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FECHANDO PARÊNTESES: RETOMANDO A REFLEXÃO TEÓRICA

No documento 2019RafaeldeSouzaTimmermann (páginas 76-78)

3.3 Gostamos de Benveniste

3.3.2 FECHANDO PARÊNTESES: RETOMANDO A REFLEXÃO TEÓRICA

Retomamos, assim, a exposição feita por Flores (2017) em suas aulas ministradas na École Normale Supérieure, no que diz respeito aos eixos temáticos dos estudos benvenistianos no Brasil, hoje.

O autor (2017, p. 77), começa apresentando um quadro, no qual resume, didaticamente, os três eixos sugeridos por ele:

Quadro 1: Segunda recepção de Benveniste no Brasil Primeiro eixo Situa a enunciação no centro

da reflexão.

Produz uma linguística da

enunciação strictu sensu. Segundo eixo Situa a enunciação no centro

da reflexão, mas a articula ao conjunto da teoria da linguagem de Benveniste, tendo em vista uma teorização comum ao campo das ciências humanas em geral.

Produz uma abertura para uma teoria da linguagem em diálogo com as ciências conexas.

Terceiro eixo Situa a imanência da teoria da linguagem de Benveniste no centro da reflexão e visa esclarecer termos, noções e conceitos da teoria.

Produz estudos intra- teóricos, uma espécie de

hermenêutica da teoria.

Fonte: Flores (2017, p. 77)

O primeiro eixo, como descrito no quadro, situa os estudos que tem como foco a enunciação propriamente dita, baseados, principalmente, no texto O aparelho formal da

enunciação26, buscando as indicações presentes no texto para “definir a língua a partir de categorias específicas (tempo, espaço e pessoa)” (FLORES, 2017, p. 77). No entanto, salienta

26 Esse texto ganha destaque na obra de Benveniste, pois é nele que encontramos de forma mais direta e pontual

o autor, que se deve tomar cuidado com a ênfase dada a aspectos descritivos, pois “em Benveniste, o estudo das línguas está sempre relacionado a uma teoria da linguagem, o que remete, por sua vez, a uma teoria da significação na qual o homem tem lugar central” (FLORES, 2017, p. 79).

O segundo eixo, os estudos que nele se enquadram, explicita uma relação entre linguagem e cultura. Embora seja impossível retirar a teoria da enunciação quando se estuda Benveniste, nesse eixo, a enunciação não é o centro da discussão. Flores (2017, p. 80) pontua que se interessa por esses trabalhos

uma vez que eles iluminam uma prática de Benveniste, qual seja, a da interlocução interdisciplinar. Ora, o diálogo com áreas conexas, para usar uma expressão de Saussure, à linguística é uma constante na prática de Benveniste.

Assim, é a posição de diálogo do linguista que convoca sua teoria ao diálogo!

Dessa forma, mesmo não separando a reflexão da enunciação, pois este é um conceito que atravessa os textos de Benveniste, direta ou indiretamente, é possível pensar a língua em uma dimensão que abrange a cultura e a sociedade, pois estão intimamente ligadas, como pontuaremos no capítulo seguinte de forma mais expressiva. Por ora, dizemos que é a partir dessa relação e desse olhar cultural/antropológico para a língua que Benveniste nos permite compreender a língua e a sua realização (enunciação) e, por isso, dialogar sobre o ensino.

O terceiro e último eixo destacado por Flores (2017) diz respeito aos estudos que se propõem a analisar o pensamento benvenistiano em sua integralidade, pois percebem que, dessa forma, a teoria de linguagem que o autor propõe é melhor compreendida. Esses estudos, no Brasil, ganharam força, segundo Flores, pela certa simultaneidade com que foram publicadas as Últimas aulas, aqui e na França. Essa força advém dos estudos atuais de forma geral e dialogam e contribuem para que mais se entenda de Benveniste.

Situamos nosso trabalho no segundo eixo elaborado por Flores (2017). Tentamos compreender a teoria de linguagem que Benveniste desenvolve em seus textos, principalmente notando a presença do homem e da cultura na língua; e, com essa compreensão, salientamos que o conhecimento construído a partir do pensamento de Benveniste dialoga, de forma positiva, com os estudos referentes ao ensino de línguas estrangeiras: tratamos de língua. Isso, em si, bastaria. No entanto, nos próximos capítulos, discorremos sobre este diálogo possível,

pois percebemos que os professores podem ser beneficiados em suas escolhas docentes se as fizerem sob a luz dos preceitos benvenistianos.

Para encerrar esta seção inicial, seguimos o conselho de Flores (2017, p. 88):

Enfim, estamos no tempo de reler Benveniste. É mesmo necessário que a linguística volte a se surpreender com a fineza de um raciocínio que vai se fazendo na medida em que é exposto. O jovem linguista, o que está em formação e ainda não pensa que já está tudo dito, deve se beneficiar, e muito, da sagacidade de um mestre.

Não temos a ambição de determinar novos rumos para os estudos da linguística da enunciação, mas sim contribuir, de alguma forma, para as discussões sobre língua, ensino de língua estrangeira, enunciação e os saberes que compõem essas teorias, tentando não repetir os assuntos já tratados em demasia. Salientamos que não aprofundaremos os conceitos, como outros trabalhos assim o fazem, pois têm esse intuito. Nosso objetivo é utilizar conceitos provenientes de uma leitura possível sobre a Teoria da Enunciação para realizar uma discussão a respeito do ensino de línguas.

Nessa seção, discorremos sobre a vida de Émile Benveniste, sua contribuição para a linguística (sem aprofundamento teórico), bem como a recepção de seu pensamento no Brasil. Após isso, justificamos, de forma inicial, nossa escolha pelo tema e pelo aparato teórico baseado em Benveniste.

Com Barthes (1988), concordamos que gostamos de Benveniste. Com Flores (2017), concordamos que é necessário ler Benveniste, reler Benveniste e, principalmente, no nosso caso, dialogar com Benveniste.

Na próxima seção, apresentamos textos de leitores de Benveniste que tratam do ensino de língua materna sob um viés enunciativo. A discussão que começa em seus textos, de certa forma, motivou-nos e, acreditamos que os apresentar aqui despertará o mesmo interesse em nossos leitores.

No documento 2019RafaeldeSouzaTimmermann (páginas 76-78)