um ritmo bem mais acelerado. Em decorrência disso, aumentaram-se os subempregos e as ocupações informais na cidade, a exemplo da expansão de invasões como Alagados. A infraestrutura da cidade não atendia à crescente demanda populacional, gerando espaços desiguais, uns privilegiados com equipamentos urbanos adequados, enquanto outros de certa forma “abandonados” e “esquecidos” pelo processo de urbanização em curso. Dessa forma, criavam-se espaços segregados socialmente, com limites bem demarcados na paisagem.

Salvador apresentou um descompasso muito grande entre o aumento de sua população e a oferta de serviços e infraestrutura urbana. Para se ter uma ideia do ritmo de crescimento da cidade, basta analisar sua população em meados do século XX para o início do século XXI, representado na Gráfico 2.1. De acordo com dados do IBGE, em 1940, a cidade possuía 290.443 habitantes. Em apenas trinta anos, a população absoluta ultrapassou a marca dos um milhão de habitantes, e, em mais vinte anos, ultrapassou a marca dos dois milhões, possuindo uma população atual de 2.675.656 habitantes de acordo com o último censo demográfico.

Gráfico 2.1 - Evolução da população absoluta em Salvador de 1940 a 2010

No final do século XX, a população de Salvador já ultrapassava a cifra dos dois milhões de habitantes, sendo a terceira maior cidade do país em população. Ela entrou no século XXI marcada pela existência de várias centralidades, diferente de como era nos séculos anteriores ao XX quando existia um único centro. Novas dinâmicas econômicas na cidade fizeram com que surgissem novos centros de negócios, comércio e serviços, a exemplo da região do Iguatemi, configurando-se como uma cidade polinuclear. Novos vetores de expansão da cidade foram surgindo, atraindo o capital imobiliário, como é exemplo a Av. Luís Viana (Av. Paralela).

O processo de urbanização de Salvador, assim como em outras metrópoles brasileiras, foi caracterizado pela geração de desigualdades sociais bem demarcadas na paisagem. Enquanto existem bairros na cidade com uma boa infraestrutura de serviços e equipamentos urbanos, a exemplo da maior parte do bairro da Pituba, existem outros desprovidos de infraestrutura adequada e serviços básicos que garantam a sua população melhores condições de vida, como é exemplo boa parte do bairro de Alto de Coutos.

Como o espaço encontra-se em contínua mudança, ocorrem também melhorias na infraestrutura urbana em espaços antes esquecidos, todavia, isso não atinge a área como um todo e normalmente tais melhorias são motivadas por aspectos econômicos e não sociais, como, por exemplo, por interesse do mercado imobiliário. Isso vem ocorrendo de certa forma em Canabrava, entretanto sem beneficiar grande parte da comunidade carente que já habita a área. Nessa questão, tem papel fundamental também a atuação do poder público, através de suas políticas urbanas. Diante disso, o mercado imobiliário e as políticas públicas são questões que devem ser abordadas no estudo da expansão urbana e da segregação socioespacial. Apresenta-se, então, uma breve discussão sobre tais questões na seção a seguir.

2.3.2 Políticas públicas e atuação do mercado imobiliário

A configuração espacial das ocupações por classes de renda dentro dos territórios urbanos está intimamente relacionada às políticas públicas e à atuação do mercado imobiliário. As políticas públicas relacionam-se, principalmente, às políticas de cunho habitacional e de infraestrutura urbana. O poder público atua, nesse sentido, principalmente, na definição de normas e leis urbanísticas de uso e ocupação do solo urbano e na implantação de programas de financiamento de unidades ou conjuntos habitacionais. Conforme aponta Rolnik apud Azevedo (2007)

Ao definir formas de apropriação e utilização do espaço permitidas ou proibidas no contexto de uma economia de mercado extremamente hierarquizada e marcada por profundas desigualdades de renda, a legislação urbana brasileira termina por separar a „cidade legal‟ – ocupada pelas classes médias, grupos de alta renda e apenas por parte dos setores populares – da „cidade ilegal‟ destinada à maior parte das classes de baixa renda. Assim, a legislação acaba por definir territórios dentro e fora da lei, ou seja, configura regiões de plena cidadania e regiões de cidadania limitada. (ROLNIK, 1997 apud AZEVEDO, 2007, p. 14)

Nos últimos anos, conforme Azevedo (2007), a maioria das construções habitacionais no Brasil não contou com linhas de crédito governamentais, sendo que a autoconstrução foi o que predominou no sistema construtivo. As políticas públicas urbanas, na área habitacional, voltaram-se mais para o financiamento de moradia para classes de renda média a alta e para construção de conjuntos habitacionais para as classes de renda mais baixa. No nível nacional, destaca-se a atuação do Banco Nacional de Habitação (BNH) que, por ter controle sobre recursos críticos, couberam-lhe, na prática, a definição e a implantação concreta da política urbana e habitacional (AZEVEDO, 2007).

Com a extinção do BNH em 1986 e sua incorporação à Caixa Econômica Federal, a questão urbana, com destaque para a habitacional, passou a depender de uma instituição em que esses temas, embora importantes, fossem objetivos setoriais. Diante disso, dentre outras questões, tornou-se difícil dinamizar programas alternativos voltados para os setores de menor renda e que exigem elevado grau de subsídios, envolvimento institucional e desenvolvimento de pesquisas. A Caixa Econômica Federal passou a ser o carro-chefe da política habitacional vinculada ao Sistema Financeiro da Habitação (SFH). O financiamento de casas populares, voltados para a população de menor renda, foi delegado às Companhias Habitacionais (Cohab), as quais foram transformadas de agentes promotores a simples órgãos assessores, diminuindo seu poder e impactando na diminuição do financiamento da construção de casas

populares3 (AZEVEDO, 2007).

A política habitacional, nos anos 1990, foi marcada no início por pouca inovação em relação à década anterior, conforme aponta Azevedo (2007). Houve algumas inovações na década seguinte. Em consulta a este autor, podemos destacar os principais fatos ou medidas que marcaram essa política, no nível federal, nas décadas de 1990 e 2000, a seguir:

a) Plano de Ação Imediata para a Habitação (Paih)4, em maio de 1990 (Governo Collor);

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Conforme CAIXA (2000) apud Azevedo (2007), no primeiro ano após a extinção do BNH, 1987, as Cohab’s financiaram 113.389 casas populares. Já durante o primeiro semestre de 1988, esse número caiu para 30.646 unidades devido às mudanças da política habitacional a partir da Resolução 1464 (26/02/1988), do Conselho Monetário Nacional (CMN), e normas posteriores.

4 Plano de caráter emergencial, com três vertentes: “programa de moradias populares” (unidades acabadas),

“programas de lotes urbanizados” (com ou sem cesta básica de materiais) e “programa de ação municipal para habitação popular” (unidades acabadas e lotes urbanizados).

b) Progama Habitar Brasil (municípios de mais de 50 mil habitantes) e Morar Município (municípios de menor porte) (Governo Itamar Franco);

c) no Governo FHC, passa-se a discutir a questão habitacional de forma integrada à política urbana e à política de saneamento ambiental, através da Secretaria de Política Urbana;

d) Programa de Conclusão de Empreendimentos Habitacionais (primeira administração do Governo FHC), Programas de Crédito Direto ao Cidadão, denominados Cred-Mac e Cred-Casa, voltados para famílias com renda mensal de até oito salários mínimos;

e) Pró-Moradia e Programa Habitar Brasil5, voltados para o poder público (estados e

municípios) e financiados, respectivamente, com recursos do FGTS e do Orçamento Geral da União (OGU);

f) Programa de Arrendamento Residencial (PAR), voltado para a faixa de renda familiar mensal entre quatro e seis salários mínimos;

g) Programa Carta de Crédito, que utiliza recursos do FGTS e das cadernetas de poupança, com destaque para os setores médios, renda familiar de até 12 salários mínimos;

h) Programa de Financiamento à Produção e ao Crédito Individual, voltado para apoiar a indústria da construção civil na produção de projetos habitacionais destinados à parcela da população de renda média e alta que opte por um contrato de financiamento vinculado ao imóvel;

i) criação do Sistema Financeiro Imobiliário (SFI)6, aprovado através da Lei Federal

9.512/97;

j) criação do Ministério das Cidades (Governo Lula), com a aproximação institucional da política urbana (lato sensu), habitacional, de saneamento e de transporte, com características de políticas regulatórias centralizadas, buscando envolver as três esferas de governo;

k) instituição do novo Sistema Nacional de Habitação, com inclusão do mercado privado e a habitação de interesse social – Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social

5

Seus principais objetivos seriam a urbanização de áreas degradadas para fins habitacionais, a regularização fundiária e a produção de lotes urbanizados.

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Inspirado na experiência norte-americana, o SFI opera exclusivamente com recursos da iniciativa privada nacional e internacional.

(FNHIS) e o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), previstos na Lei Federal 11.124/2005;

l) realização da Conferencia Nacional das Cidades (2003) que definiu as diretrizes e prioridades da Política Urbana brasileira.

O principal marco em termos de políticas públicas urbanas foi a instituição da lei 10.257/2001, denominada de Estatuto da Cidade. Esta lei determina objetivos e diretrizes gerais a serem observados pelas políticas públicas urbanas, instituindo os instrumentos dessa política. Essa lei determina também a obrigatoriedade do plano diretor para as cidades

integrantes de regiões metropolitanas, dentre outros casos previstos em lei7, que estão

obrigados a elaborar seus planos diretores até outubro de 2006. Este plano é tido como o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.

A atuação das políticas públicas urbanas em Salvador e na sua região metropolitana sofreu influências diretas do contexto nacional, com algumas especificidades, e dos acontecimentos que se processavam no estado da Bahia. Após apresentar certa estagnação no início do século XX, a situação da Bahia e de Salvador começou a mudar entre as décadas de 1940 a 1950, tendo sido importante nesse sentido iniciativas estatais, tais como a construção da usina hidrelétrica de Paulo Afonso, a implantação das atividades de extração e refino do petróleo no Recôncavo, a construção da ligação rodoviária Rio-Bahia (BR-116) e a criação do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), conforme apontam Cunha e Pedreira (2008). Esses acontecimentos foram decisivos na atuação das políticas públicas urbanas na RMS.

Entre 1960 e 1980, houve um incremento nos gastos públicos com grandes obras de infraestrutura no estado, tais como construção de estradas, pontes, barragens, abastecimento de água, saneamento e avenidas. No mesmo período em Salvador, ocorreram a expansão da construção civil e a valorização da terra urbana nos novos bairros de classe média,

7

A Lei 10.257/2001, em seu art.41, determina que o plano diretor é obrigatório para as seguintes cidades: “I – com mais de vinte mil habitantes; II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no §4o do art. 182 da Constituição Federal; IV - integrantes de áreas de especial interesse turístico; V - inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional; VI - incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos.”

impulsionadas pela criação do SFH, assim como a expansão dos serviços imobiliários. Outro fato importante foi a criação da estatal Bahiatursa (Empresa de Turismo da Bahia), em 1968, num contexto de inserção da cidade no mapa do turismo nacional com o desenvolvimento do transporte aeroviário no país e o asfaltamento da estrada Rio-Bahia (em 1963). Este último junto com a implantação da malha rodoviária no Recôncavo e os investimentos nas fábricas do CIA e do COPEC desarticularam as antigas redes de transporte regionais, de base ferroviária e flúvio-marítima (CUNHA; PEDREIRA, 2008). Como um dos últimos acontecimentos desse período em termos de políticas públicas, destaca-se a criação da RMS em 1973 que

[...] passou a ser o lugar privilegiado da intervenção governamental, com o Conselho de Desenvolvimento do Recôncavo, criado em 1967, transformado em Companhia de Desenvolvimento da RMS, com a mesma sigla – CONDER – não antes de produzir o primeiro Plano de Desenvolvimento Integrado da nova região. Conseqüência simétrica e indesejada desse processo foi o abandono do Recôncavo e da BTS [Baía de Todos os Santos] como espaços de planejamento e de investimento público e privado. A capital da Bahia „deu as costas‟ ao seu litoral tradicional e seus governantes só se deram conta do erro quando, a partir dos anos de 1990, a necessidade de combater a poluição na baía e a importância da Bahia (sic) de Todos os Santos para a náutica de lazer e para o turismo de base ecológica e cultural ficaram evidentes. (CUNHA; PEDREIRA, 2008, p.29-30)

A atuação das políticas públicas urbanas na capital baiana e na sua região metropolitana esteve intimamente relacionada aos interesses do grande capital imobiliário local, assim como nas demais metrópoles brasileiras. O abandono do antigo centro da cidade e a migração de organizações públicas e privadas para o novo polo intra-urbano de serviços foi resultado da articulação do governo estatal com o capital imobiliário local, conforme aponta Cunha e Pedreira (2008). Esses autores citam exemplos dessas ações, que se iniciaram entre o final da década de 1960 e início da seguinte, tais como:

a) abertura de novas avenidas de ligação do eixo Sul-Norte, que ligasse espaços ainda vazios (apropriados por empresas imobiliárias) ao aeroporto e aos novos bairros residenciais destinados às novas classes médias;

b) implantação do Centro Administrativo da Bahia (CAB), novo núcleo administrativo, sobre o corredor principal do novo eixo que é a Av. Paralela;

c) implantação de equipamentos estratégicos no coração do futuro Central Business District (CBD), hoje atual região do Iguatemi, sendo eles a nova estação rodoviária,

um grande shopping Center regional, o primeiro hipermercado da capital e alguns dos primeiros prédios de escritórios.

Acompanhando esse processo, os investimentos públicos estavam voltados para áreas de interesse do grande capital imobiliário. Essas áreas, em especial a orla atlântica, tiveram investimentos em infraestrutura, nas áreas de lazer, esporte e cultura, atraindo os empreendimentos turísticos, condomínios fechados e shopping centers (PORTO; CARVALHO, 2001 apud CUNHA; PEDREIRA, 2008). No campo do cenário político da capital, destaca-se também a promulgação da Lei da Reforma Urbana (1968), através da qual a Prefeitura de Salvador, que detinha a maioria das terras do município, transferiu sua propriedade para poucas mãos privadas, consoante uma modernização excludente e alinhada com os interesses do capital imobiliário. Além disso, o governo municipal erradicou invasões populares localizadas na orla marítima atlântica, área de interesse do capital imobiliário, e, com a abertura das avenidas de vale, um conjunto significativo de assentamentos de população pobre foi retirada das áreas urbanas mais valorizadas (CUNHA; PEREIRA, 2008). Um exemplo deste último caso foi o que aconteceu na abertura da Av. Vasco da Gama, no qual parte da população pobre foi remanejada para a região do miolo, na área hoje conhecida como Canabrava.

Mais recentemente, o governo estadual e os municipais têm atuado na concessão de incentivos fiscais com o intuito de atrair novas indústrias e incrementar a atividade turística. Nesse sentido, existiram dois determinantes preferenciais de intervenção e de impacto metropolitano. Um esteve ligado à dinamização e expansão do polo industrial, com a instalação do complexo automobilístico da Ford Nordeste e de outros empreendimentos. O outro determinante esteve direcionado para o centro histórico e o litoral norte, com a ampliação e diversificação de ações relacionadas ao turismo, empreendidas a partir da década de 1990, através da construção de grandes complexos hoteleiros e de projetos de requalificação urbana na área formal da cidade, com a exploração de áreas públicas, a privatização de praias e dos serviços urbanos e a instalação de pedágios nos principais acessos à cidade formal valorizada (CUNHA; PEREIRA, 2008).

O que se nota no caso de Salvador é o estreito alinhamento das políticas públicas aos interesses privados, em detrimento dos interesses coletivos das populações envolvidas. Isso se tornou explícito na discussão e aprovação dos PDDU‟s de Salvador, tanto em 2004 quanto em