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CAPÍTULO II FORMAÇÃO, IDENTIDADE E SABERES: O DESENVOLVIMENTO

2.3 Formação e prática pedagógica de professores engenheiros

O exercício da docência nos cursos de Engenharia exige que o professor seja conhecedor não apenas de conteúdos teóricos e práticos específicos da profissão, mas que tenha também um compromisso com a sala de aula, igual ao exigido para o exercício de qualquer profissão. Porém, uma coisa que nos preocupa é que o papel do professor de Engenharia é pouco privilegiado como um dos principais agentes do processo de formação dos futuros engenheiros, profissionais que estarão envolvidos direta ou indiretamente com aspectos como valores éticos, modelos de produção tecnológica, sobrevivência, disputa por espaço de trabalho, dentre outros, que envolvem a sociedade nos dias contemporâneos.

Desta forma é importante discutir aspectos que influenciam a formação e a construção da prática pedagógica dos professores que são bacharéis em Engenharia e ministram disciplinas nos cursos de graduação em Engenharia. É comum perceber que muitos professores, mesmo diante das mudanças que acontecem em todos os setores da sociedade, incluindo aqui a educação, apesar de muitas vezes participarem das mudanças curriculares que acontecem nos cursos da Educação Superior, inclusive nos cursos de Engenharia, continuam praticando as mesmas aulas. E aí nos perguntamos: o que leva um professor a mudar sua prática pedagógica? Por que alunos reclamam tanto das metodologias e da forma como alguns professores ministram suas aulas?

Na contemporaneidade, a educação vem passando por muitas mudanças, sociais, técnicas, políticas, decorrentes da reorganização econômica mundial. Mas para que essas

mudanças ocorram de forma favorável é preciso uma nova postura das IES, que envolva os professores, os alunos e toda a comunidade acadêmica.

Como já discutimos anteriormente, sabemos que para se tornar professor, não basta apenas começar a dar aulas. É um caminho muito mais complexo, de construção de saberes capazes de apreender e buscar soluções para os mais variados enfrentamentos da prática docente e do trabalho de ensinar. O trabalho docente se faz ao confrontar os conceitos teóricos desenvolvidos pelos saberes da educação (teoria) com as atividades no laboratório onde esses saberes são colocados em prática (sala de aula). Sendo assim, embora a prática em sala de aula seja fundamental para sua experiência, é importante que haja uma reflexão que deve ser feita simultaneamente a ela (formação) e que subsidie e instrumentalize o professor em sua docência no cotidiano.

Quando o professor engenheiro inicia na docência, principalmente aquele que não tem uma formação pedagógica, na maioria das vezes o recurso de que ele dispõe é basear-se nas experiências que traz da sua vivência como aluno. São esses referenciais, vinculados à figura de seus antigos professores, que na maioria das vezes orientam o docente engenheiro no início de seu trabalho na área da educação.

Além da falta da formação pedagógica ainda acrescentamos ao curso de graduação dos docentes engenheiros a compartimentalização e especialização próprias das ciências exatas e tecnológicas, sem aprofundamento nas ciências humanas e sociais. Isso dificulta bem mais o entendimento das relações complexas que envolvem as instituições educacionais, como planejamento, avaliação e aspectos socioculturais do processo educativo. Sendo assim, para esses profissionais, as discussões pedagógicas precisam ser trazidas de maneira que os levem à reflexão de sua prática docente.

Nos cursos de graduação em Engenharia, não existe uma preocupação em formar professores. Eles procuram formar o profissional engenheiro, e não o docente engenheiro. A formação do professor engenheiro fica a cargo, como já dito anteriormente, dos cursos de pós- graduação stricto sensu que terminam por habilitar os engenheiros para a docência. Como sabemos, esses cursos também não têm como principal preocupação a docência, e sim a pesquisa. Preocupam-se com o aprimoramento técnico na área de atuação, supondo que o exercício da docência seria uma simples decorrência dessa formação. A partir de 2002, o estágio na docência passa a ser obrigatório para os bolsistas, de acordo com a CAPES, como parte integrante dos cursos de pós-graduação stricto sensu, com o objetivo de preparação para a docência e a qualificação do ensino de graduação, de acordo com o artigo 17 do anexo à Portaria Capes nº 52/2002 (CAPES, 2012).

Há algumas décadas acreditava-se que bastava ser um engenheiro bem-sucedido profissionalmente, para ser um bom professor. Com a exigência da pós-graduação a crença passou para a titulação, ou seja, um engenheiro com título de mestre e doutor seria um bom professor.

Nem sempre isso procede, pois muitas vezes ouvimos dos próprios alunos: “ele sabe muito a matéria, mas não sabe ensinar”; “ele tem muita experiência, mas não sabe relacioná-la com a teoria”, dentre outros comentários nesse sentido. Na verdade, para ser professor não basta ser doutor, ou excelente profissional na área de atuação, nem mesmo dominar os conhecimentos específicos da profissão. É necessário também conhecer os aspectos pedagógicos que permeiam o exercício da docência. No entanto, ainda não temos uma ação efetiva e institucionalizada que vise proporcionar uma transformação na prática pedagógica do docente engenheiro.

De acordo com Pinto et al. (2010), faz-se necessário que o professor engenheiro conheça e saiba aplicar métodos e técnicas do processo de ensino-aprendizagem estruturados e que pressuponham a apropriação do conhecimento por parte do aluno. Sem essa apropriação o docente engenheiro não contribuirá para a formação de profissionais que tenham condições de assumir as demandas da sociedade contemporânea.

Bazzo, Pereira e Linsingen (2000, p. 23) consideram a formação específica para a docência como questão fundamental para a melhoria da qualidade de ensino nos cursos de Engenharia, visando à superação de um modelo tradicionalista e conservador de ensino. Fundamentado na herança positivista e na racionalidade técnica que rege o campo da Engenharia brasileira, “o processo de ensino passa a ser uma indisfarçada afirmação da realidade do objeto por parte do professor e uma apassivada memorização de informações técnicas, de preferência matematizadas, por parte dos alunos”.

Esse modelo de ensino mostra claramente que a relação professor-aluno-conhecimento está em descompasso com as exigências da sociedade atual.

Os métodos tradicionais de ensino na Engenharia parecem estar se esgotando como modelos adequados de formação de profissionais para a dinâmica tecnológica e a diversidade das relações a que estamos submetidos, todos nós, profissionais da Engenharia (BAZZO; PEREIRA; LINSINGEN, 2000, p. 125).

O ensino praticado nos cursos de Engenharia pelos docentes engenheiros ainda se apresenta muito mais com o objetivo de formar alunos como mão de obra para as necessidades específicas do mercado e para serem servidores do modelo econômico praticado na sociedade. Os engenheiros, de uma maneira em geral, ainda são formados com base em uma abordagem pedagógica acadêmica e tecnicista ainda caracterizada pelo tradicionalismo. No entanto, a universidade pode rever e modificar a sua função, por meio do desenvolvimento da consciência crítica, do pensamento científico e da criatividade, buscando valores como a cidadania e desvelando a realidade para preparar um saber politécnico, integral e adequado a uma sociedade heterogênea e desigual (CAVALLET, 1996).

Portanto, para ser um bom professor engenheiro, não basta ser um bom profissional da Engenharia, gostar de cálculo, física e matemática, como se pensava até bem recentemente. Na sociedade contemporânea o professor engenheiro, além de possuir os quesitos mencionados acima, precisa ser capaz de construir e mediar a construção de conhecimentos, conhecimentos multidisciplinares, para que seus alunos, os futuros engenheiros, sejam capazes de tomar decisões, de trabalhar em equipe, de serem críticos, proativos e criativos; que saibam se comunicar e se adaptar a situações diversificadas, saindo da posição de “solucionadores de problemas” e tornando-se “projetistas de soluções”.

No próximo capítulo, apresentaremos a evolução das tecnologias em nossa sociedade, principalmente das TIC, abordando sua importância na educação, na Educação Superior e, principalmente, nos cursos de graduação em Engenharia.