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1 FORMAÇÃO EM ENFERMAGEM E CONTEXTOS DE FORMAÇÃO

1.1 – NATUREZA DO CONTEXTO DE ENSINO CLÍNICO

Uma parte significativa do período de formação do enfermeiro responsável por cuidados gerais acontece em contexto de trabalho durante os períodos de ensino clínico que, de acordo com a legislação, têm de representar pelo menos metade da duração de formação, isto é de 4600 horas. Entende-se por ensino clínico “(...) a vertente da formação em enfermagem através da

qual o candidato a enfermeiro aprende no seio de uma equipa e em contacto directo com um indivíduo em bom estado de saúde ou doente e/ou uma colectividade (...)” (Directiva

2005/35/CE: 41).

Todos os aspectos regulamentares para o curso de licenciatura em enfermagem, em Portugal, estão definidos desde a publicação da Portaria 799-D/99 de 18 de Setembro, tendo a Directiva anteriormente referida apenas confirmado o que já estava a ser implementado nas várias Escolas Superiores de Enfermagem do país. Esta legislação reforça também a importância que na enfermagem sempre tem sido atribuída à formação em contexto de trabalho, nomeadamente em ambiente hospitalar. Em Portugal, a ligação aconteceu de forma próxima que as Escolas de Enfermagem durante muitas décadas nasceram e/ou existiram dentro dos próprios hospitais (Amendoeira, 2006).

As mudanças determinadas pela evolução da profissão, mas também das próprias políticas de saúde e necessidades de intervenção por parte dos enfermeiros fizeram com que os contextos de formação se alargassem e o ensino clínico actualmente seja realizado “(...) em hospitais e

outras instituições de saúde e na colectividade, sob a responsabilidade de enfermeiros docentes e com a cooperação e a assistência de outros enfermeiros qualificados.” Os

estudantes durante o período formativo participam, integrados na equipa do serviço em causa, nas actividades de prestação de cuidados ou outras de particular interesse para a sua formação de modo que “(...) lhes permitam aprender a assumir as responsabilidades que os cuidados de

enfermagem implicam” (Directiva 2005/35/CE: 41). Articulando os conhecimentos já adquiridos

na preparação prévia numa modalidade formativa mais centrada no ensino teórico, o estudante em ensino clínico desenvolve as competências necessárias para planear, dispensar e avaliar os cuidados de enfermagem globais requeridos pelo indivíduo, grupo, e/ou comunidade.

Para que os estudantes de enfermagem realizem os diferentes ensinos clínicos em instituições de saúde levanta-se, em primeiro lugar, a questão das relações entre o meio clínico e os estabelecimentos de ensino. A este nível pode mesmo surgir alguma confusão entre a missão de uns e de outros pois enquanto o meio clínico se centra na pessoa em situação de doença (pelo menos a nível hospitalar) a instituição de ensino está centrada no estudante (Hesbeen, 2000). Não se trata de duas lógicas opostas, apenas missões diferentes, que se unem e

encontram pontos de convergência e finalidades comuns quando participam conjuntamente na formação de estudantes. De acordo com esta visão Serra (2007: 128) considera que o acesso ao hospital para a formação de estudantes pode mesmo ser vedada pois a “assistência à

doença é tida como uma função prioritária do hospital” pelo que a actividade de “ensinar é frequentemente levada a adoptar configurações compatíveis (por vezes de recurso) com a missão primordial do hospital”. A possibilidade de surgirem conflitos, de génese multifactorial

(pois são duas instituições diferentes a trabalharem conjuntamente e para o mesmo fim), faz com que tenha de haver de ambas as partes uma atenção e motivação constantes para a negociação e o diálogo.

O ensino clínico é a ocasião para o estudante descobrir a realidade das situações de vida, surge como o complemento ao ensino em contexto de sala de aula que, independentemente de utilizar as estratégias pedagógicas mais eficazes, não consegue substituir-se ao contacto directo com a realidade que as instituições de saúde permitem pois as competências que ali desenvolve nunca poderão ser aprendidas “(…) em sala de aula ou laboratório, dado

constituírem uma vivência de situações concretas que são integradas por cada um dos estudantes de forma diferente e única”. É, por esta particularidade que a actividade dos

prestadores de cuidados, enquanto formadores, e consequentemente o ensino clínico, têm uma importância tão singular (Abreu, 2007; Serra, 2007: 133).

Exige-se assim, que se prevejam momentos de exploração destes períodos de aprendizagem clínica com os formadores com a finalidade dos estudantes expressarem as suas interrogações, as suas satisfações, bem como as suas indignações e/ou as suas emoções, isto é, tudo aquilo que abre campo de intervenção ao docente e lhe permite situar-se no papel de quem faz despertar para a complexidade e para a riqueza do ser humano ao mesmo tempo que revela os cuidados de enfermagem e tudo o que lhes está subjacente.

Estamos perante uma etapa em que o estudante para além das vivências inerentes ao seu papel de estudante terá de se confrontar com um ambiente de uma instituição prestadora de cuidados de saúde, integrando-se no seu seio para ali aprender. Esta é uma situação que terá componentes tanto de desafio, motivação, interesse, curiosidade e expectativa como de medo e receio. O contexto clínico é com frequência o hospital, de maiores ou menores dimensões, geral ou especializado mas sempre um contexto social onde se verificam combinações complexas. (Abreu, 2001)

O contexto hospitalar: local de formação de novos profissionais

O hospital é um estabelecimento de saúde, uma organização prestadora de serviços de grande utilidade e importância para a comunidade em geral segundo Senhoras (2007), de diferentes níveis de diferenciação, constituído por meios tecnológicos e humanos, cujo objectivo nuclear é a prestação de cuidados de saúde 24 horas por dia.

A Direcção Geral da Saúde (1998: 39), refere os hospitais como “(…) organizações

extremamente complexas, desenvolvendo a sua actividade num sistema composto por muitos agentes, de natureza, nível e diferenciação diferentes, inter-actuando com praticamente todas as expressões do tecido social e da sociedade civil.”

As instituições são formadas por pessoas que, inseridas na organização e através das suas capacidades técnicas, aptidões e motivações, orientam a sua actividade de modo a alcançar determinados objectivos pessoais e institucionais. Representam o recurso mais valioso para a instituição hospitalar como sistema socio-técnico que é pois, esta é uma instituição de capital humano intensivo dotado de qualificações técnicas elevadas e muito diversificadas (Direcção Geral de Saúde, 1998; Abreu, 2001)

Assim, o factor de desenvolvimento por excelência dos hospitais é, os seus recursos humanos pois a estes compete o desempenho da sua principal missão, a prestação de cuidados de saúde à população servida. Os meios técnicos e materiais constituem apenas instrumentos auxiliares para o cumprimento da sua missão. A importância que os meios humanos assumem faz com que qualquer dificuldade ou constrangimento no que se prende com a sua dotação ou optimização possa ter reflexos imediatos na prestação de cuidados globalmente, na qualidade da prestação, na satisfação dos utilizadores ou no ambiente relacional vivido entre profissionais individualmente ou grupos profissionais.A dotação de pessoal e os constrangimentos que lhes estão associadas são em muito decorrentes daquilo que é o principal objectivo de uma instituição de saúde hospitalar pois a composição, quantidade, disponibilidade e qualidade da produção de cada serviço ou globalmente da instituição, não é fácil de planear e, consequentemente, não é fácil prescrever usando critérios de pura racionalidade. A inserção do ensino na dinâmica de trabalho hospitalar não se pode alhear das questões relativas aos seus recursos humanos pois exige adaptações que directamente os afectam (Serra, 2007).

Em 1998, a Direcção Geral de Saúde, identificava problemas de maior relevância que afectavam a organização e funcionamento dos hospitais. Entre eles destacava os seus quadros, carreiras e sistemas de compensação, ambiente e organização do trabalho, e ainda a formação e desenvolvimento. No ambiente de trabalho identificava a desmotivação como uma

consequência, por um lado de factores intrínsecos aos próprios profissionais mas também por factores ligados à falta de informação e comunicação interna, às dificuldades de relacionamento interpessoal e inter-serviços, à falta de desafios tanto no que se prende com a qualidade como com a organização. Todas estas situações são apresentadas como tendo implicação directa na qualidade da prestação de cuidados (Direcção Geral de Saúde, 1998).

Em consequência da evolução dos hospitais, da forma como a medicina (profissão sempre considerada dominante no poder, nestas instituições) científica se constituiu, dos elementos próprios da estrutura da medicina actual, pela sua natureza, não é feita, não está estruturada tendo como foco de atenção o indivíduo. Pese embora, o facto dos profissionais de saúde serem animados por uma intenção humana esta é, muitas vezes, prisioneira do contexto pelo qual se deveria exprimir. Frequentemente expressões usadas como “O caso, o número da

cama de que nos servimos para identificar os doentes no hospital, ou ainda o nome dos orgãos de que nos servimos para falar dos operados previstos para a sala de operações (...)” são

aspectos que não se podem ligar a uma insuficiente consideração pelas pessoas doentes ou à falta de tempo, são em tudo o resultado, de acordo com Hesbeen (2000: 20) e Senhoras (2007), de uma cultura que se criou e que evidencia que a medicina científica pela sua natureza não foi feita para a pessoa.

Assiste-se a um certo desfasamento entre, por um lado, conhecimentos adquiridos e proezas tecnológicas e, por outro, a realidade das dificuldades, do sofrimento vividas por quem acorre ao sistema de saúde. Há um afastamento entre aquilo que se poderia designar de cuidados centrados no doente e de cuidados centrados na doença o que tem consequências (em vários domínios para o próprio indivíduo e para a sociedade) pois a resposta dada é fundamental e sistematicamente técnico-científica deixando-se pouco espaço para uma abordagem individual e centrada na pessoa a cuidar (Hesbeen, 2000). A este nível a ideologia hospitalar da humanização e da reintegração é atribuída ao pessoal de enfermagem sendo mesmo este o papel psicossocial reconhecido como o papel dominante da profissão e concessor de autonomia (Carapinheiro, 1993). Contudo esta autora também refere que estes são contextos sociais onde se verificam combinações complexas entre objectivos institucionais e objectivos próprios de cada grupo profissional o que nos faz questionar que atmosfera ou ambiente se vive nestas instituições.

A este respeito a Organização Mundial de Saúde (OMS) defende que os cuidados de saúde de qualidade têm de obedecer a componentes como a excelência profissional, a eficiência na utilização dos recursos, riscos mínimos para os doentes, satisfação dos utilizadores e obtenção de resultados em saúde. Nesta evolução os cuidados de saúde encontram-se numa fase de profunda mudança e transição, fruto dos desenvolvimentos científicos, laborais, políticos e

sociais, assiste-se a uma melhoria dos cuidados envolvendo o cidadão como parceiro, uma cultura de cuidados partilhados e de promoção dos complexos processos de produção e prestação dos cuidados de saúde e do desenvolvimento de educação profissional contínua (Abreu, 2007).

Autores como Carapinheiro (1993) e Abreu (2007) salientam que se tem vindo a evidenciar uma dinâmica de mudança nas instituições de saúde em muito baseada, nas exigências sociais, em formas alternativas de organização do trabalho, nas novas tecnologias, nas alterações dos padrões de saúde-doença ou em alterações na formação dos profissionais de saúde.

Destas instituições, os hospitais continuam a ser considerados como lugares insubstituíveis de ensino prático de médicos, enfermeiros e técnicos de diagnóstico e terapêutica pois a sua actividade é fulcral na continuidade da formação destes mas também na de novos profissionais. Isto é, a formação contínua mantém-se como uma das suas grandes missões a par com a formação e o ensino pré-graduado. Tendo subjacente esta ideia surgiu o modelo do hospital escolar, instituição adequada e com especificidades próprias de um hospital de ensino (Direcção Geral de Saúde, 1998).

No ensino de enfermagem, à semelhança de outros na área da saúde, o hospital tem desempenhado um papel nuclear em termos formativos num processo integrador entre os saberes e as práticas quotidianas que os enfermeiros têm de aprender e desenvolver na construção do seu perfil de competências. Independentemente destes aspectos as escolas de enfermagem, responsáveis pela formação destes novos profissionais, há algumas décadas que alargaram significativamente os contextos de saúde onde integram os estudantes para realizarem aprendizagens em períodos de ensino clínico. Esta resposta é decorrente das sucessivas reformas na formação em enfermagem mas também dos sistemas de saúde que têm afirmado e valorizado um investimento na prevenção dando visibilidade e promovendo outro tipo de instituições de saúde (Abreu, 2001).

Contudo, o hospital pela sua tripla vertente de produção de cuidados, formação e investigação continua a constituir-se como um contexto fundamental na formação dos profissionais de saúde. Na perspectiva defendida por Serra (2007), e referindo-se à visão de quem aprende, é no hospital que se encontram, de facto, as situações de aprendizagem que exigem mobilização de saberes prévios ou a construção de novos saberes.

Esta foi uma mudança e evolução significativas pois a produção de conhecimento em enfermagem foi iniciada nos hospitais, sendo este o único local de ensino durante várias décadas, em que a intervenção do enfermeiro tinha uma natureza colaborativa no âmbito dos cuidados de saúde. A produção do conhecimento em enfermagem veio mostrar como a

actividade de enfermagem é determinante no sucesso terapêutico e na melhoria de cuidados e serviços de saúde pela quota significativa de intervenções dos enfermeiros nesses mesmos cuidados e serviços. É durante os períodos de formação pré-graduada que os estudantes desenvolvem competências privilegiando-se, na sua formação, os processos de boas práticas e dinâmicas de promoção da saúde (entre outras), o que só por si traz desafios importantes para os profissionais que colaboram nestas dinâmicas formativas e que consequentemente serão também promotores da qualidade global da prestação de cuidados nestas instituições (Ooijen, 2000; Canadian Nurses Association, 2003; Castledine, 2001, 2003).

A faceta formativa do hospital faz com que ali existam profissionais preparados, condições de trabalho, financiamento e um conjunto de estímulos que levam a que os seus profissionais adoptem uma postura de aprendizagem ao longo de toda a sua vida na promoção de hábitos de rigor e de exigência fazendo com que o hospital seja vocacional e reconhecidamente um local de ensino (Carapinheiro, 1993). Conceito corroborado pela Direcção Geral de Saúde (1998: 94) ao dizer que numa instituição hospitalar todos os profissionais são docentes potenciais e a própria instituição tem de ser vocacionalmente um local de ensino sendo reconhecida como tal. Isto implica “uma reforma cultural importante” que passa por: i) reconhecimento no trajecto profissional; ii) concessão de facilidades de investigação; iii) orientações claras e correctas em normas e guias de boas práticas; iv) avaliação permanente das instituições e dos profissionais. Tudo isto terá como consequência “(...) uma cultura de qualidade, ou seja, o imbuir de um

espírito académico a todos os elementos que nele trabalhem.”

Ser-se formador num contexto tão complexo como o do ambiente hospitalar é uma tarefa que nada tem de simples pois trata-se de ajudar o estudante a despertar para a complexidade do ser humano (a riqueza do outro), para as “coisas da vida” contextualizando-as numa perspectiva de enfermagem. O docente, seja o professor da escola ou o enfermeiro do contexto da prática, desperta e revela para e nas situações encontradas, o que exige que desde o início aborde, com o estudante, assuntos tão sensíveis quanto complexos como a morte, o sofrimento, a angústia, o isolamento, o que revela quanto esta actividade pode ter uma exigência extra e ser uma sobrecarga para o enfermeiro que assume esta função (Levett-Jones, 2009).

Embora a Direcção Geral de Saúde (1998) apresente a perspectiva de todos os profissionais de um hospital como docentes potenciais, considera-se que o formador deve distinguir-se pelo olhar que tem sobre as situações de vida, incitando à reflexão sobre os fundamentos das práticas em causa, abrindo os estudantes à vida de modo que o processo de formação consiga dar um sentido a múltiplas matérias e experiências. Não pode limitar-se a transmitir o que sabe numa lógica de formação pelo consumo do saber, mas tem de permitir e de fomentar que os

estudantes estruturem as suas próprias referências, elaborem as suas próprias palavras, isto é, encontrem sentido para as suas experiências de prestação de cuidados.

O estudante dá ao seu formador créditos de competência e de saber mas tem expectativas de encontrar formadores apaixonados pelo que fazem, ensinando e evidenciando a sua paixão. Esperam deles capacidades para o escutarem e para o acolherem, para o fazerem sentir parte da equipa, sentido de humor, acompanhamento pessoal e a humildade de reconhecerem algumas áreas de não saber ou mesmo de dúvidas e incertezas (Chan, 2001; Sá-Chaves, 2000). Nestes âmbitos esperam encontrar, nos formadores, abertura e disponibilidade para a análise e discussão construindo-se conjuntamente neste espaço de partilha. Assim, estão perante uma formação que acontece na produção do saber, organizada numa tensão permanente entre a reflexão e a intervenção (Canário, 2000 citando Nóvoa).

A complexidade da intervenção

Cuidar na perspectiva de uma atenção dada ao outro, para o ajudar, inscreve-se no domínio da complexidade se considerarmos que complexo designa “o que é tecido em conjunto”. Assim, cada um dos elementos de um conjunto ou situação estão ligados entre si, interagem entre si, fazendo com que qualquer modificação num dos seus elementos tem repercussão num ou em vários outros elementos, isto é, constituintes heterogéneos inseparavelmente associados. Contudo, pensar nas situações deste modo não é o habitual, a tendência é o pensamento cartesiano, isto é, tornar as coisas claras, nítidas e precisas (Morin, 2003: 20).

A abordagem, que se faz ao ser humano e às suas doenças (numa abordagem científica), reduziu consideravelmente o campo de visão e a capacidade para interpretar o que se passa na complexa situação de vida de uma pessoa ou de um grupo. As interacções que se produzem durante uma situação de cuidados, em que todos os seus constituintes estão inseparavelmente associados, são interacções únicas, o que faz com que cada situação de vida com que o profissional se depara seja uma situação definitivamente singular e que nunca se repetirá. Inscrevendo-se assim no conceito de complexidade entendido como “(…) a propriedade de um

sistema modelizável, susceptível de manifestar comportamentos que não sejam todos predeterminados (necessários) ainda que potencialmente antecipáveis (possíveis) por um observador deliberado desse sistema” (LeMoigne, 1999: 191). O complexo é sempre único, não

repetível, não dominável nem duplicável, ambíguo, pouco claro (Morin, 2003).

O complexo necessita de meios que precisam de ser reflectidos pois não são racionais nem grandiosos, a abordagem é simples, enquadra-se numa forma de sujeição da situação e que

não tem a ambição de um conhecimento total. Esta forma de pensamento tem de ser capaz de conviver com o real, de dialogar e negociar com ele, pois a complexidade envolve a ideia de ser impossível unificar ou concluir, mas também a incerteza, a ambiguidade, a contradição, o facto de nem sempre ser demonstrável mas também a capacidade de reconhecer que no final algo se pode manter como não explicável. Daí que o conhecimento pertinente reconhece esta multidimensionalidade na análise destes dados relativos à abordagem do ser humano, questionando os princípios de disjunção, de redução e de abstracção caracterizadores da simplificação (Morin, 2002; 2003).

A propósito da complexidade Collière (1999: 256) refere que só assim os cuidados de enfermagem podem “(...) contribuir para fazer descobrir, para elucidar e mobilizar, sem

pretender agarrar ‘a verdade’, mas ousando apreender a rede de verdades múltiplas, através da qual a vida se insinua.”

A prática dos cuidados de enfermagem inscreve-se, no grupo das actividades complexas pois trata-se de uma situação em que há um encontro entre uma pessoa que é cuidada e pessoas que cuidam. É necessário recorrer a um processo para situar esta acção, o profissional intencionalmente dirige-se ao outro, disponibiliza-se para ir ao encontro da pessoa doente no seu próprio espaço ou percurso de vida. Para iniciar e ajustar este movimento para a intervenção, o profissional tem de se socorrer de múltiplas estratégias como o diálogo, a análise, a identificação, a reflexão, sobre os elementos que constituem aquela situação de vida em que se pretende intervir. Esta acção profissional tem lugar em contextos sociais e condições marcados pela incerteza, imprevisibilidade e singularidade onde se cruzam “as prescrições

hierárquicas, a procura social e os interesses próprios dos profissionais” (Canário, 1997: 138).

Deste modo, este processo permite elaborar com a pessoa alvo de cuidados e/ou com os seus familiares o que se pretende, exigindo-se, para tal, que a enfermagem como área do

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