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3 IMPLANTAÇÃO IÔNICA POR IMERSÃO EM PLASMA

3.2 FORMAÇÃO DA CAMADA MODIFICADA COMPOSTA POR FASES

NITRETAÇÃO POR PI3 EM AÇOS INOXIDÁVEIS

Após os íons serem implantados no processo PI3, em profundidades que dependem de sua energia cinética (seção 3.1), e se recombinarem eletricamente, os átomos de nitrogênio difundem então para regiões mais internas do substrato por ativação térmica. A elevação da temperatura na faixa entre 300 °C e 400 °C para aços inoxidáveis é resultado da dissipação parcial da energia de implantação em energia térmica, como discutido por (OLIVEIRA, 2016). Esse processo de implantação e difusão resulta na formação de camadas modificadas ricas em nitrogênio no material. O processo de difusão depende, além de propriedades relacionadas ao material, a temperatura e ao tempo. Partindo das leis de Fick da difusão (CALLISTER JR; RETHWISCH, 2007; MEHRER, 2007), encontra-se a relação

𝑥 ∝ √𝐷. 𝑡, (3.4)

onde x é a espessura da camada modificada, D a difusividade expressa pela equação (2.1), dependente da temperatura e t é o tempo de tratamento. Assim, ocorre o estabelecimento da camada modificada rica em nitrogênio por PI3.

Após a inserção de nitrogênio em solução sólida acima do limite de solubilidade das estruturas cristalinas em equilíbrio termodinâmico (discutido na seção 2), nesses materiais forma-se então fases metaestáveis livres de precipitados. Na microestrutura austenítica dos AIA, onde ocorre uma supersaturação intersticial de nitrogênio em solução sólida com a concentração atômica entre 17 e 40 % em regiões próximas a superfície, a fase metaestável resultante é conhecida como austenita expandida por nitrogênio em solução sólida (γN, também

denominada fase S) (DONG, 2010; MANOVA et al., 2014a, 2017). Em analogia à fase γN, as

fases metaestáveis formadas a partir da introdução de nitrogênio em solução sólida nas microestruturas ferríticas e martensíticas denominam-se ferrita expandida por nitrogênio em solução sólida (αN) (GONTIJO et al., 2010) e martensita expandida por nitrogênio em solução

sólida (α’N), respectivamente (MÄNDL; RAUSCHENBACH, 2004). Na literatura, encontram-

se valores entre 14-28% para a concentração atômica de nitrogênio de α’N em regiões próximas

a superfície de AIMs nitretados(MÄNDL et al., 2005; MANOVA et al., 2005, 2006a). Os dados

disponíveis relativos à fase αN são bem mais escassos. Blawert et. al. encontraram a

concentração atômica de ~4% numa condição em que ocorre somente a formação de αN em

(BLAWERT et al., 2002). A baixa concentração de nitrogênio na αN pode ser consequência da

distribuição do nitrogênio, na microestrutura ferrítica, principalmente ao longo de defeitos e contornos de grãos (MANOVA et al., 2017; STEIN et al., 2013). Assim, as concentrações de

nitrogênio atribuídas na literatura a αN eα’N, são significativamente menores que a concentração

máxima atribuída a γN, o que é compatível com as características de solubilidade em equilíbrio

termodinâmico das estruturas a partir das quais são formadas α, α’ e γ (seção 2.1).

A identificação das fases γN, α’N e αN é realizada principalmente por meio de análises de

difratometria de raios X (DRX), nas quais estas fases são caracterizadas pela presença de picos largos deslocados para distâncias interplanares maiores em relação a posição dos picos das fases a partir das quais são formadas. Nas três fases γN, α’N e αN, o alargamento dos picos é causado

por deformações anisotrópicas induzidas nas redes cristalinas pela presença de nitrogênio em solução sólida e à sobreposição de picos correspondes às diversas concentrações não estequiométricas Fe-N (DONG, 2010; GONTIJO et al., 2010; MANOVA et al., 2006a). A partir de análises DRX entreγN, α’N e αN, pode determinar-senálises comparativas mais precisas por

meio das deformações apresentadas pelas estruturas cristalinas nos diferentes planos cristalográficos. Em γN a expansão do parâmetro de rede atinge 11% na condição em que a

concentração atômica de nitrogênio é de 38% (MANOVA et al., 2014b), enquanto que em α’N

observa-se umavariação menor de até 4-5 % dependendo da composição química do material (MÄNDL et al., 2005; MANOVA et al., 2006a) e em αN a expansão observada é menor que

3,5% (BHUYAN et al., 2014). Assim, a deformação e os deslocamentos nos picos de DRX são significativamente maiores na estrutura γN em relação às estruturas αN eα’N.

Para explicar a formação da fase γN a partir dafase γ contemplando a deformação

anisotrópica observada em AIA nitretados; foram avaliados, vários modelos com deformação tetragonal, triclínica, monoclínica, ortorrômbica (FEWELL; PRIEST, 2008; MÄNDL; RAUSCHENBACH, 2000; MANOVA et al., 2017). No entanto, nenhum dos modelos avaliados apresentou total correspondência com as análises experimentais. Sabe-setambém a anisotropia produzida nas deformações de distâncias interplanares se deve a anisotropia elástica, presente em todos os metais cfc, superfície também à restrição da dilatação livre da camada modificada pelo material de substrato subjacente (MANOVA et al., 2017).

Uma teoria complementar para a formação de fases metaestáveis em aços inoxidáveis foi proposta por Parascandola e desenvolvida para a fase γN em AIA, a qual prevê que a fase

γN se forma devido à maior afinidade que o nitrogênio tem com o cromo em relação ao ferro

(PARASCANDOLA; MÖLLER; WILLIAMSON, 2000). Isto resulta num mecanismo conhecido como aprisionamento de nitrogênio pelo cromo. Uma vez que todos os locais de

armadilha de Cr estejam ocupados, qualquer N adicional difunde rapidamente através da camada de fase γN. Assim, a energia de ativação para a difusão na camada composta por fase

γN é muito menor que aquela reportada para a fase austenita γ (seção 2.1) e portanto, a

difusividade de nitrogênio (disposta nas equações 2.1 e 3.4) também é maior em para a fase γN

do que a reportada para a fase γ (DONG, 2010).

Análises in situ em câmaras PI3 realizadas em AIA permitiram observar que há uma elevação no coeficiente de difusão após a introdução de nitrogênio, o que causa uma transição dinâmica de “austenita expandida” de baixa expansão para alta expansão (MANOVA et al., 2014a, 2017). Utilizando espectroscopia Mössbauer, foi observado que a fase γN é

ferromagnéticaaté a concentração de 17,5% (atômica) e, acima desta concentração, passa a ser paramagnética (BLAWERT et al., 2001b). Assim, pode se afirmar que a fase γN, em aços

austeníticos, se apresenta como duas fases com características distintas. Em adição, sabe-se também, por meio de análises de microscopia eletrônica de transmissão, que a fase γN pode ser

caracterizada como uma estrutura cúbica com alta densidade de discordâncias e falhas de empilhamento, onde o nitrogênio ocupa preferencialmente os sítios octaédricos e, que tem tendência para ordenamento do tipo Fe4N (cfc) (BLAWERT et al., 1999; FERNANDES;

CASTELETTI; GALLEGO, 2013; STRÓZ; PSODA, 2010). No entanto, até onde se pode investigar, nenhum modelo é ainda totalmente capaz de prever corretamente a estrutura da fase γN e explicar de maneira precisa a anisotropia observada (FEWELL; PRIEST, 2008; MANOVA

et al., 2017).

Em AIM e AIF, o conhecimento sobre α’N é bem menos avançado. Até o presente

momento, não há dados de análises de DRX in situ nesses materiais. Análises DRX ex situ em AIMs nitretados por PI3 têm demonstrado que aços martensíticos nitretados apresentam comportamento semelhante aos austeníticos, porém mantendo a estrutura cristalina base de martensita (MÄNDL; RAUSCHENBACH, 2004; MANOVA et al., 2005, 2006a).

Dentre as fases γN, α’N e αN, o comportamento de formação e evolução da fase αN é o

menos conhecido, para o qual ainda não existe um consenso sobre sua natureza. Em AIF nitretados por tratamentos assistidos a plasma, em alguns casos não se identifica a fase ferrita expandida por nitrogênio em solução sólida (αN); além disso, ocorre precipitação de nitretos

mesmo em temperaturas baixas, da ordem de 300 ºC (BLAWERT et al., 2002; LARISCH; BRUSKY; SPIES, 1999). Diferentemente, outros trabalhos relatam a presença de fase αN, de

modo similar como ocorre γN na austenita (GONTIJO et al., 2010). Alguns estudos apontam

ainda que a presença ou não de αN e/ou nitretos em aços de microestrutura ferrítica está ligada

fenômeno que pode ocorrer com a inserção de nitrogênio, que é um elemento austenitizante, é a transição de ferrita para austenita, que posteriormente forma a fase γN, tal qual como ocorre

em aços austeníticos (JIRÁSKOVÁ; BLAWERT; SCHNEEWEISS, 1999).

Após a supersaturação de nitrogênio em solução sólida, pode ocorrer a precipitação de nitretos de tipo γ'-Fe4N e ε-Fe2+xN (com x entre 0 e 1), que se tornam evidentes em tratamentos

PI3 em temperaturas próximas de ~400 °C. As estruturas cristalinas desses nitretos são cúbica de face centrada para a fase γ' e hexagonal compacta para a fase ε (Figura 3.4) (ROHITH et al., 2016; YE; CAO, 2016). Nas duas estruturas, o nitrogênio encontra-se em intersticios octaédricos, onde se liga aos átomos de ferro (ROHITH et al., 2016).

Figura 3.4 – Estruturas cristalinas dos nitretos γ'-Fe4N e ε-Fe2+xN (com x entre 0 e 1).

Fonte: Adaptado de Ye e Cao (2016) e Rohith (2016).

Tratamentos realizados acima de 420 °C levam a uma depleção considerável de Cr, principalmente nas regiões de contorno de grão da matriz austenítica (MANOVA et al., 2006a), onde o Cr é segregado durante a solidificação, dando início ao processo de precipitação de nitretos de cromo. Assim, o filme passivo de óxidos de Cr que protege a superfície é comprometido, diminuindo fortemente a resistência a corrosão do material (DONG, 2010; FOERSTER et al., 2007; MÄNDL; RAUSCHENBACH, 2004; PINEDO; MONTEIRO, 2004). O conteúdo disponível na literatura sobre as estruturas obtidas a partir de tratamentos PI3 se refere principalmente as ligas padrão de aços inoxidáveis (AIA, AIM, AIF e AID) nitretados. No entanto, sabe-se que a composição química dos aços inoxidáveis tem efeito sobre as fases formadas nos tratamentos de nitretação. Além disso, no caso dos AIA, os elementos que são fortes formadores de nitretos, como Ti, V, Nb, Al, Cr, Mo e Mn, elevam a solubilidade de nitrogênio nas ligas, enquanto o Ni e o Si atuam para a redução da solubilidade (DONG, 2010). Assim, nos aços inoxidáveis de alta liga, com teores mais elevados de Cr, Mo e Ni e

adições de Ti, V, Nb e Mn (como observado na Tabela 2.1), desenvolvidos para aplicação em ambientes corrosivos, o comportamento de formação das fases pode diferir em relação as classes padrão de aços inoxidáveis.

Durante o processo de nitretação por PI3, dependendo das condições de tratamento, pode ocorrer a formação de duas camadas distintas, conhecidas como zona de compostos ou camada rica em nitretos (CN) e zona de difusão ou camada composta predominantemente por fases expandidas (CαN, Cα’N e CγN, dependendo da microestrutura base) (BLAWERT et al.,

2001a). A primeira se situa mais superficialmente e, é rica em fases de nitretos como γ' e ε. A zona de difusão é formada principalmente por solução sólida de nitrogênio na matriz, podendo apresentar também pequena quantidade de precipitados dispersos.