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2.2 Descrição da alta atmosfera e ionosfera

2.2.3 Fenômenos da Atmosfera Neutra

Uma propriedade muito importante da atmosfera neutra da Terra é a de suportar movimentos ondulatórios. A dinâmica da atmosfera neutra consiste em perturbações induzidas por fontes internas e externas, tais perturbações são do tipo ondas atmosféricas que podem transmitir energia e momentum sem transportar matéria. De acordo com o seu período, as principais ondas atmosféricas de interesse geofísico são categorizadas como ilustrado na Tabela 2.1.

Tabela 2.1 – Principais ondas atmosféricas.

Ondas Período Região de ocorrência

Acústica < 270 segundos Troposfera

Gravidade ~5 min - ~10 horas Troposfera-Mesosfera-Ionosfera

Marés atmosféricas 24,12,8 horas Estratosfera-Mesosfera

Ondas planetárias 2-16 dias Troposfera-Mesosfera

Fonte: Adaptada de WRASSE et al. (2004).

As ondas devido à força da gravidade são as ondas de gravidade; e aquelas devido às forças rotacionais são as ondas de escala planetária Rossby (WRASSE et. al, 2004; SCHUNK et al., 2009). As ondas atmosféricas são geradas na estratosfera e mesosfera propagando-se para alturas equivalentes a baixa termosfera. A dinâmica da atmosfera neutra é muito importante no estudo da ionosfera, uma vez que vários estudos mostram um acoplamento entre marés atmosféricas e a dinâmica da ionosfera. As marés atmosféricas controlam o movimento dos ventos neutros (ventos de marés) e também o dínamo da região E. Estudos recentes têm mostrado associações entre ondas de gravidades e instabilidades de plasma na região F da ionosfera. (FAGUNDES et al., 1998; FAGUNDES et al.,2009ab ENGLAND et al.,2010)

Ondas de gravidade - As ondas de gravidade são oscilações com períodos da ordem de minutos a horas e as dimensões espaciais variam de alguns quilômetros a dezenas de quilômetros. Começaram a serem estudadas na década 50, a partir de observações dos perfis irregulares dos ventos na alta atmosfera. Estes perfis observados estavam associados aos modos de propagação de ondas de gravidade da atmosfera, cuja origem é devido ao balanço entre as forças de gravidade e a força gradiente de pressão. Nas últimas décadas, radares operando em VHF, radares de laser, além de outros instrumentos, foram utilizados para caracterizar as ondas de gravidade (HINES 1960; WRASSE et. al., 2007).

A maioria destas fontes de geração encontra-se na troposfera, incluem fenômenos meteorológicos como as frentes frias, sistemas convectivos, ventos que sopram sobre montanhas, entre outros. Estas ondas atmosféricas influenciam em larga escala a circulação e a estrutura da atmosfera. As ondas de gravidade transportam energia e momentum entre a baixa e a média atmosfera, sendo uma das oscilações responsável pelo acoplamento dinâmico entre as camadas da atmosfera (KIRCHHOFF, 1991; WRASSE et al., 2007). A Figura 2.3 apresenta um esquema ilustrativo de uma onda de gravidade se propagando verticalmente para cima.

Figura 2.3 – Esquema ilustrando a propagação de uma onda de gravidade em um meio dispersivo (atmosfera) com as propriedades básicas de uma onda de gravidade verticalmente propagante, para k >0, m <0 e ω >0, onde k é o número de onda zonal, m é o número de onda vertical e ω é a frequência intrínseca da onda.

Fonte: Retirado de Vargas (2007).

Quando uma onda de gravidade se propaga na atmosfera neutra é de se esperar que seus efeitos cheguem até a ionosfera, pois através do arraste iônico, o campo do vento dos íons está acoplado ao campo dos ventos neutros.

Marés atmosféricas - As marés atmosféricas são oscilações com períodos submúltiplos do dia lunar ou solar, de escala da ordem de 8, 12 e 24 horas. A principal causa das marés está associada ao aquecimento da atmosfera pela absorção da radiação UV pelas moléculas de ozônio e vapor d’água. As marés são caracterizadas pela variabilidade de curto prazo, que podem resultar de

interações gravitacionais com as ondas planetárias ou as ondas de gravidade, podendo ser globais ou locais (ANDREWS et al., 1987; KIRCHHOFF, 1991). As primeiras verificações da existência de marés na atmosfera foram no século IXX, através de medidas barométricas realizadas nos trópicos (o barômetro é um instrumento que mede a coluna de ar sobre um determinado local sendo, portanto, um indicador de oscilações na atmosfera). Bartels (1928) realizou um registro barográfico de duas estações localizadas em diferentes latitudes e verificou diferentes resultados para diferentes latitudes e horas do dia. Na década de 60 uma explicação satisfatória para as marés começou a surgir através dos trabalhos de Lindzen, Silbert e Kato na chamada teoria clássica das marés. Nesta teoria foi considerado que a atmosfera pudesse ser repartida em modos de oscilações horizontais, cada qual com sua estrutura vertical associada. A partir de 1970, os estudos teóricos de marés atmosféricas foram se aprimorando, muitos processos físicos que não foram considerados na teoria clássica, agora foram considerados e incluídos, como a difusão turbulenta e molecular do calor e momento, resfriamento newtoniano, forças eletrodinâmicas, variações na composição, interações com ventos médios e gradientes meridionais de temperatura (KATO, 1980; ANDREWS et al., 1987).

Ondas planetárias - São movimentos com períodos da ordem de 2, 5 e 16 dias. As ondas planetárias são ondas do tipo horizontal transversal com comprimentos de onda horizontais de milhares de quilômetros (Figura 2.4), cuja força restauradora é a variação do parâmetro de Coriolis com a latitude, associada à conservação da vorticidade potencial. As ondas planetárias também são chamadas de ondas de Rossby.

Figura 2.4 - Mecanismo e propagação de uma onda de Rossby. Campo de perturbação da vorticidade (+ e −) e campo de vorticidade induzida (setas tracejadas).

As ondas equatoriais de escala planetária são geradas principalmente por mecanismos que envolvem sistemas convectivos de nuvens na troposfera tropical. Outras principais fontes de geração das ondas de Rossby são os processos convectivos, as interações não lineares entre marés atmosféricas e ondas de gravidade ou modos diferentes de ondas de marés, as variações isoladas na topografia, o aquecimento diferencial entre continentes e oceanos (KIRCHHOFF, 1991; FORBES, 1997; WRASSE, 2007).

Ventos Termosféricos - As primeiras observações sobre os ventos termosféricos são recentes, realizadas a partir de estudos do arrasto exercido pela atmosfera neutra sobre os satélites artificiais que mudavam a órbita ao entrarem em contato com a atmosfera. O efeito dos ventos é mais pronunciado entre as 21h e 24h LT (KING-HELE et al., 1970; KIRCHHOFF, 1991, KELLEY, 2009).

A radiação solar na faixa do EUV é absorvida entre 100 e 200 km de altura e produz aquecimento e ionização local. A expansão térmica gerada nessa região produz o abaulamento atmosférico o qual induzirá gradientes horizontais de pressão que ocasionam os ventos termosféricos (KIRCHHOFF, 1991). A Figura 2.5 ilustra a formação do vento neutro pela expansão térmica da atmosfera.

Figura 2.5– Formação do vento neutro pela expansão térmica da atmosfera terrestre. Fonte: Retirada de Rees (1989).

O vento neutro sopra da região diurna para as regiões noturnas e por meio de colisões entre partículas neutras e carregadas gera uma deriva destas partículas. Os íons se deslocam através das linhas de campo geomagnético, enquanto que os elétrons têm seu movimento restrito na direção do campo magnético. Este movimento induz campos alinhados que dependem da configuração do campo magnético da Terra.

Em regiões de alta latitude existe outra fonte de aquecimento que contribui para o acionamento dos ventos. O aquecimento devido à absorção no EUV nas altas latitudes apresenta forte variação diária e horária. Em condições magneticamente calmas, também, existe uma contínua produção de ionização por precipitação de partículas que aquece as regiões mais baixas da ionosfera na zona auroral. Este aquecimento pode aumentar e atingir latitudes mais baixas durante os períodos magneticamente perturbados (MUELLA, 2004).

Os ventos termosféricos desempenham um papel fundamental na dinâmica da ionosfera, interagem de modo efetivo com o plasma desta região e alteram o ambiente ionosférico. Por circularem na região compreendida pela camada F da ionosfera, eles interagem com as partículas ionizadas desta região através do arraste iônico, esta interação é mais intensa no período diurno, sendo que à noite, as partículas ionizadas são dirigidas para altitudes maiores, em função destes ventos serem direcionados para o equador, o que ajuda na manutenção da ionosfera neste período.

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