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7. RESULTADOS E DISCUSSÃO

7.1 Descrição dos casos

7.1.4 Casos de más-formações congênitas cardíacas

7.1.4.3 Família 6

Data da entrevista: 04/07/2017

Observação: A família corresponde a um casal que apresenta um histórico de ter

gestado uma criança com má-formação congênita cardíaca, a qual evoluiu para óbito. Desta forma, a apresentação da família será diferente das realizadas para as famílias em que as crianças estão vivas.

Mãe da criança

Informações gerais: CMS, sexo feminino, 25 anos, dona de casa, natural de

Jaguaretama e procedente de Quixeré (CE) (comunidade de Tomé). Nega apresentar algum problema de saúde e o uso de medicamentos de rotina, com exceção do anticoncepcional via oral (Femina). Nega tabagismo, etilismo e o uso de substâncias ilícitas. Nega possuir algum grau de parentesco com o pai da criança.

História obstétrica e gestacional da mãe: engravidou duas vezes, teve um parto

(cesariano) e um episódio de abortamento, espontâneo, na primeira gestação (2013). O diagnóstico da gravidez de MRC aconteceu em 2014 (segunda gestação), com três meses de gravidez. Realizou o pré-natal no PSF do Tomé, 10 consultas. Relata que apresentou, durante toda a gestação, episódios de náuseas, vômitos e epigastralgia persistentes, que não melhoravam com o uso de medicamentos prescritos no posto. Apresentou alguns episódios de desmaios após os vômitos intensos, posteriores aos quais procurava atendimento hospitalar, recebia hidratação endovenosa e era encaminhada novamente para o domicílio. Apesar de referir esses sintomas com frequência ao médico responsável pelo pré-natal, foi informada que se tratava de queixas esperadas durante a gestação, por isso, não havia com o que se preocupar. Nega outras intercorrências durante a gestação (sangramentos, infecções, acidentes ou traumas). Fazia uso dos medicamentos prescritos no PSF durante a gestação (ácido fólico, sulfato ferroso e as medicações sintomáticas para as queixas relatadas acima). Antes de engravidar, o único medicamento que utilizava era o anticoncepcional via oral (Ciclo 21), que usou durante um ano. Realizou todas as consultas agendadas no posto e os exames complementares solicitados (inclusive as ultrassonografias), no entanto, o problema de saúde apresentado pela criança após o nascimento não foi diagnosticado durante gestação (má- formação cardíaca). A criança nasceu a termo, no dia 15/10/2014, via cesariana, indicada

devido à presença de circular de cordão umbilical, no hospital de Limoeiro do Norte (CE). No dia posterior ao nascimento, MRC foi encaminhada para Fortaleza (CE), ao HIAS. Mãe refere que não explicaram à família o quadro apresentado pela criança, apenas informaram que ela possuía uma dificuldade respiratória, por esse motivo estava sendo transferida. No HIAS, a criança foi internada na UTI, e precisou ser submetida à entubação orotraqueal. A família foi informada, então, que a criança apresentava uma má-formação congênita cardíaca (duas perfurações no coração) e uma suspeita de diagnóstico sindrômico. Após três meses de internamento, a criança foi submetida a um procedimento cirúrgico paliativo, no dia 05/01/2015. Poucas horas depois da cirurgia, na madrugada do dia 06/01/2015, MRC foi a óbito. Os pais referem que não foi realizado nenhum procedimento cirúrgico para correção do problema cardíaco, pois, de acordo com a equipe médica que acompanhou a criança no HIAS, a cirurgia cardíaca resolutiva poderia ser realizada somente quando a criança completasse um ano de idade.

História familiar de má-formação congênita: nega a existência de outros casos

de más-formações congênitas na família.

História de exposição da criança aos agrotóxicos durante a gestação: antes de

engravidar e durante toda a gestação, a mãe da criança residia na comunidade de Tomé, região cercada por plantações onde se pulveriza agrotóxicos. A mãe refere que, quando estava com a idade gestacional entre três e quatro meses, foi contaminada por agrotóxicos que estavam sendo pulverizados por um veículo da secretaria de saúde (para controle de arboviroses). Após esta exposição, apresentou um quadro de tontura intenso, sem outros sintomas associados, com regressão espontânea.

Informações sobre os locais de moradia e a exposição aos agrotóxicos: morou

em Jaguaretama (CE) até os quatro anos de idade, em Morada Nova (CE) até os 12 anos de idade, e, posteriormente, mudou-se para a comunidade de Tomé, onde habita até o momento atual. Relata que nos locais anteriores de moradia não havia a presença de plantações com o uso de agrotóxicos.

Informações sobre os locais de trabalho e a exposição aos agrotóxicos:

trabalhou durante 4 anos em um restaurante da região, entre os anos 2010 e 2014. Apesar de não trabalhar em contato direto com os agrotóxicos, refere que o restaurante era localizado próximo ao aeroporto da aeronave responsável pela pulverização aérea dos agrotóxicos (aproximadamente cem metros de distância) e de uma plantação de banana, onde se pulverizava agrotóxicos. Relata que nesse período presenciou muitos episódios de pulverização aérea, durante os quais ela e os demais funcionários do restaurante se recolhiam

para dentro do estabelecimento, fechavam as portas para as substâncias não entrarem, e, em seguida, ligavam o aparelho de ventilador com o intuito de amenizar o odor causado pelos agrotóxicos. Nega já ter apresentado algum sintoma devido a esse contato com os agrotóxicos.

Pai da criança

Informações gerais: AES, sexo masculino, 34 anos, agricultor, natural e

procedente de Quixeré (CE) (comunidade de Tomé). Nega apresentar algum problema de saúde e o uso de medicamentos de rotina. Nega tabagismo e o uso de substâncias ilícitas. Refere etilismo.

Informações sobre os locais de moradia e a exposição aos agrotóxicos: desde o

nascimento até o momento atual, mora na comunidade de Tomé, região cercada por plantações em que há pulverização de agrotóxicos.

Informações sobre os locais de trabalho e a exposição aos agrotóxicos: o seu

primeiro emprego foi em 2004, na empresa Delmonte, durante seis meses. Neste emprego, trabalhava nas plantações (experimento com o abacaxi e experimento com a banana). Em algumas ocasiões, relata que aplicava agrotóxicos, porém não soube informar os nomes das substâncias utilizadas. Entre os anos 2004 e 2010, trabalhou e morou em vários estados do país, em empresas relacionadas à montagem de estruturas metálicas. Durante esses anos (2004 a 2010), refere que retornava em algumas ocasiões para passar um período de tempo na comunidade de Tomé, quando conseguia se ocupar com empregos sazonais na agricultura, em geral pulverizando agrotóxicos em plantações de banana, milho e feijão. Refere que, em 2007, durante a aplicação dessas substâncias em uma plantação de banana (que fazia parte do perímetro irrigado), apresentou um quadro intenso de tontura. Recordou que o produto pulverizado possuía uma toxicidade alta, mas não soube informar o nome do agrotóxico. Utilizava como equipamento para pulverizar os agrotóxicos a bomba costal. Em 2010, ao retornar definitivamente para a comunidade de Tomé, começou a trabalhar em um cultivo próprio de banana, no qual relata utilizar agrotóxicos uma vez por ano, para combater o fungo Sigatoka Amarela (Mycosphaerella musicola). Refere que o nome do produto aplicado em sua plantação é Amistar (azoxistrobina). Relata que não aplica diretamente a substância, existe um profissional responsável por este serviço, que o realiza por meio de um trator e possui as vestimentas recomendadas para evitar a contaminação. No ano de 2014, relata que também trabalhou, durante um pequeno intervalo de tempo (aproximadamente quatro meses), em uma fábrica de cimento, refere ter se desligado do emprego porque desenvolveu um quadro alérgico ao cimento, exercia a função de montador de estruturas. Relata já ter presenciado

alguns episódios de pulverização aérea dos agrotóxicos na região, no entanto nega ter apresentando sintomas relacionados a estes eventos.

Exames complementares relevantes para o caso:

Sorologias da mãe para sífilis, hepatite B, HIV, toxoplasmose e rubéola (data: 06/2014): não reagentes.

Ultrassonografia obstétrica (data: 11/08/2014): gravidez tópica, única, de 28

semanas e 6 dias (+/- 1,5 semanas).

Ultrassonografia obstétrica (data: 26/08/2014): gravidez tópica, única, de 31

semanas e 2 dias (+/- 2 semanas).

Ultrassonografia obstétrica (data: 23/09/2014): gravidez tópica, única, de 34

semanas e 5 dias (+/- 2 semanas).

Declaração de óbito da criança (06/01/2015): causas da morte = choque

cardiogênico como consequência de cardiopatia congênita.

Informações obtidas após revisão de prontuário da criança no HIAS (12/09/2017):

Data da admissão: 16/10/2014

Ficha de admissão: condições ao nascer = Peso (2600g); a termo; APGAR (4/7);

cianose generalizada. Admitida no HIAS com desconforto respiratório e presença de múltiplas más-formações. Ao exame físico, Peso (2600g); Estatura (48 cm); Perímetro cefálico (33 cm); Capurro (37 semanas e 6 dias); pós-termo; presença de desconforto respiratório; largada; presença de anomalias congênitas; pulsos presentes; ausculta cardíaca = ritmo cardíaco regular, dois tempos, bulhas normofonéticas, sem sopros; ausculta pulmonar com crepitações em base pulmonar esquerda. Apresenta diástese muscular do músculo reto abdominal; alongamento dos dedos dos pés e das mãos; implantação baixa de orelhas; polo cefálico assimétrico; fáscies atípica sindrômica; genitália aparentemente normal; extremidades bem perfundidas; preensão palmar presente. Diagnósticos: recém-nascido sindrômico (Charge? Edwards?); desconforto respiratório; anóxia neonatal; infecção neonatal presumida; persistência do canal arterial, comunicação interatrial (CIA) e comunicação interventricular (CIV) grandes; hipertensão pulmonar leve; prolapso retal; falha de extubação; pneumonia.

Resultados dos principais exames complementares realizados:

Ultrassonografia abdominal (23/10/2014): hepatomegalia; conteúdo espesso na

vesícula, podendo representar lama biliar; presença de pequena quantidade de líquido livre na cavidade abdominal. (27/11/2014): sem alterações evidentes.

Ecodopplercardiograma (18/10/2014): comunicação interatrial (CIA) importante; comunicação interventricular (CIV) importante; hipertensão pulmonar discreta.

Cariótipo – banda G, resolução 400-450 bandas (31/10/2014): cariótipo do sexo

feminino, sem aparentes alterações numéricas ou estruturais; 46, XX. (19/12/2014): laudo normal.

Cirurgia cardíaca (05/01/2015): ligadura de canal arterial persistente. Data do óbito: 06/01/2015.

Investigação de óbito infantil (07/01/2015): recém-nascida feminina, a termo,

parto cesáreo por sofrimento fetal. Apresentou dispneia ao nascer com más-formações esqueléticas. Admitida na reanimação com insuficiência respiratória. Intubada e conduzida à UTI. Evolução clínica (7º dia de internamento hospitalar- DIH): estável na ventilação mecânica invasiva, com dieta enteral. Ecodopplercardiograma com CIV e CIA grandes. Não tolerou extubação. Iniciou diuréticos. Ultrassonografia: agenesia de corpo caloso. Ultrassonografia abdominal: ascite leve. Sob nutrição parenteral. 13º DIH: insuficiência renal. Anemia tratada com hemoderivados. Hemograma infeccioso. Iniciou Tazocin. Cultura de secreção (pseudomonas). Bomba diurética e sondagem vesical. 30º DIH: piora da insuficiência respiratória aguda e sepse. Submetida à diálise peritoneal. Antibiótico terceira linha. Melhora clínica após setenta e duas horas. 42º DIH: remoção de cateter peritoneal. Dieta com leite hipercalórico. Cariótipo normal. 75º DIH: clínica estável, dependente de ventilação mecânica invasiva, aguardando cirurgia cardíaca. 80º DIH: cirurgia cardíaca paliativa. Considerado instável, sob drogas vasoativas. Óbito após catorze horas. O corpo não foi encaminhado para necropsia. Causas do óbito: choque cardiogênico secundário a cardiopatia acianótica secundária a síndrome a esclarecer.

Discussão do caso

A família 6 trata-se do caso de um casal que gerou uma criança portadora de cardiopatia congênita complexa, com suspeita também de apresentar uma síndrome genética, porém não houve uma elucidação diagnóstica sobre o caso durante o internamento no HIAS. Ambos os genitores apresentam um histórico relevante de exposição ambiental aos agrotóxicos. O pai da criança, especificamente, retratou um histórico ocupacional de exposição aos agrotóxicos bastante significativo.

7.1.5 Casos de más-formações congênitas osteomusculares