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FORMAÇÕES IDEOLÓGICAS, FORMAÇÕES DISCURSIVAS E EFEITOS DE

Em acordo com a discussão realizada anteriormente sobre as ciências que deram embasamento teórico para a concepção da Análise de Discurso francesa, nesta seção serão discutidos alguns conceitos fundamentais que estão presentes na referida teoria e que são indispensáveis na análise deste trabalho.

Discutir a Análise de Discurso francesa implica dar início a um debate sobre as questões ideológicas. Sob a ótica do Materialismo Histórico, Marx concebe a sociedade como dividida em duas estruturas: a infraestrutura (econômica) e a superestrutura (a ideologia, o direito e o Estado). A ideologia encontra-se entre a infraestrutura e a superestrutura, pois é ela que possibilitará a classe dominante reproduzir sua eficácia sobre a classe dominada e essa

terá um posicionamento de submissão à classe dominante, isso quer dizer que é a ideologia que perpetua essa relação imaginária de dominante e dominado.

Ao se dedicar a buscar uma materialidade para as ideologias, Althusser (1980, p. 43) defende que essa relação é mantida pelos Aparelhos Ideológicos de Estado, que são definidos por “um certo número de realidades que se apresentam ao observador imediato sob a forma de instituições distintas e especializadas.”

Assim, para Althusser os Aparelhos Ideológicos de Estado são constituídos pela religião, escola, família, direito, política, mídias, sindicatos e cultura. Tanto os Aparelhos Ideológicos de Estado quanto o Aparelho repressivo (Governo, Polícia, Exército etc.) pertencem à superestrutura e agem simultaneamente para garantir a reprodução das relações de produção.

A teoria marxista estrutura a ideologia em regiões. No caso da ideologia religiosa há a católica, luterana, ortodoxa, entre outras, e em posições de classes, como a classe operária e os donos dos meios de produção. Pêcheux faz uma relação entre as regiões e as posições de classes a partir da formulação do conceito de Formações Discursivas.

Quanto às formações ideológicas, são constituídas pelas forças em conflito e pelas relações de aliança ou de dominação. Essas forças se caracterizam pelo conjunto de representações relacionadas a grupos sociais e são constituídas por diversos componentes, como por exemplo, rituais, práticas, gestos e linguagem. Ao abordar sobre as formações ideológicas, Pêcheux e Fuchs (1997, p. 166) afirmam que sua função é:

[...] caracterizar um elemento (este aspecto da luta nos aparelhos) suscetível de intervir como uma força em confronto com outras forças na conjuntura ideológica característica de uma formação social em dado momento; desse modo cada formação ideológica constitui um conjunto complexo de atitudes e representações que não são nem “individuais” nem “universais” mas se relacionam mais ou menos diretamente a posições de classes em conflito umas com as outras.

Dessa forma, nota-se a relação da ideologia com a linguagem, o que gera a formulação do conceito de formação discursiva. Para Pêcheux (2011, p. 73):

[...] a ideia de que as formações ideológicas assim definidas comportam necessariamente, como um de seus componentes, uma ou várias formações discursivas interligadas, que determinam o que pode e deve ser dito (articulado sob a forma de um pronunciamento, de um sermão, de um panfleto, de uma exposição, de um programa etc.), a partir de uma dada posição numa dada conjuntura.

Com base em Pêcheux, pode-se dizer que é na formação discursiva que a ideologia recebe sua representação no processo discursivo, o qual vem à tona pela linguagem verbal.

Assim, os discursos são heterogêneos e não se constituem isoladamente, mas na relação com outros, ou seja, as palavras ganham sentido de acordo com as ideologias pelas quais foram atravessadas. Logo, pode-se dizer que as formações ideológicas direcionam as formações discursivas, como afirmam Charaudeau e Maingueneau (2008, p. 241): “É nas formações discursivas que se opera o ‘assujeitamento’, a ‘interpelação’ do sujeito como sujeito ideológico”.

Compreender a formação discursiva implica compreender o processo dos efeitos de sentidos e a sua dialogicidade com as ideologias, uma vez que o discurso é constituído de sentidos, tendo na formação discursiva a sua matriz. Souza (2006, p. 89 – 90) afirma que “uma FD será sempre invadida por elementos que vêm de um outro lugar, de outras FDs, sendo atravessada pelo “pré-construído” e pelos “discursos transversos”, ou seja, pelos sentidos que residem em outros discursos anteriores e exteriores.”

As práticas discursivas mobilizam as relações de sentido. Pêcheux (2011, p. 73) considera que “[...] não se trata somente da natureza das palavras empregadas, mas também, sobretudo, das construções nas quais essas palavras se combinam, na medida em que essas construções determinam a significação que as palavras terão.” Isto é, o sentido das palavras varia de acordo com as posições assumidas por cada indivíduo, isso implica dizer que o sentido sofre uma alteração ao passar de uma formação discursiva para outra.

Dessa forma, há uma compreensão de que o sentido não é absoluto, uma vez que há sentidos diferentes para a mesma palavra ou expressão. Orlandi (2013, p. 34) diz que “Ao falarmos nos filiamos a redes de sentidos, mas não aprendemos como fazê-lo, ficando ao sabor da ideologia e do inconsciente.” Essa afirmação demonstra que o que está em contato com o sujeito não é o sentido em si, mas o efeito que esse causa nele, logo, o sentido de uma sequência discursiva só é materialmente concebível quando há uma relação dessa com uma formação discursiva, isso explica a multiplicidade de sentidos atribuída a um discurso.

E essa variedade dos sentidos faz relação direta com a paráfrase, Léon e Pêcheux (2014, p. 164) afirmam que:

[...] ler um texto, uma frase, no limite, uma palavra, não constitui uma simples “tomada de informação”. O “sentido” de um texto, de uma frase e, no limite, de uma palavra, só existe em referência a outros textos, frases ou palavras que constituem seu “contexto” (contexto onde as modalidades de acessibilidade são, obviamente, extraordinariamente invariáveis).

Assim, os sentidos invocados no discurso pertencem à família parafrástica, uma vez que se encontram no campo do mesmo e do diferente, ou seja, são as várias maneiras de dizer

algo que se mantém na memória discursiva. Isso significa que a função da paráfrase, então, é de realizar uma retomada aos mesmos espaços do dizer.

Conclui-se que as formações discursivas são diretamente afetadas pela história, uma vez que contêm elementos que são retomados, apagados e também elementos pertencentes a outras formações discursivas que são invocados em função da luta ideológica. Com isso, é possível perceber o importante papel desempenhado pelas práticas dos discursos para trazer sentidos às formações discursivas.