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A pesquisa teve como fonte os Movimentos Sociais que constituem a sociedade, sendo compostos por minorias políticas, cada um com suas especificidades, que buscam, a partir de políticas igualitárias, conquistar espaços destinados a uma minoria da população e à oferta da cultura política. São eles, especificamente, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Movimento Negro (MN) e o Movimento Feminista (MF), contendo como temáticas estruturantes os movimentos e processo de formação. A escolha por esses movimentos se deu em função da busca pela diversidade agregada à interseccionalidade e suas historicidades.

Mas, o que é Movimento Social? Essa pergunta teve resposta dentro das ciências sociais. Para Gohn (2014), tanto a sociologia quanto a ciência política estudam a temática Movimentos Sociais. Sendo a primeira o campo de estudo por excelência e a segunda coadjuvante.

Antes de conceituar, julga-se interessante resgatar, com brevidade, a memória dos Movimentos Sociais, por não ser possível, neste trabalho, aprofundar, mas apenas contextualizar.

Os Movimentos Sociais, em Gohn (2012, p. 113), “[...] são frutos de uma articulação de interesses entre grupos demandatários, chamada base [...]”, munidos pela luta do direito a ter direito e da construção de uma nova ordem social. A cultura política produzida pelos movimentos teve como eixos estruturantes três fontes básicas de inspiração (GOHN, 2018a), a saber: a participação fundada no princípio da autonomia das ações e desejos de autodeterminação devido a exclusão social; o igualitarismo pautado como condição para ações, no sentido de que todos são iguais; a organização vinculada a grupos e tendências partidárias e sindicais, em que o movimento aparece como elo fundamental de ligação entre o povo e o poder.

Nas últimas cinco décadas, a memória dos Movimentos Sociais brasileiros pode ser contada por Rios (2018), que narra a trajetória dos movimentos, passando por três grandes ciclos: a democratização, o estabelecimento democrático e a desdemocratização. Nessas condições, lutaram e se uniram em novas articulações coletivas para cobrarem seus direitos não reconhecidos, contra a ditadura militar, mesmo não havendo liberdade de expressão, muito menos a possibilidade de organização de passeatas, caminhadas, manifestações públicas − devido ao grau de isolamento e confinamento social dos trabalhadores; viveram o processo de institucionalização civil e estatal e participaram na defesa da legitimidade democrática contra o golpe, respectivamente.

Para tal, de acordo com Nascimento (2010), os setores políticos e sociais mais influentes no cenário brasileiro, a partir da década de 1950, foram os partidos políticos de esquerda e alguns setores da Igreja Católica − que traçaram a luta política, via reforma agrária radical e revolucionária, inclusive contra parte da própria Igreja Católica − e contra partidos de centro, que defendiam uma reforma agrária por meio constitucional. Essa aliança denominada democrata-cristã e social-democrata alcança conquistas fundamentais naquela conjuntura, se materializando com o I Congresso dos Trabalhadores Rurais do Norte e do Nordeste do Brasil, realizado na Bahia, em 1962, gerando como fruto dessa mobilização o reconhecimento, por parte do governo federal, de 22 sindicatos de trabalhadores, além de despertar a consciência nacional pela necessidade da reforma agrária.

Contudo, ainda, segundo Nascimento (2010), a repressão militar da década de 1960 às ligas camponesas foram proscritas com intervenção direta do governo federal nas federações estaduais e também na Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG),

passando a exisitir um único sindicato, em cada município, ligados a uma única confederação, a CONTAG. Em meio a esses conflitos, os Movimentos Sociais tornaram-se alvo do aparato repressor, já que eram considerados politicamente subversivos.

Gohn (2014) ressalta a história dos Movimentos Sociais no Brasil, na luta por direitos, com destaque para a mobilização dos sujeitos políticos nessas lutas, caracterizando os movimentos como viabilizadores da constituição da cidadania e, também, como meio para dar visibilidade aos impasses entre Estado e sociedade. Dessa forma, reconhece a ação política realizada pelos Movimentos Sociais como legítima e fomentadora de mudanças sociais.

Em síntese, o ganho dos Movimentos Sociais se concretiza, também, com a criação de leis e formulação de políticas públicas, como defende Gomes (2018a), que começou com a Constituição Federal (1986) e passou por um hiato, mas que em 2002 retoma com toda força. Questões que serão tratadas no decorrer das seções, de acordo com cada movimento selecionado para essa investigação.

Também, é plausível lembrar que existem Movimentos Sociais que não se apresentam como movimento revolucionário, sendo tidos apenas como reacionário, ou mesmo reproduzem mais do mesmo, sem a busca pela ruptura do que está posto, com atuações que favorecem a manutenção do status quo. Ao longo do texto serão citados como forma de exemplificação.

Após breve relato da memória dos Movimentos Sociais, passamos para seu conceito. De acordo com Cunha (2017), a origem do termo Movimento Social teorizado surgiu na França em 1842 e teve o sentido de luta contra dada situação. Desde então, passou a ser utilizado por autores, ora alterando-o e/ou classificando-o. Entre esses registros, o conceito elaborado por N. Bobbio, N. Matteucci e G. Pasquino, em 1986, vem sendo o mais empregado por estudiosos. A saber:

[...] os movimentos sociais constituem tentativas, fundadas num conjunto de valores comuns, destinadas a definir as formas de ação social e a influir nos seus resultados. Comportamentos coletivos e Movimentos sociais se distinguem pelo grau e pelo tipo de mudança que pretendem provocar no sistema, e pelos valores e nível de integração que lhes são intrínsecos [...]. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 787).

Outro autor que conceitua Movimento Social é Mascarenhas (2004), ao dizer que “é um palco para a educação”, uma vez que a educação não se dá apenas em espaços convencionais, como se eles fossem agências de transmissão de conhecimento. Ele abre janelas para a ressignificação de valores e culturas. É uma arena de lutas. Cabe ressaltar que

essa educação pode servir, tanto a formação do pensamento crítico quanto ao treinamento, pois depende da pedagogia adotada.

Segundo a análise de Pietrafesa (2016), enquanto a díade capital e Estado se unem de forma orgânica, coube aos sujeitos históricos se organizarem em Movimentos Sociais. Isso acontece a partir da percepção de que individualmente não seria possível ter acesso a suas necessidades básicas. Assim, de forma coletiva, adquirem força para lutar e resistir às imposições da díade. Ainda, na visão do autor, os Movimentos Sociais possuem ações de duas formas, uma trata da questão promoção e agregação de ações dos sujeitos organizados e a outra refere-se à questão educativa.

Nessa linha de raciocínio, Gohn (2012) ratifica:

Falar da existência de um processo educativo no interior de processos que se desenvolvem fora dos canais institucionais escolares implica em ter, como pressuposto básico, uma concepção de educação que não se restringe ao aprendizado de conteúdos específicos transmitidos através de técnicas e instrumentos do processo pedagógico [...]. (GOHN, 2012, p. 21).

Como o ato de agir requer o ato de pensar, então, o Movimento Social em si é autoeducativo, portanto, fonte de pesquisa do processo formativo vinculado ao movimento Bildung, por se mostrar de caráter construtor da identidade. Como advoga Gomes (2018a), os Movimentos Sociais possuem como prerrogativa a transformação do conhecimento convencional em conhecimento nascido da luta que não avança de forma isolada, e se agrega aos conhecimentos acadêmicos para atuar politicamente contra a hegemonia da sociedade. Ao mesmo tempo, ainda nas palavras da autora Gomes (2018a, p. 28), os “Movimentos Sociais, ao agir social e politicamente, reconstrói identidades, traz indagações, ressignifica e politiza conceitos sobre si mesmo e sobre a realidade social [...]”. Em outros termos, se educa e almeja educar aos demais8.

Na esteira desse argumento, os Movimentos Sociais contribuem para o avanço da democracia sempre que propõem novos códigos culturais e novas formas de vida:

Seu potencial transformador se revela no plano da experiência individual e coletiva ao confrontar as formas de dominação abrindo espaço para a conformação de novas identidades. Os movimentos sociais interrompem o curso normal. Instauram o conflito. Promovem transformações culturais, nos valores, nas ideias, nas

8 Há Movimentos Sociais acríticos que não trilham a linha da cultura política crítica educativa como mecanismo

de resistência frente ao capital. O aporte teórico selecionado foi para referenciar os movimentos pesquisados, pois o foco da investigação é a formação crítica, embora se saiba que esses mesmos movimentos, em alguns momentos, atuem de forma contraditória ao seu propósito. Castaño Gavíria (2016) alerta sobre a importância comportamental dos Novos Movimentos Sociais que se apresentam abertos, que mostram outra forma de construir o social sem necessariamente estar vinculado a uma única ideologia, nem fixado a estruturas burocráticas e formas de poder totalitário.

representações sobre o “eu” e sobre o “outro”. A existência dos movimentos sociais é em si mesma a medida do seu sucesso, é o êxito da ação. Não podem ser reduzidas, portanto, à representação política porque não demandam fundamentalmente inclusão, mas subversão dos códigos, das regras, do modo de ver e viver o mundo [...]. (TATAGIBA, 2007, p. 19-20).

Sobretudo, a parte mais marcante dos Movimentos Sociais encontra-se na relação com as esferas institucionalizadas de poder, organizados para reivindicar mudanças, direitos e/ou melhores condições de vida, além de se constituírem por meio de uma especificidade.9

Para além da luta específica de cada movimento, Gohn (2012) critica o isolamento dos Movimentos Sociais ao defender a dialogicidade entre eles. A autora aponta a importância da comunhão dos movimentos sempre que necessário para fortalecer a resistência frente ao Estado de forma coletiva, dialógica e humanitária.

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