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4. Método

4.2 Ferramentas de trabalho

O nosso principal instrumento de trabalho foi o diário de campo, que permitiu não só o registro dos encontros e conversas possíveis no espaço

escolar, de acordo com o cotidiano dos acontecimentos, mas também a nossa impressão vívida enquanto pesquisadoras aí envolvidas. Segundo Diehl, Maraschin e Tittoni (2006, p.411), o diário de campo “(...) se mostra assim como outro espaço de experimentação, que não se limita a transcrever ou representar a experiência (...) força o observador a implicar-se com o campo da experiência, tensionando-a com esse mesmo movimento”.

Geertz (2005) afirmou que o que conduz o diário de campo a ser o elemento primordial da pesquisa etnográfica não é a riqueza ou a densidade descritiva dos acontecimentos em campo, mas o fato de ser a prova contundente de que o pesquisador esteve em campo e viveu aquela experiência, penetrou e foi penetrado numa outra forma de vida; de que “(...) se houvéssemos estado lá, teríamos visto o que viram, sentido o que sentiram e concluído o que concluíram” (p.29).

Entretanto, obter conclusões a partir do material coletado não foi uma tarefa simples. Fonseca (1999) apontou a necessidade de sempre contextualizar histórica e socialmente os achados, porque é esse movimento que faz de um monte de anotações dispersas um relato etnográfico propriamente dito. Nesse sentido, Sato e Souza (2001) apontaram que por não apresentar um protocolo rígido e prévio de instrumentos a serem usados em campo, a pesquisa etnográfica costuma suscitar a impressão de uma “aparente liberdade anárquica”. Entretanto, é uma metodologia assaz exigente para o pesquisador, que precisa manter a disciplina e a constante atenção no seu objetivo e no campo, que lhe oferta uma grande diversidade de experiências.

Atentas a esses pressupostos, fizemos a análise do material etnográfico seguindo as orientações de Rockwell (2009), para quem a mesma deve alcançar a construção de relações que integrem teoria e descrição, se iniciando com as primeiras decisões a serem tomadas durante o processo de observação, o que olhar e registrar, e terminando na fase de redação, em que se procura articular os achados.

Assim, na fase de redação, procedemos a leituras e releituras, o que nos permitiu clarificar, gradualmente, os achados emergidos do cotidiano. “O trabalho analítico na etnografia é, sobretudo, uma longa sequência em que se

alternam leitura e escrita, releitura e reescrita. Sempre é necessário retomar as notas e os registros iniciais (...)29” (Rockwell, 2009,p.68).

Após estas etapas sucessivas, chegamos a um momento central do processo analítico com um recorte relevante e consistente do problema que nos propusemos a investigar, descartando ideias que surgiram no começo e que não mais se mostraram inteligíveis ou explicativas.

O gênero textual etnográfico privilegia a narração e a descrição. Os textos devem conservar, mediante descrições analíticas concentradas e ao mesmo tempo detalhadas, uma cuidadosa seleção do observado e escutado em campo, ordenada e articulada de tal maneira que apoie o argumento de fundo (...) o sentido da investigação etnográfica é produzir uma maior – ou pelo menos distinta – compreensão de processos que, frequentemente, têm sido estudados por outros instrumentos e meios30 (Rockwell, 2009, p.184-5).

Além do diário de campo, utilizamos também o Questionário de Educação para a Carreira (QEC) de Balbinotti e Tétrau (2006). Durante nossa incursão em campo no ano letivo de 2012, a diretora da escola sinalizou que seria interessante se o nosso estudo fosse apresentado como uma proposta a ser implementada em outras escolas técnicas. Mas, para isso, ela sugeriria, conhecendo os meandros da aprovação de projetos, o uso de algum tipo de questionário/teste de orientação profissional que trouxesse dados estatísticos que favorecessem a defesa dessa proposta. A partir dessa colocação, procuramos na literatura algum questionário que estivesse relacionado à Educação para a Carreira e encontramos o QEC.

O QEC possui noventa e seis itens, sendo dividido em duas escalas, Sentido e Importância do Trabalho e Preparação à Carreira. A segunda escala é subdividida em seis subescalas: Passos Efetuados, Fatores Considerados, Profissão Preferida, Pesquisa e Conservação de Emprego, Pessoas e Fontes Consultadas e Atividades Realizadas. O QEC foi criado em 1990 por Dupont e Gingras como instrumento para se avaliar as necessidades de educação para a carreira no Canadá.

29 No original: El trabajo analítico em la etnografía es, sobre todo, una larga secuencia en la que se alternan lectura y escritura; relectura y reescritura. Siempre es necesario regresar a las notas y a los registros iniciales (...)

30

No original: El gênero textual etnográfico privilegia la narración y la descripción. Los textos deben conservar, mediante descripciones analíticas concentradas y a la vez detalladas, una cuidadosa selección de lo observado y escuchado em el campo, ordenada y articulada de tal manera que apoye el argumento de fondo (...) El sentido de la investigación etnográfica es producir una mayor – o por lo menos distinta – comprensión de procesos que, frequentemente, han sido estudiados a otras escalas y por otros medios

As autoras acreditam que a “Educação à Carreira” deve conduzir o jovem a um duplo desenvolvimento: aquele de uma significação e uma valorização do trabalho (e neste sentido as autoras construíram a escala “Sentido e Importância do Trabalho”) e aquele de uma preparação à vida profissional (e nesse sentido as autoras construíram a escala “Preparação à Carreira” dividida em duas grandes partes: a “Planificação de Carreira e a “Exploração de Carreira”) (Balbinotti & Tétrau, 2006, p.51).

Além da versão canadense do questionário, há uma versão espanhola. Ambas foram comparadas à versão brasileira desenvolvida por Balbinotti e Tétrau (2006) e obtiveram-se propriedades psicométricas semelhantes, o que evidenciou a equivalência dos instrumentos.

Os noventa e seis itens têm como opção de respostas uma escala do tipo Likert de quatro pontos, que varia do “completamente em desacordo” ou “nunca” ou “ pouquíssimo” até “completamente de acordo” ou “frequentemente” ou “muitíssimo”, sendo que se obtém um escore para cada um dos domínios.

Aguillera (2013), em estudo recente comparando o QEC e o CDSEI (Inventário de Autoeficácia para o Desenvolvimento de Carreira), afirmou que o instrumento serve não apenas para a avaliação dos jovens, mas também para a avaliação de programas de educação para a carreira. Foi nesse sentido que o pensamos para este estudo. Como o instrumento ainda carece de normatização, procuramos utilizá-lo como uma ferramenta de apoio à nossa prática, pois acreditamos, assim como a autora, que ele é bem completo e interessante. Diferentemente de Aguillera (2013), aplicamos nos jovens a versão de Balbinotti e Tétrau (2006), uma vez que as diferenças linguísticas apontadas não foram um entrave percebido pelos participantes. A aplicação do QEC ocorreu em duas etapas: antes e depois da intervenção.