• Nenhum resultado encontrado

4.2 Liberdade de Associação

4.2.3 Filiação Sindical

A filiação sindical é uma manifestação pessoal de pertencimento a uma deter- minada coletividade. Dado o fato de seu fundamento ser semelhante à fundação sin- dical, alguns aspectos serão apenas retomados nesse tópico.

Estabelece o art. 8º, inc. V da CR/88: "ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato". Aparentemente, esse dispositivo confere liberdade de filiação ao indivíduo e uma proteção ao seu direito de filiação, pois impossibilita:

[...] qualquer cláusula de convenção coletiva ou de outro instrumento norma- tivo, regulamento de empresa ou contrato individual de trabalho que subor- dine a admissão em emprego ou a aquisição de direitos à condição de ser o trabalhador sindicalizado (closed shop) ou de não sindicalizar-se (yellow dog contract). Também a lei não poderá discriminar entre o sindicalizado e o não sindicalizado206.

Impossibilita, também, outras práticas, como:

[...] union shop [...] o empregador se compromete a manter apenas emprega- dos que, após prazo razoável de sua admissão se filiam ao respectivo sindi- cato operário. [...] preferencial shop [...] que favorece a contratação de obrei- ros filiados ao respectivo sindicato. [...] maintenance of membership [...] pela

204 SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Da Concepção Ontológica à Concepção Voluntarista da Categoria

Profissional. In: Trabalho & Doutrina. São Paulo: Saraiva, nº 16, mar. 1998, p.106.

205Verbete 247: “The determination of the most representative trade union should always be based on

objective and pre-established criteria so as to avoid any opportunity for partiality or abuse”. In: ILO. Freedom of Association: Digest of decisions and principles of hte Freedom of Association Committee of the Govening Body of the ILO. Fifth (revised) edition. Geneva: International Labour Office, 2006, p.73.

206 MARANHÃO, Délio; SÜSSEKIND, Arnaldo; VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do Trabalho.

qual o empregado inscrito em certo sindicato deve preservar sua filiação du- rante o prazo de vigência da respectiva convenção coletiva, sob pena de perda do emprego207.

Sobre a discriminação entre trabalhador sindicalizado e não sindicalizado, o Tribunal Superior do Trabalho – TST – editou a Orientação Jurisprudencial da Seção de Dissídios Coletivos – OJ da SDC – de nº 20, cujo texto: “Viola o art. 8º, V, da CF/1988 cláusula de instrumento normativo que estabelece a preferência, na contra- tação de mão de obra, do trabalhador sindicalizado sobre os demais”.

A análise desse princípio em um modelo de unicidade sindical, como o proposto pelo art. 8º, inc. II da CR/88, confere ao indivíduo duas opções: filiar-se ou não ao sindicato representativo de sua categoria208. A liberdade de escolha é limitada, pois a

opção de filiar-se é preenchida apenas por um sindicato. A superação desse modelo afeta a titularidade da Liberdade Sindical na filiação, posto que possibilita ao indivíduo a escolha entre mais de um sindicato.

Por oportuno, viu-se que são possíveis restrições estatutárias para a filiação, desde que não discriminatórias. Da mesma forma, é possível que o estatuto preveja causas de expulsão de filiados209.

A liberdade de filiação ainda tem um agravante, exposto no art. 8º, inc. IV da CR/88: "a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da re- presentação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei". A questão do financiamento sindical será melhor abordada na organização dos sindi- catos. Atenta-se a um problema específico da contribuição sindical compulsória.

A contribuição prevista no art. 8º, inc. IV da CR/88 não se refere à contribuição sindical compulsória. A parte final desse inciso, que é a sua porta de entrada na CR/88, diz: "[...] independentemente da contribuição prevista em lei".

O art. 579 da CLT estabelece a contribuição sindical compulsória:

207 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9ª Edição. São Paulo: LTr, 2010,

p.1216-7.

208 Cita-se apenas alguns autores, a título de exemplificação: MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Tra-

balho. 22ª Edição. São Paulo: Atlas, 2006, p.719; MARANHÃO, Délio; SÜSSEKIND, Arnaldo; VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do Trabalho. Vol. II. 19ª edição. São Paulo: LTr, 2000, p.1127.

A contribuição sindical é devida por todos aquêles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão libe- ral, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo êste, na conformidade do disposto no art. 591.

Esse artigo dispõe que, caso não haja sindicato, o valor da contribuição sindical será destinado a federação correspondente a categoria.

Posto isso, a contribuição sindical compulsória implica na cobrança de um va- lor, imposto por lei, destinado a financiar o sindicato, independentemente da filiação do trabalhador ou da empresa. Para Delgado: "Com isso, atrai severas críticas quanto à agressão que propiciaria aos princípios da liberdade associativa e da autonomia dos sindicatos"210. Nesse momento, importa somente uma parte da crítica feita pelo au-

tor211: violação ao princípio da liberdade associativa.

Sob essa perspectiva de liberdade de associação, a contribuição sindical já foi submetida a julgamento pelo STF. Para o Ministro Marco Aurélio de Mello, na análise da contribuição sindical compulsória:

Descabe confundir filiação, sempre a depender da manifestação de vontade do prestador dos serviços ou da pessoa jurídica de direito privado que integre a categoria econômica, com o fenômeno da integração automática no âmbito da categoria. Por outro lado, sob a óptica da legislação comum, tem-se a alínea e do art. 513 da CLT, que revela serem prerrogativas dos sindicatos ‘impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômi- cas ou profissionais ou das profissões liberais representadas’. Vê-se que a imposição não se faz relativamente àqueles que hajam aderido, associando- se ao sindicato, mas também no tocante aos integrantes das categorias212. O fundamento básico para sua manutenção é: filiação não se confunde com integração automática no âmbito da categoria. Ao integrar automaticamente, a pessoa assume deveres de um filiado, qual seja, contribuir. O que é integrar senão uma forma de filiar?

Em síntese, diante dos fundamentos básicos da unicidade sindical (organiza- ção por categoria em uma base territorial mínima de um município), a liberdade de filiação é mitigada, tendo em vista que há somente um único sindicato a ser escolhido. Porém, uma característica desse modelo (contribuição sindical compulsória) viola a liberdade de filiação em sua integralidade.

210 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6ª Edição. São Paulo: LTr, 2007,

p.1343.

211 A outra parte será retomada no item 4.3.1.2 do presente trabalho.

212 BRASIL: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Recurso Extraordinário n. 189.960, voto do Relator

No plano internacional, sobre a liberdade de associação manifestada pela fun- dação de sindicatos, diz a Convenção 87 da OIT, em seu artigo 2:

Os trabalhadores e os empregadores, sem nenhuma distinção e sem autori- zação prévia, têm o direito de constituir as organizações que estimem conve- nientes, assim como o de filiar-se a estas organizações, com a única condição de observar os estatutos das mesmas.

Antônio Álvares da Silva lida com o problema da contribuição sindical compul- sória. Para tanto, fundamenta que diante de um sistema que tem um sindicato por categoria e um sindicato com outro critério de agregação, essa contribuição seria de- vida somente ao sindicato por categoria, tendo em vista a determinação legal213.

Ocorre que, novamente, a manutenção do sistema categorial previsto na legislação acaba por prejudicar essa teoria, mantendo o conflito com a liberdade de filiação.

Por sua vez, Reis214 propõe a releitura do sistema de financiamento sindical e

cuida parcialmente do problema da liberdade de filiação. Em síntese, entende que a contribuição sindical obrigatória já esteja suprimida dada a sua incompatibilidade com o regime de Liberdade Sindical e da autonomia sindical, além de ir de encontro a diversos tratados ratificados pelo Brasil sobre o tema (de igual teor ao artigo 2 da Convenção 87 da OIT).

A proposta indicada no artigo é um modelo de quota de solidariedade, em que o não filiado pagaria uma taxa para que fosse também acolhido pela negociação co- letiva feita pelo sindicato.