• Nenhum resultado encontrado

10

No sentido de reduzir o efeito estocástico deste processo, foram desenvolvidas abordagens de análise que combinam dados moleculares multilocus (Brito & Edwards 2009) e inferências Bayesianas de coalescência (Yang & Rannala 2010). Este fato conduziu a uma mudança de foco nos estudos filogenéticos, inicialmente pautados pela análise individual das árvores de genes, para uma abordagem mais global utilizando-se árvores de espécies. Este método de vanguarda, que avalia as incertezas provenientes das árvores de genes, tem sido eficaz na delimitação de linhagens evolutivas, na estimativa do tempo de divergência entre linhagens recentemente diferenciadas, assim como contribuiu para o desenvolvimento das análises filogeográficas (ver Edwards 2009, O’Meara 2010, 2012; Yang & Rannala 2010, Ence & Carstens 2011, Carstens et al. 2013, Edwards & Knowles 2014).

1.1.2 Filogeografia

Os padrões de divergência genética observados ao nível intraespecífico e entre espécies próximas são o resultado da combinação das histórias evolutivas (tempo) com os fatores que limitam a dispersão das populações (espaço). A deteção e descrição desses padrões são importantes na inferência de processos microevolutivos. Com esta finalidade, surgiu em finais da década de 80 uma nova área multidisciplinar, a Filogeografia (Avise et al. 1987), que incorpora conhecimentos científicos de diversos domínios: Filogenia, Genética Populacional, Ecologia, Paleontologia, entre outros (Avise 2000, 2009). Originalmente concebida como elo de ligação entre a Filogenia e a Genética Populacional, a Filogeografia cresceu como disciplina fazendo rápidos avanços nos seus métodos de análise através da incorporação da teoria da coalescência (ver Hickerson et al. 2010).

Devido à natureza estocástica do processo genealógico e à possível ocorrência de fenómenos seletivos, diferentes marcadores (DNA nuclear, DNA mitocondrial e microssatélites) devem ser combinados em estudos filogeográficos e, sempre que possível, aumentado o número de loci investigados (Edwards & Beerli 2000, Garrick et al. 2011). Desta forma, possíveis problemas relacionados com as estimativas do tempo de divergência e presença de polimorfismo ancestral são minimizados ou completamente resolvidos (Knowles 2009, Hickerson et al. 2010). Os estudos filogeográficos são fortemente apoiados em análises de dados de diversidade genética, traduzidos em árvores e redes de haplótipos. Entretanto, na última década, observou-se a introdução de outros tipos de informação nas análises filogeográficas, nomeadamente tamanho do efetivo populacional, crescimento ou declínio populacional, taxas de migração (Watterson 1975, Tajima 1989), utilização de

FCUP

Filogeografia

11

árvores de espécies, estimativa dos tempos de divergência (Heled & Drummond 2010, Yang & Rannala 2010), assim como, modelação de nicho ecológico (Knowles 2009, Chan et al. 2011, Alvarado-Serrano & Knowles 2014). Estes dados são essenciais para a determinação dos processos históricos e das dinâmicas populacionais envolvidas nos padrões de distribuição da variabilidade genética intraespecífica, principalmente em dois cenários: i) quando os eventos de divergência são muito recentes ou ii) na identificação de isolamento populacional por alopatria na presença de eventos de expansão populacional recentes ou de fluxo génico, o que pode gerar associações com o primeiro cenário.

A crescente complexidade das questões filogeográficas fez com que surgisse a necessidade de análises determinísticas e significativas, culminando com o surgimento da Filogeografia Estatística (Knowles 2009, Chan et al. 2011). Atualmente, a aplicação de métodos estatísticos rigorosos, utilizando complexos programas computacionais, permite análises refinadas de conectividade genética entre as populações, com a descrição de corredores de dispersão, estimativas de taxas de migração e sentido do fluxo génico (ver Kuhner 2009, Nielsen & Beaumont 2009), assim como, a avaliação de modelos de divergência populacional através de testes probabilísticos, em função da incerteza sobre os parâmetros populacionais históricos, tais como tamanho efetivo da população ancestral e tempo de divergência entre populações (Amaral et al. 2013, Tsai & Carstens 2013).

1.1.2.1 Filogeografia comparada

O número de trabalhos publicados sobre a Filogeografia de diversas espécies tem aumentado de forma significativa desde o final do século passado (Avise 2000, Hewitt 2000, 2004). Este aumento permitiu a comparação e posterior observação de concordância entre alguns padrões filogeográficos numa mesma área de distribuição (Filogeografia comparada – Taberlet et al. 1998). Tanto em ambientes terrestres como aquáticos é possível destacar mecanismos geológicos e/ou climáticos envolvidos na história evolutiva, ou mesmo ecológica, de um determinado grupo de espécies através da Filogeografia comparada. Um exemplo da aplicação deste tipo de estudos está relacionado com os ciclos glaciares do Pleistoceno, uma época caracterizada por intensa diversificação biológica em consequência de drásticas flutuações climáticas (Taberlet et al. 1998, Hewitt 2004, 2011; Gómez & Lunt 2007). Nestes estudos foi também possível a determinação dos efeitos dos processos de diversificação, a avaliação dos possíveis cenários biogeográficos sob uma perspetiva probabilística, a elucidação do papel dos fenómenos climáticos e históricos na subestruturação populacional e a identificação de refúgios glaciares, rotas de colonização pós-glaciar e regiões de contacto secundário (ver Carstens et al. 2005, Gómez & Lunt 2007,

FCUP

Filogeografia

12

Hewitt 2011). Este tipo de abordagem comparada tem contribuído também de forma relevante para a avaliação das respostas bióticas atuais e para a projeção destas para o futuro, visando a conservação e gestão das espécies e populações dentro de um contexto global de alterações climáticas (Avise 2009, Hickerson et al. 2010, Fordham et al. 2014).

1.1.2.2 Distribuição espacial e modelação de nicho ecológico

Um importante objetivo presente em diversas investigações nestes últimos anos é determinar quais as consequências das alterações climáticas globais para as populações e espécies. A modelação de nicho ecológico (MNE) (Haffer 1969), associada a estudos filogeográficos, tem sido uma abordagem cada vez mais aplicada para responder a estas questões, demonstrando por exemplo que as mudanças climáticas afetam a distribuição geográfica das espécies, os padrões de estrutura genética e ainda as dinâmicas de fluxo génico (ver Stewart 2009, Stewart et al. 2010; Tocchio et al. 2015). Se, por um lado, as barreiras vicariantes podem conduzir a processos de divergência alopátrica, limitando o fluxo génico e reforçando padrões de estrutura populacional (Hewitt 2004), por outro, os fatores ambientais/ecológicos têm um papel importante na diversificação, viabilidade e manutenção de populações e espécies (Thomassen et al. 2010, Gotelli & Stanton-Gueddes 2015). As análises de MNE utilizam dados fisiográficos georeferenciados (por exemplo, vegetação, clima, paleoclima, geologia) aplicados ao Sistemas de Informação Geográfica - SIG(do inglês Geographic Information System) (ver exemplos em Swenson 2008, Alvarado- Serrano & Knowles 2014). Os modelos resultantes geram mapas indicativos de áreas de alta e baixa aptidão abiótica (persistência), baseados na tolerância ecológica de uma determinada espécie ou unidade evolutiva (ver Soberón & Nakamura 2009, Warren et al. 2008). A previsão da distribuição geográfica de uma determinada espécie pode ser obtida em diferentes escalas temporais (passado, presente e, até mesmo, futuro).

A combinação de dados genéticos e ambientais é uma ferramenta poderosa para responder a perguntas biogeográficas mais complexas (Gotelli & Stanton-Gueddes 2015, Serra-Varela et al. 2015) Vários têm sido os trabalhos científicos a utilizar esta metodologia, nomeadamente na identificação de potenciais áreas de estabilidade climática nas regiões temperadas durante o Pleistoceno (Waltari et al. 2007, Abellán & Svenning 2014), na determinação dos requisitos ambientais responsáveis pelo estabelecimento e manutenção de zonas híbridas (Martínez-Freiría et al. 2008, 2009, 2015; Tarroso et al. 2014) e na avaliação da existência de diferenças de nicho entre linhagens evolutivas divergentes (McCormack et al. 2010, Alvarado-Serrano & Knowles 2014, Rato et al. 2015).

FCUP

Documentos relacionados