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APÊNDICE C – REVISÃO NARRATIVA, OBJETIVO E HIPÓTESES

FATORES DE RISCO CARDIOVASCULARE EM PACIENTES COM NEFROLITÍASE

Cardiovascular risk factors in patients with nephrolithiasis

Bruno Guimarães de Freitas1 Edgar Guimarães Victor2

1

– Nefrologista. Universidade Federal de Pernambuco 2

– Cardiologista, PhD, Universidade Federal de Pernambuco

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Endereço para correspondência Bruno Guimarães de Freitas

Rua General Salgado, 82 apto 1301 – Boa Viagem, Recife, Pernambuco, Brasil Código Postal: 51.130-320

Telefone: +55(81) 8894-4625

RESUMO

Introdução: A nefrolitíase é uma morbidade frequente, e está relacionada a distúrbios

metabólicos sistêmicos que interferem sobre o metabolismo urinário. O estudo da interação entre fatores de risco cardiovascular e distúrbios metabólicos urinários traz novas perspectivas para o tratamento da litíase renal. Objetivos: Determinar a frequência dos fatores de risco cardiovascular tradicionais em pacientes com nefrolitíase e sua associação com distúrbios metabólicos urinários. Métodos: Em estudo de corte transversal foram analisados retrospectivamente 150 prontuários de pacientes com nefrolitíase em um serviço de referência, sendo registrados dados clínicos e epidemiológicos, história familiar de litíase renal, procedimentos urológicos e dados laboratoriais (níveis séricos de glicemia de jejum, perfil lipídico e concentração urinária de metabólitos renais). Resultados: A frequência de hipertensos igualou-se a 26,6%, de diabéticos a 3,22%, e de dislipidêmicos a 72,2%, com maior predomínio de aumento do colesterol total (60,7%). Foi detectado 18,3% pacientes com glicemia de jejum alterada, nos quais se observou associação com menor frequência de hipercalciúria. Dos distúrbios metabólicos urinários, hipercalciúria (51,8%), hipocitratúria (32,3%) e excreção aumentada de sódio urinário foram mais frequentes. Conclusões: Pacientes com nefrolitíase apresentaram alta frequência de dislipidemia e a altas concentrações de sódio urinário; sendo a hipercalciúria e a hipocitratúria os distúrbios metabólicos urinários mais frequentes.

Palavras-chave: Nefrolitíase. Fatores de risco. Distúrbios metabólicos.

ABSTRACT

Introduction: Nephrolithiasis is a frequent morbidity related to systemic metabolic

disorders, which affect kidney metabolism. The study of the interaction between traditional cardiovascular risk factors and metabolic urinary brings new perspectives to the management of nephrolithiasis. Objectives: To determine the frequency of traditional cardiovascular risk factors in patients with nephrolithiasis and its association with urinary metabolic disorders. Methodology: Within a cross-sectional study we retrospectively analyzed the 150 medical records of patients with nephrolithiasis in a referral service, and registered clinical, epidemiological, family history, urologic procedures and laboratory data (serum fasting glucose, lipid profile and renal urinary concentration of metabolites). Results: The frequency of hypertensive equaled 26.6%, diabetes ranged 3.22% and dyslipidemic reached 72.2% with a predominance of increase in total cholesterol (60.7%). There were 18.3% of patients with impaired fasting glucose, which was associated to lower frequency of hypercalciuria. Among the urinary metabolic disorders, hypercalciuria (51.8%), hypocitraturia (32.3%) and increased urinary sodium excretion were more frequent.

Conclusion: Nephrolithiasis was associated with a high frequency of dyslipidemia

and a high concentration of urinary sodium, and, among urinary metabolic disorders, hypercalciuria and hypocitraturia predomined.

INTRODUÇÃO

A nefrolitíase (NL), urolitíase ou litíase urinária apresenta-se como um dos distúrbios mais frequentes da Nefrologia, com prevalência igual a 8,8% da população norte-americana, e varia de 5,0% a 9,6%, no Brasil, sendo mais comum no sexo masculino, com tendência de equivalência entre os sexos na sexta década de vida1-4.

Alguns estudos demonstram a presença de fatores de risco cardiovascular (FRCV) na população com NL, dentre os quais o diabetes mellitus, as dislipidemias e a hipertensão arterial sistêmica (HAS), a qual tem sido a mais estudada5,6.

Existem evidências da associação entre ingesta de sódio e hipercalciúria a qual poderia se constituir em fator etiológico comum à NL e à HAS, enquanto que outros estudos demonstram maior frequência de alterações na homeostase do cálcio, níveis mais baixos de citrato urinário e fatores genéticos nessa associação7-11.

O diabetes mellitus (DM) é considerado fator de risco comum a eventos cardiovasculares e NL12, tendo a resistência à insulina como fator comum13,14. Os estudos de Sakhaee e Daudon referem a associação de resistência à insulina a alterações na produção de amônia no túbulo renal, levando a pH urinário ácido, do que resultaria maior risco de NL principalmente por ácido úrico15-17. Assim também foi identificada relação entre resistência à insulina e hipocitratúria18.

Embora a dislipidemia não se associe diretamente com a NL, a sua associação com a resistência à insulina, integra o espectro da síndrome metabólica a qual compromete o metabolismo renal16,19. Além disso, a síndrome metabólica apresenta- se como um dos fatores relacionados à recorrência de cálculos urináriose mantém em comum com a NL, relação com a ingesta alimentar (principalmente sal e água) e os hábitos de vida19,20.

Devido às evidências de distúrbios metabólicos sistêmicos interferirem no metabolismo do rim, questiona-se a existência de prevalência aumentada de FRCV tradicionais dentre pacientes com nefrolitíase. O distúrbio metabólico urinário parece fazer parte de uma alteração sistêmica, do que decorre a possibilidade de admitir que a NL pode se apresentar como componente de um estado patológico mais amplo16.

Diante dos novos estudos que correlacionam a NL com: marcadores de aterogênese associados com inflamação crônica, stress oxidativo e marcadores de ateromatose, como a espessura da parede de artérias carótidas; e da associação com eventos cardiovasculares como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular

cerebral; avaliar os FRCV nessa população é o primeiro passo para entender melhor estas relações21-25. O objetivo deste estudo é descrever alguns dos fatores de risco cardiovascular tradicionais na população com nefrolitíase e sua relação com alterações metabólicas urinárias.

MÉTODOS

Realizado estudo transversal, retrospectivo, analítico, com coleta de dados no período de setembro de 2012 a janeiro de 2013; em serviço de referência em Nefrologia e Urologia em Recife, Pernambuco, Brasil, empregando revisão de prontuários de pacientes atendidos entre 1996 e 2012.

A população esteve composta por 1.684 prontuários de pacientes. Admitiram- se como critérios de inclusão: ter diagnóstico de nefrolitíase caracterizado por cálculo expelido, associado a sintomas de cólica renal ou exame de imagem com achado de nefrolitíase; haver registro do diagnóstico em prontuário; idade maior de 18 anos; estarem registrados os resultados de glicemia de jejum, colesterol total, triglicerídeos, colesterol high density lipoprotein (HDL) e low density lipoprotein (LDL), sendo todas realizadas em soro. Foram excluídos os prontuários com registro de creatinina maior ou igual a 1,2 mg/dL (evitando-se a interferência da Doença Renal Crônica e outros distúrbios metabólicos inerentes a esta condição) ou óbito. Após análise dos prontuários integraram o estudo 150 prontuários, que possuíam todos os registros laboratoriais necessários descritos nos critérios de inclusão.

Dentre os dados disponíveis nos prontuários, foram eleitas variáveis de estudo: idade, sexo, antecedente familiar de NL, sintomas de apresentação da nefrolitíase, achados ao primeiro exame ultrassonográfico (presença de NL e/ou hidronefrose), procedimentos terapêuticos (litotripsia extracorpórea, uso de cateter tipo duplo jota, endoscopia urológica e cirurgia convencional). Também foram registrados os diagnósticos prévios de HAS, DM ou dislipidemia e de hipercalciúria, hipocitratúria, hiperuricosúria, natriurese elevada e hiperoxalúria.

Também foram eleitos para análise os níveis séricos de glicemia de jejum, colesterol total, triglicerídeos, colesterol HDL e colesterol LDL, compondo o perfil lipídico, além de ácido úrico, cálcio, sódio, potássio e creatinina sérica. Da bioquímica urinária, foram consideradas concentrações de cálcio, ácido úrico, citrato,

sódio e oxalato, aferidas em duas amostras de 24 horas. Na urina tipo 1, foram considerados os valores de pH e densidade.

Para os exames séricos, foram considerados alterados os valores expostos no Quadro 1. Classificou-se como distúrbio metabólico urinário a presença de dois exames urinários de 24 horas alterados, obedecidos aos valores de referência constantes do Quadro 1.

Quadro 1 – Valores de referência adotado como alterados para dosagens bioquímicas em soro

Dosagem Valores de referência

Glicemia de jejum 100 a 125 mg/dL - glicemia alterada > 125mg/dL - diabetes mellitus26 colesterol total ≥ 200 mg/dL27

triglicerídeos ≥ 150 mg/dL27

colesterol HDL < 40 mg/dL em homens e < 50 mg/dl em mulheres27 colesterol LDL ≥ 160 mg/dL27

hipercalciúria ≥ 300 mg/24 h, em homens, e ≥ 250 mg/24 h, em mulheres28 hiperuricosúria ≥ 800 mg/24 h, em homens, e ≥ 750 mg/24h, em mulheres28 hipocitratúria ≤ 320 mg/24 h28

natriurese aumentada ≥ 130 mmol/L 28

Foram classificados como dislipidêmicos os pacientes em cujo prontuário houvesse alteração em qualquer das dosagens de triglicerídeos, colesterol total, HDL ou LDL27, em relação aos valores de referências. Foram definidos como

hipercolesterolemia valores de colesterol total acima do valor de referencia, e hipertrigliceridemia valores de triglicerídeos acima do valor descrito como referência. Foram definidos como hipertensos, aqueles com diagnóstico prévios descrito de hipertensão arterial sistêmica e como diabéticos aqueles com diagnóstico prévio descrito de diabetes mellitus ou valor de glicemia de jejum acima da referência para diagnóstico de diabetes mellitus.

Na análise estatística, foi utilizado o programa STATA, versão 9.0, sendo os resultados expressos por média e desvio padrão ou mediana. As variáveis em escala ordinal ou nominal foram apresentadas em distribuição de frequência absoluta ou relativa. Para determinação da associação entre os distúrbios metabólicos urinários e os fatores de risco cardiovascular, empregou-se o teste do Qui-quadrado.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Federal de Pernambuco sob CAAE nº. 0499.0.172.000-11, consoante com a Resolução nº 466, de 2012, do Conselho Nacional de Saúde e a Declaração de Helsinki.

RESULTADOS

Dos 1684 prontuários analisados, 150 preenchiam os critérios de inclusão para análise. Foram identificados 50,7% pacientes do sexo masculino e média de idade de 43,6 anos. Dentre os sintomas iniciais, havia registro de 37,3 % dos pacientes referindo dor lombar como primeira apresentação do quadro de NL, seguido pela detecção de cálculo expelido de forma espontânea e hematúria. Havia registro de antecedentes familiares de nefrolitíase em 11 prontuários (7,3%).

Na avaliação dos exames de imagem, em 102 prontuários havia registro de ultrassonografia, sendo 67 (65,7%) positivos para nefrolitíase, com predomínio à direita. Destes, 22 (21,6%) apresentavam hidronefrose, também mais comum à direita.

Quase metade dos pacientes havia se submetido a procedimentos cirúrgicos urológicos (49,4%) sendo a litotripsia extracorpórea (LECO) o mais frequente (24,7%), seguido pelos procedimentos endoscópicos (16%)

Foram registrados 40 (26,7%) pacientes hipertensos (Tabela 2), e, destes, 45% utilizavam medicação hipotensora de forma regular, com predomínio de betabloqueadores (27,5%), seguidos por diuréticos (15%) e inibidores da enzima de conversão do angiotensina (12,5%) (Tabela 1).

Tabela 1 - Características dos pacientes com nefrolitíase segundo idade, sexo, sintomas iniciais, fatores de risco, procedimentos cirúrgicos e diagnóstico por ultrassonografia

Características Estatística Idade (média dp) (anos) 43,6  13,1

Sexo Frequência (%) Masculino 76 (50,7) Feminino 74 (49,3) Sintomas iniciais Dor lombar 56 (37,3) Hematúria 9 (6,0) Cálculo expelido 34 (22,7) Antecedente familiar 11 (7,3)

Diagnósticos Número (%) IC(95%)

Hipertensão 40 (26,7%) 19,5 – 33,8

Diabetes 4 (2,7%) 0,1 – 5,3

Glicemia de jejum alterada 28 (18,7%) 12,3 – 25,0

Dislipidemia 107 (71,3%) 64,0 – 78,7

Procedimentos cirúrgicos Frequência (%) Litotripsia extracorpórea 37 (24,7) Cateter duplo J 3 (2,0) Procedimento endoscópico 24 (16,0) Cirurgia aberta 10 (6,7) Resultado da ultrassonografia Litíase Negativo 35 (34,3) Positivo 67 (65,7) Hidronefrose Negativo 80 (78,4) Positivo 22 (21,6)

Legenda: dp = desvio-padrão; IC(95%) = intervalo de confiança em nível de 95%

Foram definidos como diabéticos 4 pacientes, todos pela presença do diagnóstico prévio e quanto à glicemia de jejum 28 (18,3%), apresentaram glicemia de jejum alterada pelo exame laboratorial. A média de glicemia igualou-se a 92,9 mg/dL. Dos 131 prontuários com registro de dosagem de ácido úrico sérico, em 14,4% havia valores maiores que 7,0 mg/dL, não sendo registrada concentração de cálcio sérico maior que 10,2 mg/dL.

Dos distúrbios metabólicos urinários o mais frequente foi a hipercalciúria (51,8,%), seguida pela hipocitratúria e por concentração alta de sódio urinário. Tanto na primeira como na segunda amostra, a concentração mediana de sódio urinário foi maior que 130 mmol/L, e a densidade teve média de 1,028 (Tabela 2).

Tabela 2 - Características dos pacientes com nefrolitíase segundo os níveis séricos e critérios urinários

Características observações Número de Estatística (média± dp) Níveis séricos Glicemia de jejum (mg/dL) 150 92,9  12,1 Colesterol total (mg/dL) 150 200,2  46,9 Triglicerídeos (mg/dL) 150 142,5  81,5 HDL (mg/dL) 150 48,5  10,3 LDL (mg/dL) 150 121,9  38,8 Potássio (mmol/L) 112 4,2  0,3 Ácido Úrico (mg/dL) 131 5,3  1,7 Sódio (mmol/L) 112 141,1  13,4 Cálcio(mg/dL) 118 9,4  0,5 Creatinina (mg/dL) 108 0,9  0,2

Critérios urinários Mediana (P25; P75)

Cálcio (mg/24 h) Amostra 1(mg/24 h) 123 168 (117; 230) Amostra 2(mg/24 h) 109 188 (135; 264) Ácido úrico (mg/24 h) Amostra 1(mg/24 h) 125 496 (368; 599) Amostra 2 (mg/24 h) 110 502 (379; 640) Sódio (mmol/L) Amostra 1 119 153 (112; 204) Amostra 2 107 151 (104; 198) Citrato (mg/24 h) Amostra 1 76 507 (156; 687) Amostra 2 68 476 (191; 826) Oxalato (mg/24 h) Amostra 1 117 16 (7; 23) Amostra 2 98 15 (6,5; 24) pH 104 5,9  0,6 Densidade 105 1,028  0,098

Classificação dos critérios urinários Número (%)

Hipercalciúria 108 56 (51,8) Hiperuricosúria 109 7 (6,4) Sódio aumentado 103 31 (30,1) Hipocitratúria 65 21 (32,3) Oxalúria 93 11 (11,8) Legenda: dp = desvio-padrão

Dentre os 107 (71,3%) prontuários cujos pacientes puderam ser classificados como dislipidêmicos, havia 60,7%, com aumento do colesterol total; 50,5%, com hipertrigliceridemia, 46,7% com baixos níveis de colesterol HDL segundo sexo, e 16,8%, com altos níveis de colesterol LDL. Em 35 (32,7%) prontuários, havia registro de dois critérios positivos para dislipidemia (Tabela 3).

Tabela 3 - Perfil lipídico dos pacientes com nefrolitíase classificados como dislipidêmicos

Perfil lipídico Frequência %

Resultados laboratoriais

Colesterol total > 200 mg/dL 65 60,7

Triglicerídeos > 150 mg/dL 54 50,5

HDL baixo 50 46,7

LDL > 160 mg/dL 18 16,8

Número de resultados alterados

Um 50 46,7

Dois 35 32,7

Três 18 16,8

Quatro 4 3,7

* percentual calculado com base no total de pacientes dislipidêmicos (n = 107)

Ao se avaliar a associação entre os distúrbios metabólicos urinários e HAS, glicemia de jejum alterada e dislipidemia, observou-se que pacientes com hipercalciúria apresentavam menos glicemia de jejum alterada de que pacientes sem hipercalciúria, com significância estatística exclusiva a essa associação (Tabela 4).

Não houve associação entre os distúrbios metabólicos urinários e os fatores de risco cardiovascular, incluindo as quatro alterações do perfil lipídico (Tabela 5).

64 Tabela 4 - Associação dos critérios urinários com os fatores de risco para doença cardiovascular entre pacientes com litíase urinária

* Associação estatisticamente significante (p < 0,05)

Critérios urinários

Hipertensão Glicemia de jejum alterada Dislipidemia

Sim N (%) Não N (%) p-valor Sim N (%) Não N (%) p-valor Sim N (%) Não N (%) p-valor Hipercalciúria Sim 16 (55,2) 40 (50,6) 0,676 6 (28,6) 50 (57,5) 0,017* 36 (48,0) 20 (60,6) 0,227 Não 13 (44,8) 39 (49,4) 15 (71,4) 37 (42,5) 39 (52,0) 13 (39,4) Hiperuricosúria Sim — 7 (8,8) 0,100 2 (9,5) 5 (5,7) 0,519 6 (7,8) 1 (3,1) 0,365 Não 29 (100) 73 (91,2) 19 (90,5) 83 (94,3) 71 (92,2) 31 (96,9) Sódio aumentado Sim 6 (21,4) 25 (33,3) 0,241 4 (21,0) 27 (32,1) 0,341 21 (28,4) 10 (34,5) 0,544 Não 22 (78,6) 50 (66,7) 15 (79,0) 57 (67,9) 53 (71,6) 19 (65,5) Hipocitratúria Sim 4 (20,0) 17 (37,8) 0,157 3 (25,0) 18 (34,0) 0,549 15 (32,6) 6 (31,6) 0,936 Não 16 (80,0) 28 (62,2) 9 (75,0) 35 (66,0) 31 (67,4) 13 (68,4) Oxalúria Sim 4 (16,7) 7 (10,3) 0,394 2 (12,5) 9 (11,7) 0,927 8 (12,3) 3 (10,7) 0,827 Não 20 (20,3) 62 (89,7) 14 (87,5) 68 (88,3) 57 (87,7) 25 (89,3)

65 Tabela 5 - Associação dos critérios urinários com os fatores de risco para doença cardiovascular entre os pacientes com litíase urinária

Critérios urinários Colesterol > 200 mg/dL Triglicerídeos > 150 mg/dL HDL alterado LDL > 160 mg/dL

N % p-valor N % p-valor N % p-valor N % p-valor

Hipercalciúria Sim 21 37,5 0,057 16 28,6 0,499 20 35,7 0,929 6 10,7 0,892 Não 29 55,8 18 34,6 19 36,5 6 11,5 Hiperuricosúria Sim 4 57,1 0,536 3 42,9 0,568 4 57,1 0,223 0 0,0 0,336 Não 46 45,1 33 32,3 35 34,3 12 11,8 Sódio aumentado Sim 13 41,9 0,533 12 38,7 0,420 10 32,3 0,611 2 6,5 0,362 Não 35 48,6 22 30,6 27 37,5 9 12,5 Hipocitratúria Sim 13 61,9 0,285 6 28,6 0,656 3 14,3 0,182 2 9,5 0,702 Não 21 47,7 15 34,1 13 29,6 3 6,8 Hiperoxalúria Sim 5 45,4 0,922 6 54,5 0,075 3 27,3 0,544 1 9,1 0,944 Não 36 43,9 23 28,1 30 36,6 8 9,8

DISCUSSÃO

A litíase urinária se apresenta hoje como uma doença prevalente na população e sua relação com os fatores de risco cardiovascular vem sendo evidenciada. Os achados epidemiológicos do presente estudo apontam para média de idade compatível com a população adulta.

Observou-se uma distribuição de pacientes com NL quase igual entre os sexos. Na literatura, o sexo masculino é descrito como o mais acometido, com maior prevalência no sexo feminino com os passar dos anos; o que pode estar relacionado a modificações no estilo de vida da população e maior exposição do sexo feminino a fatores ambientais predisponentes29.

No entanto esses argumentos não podem ser aplicados para explicar a semelhança das médias etárias do presente estudo posto se tratar de pesquisa retrospectiva, com base em prontuários, portanto com viés de informação. Este alerta é especialmente pertinente uma vez que, dentre 1.682 prontuários analisados, 150 preenchiam os critérios de inclusão.

Dentre os procedimentos cirúrgicos urológicos, a litotripsia extracorpórea foi o procedimento mais utilizado, o que já é descrito na literatura, por ser menos invasivo e com indicações mais amplas31. Pacientes com complicações urológicas relacionadas a litíase são pacientes de risco para evoluir para doença renal crônica (DRC) pela associação entre a presença do cálculo, o mecanismo obstrutivo e o processo inflamatório local, com geração de angiotensinogênio, espécies reativas de oxigênio, ativação de fatores de crescimentos e transcricionais que ampliam o mecanismo inflamatório e de cicatrização22. Em 2012, um estudo de coorte mostrou a relação entre um único episódio de NL e piora de função renal, com maior risco em mulheres com menos de 50 anos32. A relação de LECO com desenvolvimento de HAS em pacientes com NL, por um possível dano túbulo-intersticial já foi demonstrada, porém mais estudos são necessários para confirmar esta hipótese 33. A frequência de LECO nesta população representa um fator de risco a ser acompanhado, tal como suas possíveis consequências.

A frequência de pacientes hipertensos e do uso de medicações hipotensoras em pacientes com NL, aproximou-se à prevalência da população brasileira em geral para ambas as condições 34-36.

Foram registrados quatro pacientes que sabiam ser diabéticos, porém as dosagens de glicemia de jejum permitiram detectar um número maior de pacientes com glicemia de jejum alterada. Não existem estudos que comprovem associação da NL com esta faixa de glicemia de jejum, porém o estado de resistência à insulina e suas alterações no rim, poderiam justificar estes achados16. Comparando-se a prevalência brasileira de glicemia de jejum alterada na população em geral com nossos achados, identifica-se alto percentual de pacientes com NL com alteração de glicemia, faixa esta com potencial de desenvolvimento futuro de DM 37. Embora não seja estudado a relação de alterações glicêmicas, que não diabetes, com NL; talvez outras alterações metabólicas urinarias nesta população, relacionados a formação do cálculo, possa estar presente antes do desenvolvimento de diabetes.

Em nosso estudo, a frequência de dislipidemia ultrapassou a prevalência da população em geral27, sendo o aumento do colesterol total e a hipertrigliceridemia os mais frequentes. Embora não tenha sido pesquisado por nós, a relação do índice de massa corpórea (IMC) com NL poderia justificar esses achados14. Há evidências da associação entre SM e resistência à insulina em pacientes litiásicos, e a SM tem como um dos critérios a presença de alterações no perfil lipídico19. Estes achados já foram evidenciados na população com NL39, e os mecanismos fisiopatológios não são claros, embora, quando inclusos no espectro da SM, aumentem a prevalência de NL13,14.

Outra justificativa seria a associação a um perfil de hábitos de vida (dieta e sedentarismo) pouco saudáveis38, porém esses dados não foram estudados.

A hipercalcúria e a hipocitratúria são os distúrbios mais frequentes na população com NL e isto foi observado no presente estudo40. A presença de níveis de sódio urinário elevado, associado à alta densidade urinária, pode ter relação com características dietéticas e ambientais (baixa ingesta de água. alto consumo de sal e elevada temperatura da região estudada), que por sua vez são fatores importantes para a formação dos cálculos urinários5. A natriurese tem relação com hipercalciúria, HAS e litíase por cálculos compostos por cálcio7,8.

Avaliando-se a associação entre distúrbios metabólicos urinários e os fatores de risco estudados, os pacientes com hipercalciúria apresentaram menos glicemia de jejum alterada, o que não é descrito na literatura, já que a faixa de glicemia entre 100 e 125 mg/dL não é alvo de estudos em pacientes com NL. Este achado vai de encontro ao conhecimento científico atual, por se admitir que a resistência a insulina é capaz de reduzir níveis de pH urinário, sendo assim fator predisponente para cálculos de oxalato

de cálcio e ácido úrico15,16,18. Possivelmente, o pequeno número de pacientes, associado ao viés de o estudo ser retrospectivo, com base em registros em prontuário, bem como o nível de glicemia que utilizamos como ponto de corte possa ter interferido nos resultados.

Os pacientes com hipercalciúria detectados no nosso estudo, também apresentaram menos colesterol total alterado, porém sem significância estatística.

Também foi observada tendência de os pacientes hipertensos apresentarem menos hiperuricosúria e hipocitratúria, o que difere da literatura, já que há relações de HAS com hipercalciúria e hipocitratúria.

A presença de HAS em pacientes formadores de NL já foi demonstrada e há a presença de maiores níveis de cálcio urinário em pacientes com maior pressão arterial8. A associação positiva entre sódio urinário e hipercalciúria traz novas perspectivas para um melhor entendimento da relação entre ingesta de sódio, HAS e NL7. Em pacientes com HAS, níveis menores de citrato urinário já foram detectados, o que predispõe á formação de cálculos renais. A associação de hipocitratúria e a presença de acidose subclínica trazem evidencias laboratoriais de mecanismos que envolvem HAS, mediadores relacionados à vitamina D e níveis de renina; como também características

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