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A FOTOGRAFIA COMO ATO DE FOTOGRAFAR

GÊNEROS TEXTUAIS A SEREM

2.4. PRIMEIROS RESULTADOS COMO OS ALUNOS DEFINEM O QUE É FOTOGRAFIA

2.4.1. A FOTOGRAFIA COMO ATO DE FOTOGRAFAR

Iniciamos nossa análise não com a categoria predominante, mas com a mais ingênua e pueril delas, e provavelmente oriunda das respostas mais impulsivas. Os alunos que se mostraram com menos recursos verbais escritos para se expressar conceitualmente, consideraram em sua resposta que a fotografia é em si o próprio ato de produzi-la, a ação de produzir fotografia. Se por um lado estas respostas nos revelam que eles respondem com conceitos espontâneos, também não atingem um nível de abstração que separa a ação em si e o resultado desta ação. Por outro lado revela que este ato de fotografar é algo que de alguma forma já faz parte do cotidiano e do meio sociocultural destas crianças. Ou seja, a imagem

64 fica submetida ao ato de produzi-la.

A seguir temos uma pequena amostra do texto destes alunos que dão destaque ao ato de fotografar:

− “A fotografia é quando você tira foto de alguém ou de si mesmo […]” (Aluno 17 da 6ªA)

− “Fotografia é tirar uma foto.” (Aluno 11 da 6ªB)

Considerando a observação de Luria (2006), feita a partir de experiências com crianças em processo de alfabetização e aquisição da escrita, temos que: "não é a compreensão que gera o ato, mas é muito mais o ato que produz a compreensão - na verdade, o ato frequentemente precede a compreensão." (LURIA, 2006, pag. 188) Assim, considerando o universo de 60 alunos, 20% deles explicam o que é fotografia como o ato ou a ação de fotografar. À luz da observação de Luria, podemos concluir que estes alunos estão em processo de desenvolvimento e ainda se encontram em processo de alfabetização, apesar de já estarem na 6ª série do Ensino Fundamental, portanto numa etapa avançada da aquisição da escrita. Mas, suas respostas indicam que é como se estivessem no processo inicial de alfabetização cuja compreensão do que é fotografia está relacionada apenas à ação de fotografar, faltando-lhes ainda a compreensão do resultado desta ação e os seus múltiplos desdobramentos.

É interessante observar que do universo pesquisado, outra parte, aproximadamente 15% deles explicam o que é fotografia como ação ou ato de fotografar, mas já relacionam com outras categorias, tais como memória, visão e exposição. Estes alunos parecem estar em etapa mais avançada do processo de alfabetização que o primeiro grupo considerado, mas não plenamente. Assim, somando-se estes dois grupos, temos que 35% do universo pesquisado não apresentam ainda as condições intelectuais de compreender o ato ou a ação de fotografar realizando uma abstração maior que é necessária para definir o que é fotografia, relacionando o ato de fotografar com a produção de uma imagem que é fotografia também. Em nossa análise consideramos que é possível que, neste nível da escolaridade, o estágio em que se encontra o processo de alfabetização desses alunos não possibilite ainda a compreensão do que é fotografia.

O fato do contexto sociocultural em que vivem as crianças atualmente conter a exposição intensa de imagens fotográficas e também de apresentar a utilização frequente de tecnologias que possibilitem a ação de fotografar, não garante que a aprendizagem pela fotografia seja efetivada. Este é um dado importante que nossa pesquisa prospectou logo no início, pois no caso do ensino de Geografia em que a fotografia é muito utilizada e

65 incorporada aos processos de aprendizagem e aos materiais didáticos, verificou-se que 35% dos alunos de 6ª série não realizam até aquele momento, nível de abstração suficiente para elaborar a definição do que é fotografia. Este grupo de alunos apresenta em suas respostas uma tendência de predominância do conceito espontâneo (aqui considerado no sentido proposto por Vigostki, 2009, p. 517) ainda não totalmente relacionado ao processo de aquisição da escrita que se articula com as funções intelectuais da leitura, não apresentando em suas respostas domínio dos processos de codificação e decodificação que não se relacionam apenas aos códigos da escrita, mas ao conjunto de códigos de todo tipo que se encontram no sistema cultural contemporâneo.

Cabe esclarecer que quando nos referimos à predominância do conceito espontâneo ou cotidiano, estamos considerando que as gerações escolares atuais já nasceram e vivem no meio técnico científico informacional onde circulam artefatos digitais (câmeras fotográficas digitais, telefones celulares com câmera embutida) que fazem parte de suas vivências cotidianas em que a imaterialidade da fotografia é gerada pela utilização destes artefatos que circulam pela internet, correios eletrônicos ou ficam armazenadas nos computadores, deixando de ter aquela permanência formal emoldurada na parede ou em belos álbuns de família com capa de couro.

A fotografia, para crianças e adolescentes das gerações atuais, vai fazendo parte do seu cotidiano no meio técnico científico informacional não sem consequências no processo de aquisição da escrita, tornando-se cada vez mais comum e menos solene, mais banal e menos formal, tornando-se fugaz e volátil na multidimensionalidade das tecnologias e meios de comunicação do século XXI.

Encarando a fotografia pelo aspecto do ato em si, ele traz a armadilha da isenção por trás da câmera, na qual o sujeito procura apenas registrar.

Susan Sontag (2011) dialoga com este aspecto da fotografia, o que a nosso ver exige que também lidemos com ela pelo aspecto da comunicação a ser feita pelo sujeito, além desta isenção fictícia, que se esconde atrás do artefato:

Fotografar é, em essência, um ato de não-intervenção. […] A pessoa que interfere não pode registrar; a pessoa que registra não pode interferir. […] Mesmo que incompatível com a intervenção, num sentido físico, usar uma câmera é ainda uma forma de participação. Embora a câmera seja um posto de observação, o ato de fotografar é mais do que uma observação passiva. […] Tirar uma foto é ter um interesse pelas coisas como elas são, pela permanência […] é estar em cumplicidade com o que quer que torne um tema interessante e digno de se fotografar […] (SONTAG, 2011, p. 22-23)

A isenção do fotografo é momentânea apenas no ato de fotografar, mas ao selecionar certo momento e atribuindo-o como importante para ser fotografado ele interage com a

66 realidade de forma diferente, além de propiciar que seus espectadores interajam com sua leitura emoldurada deste pedaço de realidade tornado fotografia.

Dentro do nosso universo de pesquisa, os 15% de alunos que também definiram a fotografia como o próprio ato, incluíram aspectos apontados por Sontag (2011) demonstrando que estão em uma transição também na compreensão do que é a fotografia como algo mais amplo e complexo do que apenas o próprio ato de fazer ou tirar fotografias, conforme os exemplos a seguir:

− "Fotografia não é tirar uma foto qualquer é tirar para colocar em livros, para que a pessoa do futuro continue onde nós paramos e que elas possam fazer a mesma coisa que a gente fez e elas podem ser famosos por causa de uma foto." (Aluno 12 da 6ªB)

− "É em uma máquina fotográfica você visualiza e tira a foto da pessoa." (Aluno 36 da 6ªB)