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Capítulo IV – Discussão

4.4 Atitudes públicas perante o lobo

4.4.2 Fatores que influenciam a atitude

No geral, os fatores socioeconómicos, os níveis de conhecimento e de medo são importantes para a explicação das atitudes dos inquiridos em relação ao lobo (Røskaft et al. 2007). Tais fatores devem ser investigados, e a sua interação deve ser compreendida, para que as medidas de conservação possam ser implementadas da melhor maneira (Klein 2013). No presente estudo podemos observar que os fatores que afetaram significativamente a atitude dos diferentes grupos foram o conhecimento, o nível de escolaridade e o medo.

Apesar de um maior conhecimento sobre os carnívoros parecer estar intuitivamente associado a uma atitude mais positiva em relação a estes, e esta associação positiva ter sido já observada por diversos autores (Bath et al. 2008; Balčiauskas et al. 2010; Glikman

et al. 2012), no caso de espécies de carnívoros altamente controversas, como é o caso do lobo, tal pode não ser sempre observado (Kellert et al. 1996; Majić & Bath 2005; Lescureux & Linnell 2010). Deste modo, os caçadores com mais conhecimento sobre questões relacionadas com o lobo apresentaram uma atitude mais negativa em relação a este carnívoro, e estes resultados vão ao encontro dos resultados apresentados por um estudo de atitudes públicas para com o lobo realizado na Suécia (Ericsson & Heberlein 2003). Este estudo mostrou que os caçadores que viviam em áreas com lobo tinham mais conhecimento sobre este canídeo mas, apresentavam, simultaneamente, as atitudes mais negativas (Ericsson & Heberlein 2003). Aparentemente a sua experiência com a espécie afetava de uma forma mais marcante a atitude, do que o conhecimento.Para além disto, segundo Zimmermann et al. (2001), indivíduos com atitudes negativas em relação a determinado assunto costumam manter-se mais informados no que a ele diz respeito. Um maior conhecimento, por vezes, pode representar uma base para racionalizar e reforçar atitudes prévias (sejam elas negativas ou positivas), e não uma causa de mudança dessas atitudes (Kellert 1994). Tendo em conta este padrão, é de esperar que apenas o fornecimento de informação sobre o lobo não seja suficiente para melhorar as atitudes dos caçadores com uma atitude mais negativa (Ericsson & Heberlein 2003), e isto deve ser levado em conta aquando da realização de campanhas de sensibilização.

Embora o conhecimento sobre os lobos não tenha apresentado uma relação positiva com a atitude, níveis superiores de educação parecem desempenhar um papel importante na melhoria das atitudes da população, o que está conforme o referido na literatura (Williams et al. 2002; Naughton-Treves et al. 2003; Kleiven et al. 2004; Espírito- Santo 2007; Røskaft et al. 2007; Espírito-Santo et al. 2013; Dressel et al. 2014; Espírito- Santo & Petrucci-Fonseca 2014; Suryawanshi et al. 2014). Para o grupo do público-geral

e para os caçadores, um maior nível de escolaridade parece estar associado a uma atitude mais favorável em relação ao lobo. Isto deve-se, possivelmente, ao facto de um maior nível de educação, na maioria das vezes, resultar numa maior consciência em relação à vida selvagem e à natureza (Williams et al. 2002; Gusset et al. 2008), e numa melhor compreensão da importância do papel ecológico dos carnívoros (Kvaalen 1998; Zimmermann et al. 2001), contribuindo, assim, para uma maior tolerância em relação a estes animais (Kleiven et al. 2004). Foi já descrito que indivíduos com níveis de educação superiores tendem a apresentar mais fortemente valores ecológicos e naturalistas (“preocupação com o meio ambiente como um sistema, e com as inter-relações entre espécies selvagens e habitats naturais” e “ênfase primária na experiência direta da vida selvagem num ambiente recreacional ao ar livre”) (Kellert 1994). Isto está em consonância com os resultados de um estudo de atitudes públicas para com o lobo, realizado na Noruega (Bjerke et al. 1998), que demonstrou que a percentagem de inquiridos que defendia uma diminuição da população lupina decrescia em grupos com maiores níveis de educação; inversamente, os valores naturalistas aumentavam à medida que a escolaridade era maior. Outro estudo realizado na Noruega observou também que indivíduos com uma educação superior apoiavam o aumento das populações de lobo, quando comparados com indivíduos com uma educação mais limitada (Skogen & Thrane 2007).

No entanto, contrariamente ao esperado, no caso dos criadores de gado, um maior grau de escolaridade teve uma influência negativa na atitude deste grupo. Não parece existir uma razão evidente para esta associação, e isto pode querer dizer que outros fatores podem estar a influenciar esta atitude negativa de forma mais intensa. Apesar disto, uma possível explicação foi avançada por Klein (2013), num estudo do conflito entre as populações locais e carnívoros, numa região do Botsuana. Segundo este autor, pessoas com níveis superiores de escolaridade passam mais tempo afastadas das terras para se focarem na sua educação. Consequentemente, acabam por perder a ligação com práticas tradicionais de coexistência com os carnívoros, e isto acaba por resultar numa perda da compreensão da vida selvagem, e das práticas da proteção ao gado doméstico a ela associadas. Segundo este autor, quanto maior a proximidade ao estilo de vida rural, maior é a probabilidade de aprenderem a coexistir com a vida selvagem.

Para além do conhecimento e do nível de escolaridade, o medo foi o fator que influenciou negativamente e, mais intensamente, a atitude de todos os grupos-alvo: inquiridos que sentiam mais medo do lobo apresentaram também uma atitude mais negativa. Este padrão foi já amplamente descrito na literatura (Espírito-Santo 2007; Majić 2007; Espírito-Santo & Petrucci-Fonseca 2014), e uma forte correlação negativa entre a

atitude e o medo foi observada no teste de correlação entre os diferentes índices utilizados neste estudo. Do mesmo modo, num estudo efetuado na Noruega, onde foram estudadas as atitudes da população para com quatro carnívoros diferentes [i.e. glutão (Gulo gulo), lince (Lynx lynx), urso-pardo (Ursus arctos) e lobo (Canis lupus)], os inquiridos que sentiam um medo mais forte dos carnívoros e que mais se preocupavam com a sua própria segurança e a da sua família, expressaram também as atitudes mais negativas para com as quatro espécies (Røskaft et al. 2007).

Posto isto, parece importante ter em conta os níveis de medo que as populações sentem do lobo em campanhas de sensibilização que tenham o objetivo de melhorar as atitudes públicas. Como observado, o medo teve uma influência muito mais forte na atitude do que o conhecimento, e, portanto, é imperioso selecionar-se a informação mais eficaz no sentido de permitir a diminuição do medo das populações, e não apenas elucidar sobre a biologia e comportamento da espécie. Especificamente para a região estudada, deve ser transmitida a mensagem de que o lobo não representa um perigo, nem para o Homem, nem para as criações de gado da região, uma vez que os ataques ao gado são muito raros.