• Nenhum resultado encontrado

2.3. Espontaneidade segundo Viola Spolin

2.3.7. Fisicalização

Segundo Joaquim Gama, Spolin considera que:

A realidade só pode ser física. Nas suas palavras estão expressas a ideia de que o artista deve captar e comunicar o mundo físico. Quando existe a comunicação sem os ruídos da subjetividade, isto significa que o corpo está presente. (2010a:3)

E completa:

A fisicalização é um recurso utilizado na sistematização de jogos teatrais. Trata-se de usar o próprio corpo para dar vida aos objetos. É uma maneira de mostrar objetos imaginários. Com a fisicalização é possível tornar a realidade do palco visível. Ela permite aos atores utilizarem da ação física para dar forma a um objeto, para torná-lo concreto para a plateia. (2010:42)

É através da realidade física que comunicamos e que desenvolvemos o equipamento sensorial. Neste aspeto, aborda-se como comunicamos corporalmente, incluindo sentimentos e emoções, que são refletidos no próprio corpo. O que Spolin (2006) procurou foi a perceção da realidade enquanto física, de tudo que engloba o corpo, atitudes, gestos, ações e que envolvem também as reações físicas de uma maneira de ser, estar e sentir.

A fisicalização é um processo de representação corporal que busca evitar uma imitação irrefletida, uma simples cópia da realidade por parte do aluno-ator, sem uma real observação de si mesmo e de como reage fisicamente a diferentes situações. Nesse sentido, os jogos teatrais propõem aos jogadores um problema a ser solucionado: tornar real o imaginário. Para Grotowski, a fisicalização seria o que ele chamava por “penetração na própria natureza humana.” (1968:25). Esta capacidade intrínseca no trabalho do ator, de conferir às ações e aos gestos, uma realidade e não uma imitação.

Isso diferencia a fisicalização da mímica. O problema a ser solucionado não está em descrever o objeto imaginário, mas em mostrar a intencionalidade de um gesto. Spolin (2003) chama por objeto, o POC. Cada jogador deve mostrar por intermédio do gesto o objeto imaginário, tornando-o real no palco. Existe a verdadeira necessidade de apropriação do objeto, o que leva a um exercício quotidiano de observação de si mesmo face aos gestos, ações físicas e de

ao emocional. Estimula a observação das intenções e emoções a que relacionamos os gestos.

Assim, é estabelecida uma relação entre corpo, ações e sentimentos. O corpo do ator está no palco com as próprias características físicas, mas é possível ler os gestos que ele realiza e ver o objeto imaginário. Corpo e objeto imaginário coexistem no palco.

A fisicalização aponta para a diferença entre mostrar e contar. Contar é fazer de conta, é simular. Mostrar é tornar real. O que significa a ação da realidade cénica. A diferença entre mostrar e contar visa fazer com que os jogadores mantenham contacto com a realidade física da cena. Evita-se assim, um processo de ensino com uma abordagem intelectual ou psicológica e substitui- se pelo plano da corporeidade.

A fisicalização refere-se à capacidade corpórea dos jogadores de tornarem visíveis as ações para os observadores do jogo teatral. Sem uso de qualquer suporte material (figurinos, adereços, cenografia, etc), os alunos-atores devem descobrir as possibilidades expressivas dos seus corpos e compreenderem o princípio semiótico da linguagem teatral. (Gama, 2010:3)

Oliveira cita Stanislaviski:

É claro que eu poderia forçar-me a falar alto, a atuar energicamente, mas quando nos forçamos a ser ruidosos apenas pelo ruído, corajosos unicamente pela coragem, sem qualquer significado interior ou inspiração, sentimo-nos envergonhados em palco. Isto não poderá colocar-nos num estado criativo. (2007:35)

A fisicalização refere-se à capacidade corporal dos jogadores em tornarem visíveis as ações, sem existir a necessidade do uso de materiais cénicos. A presença faz-se através da própria consciência do corpo e de suas ações e gestos. Da própria energia que concentramos e liberamos a cada momento.

Talvez as palavras de Spolin (2003) pareçam ásperas ao considerar que o público está somente interessado na comunicação física direta e que os sentimentos são um assunto pessoal. Esta aspereza reflete a força do trabalho no sentido em que, se o ator não for capaz de mostrar fisicamente, de nada valerá seus esforços em sentimentalismos. O público precisa ver e entender.

Esta consideração advém de que tudo nasce de um mundo físico, mesmo as emoções. Assim, o barulho do mar, uma pedra que cai, o toque de alguém que amamos, revelam e despertam em cada indivíduo, sentimentos. Daí vem o reflexo da realidade. O corpo está presente.

E o que são os ruídos da subjetividade? Gama (2010) define os ruídos da subjetividade sendo estas sentimentalidades que nada transmitem ou nada significam, quando ainda não trabalhados pelo ator, tornando-o inerte a nível de atuação, interpretação, baseando-se em suportes que requerem um grande domínio do trabalho do ator.

A ação colabora nas intenções e auxilia o ator como ponto presente, trazendo o corpo para o estado de alerta , permitindo ao mesmo que ele vá onde quiser e leve o público consigo e ainda, dando profundidade, espaço, textura e substância ao espaço cénico. “O ator cria a realidade teatral tornado-a física”. (Spolin, 2003:15)

Parece redundante a necessidade de reafirmar esta presença física e de relacionar corpo/sentimento, visto que ambos não existem dissociados. Porém quando se inicia o aprendizado na arte de representar, por vezes o aluno-ator serve-se de artificialidades e da necessidade de impressionar o público com uma falsa representação, buscando emocionar o público com sentimentos, como chorar, mostrar dor, tristeza, sem realmente senti-los. O que demonstra a imaturidade no trabalho. Através da fisicalização, o aluno-ator encontra um suporte, uma base para encontrar referências e usá-las em cena, gerando uma maior autoconfiança e uma maior perceção da realidade.

Documentos relacionados