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7 IMPLEMENTANDO A METODOLOGIA PROPOSTA E APRESENTANDO OS

7.2.5 Formação e prática em saúde e enfermagem: condicionantes do

O participante alude que a formação acadêmica e o exercício profissional na área da saúde condicionam a uma vida saudável, como elucida na fala a seguir:

[...] o conjunto de conhecimentos faz com que tu tenha uma vida mais saudável (P.10).

Contudo, questiona-se, tais conhecimentos oriundos da formação e da prática em saúde condicionam os profissionais à ação para uma vida com mais saúde ou à praticidade de autocuidar-se e automedicar-se quando detectado algum transtorno de saúde? Ou seriam ambas as questões verdadeiras?

Quanto à presença de alguma dor de cabeça (cefaléia), por exemplo, o profissional reportando-se a si mesmo e aos demais manifesta que em geral [...] tu não vai investigar, tu resolve na hora (P.2).

Por deter o saber sobre qual(ais) medicação(ões) são indicadas/recomendadas para a cefaléia e que provavelmente resolverá(ão) a condição álgica, o profissional busca alternativas que minimizam o sintoma presente. Porém, essas alternativas podem mascarar uma doença aparente, como aponta outro profissional:

Tomar analgésico é paliativo, tu tem uma coisa que tu não sabe, se é um estresse emocional, cansaço físico e mental, pode até ser, mas é uma coisa paliativa porque tu não investigou... tu não procura saber... de repente, investigar! (P.1).

Eis a polêmica! Afinal, ter o conhecimento teórico e a experiência da prática, que facilitam o exercício do autodiagnóstico e automedicação é uma condição que promove o autocuidado para um viver mais saudável ou pode ser considerada uma

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intervenção paliativa que pode adiar (atrapalhar) o diagnóstico prévio de alguma doença grave?

O conflito de opiniões emerge quando a questão acima surge para reflexão e outro profissional emite a opinião:

Eu acho que não atrapalha, jamais. Quanto mais conhecimento se tem, melhor (P.1).

Contudo, outros participantes discordam do posicionamento anterior e comparam as atitudes do profissional às atitudes de um sujeito leigo:

Às vezes atrapalha, por estar aqui no meio e conhecer a gente adia alguns procedimentos. Por exemplo, tu tá com uma dor, tu já sabe como tratar aquela dor. Então, a gente se automedica muito... Tô com uma dorzinha, ah, toma um remedinho que já vai passar. Tu toma e realmente passou, pronto! E se é uma pessoa que não tá no meio, que não sabe nada, que é totalmente leigo, apareceu ele vai investigar, né? Porque ele não vai se automedicar... E se tu tá aqui dentro (hospital) já pega, já toma um remédio. Daí, hoje passou, amanhã não deu, ah, não procura mais, só quando volta de novo, mais forte às vezes, né? (P.3).

As pessoas que não tem conhecimento ficam muito mais ansiosas, ficam com mais medo e tendem a procurar mais. Às vezes, nem ajuda, porque a maioria das coisas passam, assim, nem precisa tu investigar e a gente não se desespera por causa de uma coisa tão simples. A gente consegue levar as coisas mais naturalmente. A gente encara uma dorzinha como uma coisa normal (P.10).

Conforme a fala anterior percebe-se que, por ansiedade, medo ou precaução, o indivíduo leigo recorre ao médico para diagnosticar e tratar a moléstia que o acomete por não entender ou associar a clínica apresentada à doença x ou y . Dessa forma, o leigo pode, necessária ou desnecessariamente, buscar o recurso adequado para investigar o sinal ou sintoma anormal. Em contrapartida, o não leigo o profissional da saúde não se exaspera tão facilmente, recorrendo a condições minimizadoras da clínica apresentada.

Para os participantes esta situação é considerada um descuidado, pois a condição aparentemente sem importância pode agravar-se devido à negligência do profissional em procurar o recurso adequado e tornar-se uma enfermidade tardiamente grave, como denotam os relatos a seguir:

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Às vezes, a gente subjuga uma dor, um sintoma que a gente tem, não se preocupa muito, e que pode vir a ser uma coisa mais séria, né? E, às vezes, eu acho também, que a gente resolve as coisas simples, de uma maneira simples (P.7).

A sorte que a gente tem é que normalmente não é coisa grave (risos

de todos). Tem coisa, uma dor de cabeça, que a gente trata (automedicação) e nunca mais incomoda, normalmente não é coisa

séria, que quando for a gente demora mais a descobrir (P.10). ... Vai persistir os sintomas e com certeza a tendência é se agravar

(P.1).

Segundo o depoente abaixo, embora os profissionais (quando apresentam algum sinal ou sintoma de enfermidade) busquem auxílio de outros profissionais da saúde tardiamente ou não tão abruptamente quanto à população leiga, faz-se o diagnóstico e tem-se o início do tratamento, na maioria das vezes, mais rápido que o leigo. Tal justificativa se daria justamente por este profissional fazer parte do sistema/serviço de saúde, que mesmo com todas as dificuldades relatadas anteriormente, pode auxiliá-lo a desencadear o processo assistencial, sendo facilitado pelas inter-relações e conhecimento a acerca do funcionamento do sistema/serviço e dos modos de intermediação para obter o acesso diagnóstico e terapêutico necessários.

Com sintoma, acaba conversando com as pessoas (do meio) e a gente chega mais rápido (ao diagnóstico) do que as pessoas que tão de fora. A gente tem mais acesso as coisas. Ah, eu preciso de tal coisa, tu consegue antes. Embora tu comece a investigar mais tarde, o diagnóstico acaba sendo mais precoce do que de uma pessoa que está fora do sistema de saúde. A gente aqui dentro consegue o que a gente quer (P.10).

Por outro lado, salienta este participante que:

[...] às vezes, um sintoma que só ocorre quando a gente tem que sabe que só ocorre quando acontece alguma coisa mais séria, logo busca, né? (P.7).

Esta fala denota que por deter conhecimentos da área da saúde e potencial para relacionar sinais e sintomas clínicos às condições patológicas, o profissional procede à investigação, sem hesitação, quando relacionados a alguma condição grave.

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Autocuidar-se é também cuidar da própria saúde e prevenir doenças através de atitudes e medidas de prevenção primária, faz parte desse cuidado (BAGGIO, 2004). No entanto, os profissionais deste estudo, embora desempenhem sua prática laboral em ambientes destinado à promoção da saúde e tratamento de doenças, denotam pouco cuidado consigo no que diz respeito à prevenção, ficando este cuidado postergado, mesmo atuando em seu cotidiano em prol do cuidado do outro.

Muitas vezes a gente esquece né? Cuida mais dos outros e esquece de cuidar de si mesmo, né? [...] só vai perceber que o corpo ta doente quando a máquina começa a falhar, né? (P.6).

Faz tempo que eu não faço algum exame de rotina. Olha pra dormir ta difícil [...] não consigo dormir, porque eu viro prum lado dói o pescoço, viro pro outro dói o ombro, porque daí sobrecarrega o ombro, de barriga pra cima eu ronco. [...]. Daí a gente custa pra dormir [...] toma um remedinho, passa, passou e vai passando. Quando tu vai no médico é porque tu já não agüenta mais e aí aquilo que era uma coisinha mínima já é um problemão, porque tu vai adiando, tu vai melhorando, vai passando... passou bem, não vai. [...] eu não consigo dormir bem, desde novembro (entrevista em

outubro de 2007) (P.3).

Se algo não está bem com o corpo, este sutilmente manifestará algum sinal de alerta de que alguma coisa está errada. Conforme o relato acima, de P.3, o seu sono é interrompido por sinais e sintomas álgicos em diferentes partes do corpo, embora de pouca intensidade, manifestando e alertando que algo não está bem em seu corpo físico e biológico. Contudo, medidas paliativas através da automedicação são utilizadas para minimizar as manifestações, sendo o cuidado de si mesmo protelado, mais uma vez.

Quando alguma intercorrência do organismo físico/biológico tem os sintomas minimizados e ou mascarados pela automedicação, que provoca o alívio álgico, tem- se a possibilidade de complicações também serem mascaradas ou não percebidas. De acordo com Meleiro (2001), a automedicação é uma prática que pode comprometer a saúde das pessoas, que antes de sanar, pode maximizar o problema ou trazer complicações indesejadas. A autora salienta que a automedicação pode mascarar a doença, podendo comprometer o diagnóstico e o tratamento precoce de uma doença mais grave. É entendida como uma medida paliativa, não efetiva, pois minimiza os sinais e sintomas, mas não trata o problema que pode ressurgir

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potencializado. Assim, constata-se que a algia (sintoma) pode ser combatida, mas não sua causa.

Segundo Baggio (2004), os profissionais da área da saúde estão mais propensos a automedicação do que outros (leigos) por terem conhecimento sobre as drogas disponíveis, suas indicações e possuírem, via de regra, o acesso facilitado à droga, favorecendo a atitude da automedicação que visa primeiramente solucionar um problema de saúde ou minimizá-lo. Porém, a atitude de automedicar-se sem o acompanhamento de outro profissional pode se tornar o uso abusivo ou indiscriminado. Assim, salienta a autora, que o profissional da saúde que se automedica, baseado em seus conhecimentos e suas necessidades, e que, desconsidera o acompanhamento de outro profissional para julgar os benefícios e malefícios da conduta adotada, corre o risco de sofrer os efeitos indesejáveis e até irreversíveis provocados pela droga.