• Nenhum resultado encontrado

3.4 Estudo de casos

3.4.2 La Friche Belle de Mai

24

Um dia normal na Friche permitiria ver chegar, desde as 9 horas da manhã, as equipas e os artistas; às 10, um grupo de crianças para um atelier multimédia; às 11 horas, um grupo de industriais preparando a sua implantação na zona de “Euroméditerranée”; o conjunto dos “residentes” encontrarem-se no restaurante durante o almoço. Durante a tarde, quando as pessoas se entrecruzam, as portas abrem-se sobre o atelier de um artista inglês que reside na Villa ou de dançarinos croatas que vêm se instalar por um mês. Às 18 horas, quando o espetáculo público jovem acabou de terminar, começa uma vernissage de jovens artistas que reúne perto de 300 pessoas. Alguns irão, talvez, ver e ouvir a ultima criação do teatro musical apresentado na “Cartonnerie”. À meia-noite a equipa fecha o sítio. Na oficina multimédia, nos ateliers de arte plástica e na radio, alguns corajosos trabalham ainda.

(Lextrait, 2001: 38)

Em Marselha, o bairro “La Belle de Mai” cresceu ao redor das manufaturas de açúcar, de tabaco e de fósforos. Em 1990, o fecho das empresas construídas em 1863

24 Fotografia de la Friche Belle de Mai, autor desconhecido, http://www.lafriche.org/content/un-projet- culturel-pour-un-projet-urbain, acesso em 23/01/2013

44

deixa lugar às antigas fabricas abandonadas (“la fermeture des usines ont laissé place aux

friches industrielles”). É neste contexto que nasce, em 1992, “La Friche la Belle de Mai”,

no quarteirão 3 de uma antiga manufatura de tabaco. É a pedido do subdelegado de cultura, Christian Poitevin, que Philippe Foulquié e Alain Fourneau (respetivamente, diretores do teatro “Massalia” e do teatro “Les Bernardines”) criaram uma nova estrutura - “Système Friche Théâtre” - para desenvolver, nas antigas fábricas de Marselha, novas formas culturais sobre um princípio de nomadismo, de transversalidade artística e de mistura dos públicos. Depois de alguns projetos em outras fábricas, a equipa vai ocupar, finalmente, um terço da antiga manufatura de tabaco “Seita” (45000m2) e acolher outras iniciativas e outros artistas para estruturar e desenvolver o novo projeto. Confrontada com o imenso tamanho do sítio, a associação centra-se, num primeiro momento, na renovação e a segurança do lugar. Em alguns anos, “La Friche la Belle-de-Mai” torna-se um dos principais polos de criação, de residência e de prática cultural da cidade. A localização de um programa patrimonial e a criação do estabelecimento “Euroméditerranée” nos outros quarteirões da antiga fabrica, o desenvolvimento das novas tecnologias, assim como o reconhecimento do trabalho de criação artístico, ajudaram a associação a criar um novo objetivo, formalizada em 1996 pelo novo presidente, Jean Nouvel: “um projeto cultural para um projeto urbano” que defende o papel dos artistas no desenvolvimento económico.

On avait dit dès le départ qu’il fallait qu’on travaille sur la notion d’économie – on ne l’a pas dit dès le départ, mais on l’a dit assez vite avant Nouvel même. C’est-à-dire, envisager la culture comme une alternative économique, comment revitaliser un site et est-ce que la culture peut proposer une alternative ?

(Philippe Foulquié, diretor de Système Friche Théâtre (SFT), 2008)

O objetivo da Friche é a permanência artística na cidade assegurada por um dispositivo de acolhimento e meios de realização artísticos. A vontade é de acompanhar e de produzir abordagens de autor criando novas relações entre públicos, lugares e linguagens artísticas, segundo uma economia de conteúdo, trabalhando com novas lógicas, cruzamentos e um quadro de experimentação livre. Em torno do “Système Friche Théâtre” trabalham, em média, entre 60 e 70 diferentes estruturas em todas as disciplinas artísticas. A função

45

central dos produtores reside no acompanhamento dos artistas, da produção à difusão das suas obras. A Friche tem também como objetivos ser um polo simultaneamente local e internacional da cultura viva; ser um lugar de incitação artística e de formação permanente, onde o público é considerado como um parceiro de trabalho; assim como criar associações com os média e desenvolver ações fora do sítio.

L’objectif est de refonder l’action culturelle sur des dynamiques de décentralisation, d’interdisciplinarité, de mise en synergie des projets proposés par les producteurs artistiques et sur la base de la parole même des artistes et de leur socialisation. En cela, l’action culturelle devient en elle-même un agent de développement économique et urbain,

à partir de l’ensemble polynucléaire que constitue la friche. (Henry, 2012 : 16)

A Friche de la Belle de Mai é constituída por oficinas e espaços dedicados às atividades de criação e de produção dos residentes da fábrica, lugares de vida, de espaços e de equipamentos públicos (rua, praça pública, street-parque, creche, lugares de formação, restaurante, capitel, terraços…) e lugares de difusão. Em 2007, 700 eventos foram programados sobre e a partir do local, e numerosos ateliers de trabalho e formações foram desenvolvidos. A maior parte das obras apresentadas é realizada nas residências. A fábrica funciona com uma economia mista (receitas próprias, apoio público e privado) e, desde 2009, com uma nova estrutura de organização, a Sociedade cooperativa de iniciativa cultural (SCIC). A SCIC, constituída por uma vintena de sócios, tem por missão a planificação arquitetural e urbanística do espaço e da sua gestão concreta, o que permite à Système Friche Théâtre centralizar-se no seu papel principal de produtor e iniciador de projetos transversais. Atualmente, a problemática principal da Friche é de encontrar uma organização à medida das questões culturais, económicas e urbanas que foram levantadas, e uma forma de gestão que permita, de maneira coerente, uma ótima transversalidade dos projetos, assim como alcançar, progressivamente, a autonomização financeira da estrutura.

46