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Experiência profissional: uma principiante em labirintos curriculares

“Se não morre aquele que escreve um livro ou planta uma árvore, com mais razão, não morre o educador, que semeia vida e escreve na alma." (Jean Piaget)

Em 2013, tive minha primeira experiência em sala de aula em uma escola de Cascavel, localizada na zona rural do município. Eu havia recentemente me formado em Licenciatura Plena em Pedagogia e mediante seleção no município para contratação de professores, fui lotada em uma escola rural para lecionar do 6º ao 9º ano as disciplinas de História e Geografia. Confesso que foi um desafio, uma vez que tenho consciência que o profissional adequado para tal cargo seria um licenciado em História e Geografia.

Dizem que o professor nunca se esquede do primeiro dia de aula. O meu então foi daqueles, pois o ventilador caiu no meio da sala, de tão velho que se encontrava. Depois do susto, fiquei tranquila por constatar que esse acontecimento não atingiu fisicamente nenhum de meus estudantes.

Procurei, durante meu período na escola, não apenas repassar o conteúdo que me era proposto, mas estabelecer vínculos de amizade, trocas de saberes, motivar os estudantes a buscarem o conhecimento e desenvolver cotidianamente novas estratégias de ensino que possibilitassem a troca de experiências, a reflexão, o diálogo.

No ano seguinte, passei a lecionar o 4º ano em uma escola situada no distrito da cidade. Essa experiência foi a mais desafiante, pois diariamente presenciava casos de violência e agressões na sala de aula. Minha turma superlotada, tinha também discentes que necessitavam de Atendimento Educacional Especializado.

A maioria dos estudantes da minha turma era composta por filhos de pais separados e que viviam sobre a tutela dos avós. Dentre os desafios encontrados por conta das agressões em sala, diariamente a coordenação nos pressionava quanto aos testes de leitura e escrita exigidos pela Secretaria Municipal de Educação – SME, bem como sua interferência nos planos de aula.

Diariamente, eu refletia sobre os desafios encontrados no cotidiano escolar, minha prática pedagógica, as metodologias adotadas e consequentemente as exigências internas e externas, as quais me pareciam mais preocupadas com o índice de rendimento da escola nos testes a que os aprendizes seriam submetidos do que propriamente com eles.

Essa situação me inquietava, pois compreendo a Educação como agente transformador. O estudante deve ser percebido, antes de tudo como um ser humano e que o espaço escolar não são meros depósitos de gente, mas um ambiente promotor de aprendizagens, desafios, oportunidades, reflexão, onde se deve viver valores e relações humanas mais saudáveis.

A docência é a profissão que escolhi para exercer mesmo sabendo dos desafios enfrentados pelo caminho e que me trazem cotidianamente reflexões sobre o Homem, a educação, os valores e a sociedade. Questiono-me sobre minha prática pedagógica, minha metodologia, meus conceitos, em virtude das situações enfrentadas no cotidiano escolar.

O professor tem uma das rotinas mais imprevisíveis pra quem se dispõe a conhecer novos seres. É uma profissão cheia de ousadia, desafios, certezas, incertezas, medos, aprendizagem, esperança, fé. Na sala de aula, temos que educar usuário de drogas, criança que foi violentada, a que ficou órfã, a que foi espancada, a que passa fome e carecem de amor e carinho. Isso lhe assusta? São apenas algumas das realidades enfrentadas na escola, pois existem muitas outras que chegam a ser até alarmantes.

Vale destacar, contudo, que, apesar das dificuldades enfretadas por muitas pessoas, cada ser tem talentos, desejos e sonhos a serem desenvolvidos, num processo que o cotidiano da escola, mediante o olhar sensível do professor, pode ajudar a acontecer. Antes de percebermos o indivíduo em suas particularidades, precisamos reconhecer antes de tudo o ser humano, um aprendiz que também tem sonhos, alegrias, criatividade e esperanças.

Procuramos o apoio da família, o qual na maioria das vezes não encontramos. Então, dividimos nossas angústias, incertezas, medos e desafios com os colegas de profissão, ou até mesmo com aquele nosso melhor amigo. Com o governo e todo o sistema, pouco ou nenhum apoio é encontrado, pois eles estão preocupados apenas em quantificar dados, via IDEB, SAEB...

Eles esquecem de que a aprendizagem não pode ser medida ou quantificada, mas avaliada por processos. Eles esquecem que por trás de um índice, existem pessoas com suas singularidades, as quais interferem no seu desempenho escolar. Porém, diante de tantas angústias e desafios, o que motiva o trabalho do professor é ver seu estudante progredir e de alguma forma ser lembrado.

Seja encontrando um discente do passado na rua e ele te cumprimentar: “Oi, professora. Como a senhora está? Sinto saudades de suas aulas!”. Seja ouvir daquele aprendiz que fazia algazarra em sua aula: “Professora, eu não queria me comportar assim, o que eu faço pra mudar?”. Seja escutar de seus estudantes que está lendo aquele livro tão falado na sala de aula. Seja ouvir na sua aula de História um estudante: “Professora, quando assisti o jornal que falava das manifestações só me lembrei da senhora!”. São muitas as situações cotidianas que nos revelam o quanto somos responsáveis na formação do cidadão.

São nos singelos gestos que vamos percebendo que as poucas horas em sala de aula se manifestam em algumas ações cotidianas, as quais nos fazem perceber, enquanto educador(a), que nossa influência na vida de nossos estudantes e na formação de seus conceitos é um ato de grande responsabilidade, pois estamos muito mais do que ensinando a ler e escrever, mas desenvolvendo virtudes humanas.

3 COMPREENDENDO CURRÍCULO

“O currículo é trajetória, viagem, nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é o texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade”.

(Tomaz Tadeu da Silva)

Neste capítulo apresentarei como compreendo o currículo e avaliação curricular e a discussão de como estes são pensados pelos autores em suas dimensões técnica-pedagógica, política e culturais. Para tanto, destaco os estudos de Barguil (2000, 2006), Esteban (2003), Goodson (1995), Hoffmann (2001), Nóvoa (1993), Sacristán (1998), Silva (2009), dentre outros.