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Flexibilização trabalhista e desemprego: análise crítica

CAPÍTULO 1 FLEXIBILIZAÇÃO TRABALHISTA

1.2 Flexibilização

1.2.3 Flexibilização trabalhista e desemprego: análise crítica

Por que flexibilizar o direito do trabalho? É realmente necessário? Quais os benefícios e riscos decorrentes de tal flexibilização? Para responder a esses questionamentos, parece-nos necessário, inicialmente, retornar à origem do direito do trabalho, de modo a compreender a sua essência e, em seguida, avaliar a atuação desse direito do trabalho original, no mundo atual.

O direito do trabalho tem por fim a tutela dos trabalhadores e a consecução de uma igualdade substancial e prática para os sujeitos envolvidos na relação de emprego. Nascido na época da prosperidade econômica da revolução industrial do século XVIII, concebeu a intervenção do Estado como um meio de elaborar um regulamento detalhado das condições de trabalho, a fim de forçar as partes envolvidas na relação de emprego, a buscarem a solução dos seus conflitos.

Entretanto, esse modelo de direito do trabalho, assegurando a tutela dos trabalhadores, na atualidade, tem sido acusado de constituir fator de rigidez ao mercado de trabalho e de, nessa medida, contribuir para o decréscimo dos níveis de emprego. Dessa forma, em decorrência dessa realidade atuante do desemprego, em contraposição com a rigidez da legislação trabalhista, semeou-se na Europa, a partir da segunda metade do século XX, um movimento de idéias, a flexibilização, admitindo com mais facilidade a mobilidade profissional dos trabalhadores e a alteração das condições dos contratos de trabalho.

No Brasil, muito se tem falado sobre a necessidade de se flexibilizar a legislação trabalhista. Argumenta-se, em síntese, que se trata de legislação restritiva da liberdade das partes integrantes da relação de emprego e, por conseguinte, um entrave à expansão da economia e do mercado de trabalho brasileiro. Os defensores da flexibilização sustentam que a rigidez das normas trabalhistas vem na contramão da globalização da economia mundial e traz prejuízos ao desenvolvimento econômico do Brasil.

De fato, não se pode negar que a nossa Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é antiga, pois foi aprovada através de Decreto-Lei nº 5.452/43, pelo

então presidente Getúlio Vargas, e que é marcada pelo intervencionismo estatal. Desse modo, é preciso reconhecer que, em alguns aspectos, a referida CLT possa apresentar anacronismo, tendo em vista as novas condições da economia e do processo de produção. Com efeito, a passagem da era industrial para a pós- industrial, da atualidade, que compreende a expansão do setor terciário e novas formas de trabalho, pode exigir a revisão de condições de trabalho, especialmente em relação às pequenas e microempresas, que, muitas vezes não podem utilizar uma tecnologia mais sofisticada e que, portanto, necessitam da flexibilização das normas trabalhistas para assegurar a própria sobrevivência.

Dessa forma, a flexibilização da legislação trabalhista brasileira está em pauta, de forma polêmica, pois todos, empregados e empregadores, buscam a satisfação dos seus interesses.

De fato, deve reconhecer-se que a legislação laboral brasileira tem que estar mais aberta à economia, às novas formas de trabalho e de produção e a um novo espírito do Estado, menos centralizado. Contudo, é necessário admitir que apenas a flexibilização das leis trabalhistas, pura e simplesmente, poderá ser inócua, como medida propulsora da expansão da economia. Isto porque o fenômeno da flexibilização é bastante abrangente e compreende estratégias políticas, econômicas, sociais e jurídicas.

A Espanha, por exemplo, flexibilizou a sua legislação laboral e criou 14 tipos de contratos especiais de trabalho, sem conseguir reduzir a taxa de desemprego, que é de 22%. Na Argentina, onde também houve flexibilização das normas trabalhistas, a crise econômica é gravíssima e o desemprego chegou aos 30%. No Brasil, onde a flexibilização do direito do trabalho também já vem sendo admitida, a exemplo do disposto no inciso VI do artigo 7º da Constituição, que permite a redução salarial mediante previsão em convenção ou acordo coletivo, a taxa de desemprego é estimada em 15%.

Segundo Cláudia Brum Mothé17,

[...] pode-se deduzir que a flexibilização das normas trabalhistas não é a única solução para o desemprego, bem como que não é o custo do trabalho o que mais onera as empresas. Portanto, em termos de flexibilização do direito do trabalho, não é possível deixar de se garantir um patamar mínimo, indisponível, de direitos e de retribuição salarial, sem os quais o trabalho perde sua dignidade. Nessa ordem de idéias, retirar a participação do Estado e fazer depender as relações entre empregados e empregadores exclusivamente da negociação coletiva pode significar deixar aqueles (os hipossuficentes) à mercê destes. De fato, não nos parece possível afirmar que o grau de emancipação do empregado, em todo território nacional, em quaisquer níveis de emprego, é suficiente para que ele possa saber o que tecnicamente está em jogo e quais os valores econômicos, morais e éticos poderão estar sendo transacionados. Do mesmo modo, parece-nos necessário admitir que não existem, em nível nacional, uma generalidade de sindicatos com força e poder suficientes para negociar, em pé de igualdade, com o empresariado.

Nesse sentido, pode trazer-se exemplos de países, onde houve flexibilização dos direitos trabalhistas, mediante a utilização de mecanismos de controle e salvaguardas. Na França e na Alemanha, por exemplo, para flexibilizar direitos dos trabalhadores, a empresa deve demonstrar que está tendo prejuízos. Na Suíça, há um Conselho Nacional Tripartite, com representantes do patronato, dos trabalhadores e do governo, que examina a possibilidade de flexibilizar ou não.

Dessa forma, no Brasil, esse processo de flexibilização das normas trabalhistas deverá se dar de forma gradual e mediante a adoção de mecanismos de controle, posto que superar a tradição estatal e tutelar de nosso direito do trabalho, pressupõe modificações estruturais e políticas graduais no âmbito das organizações sindicais, que deverão passar a assumir uma responsabilidade de cunho social, político e econômico mais abrangente e relevante.

Nessa ordem de idéias, admitindo-se a flexibilização das normas trabalhistas de forma gradual e mediante a adoção de mecanismos de controle, a negociação coletiva possuirá importantíssima função, que compreenderá as tarefas de obter melhores condições de trabalho, preencherá espaços que a lei deixa em branco (relativamente às novas formas de trabalho e de produção) e de administrar as crises das empresas. De fato, a flexibilização das normas trabalhistas possui

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MOTHÉ, Claudia Brum. A flexibilização da legislação trabalhista no Brasil. Jun. 2002.

Disponível em: <http://www.sindicatomercosul.com.br/noticia02.asp?noticia=4544>. Acesso em: 3 mar. 2007.

uma função auxiliar no combate ao desemprego, pois pode contribuir na alocação das pessoas nas novas modalidades de trabalho, decorrentes do surgimento dos novos setores produtivos, que resultaram das tecnologias modernas, além de possuir o papel de estimular a parceria capital-trabalho, a exemplo da adoção de programas de participação dos trabalhadores nos lucros das empresas.

Contudo, a flexibilização deverá ser realizada de forma gradual e mediante a utilização de mecanismos de controle, pois apenas a flexibilização das normas trabalhistas poderá tornar-se inócua, como medida propulsora da economia, haja vista que somente um programa de desenvolvimento econômico, social e agrário, em conjunto com a flexibilização das normas, poderão ser medidas eficazes, no propósito da geração de empregos e expansão da economia brasileira.