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Formação profissional do arquivista e o mercado de trabalho

O século XXI é marcado pelo mundo globalizado e o surgimento de uma nova sociedade chamada de sociedade do conhecimento. Essa globalização trouxe alterações substanciais no modo de vida das pessoas e, no trabalho, exigem-se adaptações rápidas às mudanças impostas pelas tecnologias. Para tanto, é preciso acionar a capacidade crítica e criativa das pessoas e, ainda, a disposição para estar permanentemente em processo de capacitação.

Diante desse cenário, a formação profissional se destaca como sendo o meio privilegiado para preparar o profissional com o perfil necessário para enfrentar os desafios. Constitui-se, também, em grande desafio para a educação, formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres e aptos, intelectualmente, a lidar com a complexidade do sistema produtivo.

A formação profissional é fruto de uma realidade desencadeada pela Revolução Industrial que induziu a um crescimento econômico acelerado e culminou no surgimento do capitalismo. As forças produtivas foram direcionadas para a maximização do lucro obtido pelos capitalistas e ocasionou, num primeiro momento, na exploração extensiva de mão-de-obra e na progressiva inserção das tecnologias, alterando as relações sociais dentro e fora do processo produtivo. Nesse contexto, as instituições educacionais foram fundamentais para que houvesse a adequação do processo cognitivo aos anseios da produção capitalista.

De acordo com Cunha (2009), a qualificação e o reconhecimento requerido do profissional para atuar junto à comunidade vêm do conhecimento obtido por meio da formação. “A formação é organizada e gerida pela profissão e constitui um dos traços característicos de cada grupo profissional” (CUNHA, 2009, p. 97). Mas, quando nos referimos à formação profissional, é preciso que se diga que, no que tange à academia, esse conceito fica longe de representar apenas o ensino do como fazer, ligado a uma concepção tecnicista e instrumentalista.

A partir da década de 1980 e, principalmente a partir dos anos 1990, o ensino profissional investe na formação de competências. A formação profissional torna-se mais centrada no desenvolvimento da capacidade de raciocínio e aprendizagem do aluno, de modo que esse saiba pensar e aprender.

A sociedade globalizada requer profissionais que tenham excelente desempenho e sejam eficientes no que diz respeito à utilização eficaz da informação e do conhecimento. É um mercado bastante competitivo onde conhecimento e competência são fundamentais. Mas, não é nossa intenção se estender nessa discussão, o que importa aqui é destacar como se configura, na atual sociedade, a formação profissional e o mercado de trabalho, especificamente, do arquivista.

Atualmente, a realidade documental/informacional merece todo tipo de investimento, principalmente no que diz respeito ao tratamento para garantir sua recuperação e atendimento às necessidades informacionais da sociedade. É nesse âmbito que o arquivista tem a oportunidade de colocar seus conhecimentos à disposição dos cidadãos e fortalecer seu valor como um profissional da informação.

Aqui cabe fazermos um parêntese para esclarecer o que entendemos por profissional de informação, o que não é uma tarefa simples, porque existem algumas questões a serem esclarecidas como, por exemplo, a falta de uma definição universal da expressão profissional da informação. Atualmente, alguns especialistas garantem que continua sendo um conceito em processo de construção (LOUREIRO; JANNUZZI, 2005), porém, as discussões se multiplicam e há quem afirme que essa designação abrange um grupo de profissionais que atuam com a informação existente nos mais diferentes locais, em suportes, abordagens e momentos distintos (ALMEIDA JUNIOR, 2000, p. 32).

Ponjuán Dante (2000, p. 93) entende que se enquadram na categoria de profissional da informação “aqueles que estão vinculados profissional e intensivamente a qualquer etapa do ciclo de vida da informação” e ainda “são capazes de operar eficiente e eficazmente em tudo o que é relativo à informação em organizações de qualquer tipo ou em unidades especializadas de informação”38. Assim sendo, é perfeitamente cabível inserir o arquivista nesse grupo, pelo fato de a informação fazer parte do seu trabalho cotidiano, no que concordam vários autores como Muller (2004); Mason (1990) Pinto e Ochôa (2006) e Kohl (1992). Mas, a opinião de Souza (2010) é a de que o arquivista ainda ocupa um lugar periférico nesse grupo.

Ribeiro (2004) afirma que o arquivista passou de um período no qual estava preocupado apenas com a questão patrimonial e cultural para um novo momento,

38 Outras definições do conceito profissional da informação podem ser nos trabalhos de GUIMARÃES (1997), VALENTIM (2002), CUNHA (2009), FONSÊCA; ODDONE (2010).

criado pela revolução tecnológica e digital, no qual considera a dinâmica da informação como de interesse do seu universo de trabalho.

Todavia, no que diz respeito ao mercado de trabalho do arquivista, a literatura deixa a desejar, especialmente no que se refere à sua prática e seus desdobramentos ou, aos próprios espaços de trabalho (SOUZA, 2010). Segundo a autora, cresce o número de vagas para arquivistas nas instituições públicas e também no setor privado, e a atuação deste profissional junto ao processo de gestão da informação orgânica já é parcialmente reconhecida como primordial, sobretudo com o advento da informática. Mas, a tarefa de alargar suas fronteiras continua e, de acordo com Cunha e Crivellari (2004, p. 41), “quanto maior o poder de abstração teórica de uma profissão, mais sólida ela será no espaço social e no sistema profissional”.

O Conselho Internacional de Arquivos define arquivista como “aquele que tem sob sua responsabilidade o controle, cuidado, conservação e administração dos documentos” (OLIVEIRA, 2010, p. 73). Nessa mesma linha de pensamento, outros autores também definem o arquivista como o profissional cuja formação universitária que lhe assegura as devidas habilidades e competências para realizar a gestão de documentos (JARDIM; FONSECA, 2003; SOUZA, 2010).

No entanto, essa formação, de acordo com vários estudiosos, possui deficiências (BELLOTTO, 2004b), tais como: a incompatibilidade do mercado de trabalho e o “mundo universitário” e, também, a “carência de maior consolidação das teorias, das normas, da evolução vertiginosa das tecnologias não acompanhada pelo mesmo ritmo no ensino e aprendizagem”.

O fato é que a técnica e o conhecimento não permanecem estáticos diante do avanço tecnológico e das mudanças na conjuntura político-econômica. E isso é o que ocorre com a profissão do arquivista que, no final do século XIX, após a Revolução Francesa, foi alvo de investimentos na formação universitária, tendo sido criadas as escolas específicas como, por exemplo, a Escola de Munique e a École des Chartes. Também participaram deste processo de profissionalização as associações profissionais, sobretudo em alguns países da Europa como a França e o Reino Unido (RIBEIRO, 2004).

Couture, Martineau, Ducharme (1999) sintetizam a história da formação profissional em arquivística em três momentos distintos: “um longo período durante o qual a arquivística foi uma amazonas solitária, uma breve fase onde a pesquisa de alianças consistia no ‘litmotiv’ e, enfim, o decênio atual onde revisamos estas posições”.

Por muito tempo o arquivista foi visto como um auxiliar do historiador, entretanto, as conjunturas políticas, culturais e sócio-econômicas que “mediaram as duas Guerras Mundiais”, mais especificamente, o desenvolvimento tecnológico, o crescimento da produção informacional e a valorização da informação administrativa para a gestão das instituições, ocasionam uma ruptura entre os arquivos históricos e correntes, de modo a estabelecer duas categorias de profissionais que lidam com um mesmo objeto de estudo e trabalho (RIBEIRO, 2004). Esse modelo histórico-tecnicista que sustentou por muito tempo a prática arquivística e deu a esta a robustez necessária para se diferenciar das demais, também serviu de entrave quando a Sociedade da Informação passou a colocar novos desafios advindos da evolução tecnológica.

Desde então, o seu vínculo com as escolas de biblioteconomia e ciência da informação se fortaleceu. Conforme assinalam Couture, Martineau, Ducharme (1999, p. 24), “[...] esta corrente predomina na maioria das instituições de ensino, se bem que a amarração entre as formações (arquivísticas, biblioteconomia e ciências da informação) vem suscitando vários problemas”. Mas, a aproximação entre estas áreas ainda não é uma questão muito bem resolvida, na opinião de alguns teóricos.

De acordo com Ribeiro (2004), a Unesco, juntamente com outros organismos internacionais, como o Conselho Internacional de Arquivos e a Federação Internacional da Informação e Documentação e a Federação Internacional de Associações de Bibliotecários e Bibliotecas, posicionam-se a favor da harmonização Biblioteconomia, Arquivística e Documentação e defendem que a Arquivística encontra-se inserida nas disciplinas da informação, ou seja, na área da Ciência da Informação.

Para Ribeiro (2004, p. 110) a formação do arquivista deve estar alicerçada em suportes teórico-metodológicos da Ciência da Informação, com base nos seguintes itens:

• Combinar um conjunto de disciplinas nucleares da área da Ciência da Informação, de carácter obrigatório, com disciplinas de áreas interdisciplinares (Ciências Sociais e Humanas, Informática e Computação, Administração e Gestão), que constituem uma complementaridade indispensável;

• Anular as separações artificiais entre pretensas especializações de “Arquivo” e “Biblioteca/Documentação”, por não haver justificação do ponto de vista epistemológico, para tal distinção;

• Fazer a síntese com a área dos Sistemas (Tecnológicos) de Informação, uma vez que hoje, a tecnologia é absolutamente indissociável da Informação (na génese, uso e preservação).

Dessa manei do profissional da inform produtor/manipulador de flu Couture, Ma que ele chama de “harmo leitura da sua obra que a Ar seja, corre paralelamente u outros preconizam as semel Embora a p diferente do que atualmen função de que é preciso rev para que os arquivistas tenh aguarda. Souza (2010) indi trabalho do arquivista (Figu

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39 N.T.: “habilidades y competê todas las instancias y para cual

ira, acredita a autora que o arquivista se enca mação e poderá atuar “em qualquer con uxo informacional” (RIBEIRO, 2004, p. 10). artineau, Ducharme (1999), relatam as difi onização” na formação destas disciplinas. P

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agentes e a interação com o mercado de traba

nte: Extraída do trabalho de SOUZA, 2010. p. 70.

em arquivística leva à obtenção de certas r a gestão de documentos e informações a qualquer pessoa”39 (SOUZA, 2010, p. 105, abalho de Rodrigues e Marques (2009), panhois Martí Mauri e Perpinyã Morera (200 2008), a respeito dessas habilidades e competê as competências específicas do arquivista e c a a se desvincular do perfil tecnicista, par

ências para gestionar los documentos e informacion quier persona”. aixa no universo ntexto orgânico iculdades para o Percebemos pela harmonização, ou tidade, enquanto mencionadas. uma perspectiva o reavaliada em modelo formativo e trabalho que os em o mercado de alho s “habilidades e arquivísticas em tradução nossa). uma síntese da 08) e dos autores ências. considerando que ra assumir o de nes archivísticas en

produtor do conhecimento” (OLIVEIRA, 2010), é plausível defender que a formação deste profissional necessita estar embasada por uma fundamentação teórica rigorosa e consistente.

Não se trata apenas de adequar a formação do arquivista ao mercado de trabalho, mas vai além. Compartilhamos da concepção de Oliveira (2010) quando afirma que, a existência da universidade não deve estar atrelada a formar mão-de-obra para o mercado de trabalho e sim formar cidadãos. Nesse sentido, a programação de um curso deve ser ajustada de modo a capacitar pessoas a pensar criticamente o contexto onde se inserem e usar suas habilidades de modo criativo e eficiente em benefício do desenvolvimento social.

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