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3. A NECESSIDADE DE UMA FRENTE ÚNICA

3.7 O fim da Frente Única Antifascista

Tanto a FUA, quanto a proposta do PCB de “frente única pela base” “contra a guerra, a reação, e muito recente (e subsidiariamente) o fascismo”, representado pelo Comitê Antiguerreiro do PCB, segundo Castro, não tiveram mais razão de existir.

A LCI, ao longo de 1934, passou a se dedicar à frente única sindical (Coligação dos Sindicatos Proletários) e eleitoral (Coligação das Esquerdas) junto com as organizações militantes da FUA. A frente eleitoral foi proposta pelo PSPB (Partido Socialista Proletário Brasileiro) ao PCB, LCI e PSB. O PCB não aderiu a esta coligação, recusando-se a qualquer frente com “os partidos de esquerda” tanto contra o fascismo, como no campo eleitoral ou sindical contra a política varguista. A resposta foi dada no seu jornal A Classe Operária:

O PCB está disposto a entrar em contato com diversos partidos de composição operária para discutir com elles a ampliação e ajuda concreta dos movimentos grevistas. Mas nunca se prestará para formas blocos puramente eleitorais, no momento em que as eleições são uma manobra contra- revolucionária das camarilhas dominantes. O PCB irá às eleições com seu próprio nome, lutando por sua existência, precisamente por que, como um único partido do proletário, está ferozmente perseguido pela legalidade feudal-burgueza, que os iniciadores da frente única eleitoral pretendem aperfeiçoar e mascarar, fazendo crer que uma representação operária no apparelho estatal pode diminuir a feroz reação antiproletaria e ante popular das camarilhas em decomposição. 76

Esta aparente radicalização do discurso do PCB, ao se utilizar o argumento que as eleições se encontravam no terreno da burguesia, encobria sua política de negar a frente única

75ABRAMO, Fúlvio. Op. Cit. Pág 84

76 A CLASSE OPERÁRIA. Frente Única de Ferro em Redor dos Heróicos grevistas Ferroviárias da Estrada de

com organizações operárias. Em virtude disso, o PCB considerava-se o “único partido revolucionário” e por isso não tinha porquê se coligar com outras organizações.

A postura do PCB de sair da FUA e recusar a Coligação das Esquerdas já fora delineada há alguns anos. Esta postura do PCB desenvolvida pelo menos desde 1928 (VI Congresso da IC) e que resultou no fim do BOC decretado pelo SSA-IC , analisado no segundo capítulo, se manteve quando Getúlio Vargas institui a “Lei de Sindicalização” em 1931 na qual os sindicatos passaram a ser controlados, reconhecidos e aprovados pelo Ministério do Trabalho, no que diz respeito a suas formas de organização (estatutos, finanças). Essa Lei, aprovada ao mesmo tempo em que se decretavam algumas leis trabalhistas, fez com que o PCB deixasse de intervir no interior dos sindicatos controlados pelo Ministério do Trabalho, considerando-os “sindicatos fascistas”, revendo sua posição apenas em 1934. Segundo Dulles:

a oposição dos comunistas e dos anarquistas à lei de sindicalização deixou o campo livre às associações amarelas já existentes e às que seriam organizadas posteriormente pelo Ministério do Trabalho77

Os trotskistas da LCI criticaram o PCB dizendo que para os “teóricos da burocracia do PCB”, as massas “vieram ao mundo em furiosa ebulição” e estavam sempre “fervendo”, desse modo não haveria menor necessidade de agitá-las: bastaria organizar o poder “em meia hora”. Mas, “a direção do PCB nem agita, nem organiza”. Os trotskistas que defenderam a convocação de uma Assembléia Constituinte em 1931 foram condenados pelo PCB. Segundo Dulles, o PCB se opunha a proposta da LCI, pois, as massas só poderiam eleger seus representantes quando instaurassem o poder soviético.

Essa política que o PCB desenvolveu de 1928 até 1934 era chamada de “obreirista”, ou seja, sobe o argumento de se “proletarizar a direção do partido” e impedir os “desvios pequenos burgueses”, de “direita”, todos do Comitê Central que discordaram das orientações da IC eram afastados ou rebaixados de suas funções.

A partir de 1931 a IC procurou se aproximar de Luis Carlos Prestes, ex-lider tenentista e chefe da “Coluna Prestes” que percorreu o país de 1924 a 1927. Desde 1930, Prestes redigiu manifestos na tentativa de se aproximar do PCB, criticando a Aliança Liberal, os tenentes que haviam se aliado a Getúlio Vargas, defendendo uma “revolução popular anti-imperialista sob a direção do PCB”. Prestes também criticou a proposta dos trotskistas de convocar uma

77 DULLES, John W. F. Anarquistas e Comunistas no Brasil (1900-1935). Ed. Nova Fronteira. Rio de Janeiro. 1977.

Assembléia Constituinte, além de criticar todos os “trotskistas e leninistas” que se passavam por comunistas e que atacavam o PCB, o “verdadeiro partido do proletariado”. Em outubro de 1931 Prestes foi a Moscou a convite da IC onde ficou três anos.

Para Dulles, no início da década de 1930 os comunistas haviam perdido sua influência. Diversos militantes comunistas, anarquistas e trotskistas eram presos, passeatas e comícios de primeiro de maio eram reprimidos. Segundo Dulles, desde o estado de sítio de 1924-26 os anarquistas foram presos e “não se recuperariam”, o PCB era extremamente fraco em 1930-1931, os trotskistas ficavam entre 50 e nunca passavam de 100 militantes.

A política do PCB no início dos anos 30 de considerar a “iminência da revolução” e de se recusar a frente única, levou o Partido primeiro a resistir a participar da FUA, depois a sair dela e por fim a recusar qualquer tipo de coligação operária seja sindical ou eleitoral, proposta pela LCI. Em 1934 e 1935, diante da pressão dos militantes dos partidos comunistas e socialistas pela unidade e da ascensão do fascismo na Europa surgiu uma nova orientação de Moscou: a Frente Popular, na qual os comunistas foram orientados a constituir alianças não apenas com os sociais democratas, mas com os liberais e até conservadores que partilhassem de uma posição de rejeição ao fascismo.

Segundo Castro:

A formação de uma ampla frente de setores progressistas (e não apenas a esquerda) a favor de amplas reformas na sociedade que caracteriza a “frente popular” diluiu a luta antifascista na luta mais ampla por reformas e contra as forças conservadoras e reacionárias. A Comissão Jurídica e Popular de Inquérito, ainda no último bimestre de 1934, preparou o terreno para essa proposta ao rapidamente se viabilizar como uma entidade frentista e “apartidária” de luta contra o reacionarismo do governo Vargas. 78

A CJPI teve diversas adesões individuais e posteriormente de organizações (sindicatos e partidos), esta comissão lançou as bases para a Aliança Nacional Libertadora (ANL). A entrada do PCB na ANL condizia com a política da Internacional Comunista, que no final de 1934, decretou o fim do Terceiro Período e passou a conceber a política de “frente popular”, que seria uma aliança entre todas as forças “políticas progressistas”, ao contrário da frente única que se restringia à esquerda.

Para o jornal “O Proletário”, de organização trotskista, a formação da ANL mostra a disposição do PCB em desenvolver alianças com setores da burguesia:

Aliás desta última iniciativa de frente única por parte dos stalinistas ainda tinha menos razão, de ser, em face de sua atual política de apoio à “Aliança Nacional Libertadora”. Se eles fazem uma aliança orgânica com elementos da burguesia, abandonando o seu programa por um programa nacionalista aceitável para

estes elementos, a frente única está substituída com isso pela fusão, por uma fusão em bases muito mais elásticas, suprimindo o princípio marxista da luta de classes para abranger também a burguesia nacional. Em face desta política, que interesse podem ter os stalinistas em fazer frente única com organizações proletárias de existência ilegal e que ser conservam fora da “Aliança Nacional Libertadora”? Só os ingênuos poderiam acreditar na sinceridade de uma tal iniciativa.

A FUA foi derrotada politicamente pela ANL, coligando diversos setores da burguesia, classe média e classe operária por reformas e por programas mais amplos. Os trotskistas que haviam lutado lado a lado com os integrantes do PCB contra os integralistas não participaram da ANL por considerar oportunista, anti-operária e a favor da conciliação de classes. Os anarquistas através de G. Soler, Florentino de Carvalho e Edgard Leuenroth afirmaram que se aliariam com a ANL apenas enquanto esta lutasse contra o fascismo, o latifúndio e o governo, mas não apoiariam um governo ANL, pois isso ia contra os preceitos anarquistas de supressão do poder de Estado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise das fontes propostas para a realização deste trabalho e da historiografia sobre este tema podemos apontar vários aspectos da luta antifascista no Brasil.

O avanço da ideologia e do fascismo em todo o mundo trouxe conseqüências diretas para o Brasil. Mesmo que esta ideologia não tenha avançado enquanto regime político a formação da AIB, inspirada nos moldes das organizações fascistas de todo o mundo, revelou um problema para a classe operária brasileira. Em todo mundo a ofensiva deste regime mostrou um perigo para a classe operária organizada em sindicatos e partidos. A necessidade de fazer algo que desmobilizasse e acabasse com a AIB mobilizou diferentes organizações do movimento operário, existentes no Brasil entre 1930 e 1935.

A LCI apresentou diversas dificuldades internas, foi uma organização que possuía entre 50 e 100 militantes e em sua maioria intelectuais, com pouca inserção no movimento operário. Este fato prejudicou a LCI pela sua dificuldade de crescimento de sua organização, por vezes em seu jornal é possível observar a linguagem e as análises políticas escritas de forma complicada, mostrando a intelectualidade de sua direção e dificuldade sua inserção no movimento operário. Mesmo com isso, foi a LCI a maior impulsionadora da FUA, que representou no Brasil um dos principais movimentos de massa do período estudado. A experiência com o crescimento do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha e o papel da Internacional Comunista levou a LCI a convocar uma frente única operária, juntamente com diversas organizações, para o combate do fascismo no Brasil. O papel desempenhado pela LCI foi fundamental para a atuação da FUA.

A contraposição feita pelo PCB entre o antiguerreirismo e o antifascismo mostrou, no Brasil, as políticas adotadas pela IC em todo o mundo. O chamado Terceiro Período da IC e a análise de que o fascismo não seria uma peculiaridade do avanço do capitalismo e sim um desenvolvimento normal deste sistema, e que através do fascismo seria possível um avanço para a revolução socialista levou o PCB a adotar políticas esquerdistas. Ou seja, para este partido o fascismo não necessitava de uma política específica de combate então a FUA era algo dispensável, o movimento operário, ainda para o PCB, deveria se mobilizar contra a guerra. Outro fator crucial da política do PCB e da IC foi a sua recusa a uma frente única operária, ou seja, o PCB não aceitava nenhum acordo com o partidos políticos da esquerda, pois considerava- se o único representando da classe operária. Esta posição adotada pela IC levou a derrota da classe trabalhadora na Alemanha quando, ao recusar uma frente única com os sociais democratas

por considerá-los sociais fascistas, colaborou para a ascensão do Partido Nazista naquele país. Esta posição levou o PCB a recusar, inicialmente a construção da FUA.

Outro ponto a ser levantado sobre a FUA e o PCB é a sua hesitação na construção desta frente. Ao que parece o PCB ao participar, por vezes, da FUA o faz por pressão do movimento operário e pela dimensão que a FUA tomou durante os anos que existiu. O fato da FUA ter se tornado uma frente de organização de massas da classe operária pode ter sido um dos motivos que levaram o PCB a engajar-se no movimento.

O fim da FUA, em 1934, e a formação da Aliança Nacional Libertadora (ANL) em 1935 evidenciam a política de alianças desenvolvida pelo PCB, por programas mais amplos de reforma, levando o partido, fiel às orientações da IC a abrir mão de uma coligação operária para fazer alianças com setores da burguesia e da pequena burguesia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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