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3. DESESCOLARIZAÇÃO: ROMPENDO COM A LÓGICA DA

3.2 EXPERIÊNCIA

“A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo,

quase nada nos acontece.” Jorge Larrosa

Espaço e tempo, duas palavras, duas dimensões da vida, que acontecem na vida; através desses dois aspectos podemos conhecer muito sobre uma cultura, que

no mando do poder são as primeiras a serem controladas. Como vimos no início desse trabalho, a estratégia de dominação das missões jesuíticas foi perceber a maneira que as pessoas nativas do Brasil, lidavam com o tempo e com o espaço, e assim traçar seu projeto de colonização, de controlar o tempo e delimitar o espaço, segundo seus interesses de poder, herança que a escola carrega até os dias atuais.

Com o nosso tempo e espaço colonizado, qual seria então uma estratégia de descolonizá-los? Pensando que nossos corpos são constituídos e/ou carregam cicatrizes dessa perspectiva de viver nesse tempo e nesse espaço, nos arriscamos aqui pensar, que o rompimento perpassa a negação desse tempo e desse espaço, considerando a experiência como sendo esse propulsor de transgressão da ordem colonial.

Para construir uma reflexão em relação a experiência, chamamos Larrosa (2002) para essa conversa, apresentado algumas de suas ideias, primeiramente sobre o que destrói a experiência. Dentre as que ele aponta, apresentaremos três questões que fazem com que a experiência se torne cada vez mais rara, por excesso de: informação; opinião e por falta de tempo.

A experiência e o excesso de informação: antes de tudo, é importante separar a palavra experiência da informação, pois estamos rodeadas de informações, ou então imersas numa sociedade de informação, sabemos de muitas coisas, nos cobram também ficar atualizadas das informações, das notícias e acabamos ocupando o tempo em saber as coisas, o que nos distancia do viver o tempo presente, “[...] uma sociedade constituída sob o signo da informação é uma sociedade na qual a experiência é impossível.” (p.22), o que ele afirma ser uma demanda da sociedade contemporânea em formar seres informantes e informados.

A experiência e o excesso de opinião: Larrosa aponta para a imposição que introjetamos em ter que possuir sempre uma opinião sobre todas as coisas, as informações, “Depois da informação, vem a opinião. No entanto, a obsessão pela opinião também anula nossas possibilidades de experiência, também faz com que nada nos aconteça.” Lembrando que experiência é aquilo que nos toca, o que nos acontece, o que para nós, nos dá a sensação de que se fala de um corpo, que vive e sente e que é tocado pelo que vive. “O periodismo é a fabricação da informação e a fabricação da opinião. […] quando ocupam todo espaço do acontecer, então o sujeito individual não é outra coisa que o suporte informado da opinião individual, e o sujeito coletivo […] não é outra coisa que o suporte informado da opinião pública.”

(p.22)

A experiência e a falta de tempo: além de estar informado e opinar sobre o indivíduo “[...] também é um consumidor voraz e insaciável de notícias, de novidades, um curioso impenitente, eternamente insatisfeito.”(p.23), sendo que essa velocidade de se ter e querer, causa a falta e incapacidade do silêncio e da memória (sendo que ela é substituída por outro acontecimento que logo se vai sem deixar rastro). Um ser que “[...] usa o tempo como um valor ou como uma mercadoria”, não se pode perder tempo, tudo é muito rápido, “E na escola o currículo se organiza em pacotes cada vez mais numerosos e cada vez mais curtos. Com isso, também em educação estamos sempre acelerados e nada acontece.” (idem). Acrescentamos que, também não há tempo para o ócio, o tempo livre, aspecto este tão importante para nos conectar a nós mesmas/os, aos nossos desejos, ao acontecer, o que nesse processo de tirar a escola de nossas relações é o se distanciar das imposições do que dizem (escola) o que é importante para nós e assim nos aproximarmos e desenvolvermos uma educação sem escola. Relacionar desescolarização com o tempo ócio, acreditamos que daria um instigante trabalho e contribuição para a construção de elementos que alimentam a desescolarização. E por fim ele conclui “E, por não podermos parar, nada nos acontece” (p.24):

A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço. (Idem)

Por último Larrosa apresenta o saber da experiência que acontece “[...] na relação entre o conhecimento e a vida humana” (p.26), e continua dizendo que é “[...] o que se adquire no modo como alguém vai respondendo ao que vai lhe acontecendo ao longo da vida e no modo como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece.” (p.27), relacionado assim experiência como aquilo que nos acontece e o saber da experiência “[...] com a elaboração do sentido ou do sem- sentido do que nos acontece.”, sendo que esse saber está na pessoa, não se separa. Configurando assim como sua vida, seu jeito de ser, onde as pessoas não vivem a mesma experiência, embora possam ter vivido o mesmo acontecimento,

porém a experiência é única, é singular, por cada pessoa ter suas referências, e os seus sentidos atribuídos aos acontecimentos que a tocam.

Mergulhar nessa reflexão da experiência e saber da experiência, com o olhar de distinguir as ferramentas nossas das do senhor, as ferramentas desescolarizadas e as escolarizada, ou seja, a experiência aqui está sendo entendida como uma ferramenta nossa, uma ferramenta desescolarizada, por andar na contramão do tempo, do espaço, na escolha do que faço nesse tempo e nesse espaço; o que estamos percebendo como um nos permitir a esse lugar do incerto, do arriscar, do acontecer, num processo de criação, como também de reconhecer nossos pares. Nos permitindo ser tocadas/os, sensibilizadas/os e por isso ser transformadas/os.

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