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FLORESTA DE TABULEIRO DO NORTE DO ESPÍRITO SANTO

Luiz Fernando Silva Magnago, Fabio Antonio Ribeiro Matos, Sebastião Venâncio Martins, João Augusto Alves Meira Neto & Eduardo van den Berg

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FLORESTA ATLÂNTICA DE TABULEIRO: DIVERSIDADE E ENDEMISMOS NA RESERVA NATURAL VALE

espera-se que na primeira comunidade a diversidade seja maior. Desta forma, estudos sobre diversidade funcional permitem o entendimento do papel das populações e das comunidades de espécies no funcionamento ecossistêmico (Mcgill et al., 2006).

De maneira geral, a ecologia funcional se embasa na utilização de caracteres (p. ex.

morfológicos, fisiológicos e fenológicos; Violle et al., 2007). Portanto, a seleção dos atributos é um ponto chave em estudos de diversidade funcional.

A importância da seleção dos atributos funcionais reside no fato de que os atributos selecionados permitirão uma avaliação mais precisa do papel ecológico das espécies em diferentes habitats do que somente a sua identidade taxonômica (Magurran, 2004; Mcgill et al., 2006; Petchey

& Gaston, 2006). Assim, os atributos funcionais devem ser selecionados de acordo com a hipótese que esteja em teste (Cornelissen et al., 2003;

Pérez-Harguindeguy et al., 2013), levando em consideração as dimensões do estudo e a viabilidade de se obter determinados atributos funcionais (Magnago et al., 2014).

A Reserva Natural Vale (RNV) e Reserva Biológica de Sooretama apresentam uma elevada relevância para conservação, uma vez que seus tamanhos estão acima dos 20.000 hectares.

Fragmentos com desse porte representam apenas 0,08% dos remanescentes de Floresta Atlântica existentes no Brasil (Ribeiro et al., 2009). Essas duas reservas ainda são reconhecidamente detentoras de uma elevada diversidade de espécies vegetais e animais (Peixoto & Silva, 1997; Chiarello et al.,1999; Marsden et al., 2001;

Jesus & Rolim, 2005; Magnago et al., 2014).

Partes dos dados apresentados nesse capítulo foram analisados em nível de paisagem e publicados no artigo de Magnago et al. (2014), onde abordamos os impactos na funcionalidade de espécies arbóreas em função da redução do tamanho dos fragmentos e da criação do habitat de borda para uma paisagem localizada no norte do Espírito Santo. Neste capítulo, apresentamos um novo enfoque, analisando apenas como o efeito de borda em grandes reservas, o que nos permite entender o papel funcional destes dois grandes blocos florestais na paisagem na qual elas estão inseridas e também mostrar como o efeito borda pode modificar a funcionalidades desses Há muitos estudos que tratam dos efeitos da

fragmentação e da perda de habitat, porém, em sua grande maioria, tais estudos têm foco nos efeitos sobre a diversidade taxonômica (Laurance et al., 2006; Arroyo-Rodrigues et al., 2009).

Mais recentemente, há um crescente interesse na diversidade filogenética e funcional (Cianciaruso et al., 2009; Gastauer & Meira-Neto, 2013). Aqui, iremos nos concentrar nos efeitos da perda de habitat sobre a diversidade funcional em remanescente de floresta tropical de elevada diversidade, evidenciando que esta abordagem se mostra adequada para entendermos mais profundamente os efeitos da fragmentação (p. ex. efeitos de borda).

Contrastando a diversidade taxonômica e funcional

A diversidade taxonômica usualmente é avaliada utilizando-se índices sintéticos de diversidade (p. ex. Shannon-Wiener e Simpson [Maurer & Mcgill, 2010]), através da combinação da riqueza de espécies presentes em uma amostragem, como a uniformidade da distribuição do número de indivíduos entre as espécies (Colwell, 2009). Apesar de ambos os índices sintéticos ponderarem de forma diferenciada, as espécies raras e a equabilidade, isoladamente, caracterizam inadequadamente a biodiversidade (Magurran, 2004). Outra opção para a avaliação da biodiversidade é considerar o papel de cada espécie nos ecossistemas e suas respostas às variações ambientais (Petchey & Gaston, 2006).

Hipoteticamente, imaginemos duas comunidades de espécies arbóreas de Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas (Floresta de Tabuleiro) na Reserva Natural Vale, cada qual com cinco espécies arbóreas e dois indivíduos por espécie. Na primeira floresta, temos Abarema cochliacarpos, Actinostemon concolor, Allagoptera caudescens, Annona dolabripetala e Astronium concinnum e na segunda floresta temos cinco espécies pertencente ao gênero Inga spp. Se a riqueza e a uniformidade, isto é, distribuição da abundância de indivíduos por espécies, fossem as mesmas, o índice sintético de diversidade também seria o mesmo para ambas as comunidades. Porém, se levarmos em consideração a diversidade biológica em termos de morfologia dos frutos, capacidade de dispersão, disponibilidade de recursos para fauna e traços da história evolutiva,

MAGNAGO ET AL. EFEITO DE BORDA

MATERIAL E MÉTODOS Área de estudo

A área de estudo está localizada na região Sudeste do Brasil, no estado do Espírito Santo, nos municípios de Sooretama e Linhares, estando as áreas no entorno das coordenadas 19º04’05”S e 39o57’35”O (Figura 1). A matriz da paisagem é composta por pastagens, café, mamão e principalmente por plantios de Eucaliptus spp.

(Rolim et al., 2005).

grandes remanescentes. Assim, nosso estudo foi conduzido para responder as seguintes questões relacionadas à criação do ambiente de borda em grandes fragmentos: (i) Como os atributos funcionais, em termos de riqueza e do número de indivíduos, respondem ao efeito de borda? (ii) Como a diversidade funcional é impactada pelo efeito de borda? Para isso, amostramos indivíduos de espécies arbóreas em áreas de interior e borda de dois grandes fragmentos de Floresta Atlântica de Tabuleiro na região Norte do Espírito Santo.

Figura 1: Fragmentos florestais amostrados na paisagem estudada, região Norte do estado do Espírito Santo. Circulos representam o habitat de interior dos fragmentos, enquanto que o quadrado na cor cinza o ambiente de borda para cada um destes remanescentes.

bosque; as secundárias iniciais se desenvolvem em condições intermediárias de sombreamento; e as secundárias tardias se desenvolvem exclusivamente em sub-bosque permanentemente sombreado. Para classificar as espécies quanto a essas características ecológicas foi utilizada a base de dados presente em Jesus & Rolim (2005) para a floresta da Reserva Natural Vale.

Para relacionar diretamente a quantidade recurso alimentício, também classificamos os frutos quanto à consistência do pericarpo. Essa classificação foi feita para separar as espécies zoocóricas de frutos secos daquelas com frutos carnosos, já que em geral os frutos carnosos tendem a fornecer mais recursos alimentares (Coombe, 1976). Desta forma, classificamos os frutos das espécies amostradas em frutos carnosos, quando o pericarpo tem consistência carnosa e acumulador de água e frutos secos aqueles com pericarpos secos (Barroso et al., 1999).

Os dados para a densidade da madeira em peso seco (g/cm3) foram obtidos no banco de dados The Global Wood Density(GWD) database, na subseção Tropical South America (http://

hdl.handle.net/10255/dryad.235, Chave et al., 2009; Zanne et al., 2009). Para as espécies amostradas não identificadas em nível de gênero ou não presentes no banco de dados, adotamos os seguintes procedimentos já tradicionalmente empregados (Flores & Coomes, 2011; e Hawes et al., 2012): (i) para as espécies que tivemos apenas a identificação em nível de família e gênero, usamos a média da densidade da madeira do grupo taxonômico; (ii) para espécies que estavam presentes na nossa amostragem, porém não foram encontradas no banco de dados GWD, fizemos uso da média da densidade da madeira do gênero a que a espécie pertence.

As espécies que foram apenas identificadas em nível de morfoespécie representaram apenas 1,13% da riqueza de espécies e 0,22% do número de indivíduos total e foram excluídas das análises envolvendo características funcionais.

O material botânico foi determinado a partir de consultas ao Herbário CVRD da Vale, Herbário VIES da Universidade Federal do Espírito Santo e auxílios de especialistas. O material encontrado em estádio reprodutivo foi depositado na coleção Coleta de dados

Para amostragem da vegetação arbórea, utilizamos o método de parcelas permanentes (Mueller-Dombois & Ellenberg, 1974) com dimensões de 10 × 10 m, dispostas em uma distância mínima de 20 m entre si. Em cada parcela foram amostrados todos os indivíduos arbóreos com circunferência a altura de 1,30 m do solo (CAP) maior ou igual a 15 cm, sendo as parcelas instaladas sempre sobre o mesmo tipo de solo (Argissolo Amarelo).

Para avaliar o efeito da fragmentação, realizamos as amostragens no interior e borda dos fragmentos do grande bloco florestal da Reserva Natural Vale (RNV) e a Reserva Biológica de Sooretama (Rebio), que possuem mais de 20.000 ha de floresta cada.

Na RNV e Rebio alocamos 60 parcelas distribuídas em seis transectos de 10 parcelas cada, sendo 30 parcelas na borda e 30 no interior. Os transectos foram distantes, em média, 17,13 km entre si para os transectos de interior e 14,44 km para os transectos de borda (Figura 1).

Tratamento dos dados

Todas as espécies arbóreas dentro de cada parcela foram classificadas quanto à síndrome de dispersão seguindo os critérios propostos por van der Pijl (1982). Foram adotadas duas categorias:

(i) espécies zoocóricas, como sendo aquelas que produzem diásporos providos por uma ou mais características que implicam em um potencial uso pela fauna, como, por exemplo, polpa carnosa, arilo, ou outras características tipicamente associadas com agentes dispersores por animais e (ii) espécies não-zoocóricas, como sendo aquelas que apresentam características que indicam dispersão por meios abióticos, como sementes aladas, plumas, ausência de características que indiquem algum tipo de dispersão a não ser própria queda, ou sementes provindas de frutos com deiscência explosiva, mas que também não apresentavam qualquer tipo de características de plantas zoocóricas (p. ex.

sementes com arilos, sacotesta, etc.).

Também classificamos as espécies em grupos sucessionais, de acordo com o proposto por Bongers et al. (2009), sendo pioneiras aquelas que se desenvolvem em condições dependentes de maior luminosidade, não ocorrendo, em geral, no

sub-MAGNAGO ET AL. EFEITO DE BORDA

dos fragmentos amostrados. Os modelos foram construídos com a função“glm” do pacote “stats”.

As distribuições de erros utilizadas foram a de Poisson para os dados de contagem, porém para estes mesmos tipos dados, também aplicamos a distribuição Binomial Negativa. Sempre que necessário, usamos as correções de dados com superdispersão, comuns no uso da família de erro de Poisson. Utilizamos a distribuição Gaussiana para os demais dados, sendo respeitada a distribuição normal dos dados. Todas essas análises foram realizadas no ambiente R (R Development Core Team, 2009).

RESULTADOS

Impactos nos atributos funcionais

Em nosso estudo, amostramos 268 espécies arbóreas, estando estas distribuídas em 52 famílias botânicas. Apresentando de maneira descritiva, encontramos que o ambiente de borda dos fragmentos apresentou uma média de 14,1

± 3,29 espécies por parcela, valor semelhante ao do Herbário Vale da Reserva Natural Vale em

Linhares/ES.

Análise dos dados

Para análise da diversidade funcional usamos os três índices propostos por Villéger et al. (2008), sendo a riqueza funcional (FRic), a equabilidade funcional (FEve) e a divergência funcional (FDiv). De acordo com Villéger et al. (2008) a FRic representa o volume de espaço de casco convexo funcional ocupada pela comunidade, a FEve representa a regularidade da distribuição em número de indivíduos neste volume e a FDiv representa a divergência na distribuição das características das espécies dentro do volume ocupado por cada atributo funcional. Para o cálculo dos três índices, nós utilizamos os métodos e os scripts de Villéger et al. (2008), sendo trabalhados no ambiente R (R Development Core Team, 2009).

Para análise dos dados de atributos funcionais e diversidade funcional, construímos Modelos Gerais Linearizados (GLM), comparando de maneira categórica o habitat de borda e interior

Figura 2: Comparação dos valores de riqueza de espécies por atributo funcional entre os habitats de borda e interior estudados nas Reserva Natural Vale e Rebio de Sooretama. (A) Pioneiras; (B) Secundárias iniciais; (C) Secundárias tardias; (D) Zoocóricas; (E) Não zoocóricas; (F) Frutos carnosos. *<0,05; **<0,01: ***<0,001; ns=Não significativo;

Diamantes cinza representam a média dos valores; Círculos pretos representam possíveis outliers.

interior (0,65 g/cm3), em contraste com a borda (0,62 g/cm3).

Mudanças na diversidade funcional

A riqueza funcional (t = -3,16; p = 0,01; Figura 4A), a equabilidade funcional (t = -4,63; p<0,001;

Figura 4B) e a divergência funcional (t = -3,33;

p<0.01; Figura 4C) foram significativamente diferentes entre os habitat. Em todos os casos, os maiores valores ocorreram na borda dos fragmentos.

DISCUSSÃO

Nossos resultados mostraram que a riqueza e o número de indivíduos de espécies de traços funcionais com uso potencial pela fauna (p. ex.

frutos carnosos) e de indicação de distúrbio (p.

ex. grupos ecológicos) sugerem que a criação do habitat de borda pode modificar a diversidade funcional existente nos grandes blocos florestais na Floresta Tropical Atlântica. Estes resultados indicam ainda, possíveis alterações nas interações entre animais e plantas (Tabarelli & Peres, 2002;

Moran & Catterall, 2010), com possível redução para a capacidade de estocagem de carbono nestes remanescentes florestais (Magnago et al., 2015b).

Os efeitos da redução na disponibilidade de recursos florestais para uso da fauna, como os que mostramos no nosso estudo para os habitat de borda, podem causar reduções e/ou mudanças na composição de espécies da fauna que interagem fortemente com os recursos providos pela flora arbórea. O estudo de Chiarello (1999), também realizado em fragmentos florestais na paisagem que estudamos, mostrou que os grandes e médios fragmentos possuem uma maior riqueza e densidade de indivíduos de mamíferos frugívoros de grande e médio porte do que os pequenos fragmentos. Estes tendem a ser dominados por espécies herbívoras, demonstrando assim uma consequente redução na riqueza de espécies e na complexidade estrutural da mastofauna. Ainda na mesma paisagem, Marsden & Whiffin (2003) encontraram uma redução das espécies de aves frugívoras nas áreas com menos biomassa de espécies arbóreas vivas.

Assim, estas reduções e mudanças nos grupos faunísticos podem estar ocorrendo em função da menor oferta de recursos existentes nas bordas e, observado para os interiores dos fragmentos: 14,4

± 3,22 espécies por parcela.

Comparando os grupos sucessionais entre os habitats de borda com o interior dos fragmentos, observamos uma redução significativa na riqueza de espécies pioneiras (z=-4,133; p<0,001; Figura 2A) e secundárias iniciais (z=-0,76392; p<0,001;

Figura 2B) e um aumento significativo na riqueza de espécies secundárias tardias (z= 5,21; p<0,001;

Figura 2C). Para as síndromes de dispersão, encontramos que a maior média na riqueza de espécies zoocóricas ocorre no interior dos fragmentos, porém, com resultado marginalmente significativo (z = 1,80; p = 0,07; Figura 2D).

Diferentemente, as espécies não zoocóricas detém maior média de riqueza para as bordas (z = -2,04;

p<0,05; Figura 2E). Os frutos carnosos também obtiveram maior média de riqueza de espécies nos interiores, mas apenas com valores marginalmente significativos (z =1,85; p = 0,06; Figura 2F), ao passo que os frutos secos não apresentaram relação significativa entre a riqueza de espécies com os habitats dos fragmentos (z = -1,57; p = 0,12).

Entre os habitat de borda e interior dos fragmentos foi observado que tanto o número de indivíduos arbóreos de espécies pioneiras (z = -4,55; p < 0,001; Figura 3A) quanto o de secundárias iniciais (z = -6,25; p < 0,001; Figura 3B) reduzem significativamente no interior. Já o número de indivíduos de espécies secundárias tardias (z = 6,99; p = p < 0,001; Figura 3C) e zoocóricas (z

= 3,29; p = 0,001; Figura 3D) mostraram maior média para o interior das reservas. Em oposto as zoocóricas, o número de indivíduos arbóreos de espécies dispersas de forma independente da fauna reduziram significativamente o número de indivíduos no interior dos fragmentos (z= -2,16;

p = 0,03; Figura 3E). O número de indivíduos de árvores com frutos carnosos foi maior no interior dos fragmentos (z = 2,91; p = 0,004; Figura 3F), ao passo que o número de indivíduos arbóreos de frutos secos carnosos não diferiu significativamente entre os habitat (z = -0,95; p = 0,34; Figura 3G).

Os valores médios da densidade da madeira apenas apresentaram efeitos marginalmente significativos em relação aos habitat (t = 1,91; p = 0,06; Figura 3H), sendo que as maiores médias foram para o

MAGNAGO ET AL. EFEITO DE BORDA

Figura 3: Comparação dos valores do número de indivíduos (ni) arbóreos por parcela por atributo funcional e média da densidade da madeira por parcela entre os habitat de borda e interior estudados nas Reserva Natural Vale e Rebio de Sooretama. (A) Pioneiras; (B) Secundárias iniciais; (C) Secundárias tardias; (D) Zoocóricas; (E) Não zoocóricas; (F) Frutos carnosos; (G) Frutos secos; (H) Densidade da madeira. *<0,05;

**<0,01;***<0,001; ns = Não significativo; Diamantes cinza representam a média dos valores; Círculos pretos representam possíveis outliers.

como mostrado por Magnago et al. (2014), em fragmentos pequenos.

Os modelos testados não encontraram efeitos de borda na densidade da madeira das espécies arbóreas, mesmo existindo diferenças significativas na riqueza e número de indivíduos de espécies pioneiras, secundárias iniciais e secundárias tardias entre os habitat de borda e interior. O aumento do grupo de espécies pioneiras é citado como um fator relacionado com a redução da densidade da madeira em áreas em florestas tropicais (Michalski et al., 2007), isso por que o crescimento rápido dessas espécies torna a densidade da madeira mais baixa, ao passo que o crescimento lento das espécies tardias tende a tornar a densidade da madeira maior (Chambers et al., 2000). Entretanto, de acordo com Laurance et al. (2006), a densidade da madeira pode, às vezes, ser um fraco previsor para determinar as respostas de espécies sucessionais aos efeitos da fragmentação.

Contudo, temos que ser cautelosos nas nossas afirmações sobre os resultados da densidade da madeira em função de dois pontos principais: (i) nossos resultados mostraram efeitos marginalmente significativos, ou seja, com maior número de replicações poderíamos ter encontrado valores significativos e interpretáveis, já que a maior média está nas áreas de interior dos fragmentos, conferindo-lhes maior capacidade de estocagem de carbono e (ii) como usamos uma base de dados para obtenção dos valores, podemos ter perdido a sensibilidade deste parâmetro aos efeitos da fragmentação na área estudada, já que a densidade de madeira pode variar em função de características ambientais locais (Thomas et al., 2007; Nock et al., 2009).

Nossos resultados mostraram ainda que os efeitos de borda em grandes fragmentos, como os da RNV e Rebio de Sooretama, causaram mudanças no volume do espaço funcional (espaço quantificado de funções desempenhadas em uma dada comunidade de espécies) ocupado pelas espécies dentro das comunidades (Villéger et al., 2008; Mouchet et al., 2010). Desta forma, nos habitat de borda, a riqueza funcional (ou espaço funcional), é preenchida por uma riqueza significativamente maior de espécies pioneiras, secundárias iniciais e com dispersão independente Figura 4: Comparação dos valores de diversidade

funcional entre os habitats de borda e interior estudados nas Reserva Natural Vale e Rebio de Sooretama. (A) Riqueza Funcional; (B) Equabilidade funcional; (C) Divergência Funcional. *<0,05; **<0,01;***<0,001;

ns = Não significativo; Diamantes cinza representam a média dos valores; Círculos pretos representam possíveis outliers.

MAGNAGO ET AL. EFEITO DE BORDA

indivíduos que desempenham funções similares.

Assim, estes resultados sugerem que menos eventos de perdas de espécies ou de indivíduos, são necessários para levar a extinção de funções ecossistêmicas nas bordas das reservas.

Finalmente, podemos constatar que em termos de implicações para conservação, temos: (i) uma vez que as espécies pioneiras e não-zoocóricas são as principais responsáveis pela colonização de áreas degradadas (Ferreira et al., 2007; Magnago et al., 2012), a funcionalidade ecossistêmica mantida nas áreas de borda (espécies pioneiras e dispersas independentemente da fauna) tem um importante papel na recomposição de novos fragmentos florestais, sejam estes provenientes da sucessão natural ou por plantio de mudas e (ii) que os interiores dos fragmentos e também aqueles de maior tamanho são mais importantes para a manutenção das interações entre a a fauna e a flora, evitando assim processos como os de cascatas tróficas (Jorge et al., 2013; Dirzo et al., 2014).

AGRADECIMENTOS

Ao CNPq - Agência Brasileira de Ciência e Tecnologia (Nº 477780/2009-1) e ao Projeto Floresta-Escola e Fapemig pelo apoio financeiro.

Agradecemos também a Conservation International, Iema (Instituto Estadual de Meio Ambiente), através do Projeto Corredores Ecológicos, Reserva Natural Vale, Fibria Celulose AS, Instituto Daniel Marcos e o projeto Pro-Tapir pelo apoio logístico e a Reserva Biológica de Sooretama e Rebio Córrego do Veado pela permissão para conduzir nossa pesquisa. L.F.S.M. foi apoiado por pela Capes com as bolsas de Doutorado e Doutorado Sanduíche.

Atualmente L.F.S.M. é bolsista do programa PNPD/

Capes de pós- doutorado.

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interiores a riqueza funcional é mantida por uma riqueza de espécies significativamente maior de espécies secundárias tardias, de frutos carnosos e dispersas zoocoricamente.

A redução da equabilidade e da divergência funcional (ambas ligados ao número de indivíduos representado em cada um dos grupos funcionais) no interior das reservas indica que algumas partes do espaço funcional que as compõem tendem a diminuir ou desaparecer em função das reduções dos distúrbios causados pelos efeitos de borda (Magnago et al., 2014). Estes resultados sugerem uma possível homogeneização de nicho entre as espécies para o habitat de interior, e um aumento da diferenciação de nichos para o habitat de borda uma vez que este tipo de habitat foram funcionalmente mais dissimilares (Mouchet et al., 2010). Uma possível explicação a estes resultados são as alterações microclimáticas causada pela criação e ampliação do ambiente de borda (Magnago et al., 2015a), uma vez que são reconhecidamente responsáveis por conduzir a grandes alterações na composição de espécies (Magnago et al., 2014). Esse resultado sugere ainda maior redundância funcional no interior dos fragmentos, implicando em menor risco de extinção funcional neste habitat quando comparado à borda.

Podemos concluir, primeiramente, que na borda dos grandes fragmentos e nos fragmentos pequenos dessa paisagem (para esses últimos resultados veja Magnago et al., 2014), a diminuição da riqueza e do número de indivíduos de espécies com potencial de uso pela fauna traz um impacto negativo nas interações ecológicas entre flora e fauna, podendo, por efeitos de cascatas, causar mais perdas de biodiversidade (p. ex. Laurance et al., 2002; Oliveira et al., 2004).

Em segundo lugar, temos que em função de uma maior redundância funcional encontrada para o interior dos grandes fragmentos (p. ex.

menores valores de equabilidade e divergência funcional), estes fragmentos tendem a apresentarem uma menor sensibilidade à extinção funcional do que a borda, onde, a diversidade funcional, apesar de ser maior, é representada por um menor número de

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