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EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL 1 Modelo Experimental

No documento BIOMATERIAIS E TECIDO ÓSSEO (páginas 65-72)

MATERIAIS E MÉTODOS

2.3. EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL 1 Modelo Experimental

O estudo do comportamento do tecido ósseo após a implantação de biomateriais deve ser realizado, idealmente, em condições análogas ou homólogas às que se verificam quando o biomaterial é utilizado clinicamen- te. Contudo, em estudos experimentais de média duração, o recurso a mo- delos animais é a metodologia mais recomendada por se tratar de uma fase precoce da avaliação do comportamento tecidular após a introdução de um corpo estranho [139].

A decisão de seleccionar um animal para testar o comportamento de um tecido específico depende de inúmeros factores. Os critérios científicos para esta selecção dependem dos objectivos do estudo. Todavia, devem ter-se em especial atenção os aspectos anatómicos, bioquímicos, fisiológicos e patoló-

gicos que condicionam os mecanismos de resposta do animal. A fundamen- tação da escolha do animal deve também ter em consideração os estudos prévios realizados em condições semelhantes, que permitem estabelecer comparações entre os resultados obtidos no ensaio e os resultados publica- dos na literatura. 0 modelo experimental utilizado neste estudo é referido abundantemente na literatura mundial, em estudos in vivo sobre o compor- tamento biológico da maioria dos biomateriais [129,131,132,148,165-170,

182, 184, 208]. O modelo de implante transcortical é um método recomen- dado pela sua eficácia na realização de testes sobre a determinação da força de adesão na interface entre os biomateriais e o tecido ósseo [177, 232].

A selecção do Coelho como animal de experimentação foi realizada aten- dendo aos aspectos referidos. A utilização deste animal permite, de forma relativamente fácil, comprovar o comportamento dos materiais no tecido ósseo e estabelecer comparações com trabalhos publicados em revistas in- ternacionais, onde é adoptada metodologia semelhante [151,166,182]. Tra- tando-se de um estudo onde o objectivo fundamental é a análise do compor- tamento de vários biomateriais, sendo dois deles inovadores, este tipo de modelo experimental é válido quando se pretendem obter resultados que permitam fornecer indicadores das potencialidades de integração rápida dos materiais ensaiados no tecido ósseo.

Estudos experimentais de longo prazo, prévios à utilização clínica dos biomateriais, implicam a selecção de um tipo de osso, com estrutura e loca- lização idênticas às do tecido que os biomateriais pretendem substituir clini- camente. Desta forma, é possível realizar uma melhor avaliação e extrapolação dos resultados para a sua aplicação clínica. O recurso a modelos animais é recomendado sempre que a duração do período experimental não ultrapas- sa o médio prazo, isto é, 6 meses [138].

A transposição dos resultados obtidos no Coelho pode ser feita para o Homem quando se recorre ao mesmo tipo de osso, multiplicando-se o valor dos tempos seleccionados por três [56]. O osso regenerado à volta dos im- plantes de titânio aparenta semelhanças significativas no Homem, Cão e Coelho. O facto de a regeneração óssea ocorrer mais rapidamente no Coelho é um dos factores que contribuem para a selecção deste animal [148].

O custo dos animais e da sua manutenção é outro factor a ter em conta, devido às implicações que têm na viabilidade do projecto de experimenta- ção. O Coelho pode considerar-se um animal com custos de aquisição e ma- nutenção dentro do razoável. Sendo mais barato que os animais de maior porte, apresenta ossos com dimensões normalmente suficientes para a im-

plantação de biomateriais, o que não acontece com o Rato ou com a Co- baia [169].

A manipulação dos animais de experimentação tem que obedecer a nor- mas específicas e legalmente estipuladas [161, 162]. O tratamento deve ser feito por pessoal especializado e em condições adequadas, pois estes ani- mais são muito sensíveis às variações ambientais e podem morrer facilmente durante o ensaio experimental.

A legislação actualmente em vigor, em Portugal, sobre as normas técni- cas de protecção dos animais utilizados para fins experimentais e outros fins científicos, obriga a vários cuidados de ordem geral e de acomodação, assim como a selecção e o número de animais, além de todas as condicionantes que devem regulamentar a experimentação animal [161]. O nosso trabalho contemplou todas as normas existentes na legislação vigente no que respei- ta à experimentação animal. 0 número de animais a utilizar no ensaio expe- rimental foi definido em função de vários parâmetros:

• Minimização do número de animais a operar - O cumprimento das normas legais em vigor no nosso País implica a redução máxima do número de animais a utilizar nos estudos experimentais [161]. Esta norma está em conformidade com o que internacionalmente é reco- mendado para este tipo de investigação animal [138, 139]. Como se referiu na Introdução, no caso dos testes de toxicidade o número de animais a utilizar é de dois [162]. No estudo de biocompatibilidade, segurança biológica e eficácia os investigadores devem usar um núme- ro máximo de cinco ou seis animais [139,162]. Contudo, com um míni- mo de dois animais por cada tempo de implantação podem obter-se resultados válidos para este tipo de estudos [82].

• Limitações estatísticas - Utilização de um número mínimo de animais que permita realizar tratamento estatístico da variação da percenta- gem de contacto directo do tecido ósseo com os biomateriais. Com amostras superiores a cinco animais por tempo de implantação já é possível fazer a determinação estatística da variabilidade entre os dife- rentes materiais.

• Custos totais do projecto de investigação - O tamanho e o número dos animais, bem como a duração do ensaio, têm implicações significativas nos custos da investigação. As limitações económicas condicionam o recurso a um número elevado de animais e a ensaios experimentais de longa duração.

2.3.2. Protocolo da Cirurgia Experimentai

Neste estudo experimental, foram utilizados 12 coelhos (Oryctolagus cuniculus) adultos, de raça Nova Zelândia, de ambos os sexos e com peso médio de 3,0+ 0,4 kg. Os animais foram divididos em dois grupos de 6 coe- lhos cada. Este número de animais permite obter resultados válidos no estu- do da biocompatibilidade dos materiais ensaiados [82,162].

O protocolo experimental foi realizado em Santarém, na Estação Zoo- técnica Nacional, que é um centro licenciado para a experimentação animal.

A equipa cirúrgica foi constituída por um cirurgião, um cirurgião ajudan- te, um anestesista, um instrumentista, um médico veterinário e dois técni- cos de apoio.

A técnica anestésica utilizada consistiu na perfusão intra-muscular (i.m.) de Ketamina (Ketalar®, Parke-Davies S.A., Espanha), numa dose de 100 mg/ kg de peso corporal, complementada por Midazolam (Dormicum®, Roche, Suiça), na dose de 0,20 mg/kg, reforçada com a administração de anestesia local através da perfusão i.m. de 1,8 ml de Lidocaina a 2% com Epinefrina a 1:100000 (Graham Chemical Co., Jamaica) perto da zona da intervenção.

Durante o acto cirúrgico foram utilizadas todas as condições de assepsia recomendadas para este tipo de procedimentos experimentais. Todo o ma- terial utilizado num dado animal era descartável, embalado e esterilizado individualmente.

O local seleccionado para se implantarem os materiais foi a tíbia poste- rior, direita e esquerda, de cada coelho. Escolheu-se um acesso fácil à face anteromedial da tíbia, procurando produzir o menor traumatismo possível nos tecidos intervencionados e obter um leito ósseo excelente.

Os materiais foram colocados, bilateralmente, na seguinte ordem: - tíbia esquerda: grânulos de Osteopatite® e pino de aço inox 316L; - tíbia direita: cimento de vidro bioactivo e pino de titânio.

Esta ordem de distribuição dos materiais foi definida tendo em conta a possibilidade de existirem possíveis interacções entre os dois metais, se co- locados no mesmo osso a distâncias próximas.

O pêlo que recobria as patas a operar foi cortado imediatamente antes da intervenção (Fig. 3) e a superfície exposta foi desinfectada com uma solu- ção dérmica iodada, bactericida e antimicótica (Betadine®, Asta Médica, Lis- boa).

A exposição da superfície óssea foi realizada através de uma incisão lon- gitudinal com cerca de 6 cm, utilizando-se um bisturi cirúrgico com uma

lâmina n° 15. A incisão permitiu o acesso ao periósteo, que foi cuidadosa- mente cortado e descolado, permitindo a exposição do osso onde foi reali- zada a colocação dos biomateriais (Fig. 4). Foram realizadas janelas ósseas de tipo rectangular na superfície do osso exposto, com as dimensões médias de 12x3 mm, para a colocação dos materiais cerâmicos, perfurando a parede cortical até à cavidade medular (Fig. 5). Para a implantação dos pinos metáli- cos, usaram-se brocas cilíndricas normalizadas de tungsténio com 2 mm de diâmetro. Estas brocas permitem a obtenção de orifícios com um diâmetro aproximado de 2,0+ 0,1 mm. Perfurando a cortical até à medula óssea ob- têm-se um apoio firme dos pinos na parede interna da cortical oposta (Fig. 6).

O corte do osso foi realizado com brocas de tungsténio a baixa rotação, e acompanhado de irrigação abundante com uma solução de soro fisiológico (B. Braun Medicai S.A., Espanha), prevenindo-se o sobreaquecimento do osso na zona operada. Teve-se o máximo cuidado para minimizar o trauma cirúr- gico durante todo o processo. Para a realização deste procedimento, foi uti- lizado um equipamento comercial, desenvolvido e adaptado para a coloca- ção de implantes dentários, Osada XL-150 (Osada Irrigation Dispenser, Osada Electric Co. Ltd., Japão), com rotação não superior a 1500 rpm.

Os materiais foram esterilizados em autoclave (135 °C durante cerca de 30 minutos, a uma pressão aproximada de 2 atmosferas), sendo acondicionados, previamente, em mangas de esterilização hermeticamente fechadas. Esta téc- nica de esterilização demonstrou, em estudos realizados por outros investiga- dores, não alterar as propriedades de materiais semelhantes [73, 149, 173].

Durante a colocação no osso, os pinos metálicos foram pressionados para se fixarem firmemente às paredes ósseas e evitar o aparecimento de micromovimentos nos implantes, que pudessem interferir com o processo regenerativo do tecido ósseo. Os grânulos de Ostéopathe® e a pasta de ci- mento de vidro bioactivo foram compactados com uma espátula metálica para se adaptarem firmemente às paredes das cavidades ósseas. Os materi- ais foram colocados a uma distância entre os orifícios de cerca de 1,5 cm.

Concluída a implantação, removeram-se todos os resíduos, fragmentos do osso cortado e o excesso de materiais no local intervencionado, através de uma lavagem abundante com soro fisiológico.

Os tecidos foram suturados em duas camadas distintas e com dois tipos de sutura diferentes. A camada tecidular profunda foi suturada com fio de sutura reabsorvível (Dexon® II, Davis-f Gleck) e a camada superficial com fio de seda 4-0 (B. Braun SSC AG, Suiça). Finalmente, o local cirúrgico foi limpo e desinfectado através de irrigação abundante com Betadine® solução dérmica.

Fig. 3 - Patas posteriores do coelho preparadas para serem intervencionadas cirur-

gicamente. O pêlo foi cortado de modo a permitir uma correcta desinfecção e manipulação do local operatório.

Fig. 4 - Preparação de janela óssea para a colocação dos materiais cerâmicos com

Fig. 5 -Janela óssea, na tíbia da pata esquerda, onde foram colocados os grânulos

de Osteopatite®. O orifício onde foi colocado o pino de aço inox encontra-se recoberto pelos tecidos.

Fig. 6 -Janela óssea, na tíbia da pata direita, onde foi colocado o cimento de vidro

bioactivo. O orifício onde vai ser colocado o pino de titânio encontra-se já prepara- do.

Na fase pós-operatória, os animais foram submetidos a uma terapêutica antibiótica com 200000 IE de penicilina (Combi-Kel®, Helsinn, Portugal), numa dose de 0,12 mg/kg, por um período de uma semana e tratados segundo as condições recomendadas para animais de experimentação. Os animais fo- ram colocados em jaulas isoladas e com total liberdade de movimentos. A alimentação, igual para todos os animais, consistiu na dieta convencional de ração e água em doses aconselhadas para coelhos.

Uma semana antes do sacrifício foi administrado, por via e.v., cloridrato de tetraciclina (Terramicina®, Pfizer, Portugal), numa dose de 30 mg/kg, para ser- vir de marcador fluorescente. A tetraciclina possui uma grande afinidade de deposição em tecidos duros, durante o processo de formação/remodelação e é fluorescente mediante a incidência de luz ultra-violeta (IN).

Decorrido o período experimental, os animais foram sacrificados através de uma overdose endovenosa de anestésico (Penthotal® Sódico, Lab. Abbott Lda., Portugal), 4 e 10 semanas após a implantação dos materiais.

Após o sacrifício, foram retirados todos os segmentos do osso contendo os materiais implantados. Os tecidos moles envolventes foram cuidadosa- mente dissecados e removidos. As amostras, assim preparadas, foram colo- cadas num frasco de vidro estéril, contendo uma solução de formol a 4%, tamponada a pH 7,4.

Este procedimento foi executado à temperatura ambiente (20-25 °C) e, após serem colocadas identificações codificadas, as amostras foram trans- portadas em mala térmica para o laboratório a fim de serem sujeitas ao processamento histológico. Na altura da colheita dos blocos ósseos conten- do os biomateriais, estes foram observados cuidadosamente na procura de sinais macroscópicos evidentes de qualquer alteração patológica, sendo fo- tografados e radiografados (Figs. 7 e 8).

No documento BIOMATERIAIS E TECIDO ÓSSEO (páginas 65-72)