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Para compreender o funcionamento da formação algorítmica no processo de compreensão dos discursos em circulação no Facebook, optamos por utilizar os perfis de três usuários dessa rede social observando quais seriam as publicações da Folha de S.Paulo que apareceriam para cada um deles. Um dos usuários já seguia as postagens da Folha há alguns anos (U1) e os dois outros (U2 (que acessou a rede social em Pouso Alegre) e U3 (que acessou a rede social em Campinas)) curtiram a página ao mesmo tempo no dia 25 de novembro de 2017. A expectativa era que, de acordo com os históricos de interação de cada usuário, como nos afirma Pariser (2012), houvessem postagens diferentes para cada um dos usuários. Sendo assim, seriam printadas as primeiras cinco postagens da Folha que aparecessem.

No dia 25, ao mesmo tempo, os dois usuários que ainda não seguiam a página curtiram-na. Pela próxima hora, a linha do tempo do Facebook de cada um foi recarregada com objetivo de que alguma postagem do jornal aparecesse em suas linhas do tempo. Para nossa surpresa, nesse primeiro dia nenhuma postagem apareceu. Enquanto isso, para o usuário que já seguia a página havia postagens com notícias sobre a previdência, a morte de um surfista, a possível candidatura de Luciano Huck à presidência, e outras duas postagens sobre o estado de saúde do presidente Michel Temer.

No dia 18 de dezembro de 2017, ao mesmo tempo, os três usuários novamente procuraram pelas primeiras cinco postagens da Folha que apareciam em seus feeds de notícias. Mais uma vez, os dois usuários que recém curtiram a página do jornal não tinham postagens do jornal. É importante salientar que ambos os usuários configuraram no modo “Padrão” o aparecimento das postagens, e mesmo assim houve essa diferença.

Diante do fato, começamos a nos perguntar quais razões teriam levado a tal discrepância entre os resultados. Sendo assim, ao observarmos o que aparecia em cada um dos feeds, notamos que em U3, que acabara de seguir a página, predominavam as postagens de outros usuários, sendo escassas as postagens de páginas, fossem elas jornalísticas ou de empresas oferecendo produtos, a não ser que fossem patrocinados pelas marcas. Sendo assim, as postagens que apareciam tinham conteúdos relacionados ao dia a dia de outros usuários, como idas ao cinema, festas de aniversário e confraternizações.

Já para U2, que também curtiu a página em 25 de novembro, embora não houvesse no feed as postagens da Folha, havia uma série de postagens de páginas ao invés de pessoas, porém poucas eram de meios de comunicação. Havia também postagens de usuários, mas num número muito menor que o encontrado em U3.

Por fim, em U1, aquele que já seguia a página da Folha, percebe-se que em seu feed há uma predominância de postagens de páginas, em especial de páginas de veículos de comunicação. As postagens que aparecem de outros usuários são geralmente com piadas ou compartilhamento de notícias de veículos de comunicação.

A expectativa inicial, como dissemos acima, era que usuários diferentes recebessem diferentes postagens da Folha baseadas em seu histórico de interação. Porém, a diferença foi além do esperado, sendo que não foram encontradas postagens do jornal citado nos dois usuários. Diante disso, podemos afirmar que sim, o algoritmo de fato trabalha no sentido de filtrar determinados conteúdos para seus usuários. Uma filtragem que, considerando o histórico que traçamos desde o início deste capítulo, tem por objetivo apagar o político, como se o fato de não apresentar determinados conteúdos para quem acessa a rede não resultasse em determinadas posições desses sujeitos que utilizam o Facebook, baseados naquilo a que têm disponível.

Aqui fica demonstrado o efeito bolha de que Pariser (2012) nos fala. Onde, por conta dos filtros, aumenta a dificuldade dos usuários em terem acesso a posições diferentes sobre determinados assuntos, quase impedindo o trânsito entre as diferentes formações discursivas que compõem os diversos discursos que circulam no Facebook. Outra consequência dos filtros que fica comprovada com esse pequeno estudo feito é que as postagens que aparecem no feed têm relação com o histórico de atuação de cada usuário e não se alteram a partir de uma única curtida numa página. Seria necessária uma interação maior com a página da Folha para que o conteúdo publicado aparecesse aos usuários? Em conversa com os voluntários da pesquisa, todos disseram acreditar na relação daquilo que fazem na rede com aquilo que lhes aparece. Para U1, o fato de as postagens da Folha aparecerem em seu feed tem relação direta com a frequência que clica nos links mostrados e por vezes acaba compartilhando o conteúdo. Sobre os assuntos que apareceram nas postagens, ele também afirma que são coisas pelas quais pesquisou ou têm interesse.

Para U2, as postagens que mais aparecem são sobre tatuagem, desenhos, séries e postagens com piadas. O usuário também observou um padrão de ordem dos anúncios. Segundo informado, geralmente, quando abre sua conta do Facebook, a terceira postagem é quase sempre alguma propaganda, e depois dela retornam os conteúdos com os assuntos já citados.

Para U3, a predominância das postagens de amigos em seu feed tem relação direta com o uso que faz da rede. Segundo nos foi contado por U3, sua principal atividade no Facebook era curtir e comentar postagens de amigos e parentes. Então, quando percebeu, seu feed estava inundado desse conteúdo sem que se desse conta.

Para finalizar o capítulo, deixamos em aberto a pergunta: o que aconteceria se esses mesmos usuários começassem a curtir e compartilhar os conteúdos que a Folha disponibiliza em sua fanpage no Facebook? Isso provocaria mudanças também nas demais postagens que aparecem em seu feed? Essa não é uma questão que responderemos nessa dissertação, porém, a continuidade do desenvolvimento da noção de formação algorítmica, a partir do funcionamento do algoritmo, certamente, nos dará elementos teóricos para compreender o funcionamento do discurso digital, tal como ele se historiciza no mundo.