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Ferramentas de Gestão do Cuidado

2 MÉTODO 1

3.3 POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO BÁSICA

3.3.3 Ferramentas de Gestão do Cuidado

Brasil (2017) aponta que dentre as diversas características do processo de

trabalho na AB temos a resolutividade, a qual se entende pela capacidade de

identificar e intervir nos riscos, necessidades e demandas de saúde da população,

atingindo a solução de problemas de saúde dos usuários. Para tanto, é necessário

o uso de diferentes tecnologias e abordagem de cuidado, como as ferramentas da

clínica ampliada, gestão da clínica e promoção da saúde.

Entende-se por ferramentas de gestão clínica um conjunto de tecnologias de

microgestão do cuidado destinado a promover uma atenção à saúde de qualidade,

como protocolos e diretrizes clínicas, plano de ação, linhas de cuidado, projetos

terapêuticos singulares, genograma, ecomapa, gestão de listas de espera, auditoria

clínica, indicadores de cuidado, entre outras. Para a utilização dessas ferramentas,

deve-se considerar a clínica centrada nas pessoas; efetiva, estruturada com base

em evidências científicas; segura, que não cause danos às pessoas e aos

profissionais de saúde; eficiente, oportuna, prestada no tempo certo; equitativa, de

forma a reduzir as desigualdades e que a oferta do atendimento se dê de forma

humanizada. (BRASIL, 2017)

O Projeto Terapêutico Singular é uma forma de organização da gestão do

cuidado, instituída no processo de trabalho em saúde entre as equipe da Atenção

Básica. Trata-se de uma ferramenta de organização e sistematização do cuidado

constituído pela equipe de saúde e usuário que precisa considerar a singularidade

do sujeito e a complexidade de cada caso, sendo um conjunto de propostas de

condutas terapêuticas articuladas para um indivíduo, família ou coletivo, que tem

como resultado a discussão coletiva de uma equipe interdisciplinar, com apoio

matricial se necessário. (BRASIL, 2013)

Entende-se projeto como uma ferramenta assistencial que ao ser construída

deve ter como meta final ir além da formulação da ação, visando a transformação

o dever de compreender para além das patologias ou distúrbios da saúde.

Considera- se que os problemas dos indivíduos, grupos ou comunidades são

processos que envolvem diversos setores condicionantes. E singular, pois

expressa o foco da ação em torno da qual uma equipe é mobilizada em seu conjunto

para pensar e encontrar possíveis respostas, devendo saber e reconhecer que esse

foco pode ser relacionado em uma diversidade de outros focos ou problemas.

(BRASIL, 2017)

A utilização do PTS se constitui também em um dispositivo de gestão capaz

de provocar processos de reflexão e ação nos trabalhadores de saúde,

possibilitando a ressignificação e corresponsabilização de sua postura profissional

e de suas práticas à luz das realidades institucionais e comunitárias onde estão

inseridos, na perspectiva do compartilhamento de saberes e responsabilidade.

(BRASIL, 2017)

O PTS é elaborado a partir de uma análise com toda a equipe para entender

todas as dimensões do sujeito, considerando todas as visões sobre ele. É um

processo dinâmico que precisa manter em seu horizonte um caráter provisório

dessa construção, devido ao fato das relações entre os profissionais e o usuário

estarem constantemente se transformando. (BRASIL, 2017)

Existem quatro momentos para a formação do projeto: o diagnóstico

situacional, a definição de metas, a divisão de responsabilidades e a reavaliação. O

diagnóstico situacional refere-se à identificação das necessidades, demandas,

vulnerabilidades e potencialidades mais relevantes de quem busca ajuda. Além das

dimensões subjetivas, também é necessário reconhecer o contexto social e histórico

em que se inserem a pessoa, a família, o grupo ou o coletivo ao qual está dirigido o

PTS. A definição de metas é entendida como irão se formar as questões as quais

se podem intervir. A operação deste processo se dá por meio de uma comunicação

sensível e das combinações entre o técnico de referência e a equipe e pelo técnico

de referência com a pessoa, família grupo ou coletivo. É importante fazer projeções

de curto, médio e longo prazo.

A divisão de responsabilidades envolve a definição clara e a atuação do

técnico de referência por meio do esclarecimento do que vai ser feito, por quem e

em que prazos. O técnico tem a responsabilidade de coordenar o PTS, suas tarefas,

metas e prazos por meio do acompanhamento, articulação, negociação pactuada e

reavaliação do processo com a pessoa, seus familiares, a equipe de saúde e outras

instâncias que sejam necessárias. E por fim, a reavaliação deve ser sistemática,

agendada com a equipe e a pessoa cuidada. Deve ser realizada em vários

momentos os quais incluem encontros entre a pessoa cuidada, seus familiares e o

técnico de referência, além das reuniões de equipe e as reuniões ampliadas com

outros serviços e instituições implicados no PTS.

É necessário observar aspectos importantes como a escolha dos casos para

reuniões de PTS, escolhendo os usuários ou famílias em situações mais graves e

difíceis; as reuniões para a discussão de PTS, reservando um tempo fixo, semanal

ou quinzenal para as reuniões exclusivas do PTS; o tempo do PTS; a mudança e

as diferenças, conflitos e contradições.

Finalmente, algumas considerações precisam ser estabelecidas sobre o

PTS: é importante fazer junto e não pelo outro, buscar resoluções com e não para

o outro, ofertar contatos, encontros e momentos de conversa, seja nos espaços dos

serviços, na rua ou no domicílio das pessoas e oportunizar o vínculo e a formação

de algo em comum. O caminho do usuário ou do coletivo é somente dele, sendo ele

quem dirá se e quando quer ir, negociando ou rejeitando as ofertas da equipe de

saúde.

4 ANÁLISE DAS CENAS

4.1 CENA 01:

Após uma visita domiciliar feita pelo ACS (Agente Comunitário de Saúde)

Malaquias à casa da família de Joel, a enfermeira e coordenadora da Unidade de

Saúde, Beth, convoca a equipe para uma reunião para discutir o caso. Beth pede

para Malaquias falar sobre o caso por fazer parte da área de abrangência onde ele

atua como ACS, então Beth faz algumas perguntas para expor o caso à equipe,

como, ‘quem mora na casa e como é o ambiente?’. Malaquias expõe que na casa

moram o casal e dois filhos e que o ambiente é escuro, “sinistro” e com muitos

objetos acumulados, principalmente materiais eletrônicos. Em seguida o médico

Paulo questiona se ele chegou a falar com a família, Malaquias responde que não

foi possível, pois eles estavam no meio de um “ritual” e pediram para voltar mais

tarde. Beth então relata ter recebido um email do pronto atendimento dizendo que

uma menina de 8 anos que mora na casa foi ao pronto atendimento com febre de

40 graus e sinais de Subnutrição, levada pelo irmão mais velho de 13 anos que não

sabia sequer a data de nascimento dela. Malaquias ressalta que as informações

que conseguiu colher sobre a família foi através dos vizinhos, que disseram que

eles praticam “magia negra”. A reunião encerra quando Paulo se dispõe a

acompanhar o ACS em uma segunda visita domiciliar, e Beth ressalta que a equipe

precisa solucionar logo o caso, antes que envolva outras esferas como conselho

tutelar, vigilância sanitária e ministério público.

4.1.1 Análise da Cena 01

A partir desta cena podemos compreender alguns aspectos positivo sobre a

produção do processo de trabalho da equipe, que se mostra horizontal e valorizador

do trabalho multiprofissional, tendo em vista o protagonismo do ACS nas falas sobre

o caso que diz respeito ao território de sua abrangência. Este processo é nomeado

como uma prática da micropolítica do processo de trabalho, onde se dá o

protagonismo do trabalhador da saúde em seu espaço de trabalho e relação,

organizando assim as ações em saúde, sendo elas individuais ou coletivas. (Brasil

2005)

Também compreende-se a reunião de equipe como um dispositivo

indispensável e importantíssimo para a produção de cuidado em saúde, a reunião

é o momento de compartilhamento de ideias, saberes, perspectivas e afecções a

respeito de um caso, do processo de trabalho e de outras questões pertinentes à

produção de saúde. Sobre o dispositivo reunião de equipe Brasil (2009) aborda que:

Para que a equipe consiga inventar um projeto terapêutico e negociá-lo com o usuário, é importante lembrar que reunião de equipe não é um espaço apenas para que uma pessoa da equipe distribua tarefas às outras. Reunião é um espaço de diálogo e é preciso que haja um clima em que todos tenham direito à voz e à opinião. Como vivemos numa sociedade em que os espaços do cotidiano são muito autoritários, é comum que uns estejam acostumados a mandar e outros a calar e obedecer.

(

p.55)

Quando a equipe consegue estabelecer um ambiente relacional propício

para o uso adequado das reuniões de equipe, o processo de produção de cuidado

é facilitado, se distanciando de produções hegemônicas tayloristas de organização

do processo de trabalho. Segundo CAMPOS (1998):

A Teoria Geral da Administração, o taylorismo em particular, coloca-se a tarefa de administrar pessoas como se elas fossem instrumentos, coisas ou recursos destituídos de vontade ou de projeto próprio. Faz parte da cultura tradicional da maioria das Escolas da Administração o objetivo explícito de disciplinar o trabalhador, quebrar-lhe o orgulho, a autonomia e a iniciativa crítica. Delegando a padrões, normas e programas a função de operar o trabalho cotidiano daqueles encarregados de executar ações. Algumas Escolas apostaram mais em controles disciplinares para realizar este intento, bastaria-lhes a domesticação do comportamento dos trabalhadores; outras, entretanto, mais modernas e com pensamento mais estratégico, inventaram modos para modificar a subjetividade dos sujeitos, ganhar-lhes a alma. (p.865)

Quando se discute de forma multidisciplinar e horizontal um caso, a

discussão tende a partir de perspectivas mais amplas sobre o processo

saúde-doença, do que uma conduta definida e estabelecida por um único profissional,

partindo exclusivamente de sua perspectiva para analisar e estabelecer a conduta

a ser aplicada. Mais adiante na cena 3 e 4 será discutido uma situação onde a

conduta da equipe foi estabelecida de forma isolada, vertical e centrada num saber

biomédico.

Outro ponto a ser ressaltado em relação a esta primeira cena é o papel do

ACS na equipe. O agente comunitário é quem faz o primeiro contato com a

comunidade através de visitas domiciliares, lançando mão de uma busca ativa.

Segundo Brasil (2017) o ACS busca compreender aspectos quanto aos contextos

demográficos, sociais, culturais, ambientais e sanitários das famílias do território de

sua abrangência e atuação, a fim de contribuir no processo de territorialização,

assim como indicar a necessidade de internações domiciliares, mantendo a

responsabilização pelo acompanhamento da pessoa e desenvolver e planejar junto

a equipe ações a fim de integrar a equipe à população adscrita, considerando

contextos e características das famílias.

4.2. CENA 02

Paulo e Malaquias retornaram à casa da família e durante a visita, na

tentativa de examinar Lua, a filha mais nova, infringem as regras da casa e são

violentamente expulsos de lá. Para reverter o vínculo rompido, contradizendo a

conduta de denúncia do resto da equipe, Paulo tem a ideia de dar presente

diplomático para Joel, um gramofone quebrado com um convite para uma reunião

na unidade.

No dia da reunião à unidade a família se sente ameaçada por sinais de

telefonia, alarmes, antenas wifi e câmeras, Joel sente que sua mente está sendo

invadida por ondas eletro-cósmicas e decide ir embora com toda a família por

suspeitar que a equipe de saúde quer capturar seu filho ainda em gestação, e

dominar a mente de sua família.

Após o encontro frustrado Paulo percebe que Joel devolveu o gramofone

concertado e entende este ato como um pedido de desculpas pela agressão na

última visita domiciliar, mas Laura e a estagiária Samara não concordam

compreendendo que o caso não terá solução via UBS, Samara entende que a

melhor conduta é de medicalização e internação compulsória e Laura, que está à

frente do caso, decide que encaminhará o caso para um psiquiatra.

Na reunião de matriciamento com Diógenes, o psiquiatra matriciador, sugere

um atendimento compartilhado, em que ele, Laura e a estagiária Samara

atenderiam Joel juntos, porém Laura argumenta que Joel não voltaria na unidade

após o trauma da última reunião e então Diógenes sugere uma visita domiciliar que

também não é viável pois por atuar em 3 unidades só voltaria a esta unidade em

dois meses. Percebendo a impossibilidade do psiquiatra atuar no caso, Laura expõe

que Joel está impedindo o atendimento da esposa gestante e o acompanhamento

da gestação e Samara diz que por ser agressivo precisa ser medicado. Diógenes

respondeu dizendo que não é possível definir nenhuma conduta sem ver o paciente

e alerta que tomem muito cuidado seja qual for a conduta que forem tomar.

4.2.1. Análise da Cena 02

Entende-se as visitas domiciliares como uma importante ferramenta no

processo de produção de cuidado, tanto em relação a compreensão dos contextos

aos quais a família se insere, âmbitos social, econômico, cultural, costumes e

dinâmicas familiares por exemplo, quanto a questão de fazer contato com a família

em seu ambiente, trazendo uma compreensão mais ampla e real do contexto, e até

no que se refere à produção de vínculo entre os profissionais de saúde e os

usuários, questão essencial para o alcance de confiança e produção

contextualizada de cuidado em saúde com a família. As visitas podem evitar por

exemplo, condutas descontextualizadas em saúde, que não teriam efeitos de

cuidado.

No caderno de atenção básica 34, saúde mental (BRASIL, 2013) explana-se

sobre questões a serem trabalhadas pela equipe nos momentos das visitas

domiciliares aos usuários com demandas de cuidado em saúde mental, dentre

essas se destacam por exemplo, identificar quem são os cuidadores da pessoa em

sofrimento psíquico e/ou uso de álcool e outras drogas, e procurando envolvê-los

na troca, entrevista e produção do planejamento do processo de cuidado. Traçar

com eles uma lista dos cuidados que a pessoa em sofrimento psíquico e/ou uso de

álcool e outras drogas recebe em casa, a fim de organizar essa lista de acordo com

prioridades discutidas e consensuadas entre os membros da equipe de saúde e

principalmente familiares e o próprio usuário. A partir desta listagem, elencar

cuidados que faltam ou apresentam defasagem, no que diz respeito ao próprio

usuário em sofrimento psíquico e à família, a depender do contexto e das demandas

que a envolvem. Buscar junto com a família identificar possíveis causas das

dificuldades e buscarem alternativas possíveis de serem alcançadas, definindo

metas para a aplicação e solução das questões além de compreender e listar

pessoas, grupos e instituições que compõem a rede social da família, a fim de se

possível ou necessário, envolver outros atores no processo de cuidado.

Na cena 2, o médico Paulo e o ACS Malaquias lançam mão da visita

domiciliar a fim de tentar compreender melhor as dinâmicas familiares, mediante

aos poucos dados que Malaquias conseguiu coletar na primeira visita, e na tentativa

de avaliar o estado de saúde de Lua. No decorrer da investigação acabaram por

fragilizar o vínculo que ainda não havia estabelecido. Apesar da visita um tanto

desastrosa, Paulo conseguiu compreender alguns aspectos da dinâmica familiar e

conseguiu de alguma forma reestabelecer um vínculo através do presente e convite

para uma reunião na Unidade. O Caderno Caminhos do Cuidado explica vínculo

como uma ferramenta do processo de produção de cuidado:

Vínculo significa algo que ata ou liga as pessoas, indica relações com duplo sentido, compromissos de profissionais com os usuários e destes com os profissionais, portanto a criação de vínculos depende do movimento e desejo, tanto dos usuários, quanto da equipe. O vínculo é um dispositivo de intervenção que possibilita a troca de saberes entre o técnico e o popular, o objetivo e o subjetivo, contribuindo para construção de projetos terapêuticos elaborados na perspectiva da integralidade da atenção em saúde (BRASIL, 2013, p.55).

Posteriormente, na reunião, a confiança entre Joel e a equipe foi novamente

quebrada fazendo com que Laura, médica responsável pelo caso, não aceitasse

mais as propostas de Paulo, compreendendo que o caso não teria resolutividade

apenas via UBS, recorrendo, via apoio matricial (psiquiatra Diógenes), o

encaminhamento ao psiquiatra. Segundo Brasil (2017) recomenda-se às equipes a

articulação e implementação de processos que aumentem sua capacidade clínica,

como recorrer a serviços especializados, apoio matricial presencial, entre outros.

Não sendo possível o acompanhamento do psiquiatra no caso, Laura e

Samara sozinhas prosseguem com o caso, a partir de uma conduta “normatizadora”

e “medicalizante” condizentes com as condutas hegemônicas da perspectiva

médico centrada que parte da perspectiva de solucionar o caso eliminando o

sintoma. Segundo o Caderno de atenção básica 34, saúde mental:

É preciso cuidado para que as intervenções de saúde não se transformem em regras rígidas, sob a consequência de que estas ações estejam apenas

baseadas na remissão dos sintomas,

descontextualizadas da vida do usuário e do território em que ele vive. É preciso que o usuário possa se perguntar sobre a relação do seu sofrimento com a manifestação sintomática que está acontecendo. Ainda que necessárias para alguns casos, nem sempre intervenções que se orientem diretamente à supressão dos sintomas estarão aliadas a uma intervenção positiva na vida do usuário.

(BRASIL, 2013, p.26)

4.3 CENA 03:

Laura e Samara vão visitar Joel que as recebe dizendo ter uma surpresa.

Desconfiada, Samara sai da casa dizendo também ter uma surpresa, mas a

surpresa de Joel era um disco romântico que dá a Laura para ouvirem na Unidade

de Saúde, no gramofone que ele havia consertado. Enquanto entrega o presente,

Joel diz que em casa fica mais calmo, por estar sob a guarda de sua rede de

proteção eletro-cósmica e ressalta que ninguém ali está sob risco. Neste momento

Samara entra na casa com os enfermeiros que levam Joel internado, Laura lamenta

a conduta antecipada e a família se desespera enquanto Joel é levado à força para

a ambulância.

4.3.1 Análise da Cena 03

Bezerra (2001) tece uma crítica à clínica psicossocial, partindo do princípio

que já é sabida e vencida a luta que se travara entre o ideológico de práticas

manicomiais, carcerárias, asilares, e as práticas de um novo cuidado psi, que

pensam o indivíduo vinculado a seu meio e em relação. Em sua crítica, Bezerra fala

que ainda que a clínica psicossocial parta desta concepção pós reforma psiquiátrica,

ela muitas vezes age a partir de algum modelo normativo, partindo sua análise do

sujeito tendo um horizonte previamente estabelecido como parâmetro de que seria

adequado. Na perspectiva do autor, uma clínica mais adequada permite

compreender o sujeito a partir da pluralidade que a cultura e as diversas

possibilidades de subjetividades oferecem, uma clínica que permite que o sujeito se

expresse, se sinta e se produza a partir de sua perspectiva sem que isso seja

julgado como certo ou errado, normal ou patológico, e a partir daí sim, se pensa

clínica, novas propostas assistenciais e novas formas de se constituir equipe. Na

análise da cena em questão, percebemos que na atuação das profissionais, este

debate sobre clínica psicossocial pós reforma não foi considerado, e se foi, a

conduta partiu de parâmetros biomédicos do que seria adequado, saudável e

“normal”

A prática médica foi identificada com a prática científica e os médicos

tornaram-se os detentores de um saber que pode ser verificado “cientificamente”.

Assim, esses profissionais tiveram seu poder fortalecido na sociedade, ocorrendo

uma desqualificação dos outros saberes e práticas curadoras tradicionais, como a

medicina chinesa, a homeopatia, o saber popular, entre outros, ao identificá-los

como “não-científicos” e, por isso, ineficazes (LUZ, 1988 apud BRASIL, 2005).

As pessoas buscam por cuidado, porém o profissional está voltado para a

queixa, diagnosticar e tratar uma doença. Além disso, o modelo de pensamento

predominante, orientado por uma racionalidade científica, considera que a

“verdade” sobre as doenças está na alteração dos tecidos, na alteração da anatomia

e funcionamento dos órgãos do corpo. A prática em saúde, particularmente a

médica, estrutura-se então para a identificação e eliminação das lesões do corpo

“doente” e, por pretender ser científica, pela busca da objetividade, da precisão e

da exatidão (CAMARGO, 1992,1993 apud BRASIL, 2005

3

).

No caso da conduta na cena em questão, o objetivo seria eliminar o

comportamento “inadequado”, “perturbado”, “confuso” a partir de uma perspectiva

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